Acórdão nº HC 193614 / RJ de T6 - SEXTA TURMA

Número do processoHC 193614 / RJ
Data06 Outubro 2011
ÓrgãoSexta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

HABEAS CORPUS Nº 193.614 - RJ (2011⁄0000449-1)

RELATOR : MINISTRO SEBASTIÃO REIS JÚNIOR
IMPETRANTE : M.C.C.F. - DEFENSOR PÚBLICO
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
PACIENTE : J B R (MENOR)

EMENTA

HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO CRIME DE ROUBO QUALIFICADO. MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO DO MENOR. FALTA DE REPRESENTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. POSSIBILIDADE. ART. 106 DA LEI N. 8.069⁄1990. DECRETO DE INTERNAÇÃO PROVISÓRIA. MOTIVAÇÃO INIDÔNEA. IMPOSSIBILIDADE DE O TRIBUNAL A QUO COMPLEMENTAR A FUNDAMENTAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO.

  1. A representação do Ministério Público não é pressuposto para a expedição de busca e apreensão de menor, o decreto de internação provisória pode acontecer antes desse ato.

  2. A decisão que decreta a internação antes da sentença deve demonstrar não só os indícios suficientes de autoria e a materialidade da infração, mas também as razões da inevitável medida extrema e emergencial.

  3. A gravidade do ato infracional e a suposta necessidade de garantir a segurança do adolescente não podem justificar, isoladamente, a privação total da liberdade, mesmo que provisoriamente, em razão da própria excepcionalidade da medida socioeducativa de internação.

    4 Não basta a mera reprodução dos termos legais nem a indicação do que fora declarado pela autoridade policial no inquérito (peça inquisitorial de caráter informativo), porquanto não são elementos aptos a ensejar a internação provisória.

  4. Não cabe ao tribunal de origem complementar a fundamentação de decisum que pecou por sua carência.

  5. Ordem expedida para cassar a decisão do Juiz da Vara da Infância e da Juventude.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conceder a ordem de habeas corpus nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ⁄RS), Maria Thereza de Assis Moura e Og Fernandes votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.

    Brasília, 06 de outubro de 2011 (data do julgamento).

    Ministro Sebastião Reis Júnior

    Relator

    HABEAS CORPUS Nº 193.614 - RJ (2011⁄0000449-1)

    RELATÓRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO SEBASTIÃO REIS JÚNIOR: Adoto por relatório o do Ministério Público Federal (Subprocurador-Geral da R.M.J.G.):

    Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, interposto pela Defensoria Pública contra decisão proferida pela Oitava Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que denegou a ordem vindicada no HC nº 2010.8.19.0000.

    Depreende-se dos autos, que o Juízo da Vara da Infância e Juventude da Comarca da Capital, acolhendo requerimento do Ministério Público, decretou a internação provisória do ora paciente, que foi apontado pela prática, em tese, de ato infracional análogo ao crime de roubo duplamente qualificado pelo emprego de arma de fogo e concurso de agentes, determinando a expedição do competente mandado de busca e apreensão.

    Dessa decisão, a defesa impetrou o Habeas Corpus nº 2010.8.19.0000, cuja ordem foi negada pela Corte Estadual fluminense, dando azo à presente impetração.

    Nesta via, sustenta a impetrante que constitui constrangimento ilegal a expedição de mandado de busca e apreensão do paciente, sem que tenha havido representação, consoante se extrai do art. 184, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

    Afirma que o paciente não foi preso em flagrante, nem foi intimado, notificado ou citado para comparecer em Juízo ou apresentado ao Ministério Público para ser ouvido acerca do suposto ato infracional, inexistindo razões que justifiquem a medida de busca e apreensão.

    Requer, liminarmente, o recolhimento do mandado de busca e apreensão do paciente. No mérito, pugna pela confirmação da medida liminar acaso concedida, sendo assegurado ao paciente o direito de responder em liberdade, e pela revogação da suspensão do feito pelo prazo de dois anos.

    A liminar deixou de ser apreciada, pelas razões expostas no despacho de fl. 42.

    Informações prestadas pela autoridade coatora às fls. 51⁄86, ressaltando que até 25⁄03⁄11, o mandado de busca e apreensão do adolescente ainda se encontrava pendente de cumprimento.

    Opinou o parecerista pela denegação da ordem, nestes termos (fl. 92):

    HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO CRIME DE ROUBO QUALIFICADO. MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO DO MENOR. FALTA DE REPRESENTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. POSSIBILIDADE. ART. 106 DA LEI 8.069⁄90. DECRETO DE INTERNAÇÃO PROVISÓRIA. DECISÃO JUDICIAL DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE PRESENTES NOS AUTOS. NECESSIDADE IMPERIOSA DA MEDIDA. PERICULOSIDADE DO INFRATOR. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E PROTEÇÃO DO MENOR. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL.

