Acordão nº 0067400-58.2009.5.04.0461 (RO) de Tribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul), 28 de Marzo de 2012

Data28 Março 2012
Número do processo0067400-58.2009.5.04.0461 (RO)
ÓrgãoTribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Porto Alegre - RS) (Brasil)

PROCESSO: 0067400-58.2009.5.04.0461 RO

IDENTIFICAÇÃO

Origem: Vara do Trabalho de Vacaria

EMENTA

RELAÇÃO DE EMPREGO. CONTRATO DE ESTÁGIO. Demonstrado nos autos que a reclamada não cumpriu com os requisitos da Lei nº 6.494/77 e Decreto nº 87.497/82 na contratação da reclamante como estagiária, sendo a contratação havida entre as partes típica relação de emprego.

ACÓRDÃO

por maioria, vencido o Relator quanto ao intervalo do artigo 384 da CLT, dar provimento parcial ao recurso do reclamado para determinar que as diferenças salariais deferidas no período de 16-11-2004 a 04-7-2005, observe a remuneração paga ao pessoal de escritório e excluir da condenação o pagamento de quinze minutos extras diários pelo intervalo do artigo 384 da CLT e da multa do art. 475-J do Código de Processo Civil.

Por unanimidade, dar provimento parcial ao recurso do reclamante para acrescer à condenação o pagamento de honorários advocatícios no percentual de 15% do montante da condenação.

Valor da condenação mantido para os fins legais.

RELATÓRIO

Ajuizada a ação trabalhista em face do contrato de trabalho apontado na petição inicial, no período compreendido entre 16-11-2004 a 03-8-2009, foi proferida sentença às fls. 728-62.

O banco reclamado interpõe recurso ordinário às fls. 788-98, insurgindo-se contra a decisão que indeferiu o pedido da reclamada de expedição de ofício ao CIEE para que trouxesse aos autos os documentos referentes ao estágio e relatórios de estágio, requerendo seja reconhecido o cerceamento de defesa e declarada a nulidade do processo. Insurge-se, ainda, contra a decisão que reconheceu o vínculo de emprego no período em que o reclamante manteve relação de estágio com o banco reclamado e o condenou ao pagamento de diferenças salariais; horas extras (duração normal de trabalho, jornada arbitrada, intervalos intrajornada e artigo 384 da CLT, divisor e reflexos); despesas com a utilização de veículo particular, férias, aplicação do disposto no artigo 475-J do CPC e FGTS com 40%.

O reclamante interpõe recurso adesivo às fls. 818-27, postulando a reforma da sentença quanto à jornada arbitrada, férias, adicional de risco, integração do auxílio refeição e auxílio cesta alimentação, quilômetros rodados, adicional pelo acúmulo de função, devolução de descontos, indenização por danos morais, adicional de penosidade, indenização pelos frutos recebidos na posse de má-fé, honorários advocatícios e recolhimentos previdenciários e fiscais.

Com contrarrazões do reclamante às fls. 804-15 e do reclamado às fls. 831-84, sobem os autos para julgamento.

VOTO RELATOR

DESEMBARGADOR RICARDO CARVALHO FRAGA:

RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMADO.

1. CERCEAMENTO DE DEFESA. OFÍCIO CIEE.

Insurge-se o reclamante contra o procedimento do juízo a quo que indeferiu o pleito de expedição de ofício ao CIEE para que trouxesse aos autos os documentos referentes ao estágio e relatórios de estágio, sustentando que os relatórios de estágio são obrigação do estagiário que os confecciona, fica com uma cópia e entrega as outras duas na Faculdade e no CIEE.

Na ata de audiência da fl. 720 consta o requerimento do réu quanto à expedição de ofício ao CIEE, tendo a magistrada indeferido o pedido, sob o seguinte argumento:

"Indefiro o requerido, porque razão assiste à autora, na medida em que os documentos que registram contratos atípicos como o é o de estágio, devem ser provados pela parte que o aproveita, devendo esta ter a guarda de tais documentos, até porque tal tipo de contrato é firmado em diversas vias, ficando uma via, com o CIEE, uma via com a universidade, uma via com a parte e outra via com a contratante".

A sentença declarou o vínculo de emprego entre as partes no período em que a reclamada sustenta a relação de estágio, por entender desvirtuada a finalidade do programa de estágio, com base na Lei 6.494/77, vigente à época e no depoimento da preposta do banco.

Concorda-se com o entendimento da Magistrada de origem quanto à desnecessidade de expedição de ofício ao CIEE, já que incumbe à empresa concedente do estágio a manutenção dos documentos periodicamente reexaminados para que o estágio curricular não se mostrasse descaracterizado. Nesse sentido dispõe o artigo 5º do Decreto nº 87.497/82 que regulamentava a Lei nº 6.494/77, vigente à época do contrato da reclamante:

"Art. 5º Para caracterização e definição do estágio curricular é necessária, entre a instituição de ensino e pessoas jurídicas de direito público e privado, a existência de instrumento jurídico, periodicamente reexaminado , onde estarão acordadas todas as condições de realização daquele estágio, inclusive transferência de recursos à instituição de ensino, quando for o caso."

