Acórdão nº HC 187471 / AC de T5 - QUINTA TURMA

Data20 Outubro 2011
Número do processoHC 187471 / AC
ÓrgãoQuinta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

HABEAS CORPUS Nº 187.471 - AC (2010⁄0187675-7)

RELATOR : MINISTRO GILSON DIPP
IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO ACRE
ADVOGADO : G.J.F.D.S. - DEFENSOR PÚBLICO
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ACRE
PACIENTE : F F G
ADVOGADO : FABIANO CAETANO PRESTES - DEFENSOR PÚBLICO DA UNIÃO

EMENTA

PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. CORRUPÇÃO DE MENORES. CONOTAÇÃO SEXUAL. DECRETO CONDENATÓRIO TRANSITADO EM JULGADO. IMPETRAÇÃO QUE DEVE SER COMPREENDIDA DENTRO DOS LIMITES RECURSAIS. LEI N.º 12.015⁄09. NOVATIO LEGIS IN MELLIUS. RETROATIVIDADE. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. WRIT NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.

  1. Conquanto o uso do habeas corpus em substituição aos recursos cabíveis -- ou incidentalmente como salvaguarda de possíveis liberdades em perigo - crescentemente fora de sua inspiração originária tenha sido muito alargado pelos Tribunais, há certos limites a serem respeitados, em homenagem à própria Constituição, devendo a impetração ser compreendida dentro dos limites da racionalidade recursal preexistente e coexistente para que não se perca a razão lógica e sistemática dos recursos ordinários, e mesmo dos excepcionais, por uma irrefletida banalização e vulgarização do habeas corpus.

  2. Na hipótese, a condenação transitou em julgado e o impetrante não se insurgiu quanto à eventual ofensa aos dispositivos da legislação federal, em sede de recurso especial, buscando o revolvimento dos fundamentos exarados nas instâncias ordinária quanto à condenação criminal imposta, preferindo a utilização do writ, em substituição aos recursos ordinariamente previstos no ordenamento jurídico.

  3. O delito de corrupção de menores era previsto em nosso ordenamento jurídico em duas instâncias normativas, o Código Penal e a Lei n.º 2.252⁄1954. As duas disciplinas foram revogadas, nesta parte, pela Lei n.º 12.015⁄2009, a qual entrou em vigor no dia 10.08.2009 e deu nova redação ao art. 218 do Estatuto Repressivo, que passou a normatizar conduta diversa.

  4. O princípio da continuidade normativa típica ocorre quando uma norma penal é revogada, mas a mesma conduta continua sendo crime no tipo penal revogador, ou seja, a infração penal continua tipificada em outro dispositivo, ainda que topologicamente ou normativamente diverso do originário. Tal circunstância não se verifica quanto à conduta outrora prevista no art. 218, do Código Penal, pois o que passou a constar no art. 244-B, do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069⁄90), foi o delito similar, previsto na Lei n.º 2.252⁄1954, já revogada.

  5. Deve ser cassada a sentença condenatória e o acórdão recorrido, ante o reconhecimento da extinção da punibilidade do paciente, pela retroatividade de lei que não mais considera o fato a ele imputado como criminoso, nos termos do art. 107, inciso III, do Código Penal.

  6. Writ não conhecido. Ordem concedida de ofício.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça. "A Turma, por unanimidade, não conheceu do pedido e concedeu "Habeas Corpus" de ofício, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator." Os Srs. Ministros Laurita Vaz, Jorge Mussi, Marco Aurélio Bellizze e A.V.M. (Desembargador convocado do TJ⁄RJ) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 20 de outubro de 2011(Data do Julgamento)

MINISTRO GILSON DIPP

Relator

HABEAS CORPUS Nº 187.471 - AC (2010⁄0187675-7)

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO GILSON DIPP (Relator):

Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de F. F. G., visando à extinção de sua punibilidade, contra acórdão proferido no âmbito do Tribunal de Justiça do Estado do Acre, que negou provimento ao recurso de Apelação n.º 9.778, nos termos da seguinte ementa:

"PENAL E PROCESSUAL PENAL - APELAÇÃO CRIMINAL - CRIME CONTRA OS COSTUMES - CORRUPÇÃO DE MENOR - TENTATIVA - SUPRESSÃO DA CONDUTA - IMPOSSIBILIDADE - EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE - INOCORRÊNCIA.

1 - Revela-se incabível a extinção da punibilidade face a descriminalização do crime, uma vez que a conduta praticada pelo recorrente passou a constar no art. 244-B, da Lei n.º 8.069⁄90." (fl. 260).

