Acordão nº 0060900-15.2009.5.04.0351 (RO) de Tribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul), 12 de Junio de 2012

Magistrado ResponsávelClã“vis Fernando Schuch Santos
Data da Resolução12 de Junio de 2012
EmissorTribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul)
Nº processo0060900-15.2009.5.04.0351 (RO)

PROCESSO: 0060900-15.2009.5.04.0351 - RO

IDENTIFICAÇÃO

Origem: 1ª Vara do Trabalho de Gramado

Prolator da

Sentença: JUÍZA IRIS LIMA DE MORAES

EMENTA

VÍNCULO EMPREGATÍCIO. INEXISTÊNCIA. PASTOR DE IGREJA. Não comprovada a presença dos elementos indispensáveis à caracterização do vínculo de emprego, nos termos dos arts. e da CLT, incabível a declaração do vínculo de emprego. Prova que demonstra a prática de trabalho de cunho religioso.

ACÓRDÃO

preliminarmente, à unanimidade de votos, rejeitar a preliminar de não conhecimento do recurso ordinário da ré, arguida em contrarrazões. No mérito, à unanimidade de votos, dar provimento ao recurso ordinário da ré, para afastar a declaração do vínculo de emprego e absolvê-la da condenação aos pedidos decorrentes da relação de emprego, restando prejudicado o exame dos demais itens recursais, bem como o recurso do autor no que tange ao item "multas dos arts. 467 e 477 da CLT". À unanimidade de votos, negar provimento ao recurso ordinário do autor. Custas revertidas ao autor, do qual fica dispensado, por estar ao abrigo da gratuidade da Justiça.

RELATÓRIO

Inconformados com a sentença das fls. 563-574, complementada pela decisão da fl. 607, o autor e a ré interpõem recursos ordinários.

O autor pretende a reforma da sentença nos seguintes aspectos: dano moral, devolução de valores e bens doados à ré, assédio moral, indenizações dos arts. 467 e 477 da CLT (fls. 592-601).

A ré objetiva a reforma da sentença quanto aos seguintes aspectos: vínculo de emprego, verbas rescisórias, horas extras, anotação na CTPS, adicional de transferência, vale-transporte, art. 475 J do CPC e honorários de assistência judiciária (fls. 609-657).

Custas à fl. 659 e depósito recursal à fl. 658.

Com contrarrazões (fls. 664-674 e 678-685), são remetidos os autos a este Tribunal para julgamento dos recursos.

É o relatório.

VOTO RELATOR

DESEMBARGADOR CLÓVIS FERNANDO SCHUCH SANTOS:

I - PRELIMINAR

1. ARGUIÇÃO DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO ORDINÁRIO DA RÉ FEITA EM CONTRARRAZÕES

O autor argui, em contrarrazões, preliminar de não conhecimento do recurso ordinário interposto pela ré, ao argumento de que não teria constado o número correto do processo na guia de comprovação do depósito recursal.

Analisa-se.

Nos termos do art. 899, parágrafos 4º e , da CLT, o depósito recursal deve ser feito em conta vinculada do FGTS, devendo o empregador proceder à respectiva abertura caso o empregado ainda não tenha conta vinculada em seu nome.

A Instrução Normativa n. 15, do Tribunal Superior do Trabalho condiciona a validade do depósito recursal às exigências arroladas no seu item 5:

5. Do Depósito Recursal. 5.1. Depósito, referente a causas trabalhistas, previsto no artigo 899 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, efetuado como condição necessária à interposição de recurso contra decisão proferida pela Justiça do Trabalho. 5.2. Deve ser efetivado em conta vinculada do FGTS , aberta para esse fim específico, mediante GRE, avulsa e apresentada em 3 (três) vias, com a seguinte destinação: 1ª via- Caixa/Banco; 2ª via - empregador; 3º via - Processo/JCJ. 5.3. Cada GRE abrigará o depósito recursal relativo a apenas um processo, identificado no campo 17, e poderá ser autenticada em qualquer agência bancária, no ato da efetivação do depósito. 5.4. São informações indispensáveis à qualificação dos recolhimentos referentes ao depósito recursal: 5.4.1 Do Depositante (Empregador) - Razão Social/Nome do Empregador (campo 03); - CGC/CNPJ/CEI (campo 04); - Endereço (campos 05 a 09). (...) 5.4.2 Do Trabalhador - Nome (campo 21); Número PIS/PASEP (campo 23). (....) 5.4.3 Do Processo - Informações complementares (campo 17) - deverá ser preenchido com o número do processo, bem como do Juízo correspondente (na forma: nº do processo, Seção, Vara, etc ). - grifos nossos.

