Acordão nº 0001073-96.2010.5.04.0332 (RO) de Tribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul), 24 de Mayo de 2012

Número do processo0001073-96.2010.5.04.0332 (RO)
Data24 Maio 2012
ÓrgãoTribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Porto Alegre - RS) (Brasil)

PROCESSO: 0001073-96.2010.5.04.0332 - RO

IDENTIFICAÇÃO

Origem: 2ª Vara do Trabalho de São Leopoldo

Prolator da

Sentença: JUIZ LUÍS HENRIQUE BISSO TATSCH

EMENTA

TOMADOR DOS SERVIÇOS INTEGRANTE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ART. 927, CAPUT, DO CÓDIGO CIVIL. À luz do disposto no caput do art. 927 do Código Civil, impõe-se reconhecer a responsabilidade do tomador dos serviços, ainda que integrante da Administração Pública, quando constatado o fato de que, no decorrer da prestação de serviços do obreiro mediante interposta pessoa, negligenciou no dever de vigilância (culpa in vigilando) do cumprimento das obrigações trabalhistas pela empregadora, praticando, assim, ato ilícito. Aplicação da Súmula nº 331, IV e V, do TST. Apelo da reclamada desprovido.

RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. A solidariedade não se presume, na forma do art. 265 do CCB, decorre da lei ou da vontade das partes, o que não ocorre no caso dos autos. Contrato de prestação de serviços celebrado entre os demandados que não contem previsão de responsabilidade nesses moldes, inexistindo, ainda, norma legal a ampará-la. Apelo da autora desprovido.

ACÓRDÃO

preliminarmente, à unanimidade, rejeitar a prefacial de não conhecimento do recurso da reclamada arguida em contrarrazões pela reclamante, bem como não conhecer do reexame necessário, por incabível. No mérito, à unanimidade, negar provimento ao recurso ordinário da segunda reclamada e ao recurso adesivo da autora.

RELATÓRIO

Inconformadas com a sentença das fls. 163-174, que julgou procedente em parte a ação, a segunda reclamada FGTAS e a reclamante interpõem recursos.

A segunda reclamada Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação Social - FGTAS, interpõe recurso ordinário às fls. 176-182, buscando a reforma da decisão nos seguintes aspectos: reexame necessário; responsabilidade subsidiária; saldo de salários; adicional de insalubridade; juros e correção monetária.

A reclamante, em seu recurso adesivo das fls. 194-197, pretende a reforma do julgado em relação aos seguintes itens: responsabilidade solidária; salário família; verbas rescisórias; multas dos arts. 477 e 467 da CLT e honorários assistenciais.

Com contrarrazões das fls. 188-191 (reclamante) e às fls. 211-213 (segunda reclamada FGTAS), sobem os autos a este Tribunal para julgamento.

O Ministério Público do Trabalho, por meio do parecer das fls. 230-231, da lavra da Procuradora Regional do Trabalho Denise Maria Schellenberger, manifestou-se pelo prosseguimento do feito, na norma da lei.

VOTO RELATOR

DESEMBARGADOR JOÃO GHISLENI FILHO:

PRELIMINARMENTE.

1. ADMISSIBILIDADE DOS RECURSOS. ARGUIÇÃO DE NÃO CONHECIMENTO DO APELO DA RECLAMADA FORMULADA NAS CONTRARRAZÕES PELA AUTORA.

Em contrarrazões (fls. 188-191), a reclamante sustenta que o recurso ordinário da reclamada não merece ser conhecido, ao argumento de que foi interposto pela Fundação Escola Técnica Liberato Salzano Vieira da Cunha, a qual não integra o polo passivo da relação processual.

Analiso.

Com efeito, embora conste como recorrente a Fundação Escola Técnica Liberato Salzano Vieira da Cunha, na petição de encaminhamento do recurso ordinário (fl. 176), merece ser conhecido o recurso, porquanto as razões recursais guardam estrita pertinência com as matérias debatidas nestes autos, bem como há a identificação correta do número do presente processo (000173-96.2010.5.04.0332) e da parte reclamante. O que se extrai dos autos, pois, é a ocorrência de mero equívoco da parte ao proceder na identificação da reclamada.

Portanto, rejeita-se a prefacial.

De resto, tempestivos os apelos (fls. 162 e 176; e fls. 185 e 194), regulares as representações (fl. 05 - a parte autora e, nos termos da OJ nº 52 da SDI1 do TST, a Fundação reclamada), custas processuais dispensadas em relação à segunda reclamada (fl. 174-ver5so) e depósito recursal inexigível, encontram-se preenchidos os pressupostos de admissibilidade dos recursos.

2. REEXAME NECESSÁRIO.

A segunda demandada, Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação Social - FGTAS, propugna pela realização do reexame necessário, na forma preconizada pelo Decreto-Lei n. 779/69. Aduz ser inaplicável na Justiça do Trabalho a alteração do artigo 475 do CPC, uma vez que este é de aplicação subsidiária.

Analiso.