    - Parecer pela denegação da ordem.

    Até 2⁄8⁄2011, o mandado do busca e apreensão não havia sido cumprido, e o Processo n. 0329177-16.2009.8.19.0001 (2009.711.003155-6) permanece suspenso na Vara da Infância e Juventude da comarca do Rio de Janeiro⁄RJ.

    É o relatório.

    HABEAS CORPUS Nº 193.614 - RJ (2011⁄0000449-1)

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO SEBASTIÃO REIS JÚNIOR (RELATOR): Entendo tal e qual o Tribunal de origem no que tange à desnecessidade da representação para que se determine a internação provisória de menor. Confira-se, no que interessa, o voto do Desembargador Ronaldo Assed Machado (fls. 80⁄81):

    A representação não é pressuposto para a expedição da busca e apreensão, porquanto o artigo 184 do ECA estabelece expressamente que o Juiz decidirá sobre a decretação ou manutenção da internação provisória, daí porque o decreto de internação pode acontecer antes da representação.

    Colacionamos a seguinte decisão:

    BUSCA E APREENSÃO DE MENOR. FALTA DE MANIFESTAÇÃO DO M.P. POSSIBILIDADE. 'Habeas Corpus'. ECA. Fato análogo ao crime tipificado no artigo 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei n. 10.826⁄03. Busca e apreensão do menor infrator. Ausência de fundamentação e de representação do Ministério Público. A expedição de mandado de busca e apreensão do menor é medida legal, prevista no parágrafo 3º, do artigo 184, da Lei n. 8.069⁄90, para as hipóteses de não localização do menor, prescindindo da prévia representação do Ministério Público, como se depreende da redação do 'caput' do referido dispositivo, que faz expressa referência à manutenção da internação. O artigo 122 da Lei 8.069⁄90, diz respeito à aplicação de medida sócio-educativa de internação, logo, não guarda relação com o caso em comento, que discute a possibilidade de aplicação de internação provisória ao menor infrator. A representação não é pressuposto para expedição de busca e apreensão, porque o artigo 184, da Lei n. 8069⁄90 estabelece expressamente que o Juiz decidirá sobre a decretação ou manutenção da internação. Os requisitos autorizadores da internação provisória encontram-se devidamente demonstrados, eis que há indícios de autoria e materialidade. As declarações do menor em sede policial demonstram que o paciente possui inclinação para a prática de atos infracionais de extrema gravidade, como aquele análogo ao crime de roubo, qualificado pelo emprego de arma de fogo e concurso de agentes. Ordem denegada. (TJRJ. HC – 2007.059.06158. JULGADO EM 24⁄10⁄2007, OITAVA CAMARA CRIMINAL – Unânime. RELATOR: DESEMBARGADOR VALMIR RIBEIRO)

    Não foi outra a opinião do Ministério Público Federal (fls. 94⁄96):

    Segundo se extrai do artigo 106 da Lei 8.069⁄90 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA), a apreensão de adolescente em razão de suposta prática de ato infracional pode decorrer de flagrante e de ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente.

    De se ver, que o dispositivo legal não traz qualquer exigência quanto ao oferecimento de representação pelo Ministério Público.

    Por sua vez, o art. 184, § 3º, citado pela impetrante, prevê a hipótese de expedição de mandado de busca e apreensão do menor, mediante ordem judicial, quando frustrada a sua citação para fins de comparecimento à audiência de apresentação, para ser ouvido acerca da atribuição do ato infracional constante da representação oferecida pelo Ministério Público.

    Claro está, que o artigo supracitado não se presta a embasar a tese da impetração, que lhe conferiu interpretação inadequada, e totalmente contrária ao artigo 106 do ECA.

    Ademais, o caput do art. 184 dispõe que, oferecida a representação, o Ministério Público poderá requerer a manutenção da apreensão do adolescente ou a decretação de sua apreensão provisória, extraindo-se daí a conclusão de que a custódia pode ocorrer em momento anterior à instauração do processo judicial.

    [...]

    Sem embargo dos argumentos supra, ressalte-se que a representação equivale à denúncia no processo criminal, e o Código de Processo Penal, aplicável subsidiariamente nas situações reguladas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 152 do ECA), não condiciona a prisão provisória ao oferecimento da denúncia.

    Nesse contexto, não há como conferir ao paciente a liberdade pretendida pela impetração, mormente porque o decreto de internação provisória atende às exigências impostas pelo Estatuto...

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