Acórdão nº REsp 1043207 / SP de T6 - SEXTA TURMA

Número do processoREsp 1043207 / SP
Data23 Agosto 2011
ÓrgãoSexta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.043.207 - SP (2007⁄0219977-3)

RELATOR : MINISTRO HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄CE)
RECORRENTE : L.E.D.O.N.
ADVOGADO : M.L.Á.D.B. E OUTRO(S)
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
ASSIST. MP : UNIÃO - ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. ARTIGO 619 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. VIOLAÇÃO. INEXISTÊNCIA. NULIDADE DO PROCESSO. DENÚNCIA OFERECIDA COM BASE, EXCLUSIVAMENTE, EM INVESTIGAÇÃO REALIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. INQUÉRITO POLICIAL. PRESCINDIBILIDADE. ANÁLISE DE EXISTÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES PARA DAR RESPALDO À PEÇA ACUSATÓRIA. SÚMULA Nº 7⁄STJ. EMENDATIO LIBELLI. DESCLASSIFICAÇÃO PARA CRIME DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO. REMESSA DOS AUTOS AO PARQUET PARA VERIFICAR POSSÍVEIS BENESSES PREVISTAS NAS LEIS NºS 9.099⁄1995 E 10.259⁄2001. APELAÇÃO DA ACUSAÇÃO PROVIDA PARA RESTABELECER A CAPITULAÇÃO DA DENÚNCIA. AÇÃO PENAL. PRINCÍPIOS DA OBRIGATORIEDADE E INDIVISIBILIDADE. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. NULIDADE DO FEITO POR AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO DEFENSOR CONSTITUÍDO. NÃO OCORRÊNCIA. DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA. VIOLAÇÃO DE DEVER FUNCIONAL NÃO VERIFICADA. DÚVIDA QUANTO À AUTENTICIDADE DOS DOCUMENTOS QUE SÃO OBJETO DA AÇÃO PENAL. APRESENTAÇÃO DE FOTOCÓPIAS. IRRELEVÂNCIA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. INEFICÁCIA DO MEIO NÃO CONFIGURADA. REGIME PRISIONAL MENOS GRAVOSO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR MEDIDAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. PRESENÇA DE CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1 - Não ocorre omissão quando o Tribunal de origem decide fundamentadamente todas as questões postas ao seu crivo, assim como não há confundir entre decisão contrária ao interesse da parte e inexistência de prestação jurisdicional.

2 - É vedado ao Ministério Público tão somente presidir o inquérito policial - peça prescindível à apresentação da denúncia - não lhe sendo proibido, contudo, realizar investigações no exercício de suas atribuições legais e constitucionais.

3 - A avaliação acerca da existência de provas suficientes para embasar a peça acusatória demandaria o revolvimento do conjunto fático-probatório constante dos autos, providência vedada na via estreita do recurso especial. Incidência do enunciado nº 7⁄STJ.

4 - Tendo em vista que o Tribunal de origem deu provimento ao recurso da acusação no ponto em que se insurgiu contra a desclassificação do delito para crime de menor potencial ofensivo, fica superada a alegação de nulidade do feito porque não remetido ao Ministério Público para que se pronunciasse sobre eventual transação penal.

5 - Concluindo as instâncias ordinárias pela inexistência de indícios de autoria em relação à J.V.F., não se mostra possível, nesta sede, modificar tal conclusão.

6 - Não tendo o réu constituído advogado, tanto que lhe foi nomeado defensor dativo, não há como presumir que o patrono que o acompanhou tão somente na audiência de oitiva de testemunha em juízo deprecado, sem apresentar mandado, passaria a ser seu defensor em todos os demais atos processuais. Na verdade, a função daquele advogado exauriu-se na audiência.

7 - A teor do art. 2º do Código de Ética Profissional do Contabilista, o contabilista não tem o dever de guardar sigilo sobres fatos ilícitos descobertos no exercício da atividade profissional.

8 - Para a caracterização do delito de falsidade documental, é irrelevante saber se o documento é original ou fotocópia, circunstância que só seria considerada em eventual incidente de falsidade, o que não se fez no caso.

9 - Não verificada, de plano, a falsidade do documento, que só veio a ser descoberta pelo excesso de cautela do magistrado, que solicitou novos balancetes para confirmar os dados trazidos aos autos, não há como se reconhecer a atipicidade da conduta.

10 - A existência de circunstâncias judiciais desfavoráveis, tanto que fixada a pena-base acima do mínimo legal, obstam a fixação de regime menos gravoso, assim também a substituição de pena por medidas restritivas de direitos.

11 - Dissídio jurisprudencial não demonstrado nos termos exigidos pelos dispositivos legais e regimentais que o disciplinam.

12 - Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, negado provimento.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nessa parte, negar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Maria Thereza de Assis Moura e Og Fernandes (voto-vista) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Não participaram do julgamento os Srs. Ministros Sebastião Reis Júnior e V.D.G. (Desembargador convocado do TJ⁄RS).

Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.

Brasília (DF), 23 de agosto de 2011 (data do julgamento).

MINISTRO HAROLDO RODRIGUES

(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄CE)

Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 1.043.207 - SP (2007⁄0219977-3)

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄CE): Cuida-se de recurso especial interposto por Luiz Estevão de Oliveira Neto contra acórdão do Tribunal Federal da 3ª Região.