A sentença não está sujeita a reexame necessário, porquanto a condenação imposta foi de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), conforme se verifica à fl. 174-verso, não ultrapassando o valor correspondente a 60 (sessenta) salários mínimos à época da prolação da sentença em julho de 2011 (salário mínimo de R$ 545,00), a teor do que dispõe o art. 475, § 2º, do CPC. Além disso, aplica-se o entendimento da Súmula nº 303, I, do Egrégio Tribunal Superior do Trabalho, in verbis:

"Fazenda Pública. Duplo grau de jurisdição. (incorporadas as Orientações Jurisprudenciais ns. 9, 71, 72 e 73 da SDI-1) I - Em dissídio individual, está sujeita ao duplo grau de jurisdição, mesmo na vigência da CF/1988, decisão contrária à Fazenda Pública, salvo: a) quando a condenação não ultrapassar o valor correspondente a 60 (sessenta) salários-mínimos; (...)".

Incabível, pois, o reexame necessário pretendido, mantendo-se a sentença no aspecto.

MÉRITO.

I - RECURSO ORDINÁRIO DA FUNDAÇÃO RECLAMADA.

1. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA.

A segunda reclamada insurge-se contra a responsabilidade subsidiária que lhe foi imputada em face dos créditos reconhecidos e deferidos à reclamante neste processo. Refere que a decisão viola o inciso II do artigo 5° e o caput do artigo 37 da CF, bem como o artigo 265 do CCB e os artigos 70 e 71 da Lei n° 8.666/93. Aduz que não há previsão legal ou contratual para configurar a subsidiariedade. Declara que o contrato de prestação de serviços firmado entre as reclamadas estabelece que a responsabilidade pelas obrigações trabalhistas é exclusiva da empresa contratada. Menciona que ao desconsiderar o disposto no parágrafo 1° do artigo 71 da Lei n° 8.666/93, a decisão desrespeita a Súmula Vinculante n° 10 do STF. Observa que também não se trata de responsabilidade objetiva da administração pública, pois, não configurada a hipótese do parágrafo 6° do artigo 37 da CF. Sustenta a inaplicabilidade da Súmula n° 331 do TST, artigo 9° da CLT e artigo 927 do CCB. Por derradeiro, invoca a constitucionalidade do art. 71, § 1º da Lei 8.666/93 declarada pelo STF.

Analiso.

Na inicial a reclamante informou que trabalhou para a primeira reclamada do dia 17-03-2009 até 19-09-2009, na função de serviços gerais, tendo percebido como último salário a quantia de R$ 524,49. Disse que emboras contratado pela primeira reclamada, prestava serviços exclusivamente para a segunda reclamada, requerendo a sua condenação solidária/subsidiária.

A contratação da reclamante pela primeira reclamada, bem como a prestação dos serviços em benefício da segunda reclamada são fatos incontroversos nos autos, como se verifica pelas próprias contestações apresentadas pelas reclamadas, mais especificamente o quanto informado pela primeira reclamada à fl. 42 e às fls. 117 e 122 pela segunda reclamada.

Assim, o conjunto probatório disponível é suficiente para confirmar a execução de serviços de limpeza e higienização pela reclamante, na função de Auxiliar de Serviços Gerais, no Parque de Recreação do Trabalhador - PRT, unidade administrada pela FGTAS de São Leopoldo no período de 17-03-2009 até 19-09-2009 (documento de fls. 122-123), na forma em que apontada na petição inicial, embasando a condenação subsidiária da Fundação reclamada, real beneficiária dos serviços prestados pela reclamante, ou seja, de sua força de trabalho e capacidade laborativa.

Às fls. 125-128 encontra-se o contrato firmado entre as rés para prestação de serviços de limpeza e higienização (cláusula primeira - fl. 125) com data inicial de 17-03-2009. O distrato da fl. 129 revela que a contratação havida entre as reclamadas foi declarada extinta em 10-05-2010.

O tomador dos serviços integrante da Administração Pública, se negligente no decorrer da prestação de serviços, pela falta de fiscalização (culpa in vigilando) do cumprimento das obrigações trabalhistas pela empregadora, é responsável subsidiário pela satisfação dos créditos dos empregados daquela, quando careça de idoneidade econômica e financeira para suportá-los, nos termos do caput do art. 927 do Código Civil: "Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo". Pode-se reconhecer, então, a responsabilidade do tomador dos serviços independentemente de culpa pela má escolha da empresa contratada para a prestação dos serviços (culpa in eligendo), se havida culpa in vigilando, atraindo a responsabilidade subsidiária na demanda pelo fato de beneficiar-se do trabalho prestado pelo obreiro, sem que tenha fiscalizado o cumprimento dos créditos trabalhistas pela empregadora. Nesse caso, o tomador do serviço responde por ato ilícito, por ter causado, com sua omissão, dano a outrem.

Com a declaração de constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93 pelo Supremo Tribunal Federal na ADC16/DF, essa situação não é alterada, pois a referida norma não se sobrepõe a outras normas e princípios, quando comprovada a culpa.

A própria decisão do STF deixou essa margem, constando no Informativo n. 610, do período de 22 a 26 de novembro de 2010, o qual se toma por base, uma vez que ainda não há acórdão publicado: "entendeu-se que a mera inadimplência do contratado não poderia transferir à Administração Pública a responsabilidade pelo pagamento dos encargos, mas reconheceu-se que isso não significaria que eventual omissão da Administração Pública, na obrigação de fiscalizar as obrigações do contratado, não viesse a gerar essa responsabilidade" - grifou-se.

Por este raciocínio, não é inconstitucional o § 1º do art. 71 da Lei n. 8.666/93, mas ele pode ceder espaço, caso a caso, para a responsabilização civil por atos ilícitos, respondendo o Poder Público pelos danos causados a outrem. Nesse...

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