Acordão nº 0000820-04.2010.5.04.0302 (RO) de Tribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul), 10 de Mayo de 2012

Magistrado ResponsávelAndr㉠Reverbel Fernandes
Data da Resolução10 de Mayo de 2012
EmissorTribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul)
Nº processo0000820-04.2010.5.04.0302 (RO)

PROCESSO: 0000820-04.2010.5.04.0302 - RO

IDENTIFICAÇÃO

Origem: 2ª Vara do Trabalho de Novo Hamburgo

Prolator da

Sentença: JUÍZA DANIELA ELISA PASTÓRIO

EMENTA

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. Não há dúvida de que é direito potestativo do empregador despedir seu empregado. Contudo, o ordenamento jurídico não admite a exacerbação deste direito ou a sua utilização para atingir fim espúrio. A despedida decorrente de ato discriminatório constitui verdadeiro abuso de direito, previsto no artigo 187 do Código Civil. Recurso ordinário da reclamante parcialmente provido.

ACÓRDÃO

por unanimidade de votos, dar parcial provimento ao recurso ordinário da reclamante para condenar a reclamada ao pagamento das seguintes parcelas, com juros e correção monetária na forma da lei: a) férias dos períodos aquisitivos 2003/2004, 2004/2005, 2005/2006, em dobro, e 14 dias referente ao período aquisitivo 2006/2007, de forma simples, autorizada a dedução do terço constitucional de férias recebido; b) indenização por danos morais no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais) e c) honorários assistenciais fixados em 15% sobre o valor bruto da condenação. Sobre o valor da indenização por dano moral incidem juros de mora a partir do ajuizamento da presente ação, nos termos do artigo 883 da CLT e correção monetária a contar da sessão de julgamento, a teor do que estabelecem a Súmula 362 do STJ e a Súmula 50 deste Regional. Autorizam-se os descontos previdenciários e fiscais cabíveis. Custas de R$ 400,00 (quatrocentos reais), calculadas sobre o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), que ora se arbitra à condenação, pela reclamada.

RELATÓRIO

Inconformada com a sentença das fls. 275/279, a reclamante interpõe recurso ordinário às fls. 298/299, buscando a reforma do julgado no que se refere à doença ocupacional e férias.

A reclamada apresenta contrarrazões às fls. 298/299.

Os autos são remetidos a este Tribunal para julgamento.

VOTO RELATOR

JUIZ CONVOCADO ANDRÉ REVERBEL FERNANDES:

RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE.

1. RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR. DOENÇA OCUPACIONAL. DESPEDIDA SEM JUSTA CAUSA. PRESSUPOSTOS DO DEVER DE INDENIZAR.

Na petição inicial (fls. 02/13), a reclamante assevera que foi admitida pela reclamada em 02.05.2001 para exercer a função de assistente financeira e que foi despedida injustamente em 25.08.2008. Alega que, como era a única pessoa responsável pelo departamento financeiro, seus atestados médicos não eram respeitados e que a reclamada nunca concedeu férias de forma correta. Sustenta que desenvolveu doença ocupacional. Requer a condenação da reclamada ao pagamento de indenização por danos morais "em decorrência da demissão [sic] sem justa causa, quando a Reclamante já encontrava-se com a doença ocupacional, em R$ 100.000,00 (cem mil reais), tendo em vista a impossibilidade de ser a Reclamante recolocada no mercado de trabalho em definitivo" - letra #####i/i##### (fl. 12).

A reclamada contesta (fls. 160/168). Nega que a reclamante fosse a única pessoa responsável pelo departamento financeiro. Sustenta a correta concessão e gozo das férias. Aduz que a função da reclamante não envolve esforço repetitivo. Ressalta que a reclamante foi considerada apta no exame demissional.

É determinada a realização de perícia médica (ata da fl. 148). O laudo é apresentado às fls. 227/233 e complementado às fls. 257 e 267.

