Acórdão nº HC 129035 / PE de T6 - SEXTA TURMA

Número do processoHC 129035 / PE
Data16 Agosto 2011
ÓrgãoSexta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

HABEAS CORPUS Nº 129.035 - PE (2009⁄0029721-4)

RELATOR : MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄SP)
R.P⁄ACÓRDÃO : MINISTRO HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄CE)
IMPETRANTE : J.A.B. E OUTRO
IMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A REGIÃO
PACIENTE : M.J.B.
PACIENTE : J.C.B.
PACIENTE : JOSÉ CARLOS BEZERRA JÚNIOR

EMENTA

HABEAS CORPUS. LAVAGEM DE DINHEIRO. AUSÊNCIA DE DEFINIÇÃO LEGAL DO TERMO ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. INOCORRÊNCIA. CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA O CRIME ORGANIZADO TRANSNACIONAL (CONVENÇÃO DE PALERMO). DECRETO LEGISLATIVO Nº 231, DE 29 DE MAIO DE 2003 E DECRETO N.º 5.015, DE 12 DE MARÇO DE 2004. DELITO DE LAVAGEM DE DINHEIRO PRATICADO POR ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA (ART. 1º, VII, DA LEI Nº 9.613⁄98). DESNECESSIDADE DE DESCRIÇÃO DO CRIME ANTECEDENTE. INÉPCIA DA DENÚNCIA NÃO VISLUMBRADA. ORDEM DENEGADA.

  1. O conceito jurídico da expressão organização criminosa ficou estabelecido em nosso ordenamento com o Decreto n.º 5.015, de 12 de março de 2004, que promulgou o Decreto Legislativo nº 231, de 29 de maio de 2003, que ratificou a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Convenção de Palermo). Precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal.

  2. A Lei nº 9.613⁄98 não só estabelece, em seu art. 1º, um rol de crimes antecedentes ao de lavagem, como também autoriza que outros delitos nela não especificados venham a constituir crimes antecedentes, desde que cometidos por organização criminosa. Assim, possível a imputação do crime de lavagem de capitais quando os recursos financeiros foram obtidos por organização criminosa, não havendo necessidade de se elencar quais seriam as supostas condutas por ela perpetradas a fim de se obter as vantagens econômicas indevidas.

  3. O trancamento da ação em sede de habeas corpus é medida excepcional que somente pode ser deferida quando se mostrar evidente a atipicidade do fato, a absoluta falta de indícios de materialidade e de autoria do delito ou quando presente alguma causa extintiva da punibilidade, hipóteses não encontradas no presente caso, pois foram apresentados na denúncia fatos que, pelo menos em tese, podem caracterizar a prática do crime de lavagem de capitais oriundos de recursos provenientes de delitos perpetrados por organização criminosa.

  4. Dessa forma, a peça acusatória, tal como apresentada, preenche os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, e atende as exigências trazidas pela Lei nº 9.613⁄98, uma vez que o delito de lavagem de capitais teria sido praticado por organização criminosa - o que dispensa a exigência de descrição do crime antecedente -, não havendo falar em encerramento prematuro do processo pela via do trancamento.

  5. Ademais, o parquet não só trouxe a descrição abrangente de como funcionava o esquema delituoso da organização criminosa, como também demonstrou a existência de indícios suficientes da ocorrência dos delitos de estelionato e formação de quadrilha em prejuízo do Poder Público, motivo pelo qual não se vislumbra qualquer irregularidade apta a tornar a denúncia inepta.

  6. Habeas corpus denegado.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, denegar a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Sr. Ministro Haroldo Rodrigues que lavrará o acórdão. Vencido o Sr. Ministro Relator.

    Os Srs. Ministros Maria Thereza de Assis Moura e Og Fernandes votaram com o Sr. Ministro Haroldo Rodrigues.

    Não participaram do julgamento os Srs. Ministros Sebastião Reis Júnior e V.D.G. (Desembargador convocado do TJ⁄RS).

    Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.

    Brasília (DF), 16 de agosto de 2011 (data do julgamento).

    MINISTRO HAROLDO RODRIGUES

    (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄CE)

    Relator

    HABEAS CORPUS Nº 129.035 - PE (2009⁄0029721-4)

    RELATOR : MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄SP)
    IMPETRANTE : J.A.B. E OUTRO
    IMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A REGIÃO
    PACIENTE : M.J.B.
    PACIENTE : J.C.B.
    PACIENTE : JOSÉ CARLOS BEZERRA JÚNIOR

    RELATÓRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄SP) (Relator):

    Trata-se de habeas corpus substitutivo de recurso ordinário impetrado em favor de M.J.B., J.C.B. e J.C.B.J., contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da Quinta Região (Habeas Corpus nº 3115).

    Levando a cabo a denúncia contra oito pessoas, o Ministério Público Federal, quanto a cada um dos denunciados, combinou as imputações que lá fez com o art. 1º, inciso VII, da Lei nº 9.613⁄98 – Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime, por meio de organização criminosa.