Os autos revelam que o paciente foi condenado em 29.05.2009, no Juízo da Comarca da 4ª Vara Criminal da Comarca de Rio Branco⁄AC, a cumprir 06 anos e 08 meses de reclusão, no regime inicialmente fechado, pela prática do delito descrito no art. 218, c⁄c art. 71, ambos do Código Penal, consignando-se no decreto condenatório que os fatos ocorreram nos idos de 2003.

Irresignada, a Defesa interpôs apelação, pugnando pelo reconhecimento da extinção da punibilidade do réu, nos termos do art. 107, inciso III, do Código Penal.

A Corte Estadual, contudo, em julgamento ocorrido na sessão do dia 17.06.2010, negou provimento ao apelo, mantendo a sentença condenatória por seus próprios fundamentos.

Daí a presente impetração, na qual são repisados os argumentos originários, sustentando-se a descriminalização do delito de corrupção de menores, bem como que o art. 244-B do ECA além de não abranger a conduta praticada pelo réu, não pode retroagir para prejudicá-lo.

Em síntese, assevera: "de uma análise mesmo que superficial do Decisum colegiado resta claro que este desrespeitou a norma prevista no artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal, ao não reconhecer a retroatividade da lei penal, bem como fez referência da ocorrência, na espécie, da figura da continuidade normativa-típica em relação a conduta totalmente diversa da que o ora paciente fora condenado pelo juízo a quo, qual seja corrupção de menores para fins sexuais (art. 218 do Código Penal), com corrupção de menores para prática de crimes (artigo 244-B, da Lei n.º 8.069⁄90)." (fl. 04).

Aduz que houve a incidência, na espécie, do instituto denominado pela doutrina de novatio legis in mellius, pois a conduta imputada ao réu - antes prevista no art. 218 do Código Penal - teria sido revogada pelo legislador ordinário, o qual deu nova redação ao dispositivo, não abrangendo os fatos por ele praticados.

Requereu a concessão da ordem, em sede de liminar e no exame de mérito, para que fosse reconhecida a extinção da punibilidade do paciente, com a conseqüente cassação da sentença condenatória e do acórdão recorrido.

A medida de urgência foi indeferida à fl. 279.

Devidamente instruídos, os autos foram encaminhados à Subprocuradoria Geral da República, oportunidade em que o Parquet se manifestou às fls. 288⁄291 pela concessão da ordem.

É o relatório.

Em mesa para julgamento.

HABEAS CORPUS Nº 187.471 - AC (2010⁄0187675-7)

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO GILSON DIPP (Relator):

Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de F. F. G., visando à extinção de sua punibilidade, contra acórdão proferido no âmbito do Tribunal de Justiça do Estado do Acre, que negou provimento ao recurso de Apelação n.º 9.778.

Os autos revelam que o paciente foi condenado em 29.05.2009, no Juízo da Comarca da 4ª Vara Criminal da Comarca de Rio Branco⁄AC, a cumprir 06 anos e 08 meses de reclusão, no regime inicialmente fechado, pela prática do delito descrito no art. 218, c⁄c art. 71, ambos do Código Penal, consignando-se no decreto condenatório que os fatos ocorreram nos idos de 2003.

Irresignada, a Defesa interpôs apelação, pugnando pelo reconhecimento da extinção da punibilidade do réu, nos termos do art. 107, inciso III, do Código Penal.

A Corte Estadual, contudo, em julgamento ocorrido na sessão do dia 17.06.2010, negou provimento ao apelo, nos termos da ementa de fl. 260.

Daí a presente impetração, na qual são repisados os argumentos originários, sustentando-se a descriminalização do delito de corrupção de menores, bem como que o art. 244-B do ECA além de não abranger a conduta praticada pelo réu, não pode retroagir para prejudicá-lo.

Em síntese, assevera: "de uma análise mesmo que superficial do Decisum colegiado resta claro que este desrespeitou a norma prevista no artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal, ao não reconhecer a retroatividade da lei penal, bem como fez referência da ocorrência, na espécie, da figura da continuidade normativa-típica em relação a conduta totalmente diversa da que o ora paciente fora condenado pelo juízo a quo, qual seja corrupção de menores para fins sexuais (art. 218 do Código Penal), com corrupção de menores para prática de crimes (artigo 244-B, da Lei n.º 8.069⁄90)." (fl. 04).

Aduz que houve a incidência, na espécie, do instituto denominado pela doutrina de novatio legis in mellius, pois a conduta imputada ao réu - antes prevista no art. 218 do Código Penal - teria sido revogada pelo legislador ordinário, o qual deu nova redação ao dispositivo, não abrangendo os fatos por ele praticados.

Requereu a concessão da ordem, em sede de liminar e no exame de mérito, para que fosse reconhecida a extinção da punibilidade do paciente, com a conseqüente cassação da sentença condenatória e do acórdão...

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