A Magistrada de origem julga improcedente o pedido. Acolhe a conclusão do laudo pericial quanto à ausência de nexo de causalidade entre a doença apresentada pela reclamante e o trabalho desenvolvido na reclamada. Fundamenta que "a simples extinção contratual, por si só, não gera dano moral, inclusive por que é admitido no ordenamento jurídico pátrio o exercício do poder potestativo do empregador. Também não se evidencia tenha sido ofendida a honra da autora, ou que esta tenha sido abalada psiquicamente de forma a considerar agressão a sua dignidade, ou situação geradora de dor íntima" - fl. 278. A reclamante não se conforma. Salienta que todas as suas atividades na empresa demandavam o uso do computador. Afirma que o INSS, na Instrução Normativa nº. 98/2003, reconhece a relação entre o trabalho e algumas moléstias, entre elas a síndrome do túnel do carpo. Requer a reforma do julgado com a condenação da reclamada ao pagamento de indenização por dano moral em decorrência da despedida quando existente a doença ocupacional, conforme pedido deduzido na petição inicial.

Com parcial razão.

De acordo com o laudo pericial das fls. 227/233, a reclamante apresenta quadro de síndrome do túnel do carpo bilateral de origem não ocupacional, ou seja, não relacionado com o trabalho. Não obstante, analisando os demais elementos de prova constantes dos autos, entende-se que existe relação de causa e efeito entre a mononeuropatia desenvolvida pela autora no punho e as atividades por esta desempenhadas na reclamada.

Frise-se que o Julgador não está adstrito ao laudo pericial, como bem salienta Humberto Theodoro Júnior:

O perito é apenas um auxiliar da Justiça e não um substituto do juiz na apreciação do evento probando. "Deve apenas apurar a existência de fatos cuja certificação dependa de conhecimento técnico." Seu parecer não é uma sentença, mas apenas fonte de informação para o juiz, que não fica adstrito ao laudo e pode formar sua convicção de modo contrário a base de outros elementos ou fatos provados no processo (art. 436).

E, realmente, deve ser assim, pois, do contrário, o laudo pericial deixaria de ser simples meio de prova para assumir o feitio de decisão arbitral e o perito se colocaria numa posição superior à do próprio juiz, tornando dispensável até mesmo o pronunciamento jurisdicional. (Curso de Direito Processual Civil, Vol I, 51ª edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010, p. 488/489)

Embora o perito tenha referido que as atividades da reclamante não contribuíram para o desencadeamento ou agravamento da lesão no punho (Síndrome do Túnel do Carpo), o conjunto probatório demonstra que as tarefas realizadas pela autora foram determinantes para o desenvolvimento da doença.

No perfil de cargo das fls. 192/194 consta a descrição detalhada das tarefas atinentes ao conteúdo ocupacional da função desenvolvida pela reclamante. A primeira tarefa listada, "digita a contabilidade gerencial e emite relatórios correspondentes a mesma", corrobora as alegações da reclamante. Observa-se , ainda, que a maioria delas exige o uso de digitação de dados em computador.

Segundo o Ministério da Saúde e Organização Pan-Americana da Saúde no Brasil, a Síndrome do Túnel do Carpo (CID G56.0):

É a síndrome caracterizada pela compressão do nervo mediano em sua passagem pelo canal ou túnel do carpo. Está associada a tarefas que exigem alta foca e/ou alta repetitividade, observando-se que a associação de repetitividade com frio aumenta o risco.

[...]

Entre os profissionais mais afetados estão os que usam intensamente os teclados de computadores , os trabalhadores que lidam com caixas registradoras, os telegrafistas, as costureiras, os açougueiros e os trabalhadores em abatedouros de aves ou em linhas de montagem. - grifa-se. (Doenças relacionadas ao trabalho: Manual de procedimentos para os serviços de saúde. Brasília: Ministério da Saúde do Brasil, 2001, p. 217).

Cumpre ressaltar que a autora laborou na empresa demandada de 02.05.2001 a 25.08.2008, totalizando mais de 7 anos de trabalho. Assim, não é possível afastar a contribuição do trabalho para o desenvolvimento da moléstia.

É ônus da reclamada comprovar a adoção de medidas preventivas e a observância das normas de proteção e segurança do trabalho, do qual não se desincumbe a contento, a teor do que estabelece o artigo 333, inciso II, do Código de Processo Civil. A demandada sequer traz aos autos Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), Laudo Técnico das Condições do Ambiente de Trabalho, Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA); Levantamento de Riscos Mecânicos; Levantamento Ergonômico e Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP).

Os atestados de saúde ocupacional das fls. 185/189 comprovam que a reclamante estava exposta a riscos ergonômicos: postural e repetitividade.

De outra banda, a patologia suportada pela autora tem caráter multifatorial, razão pela qual se imputa à reclamada 30% da...

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