    No Tribunal Regional Federal da Quinta Região, impetrou-se habeas corpus com o fim de se extinguir a ação penal. Foi lá a ordem denegada nos termos desta ementa:

    PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA A PREVIDÊNCIA. QUADRILHA (ART. 288, DO CP). LAVAGEM DE DINHEIRO (ART. 1º, INCISO VII, DA LEI Nº 9.605⁄98). ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA COM RAMIFICAÇÕES EM CINCO ESTADOS DA FEDERAÇÃO. MODUS OPERANDI. PRETENSÃO. EXCLUSÃO DO TIPO PENAL DESCRITO NO ART. 1º, INCISO VII, da LEI nº 9.613⁄98 (LAVAGEM DE DINHEIRO). ALEGADA AUSÊNCIA DE DEFINIÇÃO LEGAL DA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA O CRIME ORGANIZADO TRANSNACIONAL. DECRETO LEGISLATIVO Nº 213, DE 29 DE MAIO DE 2003. DECRETO Nº 5.015, DE 12 DE MARÇO DE 2004. DENÚNCIAS. EXIGÊNCIAS DO ART. 41 DO CPP. OBSERVÂNCIA. FORTES INDÍCIOS DA EXISTÊNCIA DE CRIME ANTECEDENTE. INVESTIGAÇÕES PROBATÓRIAS. NÃO CABIMENTO. DENEGAÇÃO DA ORDEM.

  7. Cuida-se de ordem de habeas corpus impetrada em favor de pacientes, denunciados como incursos nas penas do art. 288, caput, do CP e no art. 1º, inciso VII, da Lei nº 9.613⁄98, para o fim de excluir da denúncia, o tipo penal descrito no art. 1º, inciso VII, da Lei nº 9.605⁄98 e revogar a ordem de prisão emanada do Juízo da 23ª Vara Federal de Pernambuco, por entenderem que, passando os pacientes a responder apenas pelo crime do art. 288 do CP, cuja pena é de reclusão de 01 (um) a 3 (três) anos, é possível a suspensão condicional do processo.

  8. Trata-se de uma rede criminosa formada por mais de 120 (cento e vinte) integrantes, com ramificação em pelo menos 5 (cinco) Estados da Federação, subdividida em basicamente quatro células distintas que, não sem comunicação e prestação de auxílio mútuo, atuam de forma autônoma na consecução do propósito de fraudar a Previdência Social. Modus operandi da quadrilha minuciosamente descrito.

  9. O art. 1º, inciso VII, da Lei nº 9.605⁄98 não prevê a prática de crime de organização criminosa que demandasse a existência de um tipo específico, mas a prática de crime por organização criminosa. Desse modo, responderá pelo crime de lavagem, ou ocultação de bens, direitos e valores quem ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime praticado por organização criminosa.

  10. A definição do termo 'organização criminosa', objeto de reiteradas discussões doutrinárias, restou pacificada, tendo em conta a adesão do Brasil à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, cujo texto fora aprovado pelo Congresso Nacional através do Decreto Legislativo nº 213, de 29 de maio de 2003 e promulgado pelo Decreto nº 5.015, de 12 de março de 2004, o qual determinou seja ela 'cumprida tão inteiramente como nela se contém'. A citada Convenção, cujo objetivo reside em promover a cooperação para prevenir e combater mais eficazmente a criminalidade organizada transnacional, definiu no art. 2º: 'a) Grupo Criminoso Organizado - grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material'.

  11. O Superior Tribunal de Justiça têm identificado organizações criminosas à luz do art. 1º da Lei 9.034⁄95, com a redação dada pela Lei 10.217⁄01, com a tipificação do art. 288 do CP e do Decreto Legislativo 231⁄03, o qual ratificou a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional.

  12. As condutas delituosas minuciosamente descritas na denúncia (redigida segundo as exigências do art. 41 do CPP e baseada em Relatório da Polícia Federal e em degravações de interceptações telefônicas, devidamente autorizadas judicialmente) se amoldam, em princípio, aos fatos típicos contidos no art. 288, caput, do CP e no art. 1º, VII, da Lei nº 9.613⁄98.

  13. Há, outrossim, elementos indiciários veementes da existência de crime antecedente – estelionato contra a Previdência Social – suficientes para o recebimento da denúncia. Tal ilação á corroborada pelo disposto no art. 2º, § 1º, da Lei nº 9.613⁄98.

  14. 'A teor do que dispõe o artigo 2º, inciso II, da Lei nº 9.613⁄1998, segundo o qual a denúncia pelo crime de lavagem de dinheiro independe do processamento do acusado pela infração que a antecede, mostra-se possível, em princípio, a deflagração da ação penal tão-somente em relação àquele delito, desde que a peça acusatória seja instruída com indícios suficientes da existência do crime antecedente (§ 1º do mencionado diploma)'. Excerto do voto do Ministro Paulo Gallotti, Relator do HC 65041⁄CE, Sexta Turma, julgado em 21.06.2007, DJ 01.10.2007, p. 370.

  15. Consoante cediço, a via angusta da ação constitucional do habeas corpus exige para o deslinde de questões fáticas a existência de prova pré-constituída, porquanto não comporta dilação probatória. In casu, é notório que o desvelar da assertiva dos impetrantes, de insubsistência da imputação do crime de lavagem de dinheiro, haja vista que a conta na qual eram efetuados os débitos era titularizada, em conjunto,...

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