Nesse sentido, o ofício ao CIEE (Centro de Integração Empresa-Escola), embora pudesse trazer mais dados em relação a outros elementos da contratação havida, há outros fatores importantes que se considera que dispensam tal ofício, o que se verá no item a seguir.

Deve ser ponderado que a situação fática se sobrepõe ao aspecto formal, notadamente em casos que envolvem pedido de reconhecimento de vínculo. Recorde-se, por fim, que o reclamado não juntou aos autos documentos pertinentes ao contrato de estágio.

Assim, não se verifica cerceamento de defesa a justificar a nulidade do processo.

Provimento negado.

2. VÍNCULO DE EMPREGO. RELAÇÃO DE ESTÁGIO.

Insurge-se o recorrente contra a sentença que reconheceu como de emprego o vínculo existente com o reclamante no período em que as partes mantiveram válida relação de estágio (de 16-11-2004 a 04-7-2005). Sustenta que os documentos juntados aos autos (termos de compromisso de estágio) são perfeitamente válidos para comprovar o lapso da relação havida bem como a natureza das atividades desenvolvidas, adequadas ao curso de Administração cursado pela reclamante. Assim, por terem sido observadas as formalidades legais previstas na Lei 6.494 de 07-12-77 e porque a natureza das atividades desempenhadas pela autora são relacionadas e compatíveis com o curso de Administração de Empresas entende inexistente o vínculo de emprego.

A Magistrada de origem acolheu a tese da inicial, com base na prova oral produzida, concluindo que a jornada de trabalho ultrapassava a carga máxima prevista na legislação e que as atividades exercidas pela autora eram típicas de bancária, sujeita a controle de horário, possuindo atividades fixas e subordinação, reconhecendo o vínculo de emprego como banco reclamado. Refere, ainda, a Magistrada:

"Ademais, não verifico ter o estágio fornecido à estudante experiência prática na linha de sua formação - Administração de Empresas - tampouco houve supervisão quanto à complementação do ensino e da aprendizagem, menos ainda avaliação da estagiária no curso do contrato, conforme determinam os §§ 2º e 3º do art. 1º da Lei n. 6.494/77, alterada pela Lei n. 8.859/94, que regulamentava a prática do estágio na época em que ocorridos os fatos em exame.

Tais constatações demonstram ter havido desvirtuamento do programa de estágio, que, ao invés de dar ênfase ao aspecto pedagógico, enfatizou o aspecto produtivo do qual a empresa foi a maior beneficiária. Condenável é essa prática de empregadores que, buscando reduzir despesas com encargos sociais e trabalhistas, utilizam estagiários como mão-de-obra a custo baixo para o desenvolvimento de suas atividades-fim, deixando em segundo plano o caráter pedagógico do programa.

Logo, desvirtuada a finalidade do programa de estágio, decorrente da utilização do trabalho do estagiário de forma dissociada do previsto na Lei n. 6.494/77, e estando presentes os requisitos elencados no art. 3º da CLT, deve ser reconhecido o vínculo empregatício.

O salário a ser reconhecido e anotado em CTPS é o piso salarial da categoria dos bancários, na forma das convenções coletivas da categoria. Por fim, deve ser dito que a ausência do contrato em nada altera o deslinde do feito, porque a realidade demonstra que o contrato era de emprego e não de estágio. De mais a mais, a existência deste e respectiva guarda deveria estar com a demandada, porque a documentação relativa ao contrato é ônus da empresa deter. "

Examina-se.

A Lei 6.494, de 07.12.77, regulamentada pelo Decreto nº 87.497/82, que regulava os estágios dos estudantes de ensino superior e de ensino profissionalizante do 2º grau e supletivo, vigente à época do contrato da reclamante, dispõe expressamente no art. 4º que o estágio não gera relação de emprego. Para tanto devem ser atendidos os seguintes requisitos básicos:

"a) o estagiário deve deter a condição de aluno regularmente matriculado em estabelecimento de ensino;

b) o estágio somente pode ser feito em unidades que possam propiciar experiência prática na linha de formação do estagiário;

c) o estágio deve propiciar a complementação do ensino e da aprendizagem, mediante acompanhamento e avaliação, de acordo com os currículos, programas e calendários escolares ou, ainda, poderá assumir a forma de atividade de extensão, participando o estudante em empreendimentos ou projetos de interesse social."

Incontroverso nos autos que as partes firmaram Contrato de Estágio,com interveniência do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE).

Contudo, como referido pela Sentença, não há comprovação nos autos, sequer quanto ao atendimento dos requisitos formais do contrato de estágio, como exigia a Lei 6.494/77, vigente à época da prestação de serviços. Não foi juntado o Termo de Compromisso de Estágio (instrumento jurídico) que demonstrasse a compatibilidade das atividades exercidas e o regular acompanhamento do aprendizado.

A reclamante, em depoimento, informa que desde seu ingresso no banco, teve metas de venda de produtos e cumpria a mesma jornada de trabalho.

A preposta do reclamado, em depoimento, afirma:

"...que quando a reclamante era estagiária fazia abordagem de clientes, oferta de produtos, direcionamento para o caixa e auto-atendimento ; que não se recorda se a reclamante trabalhou como...

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