Extrai-se do processado que o recorrente foi denunciado, juntamente com outras pessoas, pela prática de falsificação de documento público e uso de documento falso, por terem, em tese, juntados documentos contábeis falsos nos autos da Ação Civil Pública nº 2001.61.012.554-5, com o fim de induzir o juízo em erro e, assim, promover a liberação de bens indisponíveis por força de decisão judicial.

A ação penal foi julgada parcialmente procedente para condená-lo, por fraude processual, a 1 ano e 2 meses de detenção, em regime aberto, e multa, substituída a pena privativa de liberdade por duas medidas restritivas de direitos.

Interposto recurso de apelação por ambas as partes e pela União, assistente da acusação, o da defesa foi improvido, o da União não conhecido, e o apelo do Ministério Público foi parcialmente provido para "restaurar parcialmente a capitulação original conferida aos fatos e condenar o réu somente nas penas do artigo 297, § 2º, do Código Penal, com a incidência da agravante prevista no artigo 62, inciso I, do Código Penal, aplicando-lhe a pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão em regime semi-aberto, sem possibilidade de substituição por pena alternativa, e multa equivalente a 17 (dezessete) dias-multa, no valor unitário de 15 (quinze) salários-mínimos, restando prejudicada a insurgência quanto à fundamentação da dosimetria da pena feita em primeiro grau."

O acórdão encontra-se assim ementado:

"APELAÇÃO CRIMINAL – CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO – INEXISTÊNCIA DE NULIDADE DO PROCESSO DECORRENTE DA AUSÊNCIA DE INQUÉRITO POLICIAL – INEXISTÊNCIA DE NULIDADE DO PROCESSO PROVENIENTE DA NÃO INCLUSÃO DE CONTADORA DO GRUPO EMPRESARIAL NO PÓLO PASSIVO DA DEMANDA – INEXISTÊNCIA DE NULIDADE DO PROCESSO ORIGINÁRIA DA AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DE DEFENSORA CONSTITUÍDA – INEXISTÊNCIA DE NULIDADE DO PROCESSO ORIUNDA DA OFENSA AO ARTIGO 207 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL – INEXISTÊNCIA DE NULIDADE DA SENTENÇA DECORRENTE DA INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO DA CONDENAÇÃO – MATERIALIDADE COMPROVADA - DESCABIMENTO DE ALEGAÇÃO INOVADORA DA DEFESA FEITA EM SUSTENTAÇÃO ORAL QUANTO À ATIPICIDADE DO FATO – RESTAURAÇÃO DA CAPITULAÇÃO ORIGINÁRIA DOS FATOS – POTENCIALIDADE DA FALSIFICAÇÃO - AUTORIA INDUVIDOSA – PROGRESSÃO CRIMINOSA – PRELIMINAR REFERENTE A DOSIMETRIA DA PENA FEITA EM PRIMEIRO GRAU PREJUDICADA - DOSIMETRIA DA PENA DENTRO DOS LIMITES TRAÇADOS PELO ARTIGO 297, § 2º, DO CÓDIGO PENAL – INCIDÊNCIA DA AGRAVANTE PREVISTA NO ARTIGO 62, I, DO CÓDIGO PENAL – IMPOSIÇÃO DO REGIME SEMI-ABERTO – IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO POR PENA RESTRITIVA DE DIREITOS – EXPEDIÇÃO DE MANDADO DE PRISÃO – SÚMULA 267 DO STJ – NÃO CONHECIMENTO DA APELAÇÃO DA UNIÃO FEDERAL – APELAÇÃO MINISTERIAL PARCIALMENTE PROVIDA – DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO DO RÉU.

  1. Réu denunciado pela prática dos crimes capitulados nos artigos 297, § 2º e 304 do Código Penal, em concurso material, c.c artigos 29 e 62, I, do mesmo diploma legal. O MM. Juiz a quo, sob a fundamentação de que os fatos narrados na denúncia não se enquadram no tipo penal nela capitulado, aplicou a emendatio libelli, nos termos do artigo 383 do Código de Processo Penal e condenou o réu ao cumprimento de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de detenção, a serem cumpridos em regime aberto, e ao pagamento de 200 (duzentos) dias-multa, no valor unitário de 15 (quinze) salários mínimos, pela prática do crime descrito no artigo 347, caput, do Código Penal. Não obstante os antecedentes criminais do condenado, o ilustre magistrado, com base no artigo 44, § 3º, do Código Penal, substituiu a pena privativa de liberdade, pelo mesmo prazo, por 2 (duas) penas restritivas de direitos, quais sejam, prestação pecuniária consistente no pagamento em dinheiro de 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos à 'Cáritas Brasileira', e prestação de serviços à essa mesma entidade, à razão de uma hora por dia de condenação.

  2. Em síntese: ao réu atribui-se os fatos de promover e coordenar operação de adulteração de balancetes comerciais do 'Grupo OK' – documentos equiparados ao documento público por força do § 2º do artigo 297 do Código Penal – fazendo constar como integrantes do 'ativo circulante' da empresa – e portanto salvos de indisponibilidade – imóveis que na realidade integravam o 'ativo permanente' e seriam indisponibilizados; tudo com o fim de safar de prévio decreto judicial de indisponibilidade esses imóveis; fez juntar no rol inclusive um bem de seu patrimônio pessoal consistente na moradia dele.

  3. A acusação formulada é perfeitamente viável, pois foi lastreada em farta documentação coligida aos autos, com especial ênfase nos balancetes referentes aos meses de dezembro de 1998 e janeiro de 1999, através dos quais constata-se...

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