Já a Instrução Normativa n. 18 do Tribunal Superior do Trabalho, posteriormente editada e versando sobre a mesma questão, dispõe:

Considera-se válida para comprovação do depósito recursal na Justiça do Trabalho a guia respectiva em que conste pelo menos o nome do Recorrente e do Recorrido; o número do processo; a designação do juízo por onde tramitou o feito a explicitação do valor depositado, desde que autenticada pelo Banco recebedor.

Na hipótese, por meio da guia juntada à fl. 658, é possível constatar que o depósito realizado se refere ao processo correto, constando o nome das partes, o juízo e valor correto. Destaco, ainda, que o número do processo constante na guia juntada diz respeito à carta precatória formada, neste feito, para a oitiva de testemunhas. Embora não tenha constado o número do processo principal, o depósito foi feito em nome do autor e em sua conta vinculada.

Portanto, considero observada a previsão legal, pelo que a guia carreada aos autos é plenamente válida para garantir a execução do feito, tendo em vista que a finalidade de garantia da condenação foi alcançada, por força do Princípio da Instrumentalidade das Formas.

Rejeita-se a preliminar.

II - MÉRITO

1. RECURSO ORDINÁRIO DA RÉ. MATÉRIA PREJUDICIAL

1.1 VÍNCULO DE EMPREGO

A ré busca a reforma da decisão em que reconhecido o vínculo de emprego entre as partes. Sustenta, em síntese, que a prova produzida descaracteriza a relação de emprego, uma vez que não se encontram preenchidos os requisitos legais (subordinação, salário, continuidade e pessoalidade). Assevera que a decisão ataca os preceitos da entidade recorrente de uma forma pessoal, deixando-se levar por uma aparente aversão à filosofia pregada. Argumenta que a decisão lhe imputa desvio de finalidade, entendendo que a entidade visa lucro, embora se trate de uma entidade religiosa divorciada do fim econômico. Aduz que a decisão recorrida causa reflexos de natureza social e jurídica, por intervir na liberdade de auto gestão da entidade religiosa, regulando seus membros no processo de socialização, salientando que a Constituição da República preceitua que o Estado não pode intervir nas instituições religiosas (art. 19, inciso I).

O Juízo de origem entendeu que a relação mantida entre as partes reveste-se da natureza empregatícia. No seu entender, o autor, além dos domínios religiosos, também se ocupava de assuntos leigos, como a limpeza do local de trabalho. Além disso, considerou inarredável a constatação de empreendimento lucrativo, resultado que teria sido atingido por meio do trabalho humano. Considerando demonstrado o trabalho do autor em prol da ré, de forma pessoal, contínua, subordinada e mediante retribuição pecuniária, reconheceu a relação jurídica de emprego entre as partes.

Analisa-se.

Combinadas as disposições contidas nos artigos e da CLT, tem-se que é empregado aquele (pessoa física) que, pessoalmente, presta serviços de natureza não eventual, de forma subordinada e mediante remuneração, a quem (pessoa física ou jurídica), assumindo os riscos da atividade, dirige, fiscaliza e remunera aquela prestação de serviços.

A relação de emprego é relação que se estabelece, independentemente da vontade das partes, submetida apenas à existência, no plano dos fatos, dos elementos que a informam, aos quais se impõe a presença total, de forma concomitante. A ausência de um dos elementos, por si só, afasta a possibilidade jurídica de sua caracterização. Por se tratar de relação que emerge do plano fático, necessária se torna a análise dos elementos que a caracterizam. Assim, a pessoalidade resta demonstrada pela prestação pessoal dos serviços à relação intuito personae, sendo relevante ao tomador destes serviços não só a realização dos mesmos como a pessoa que os realizou. No que diz respeito à eventualidade, se dissocia o conceito do conteúdo da ideia de tempo. Não se indaga se a relação se desenvolveu por curto ou longo período, se contínua ou descontínua. A eventualidade, para fins de caracterização da relação de emprego, diz respeito à compatibilidade entre as tarefas prestadas e o fim a que se destina o empreendimento. A subordinação é elemento primordial à caracterização desta relação especial de trabalho e, por vezes, o único elemento hábil a configurar sua existência. A subordinação que caracteriza a relação de emprego é a que decorre do poder diretivo do empregador, a quem cabe orientar, fiscalizar, dirigir a prestação do trabalho e, consequentemente aplicar advertências, punições e, até mesmo, extinguir a própria relação.

Ressalte-se que o contrato de trabalho é contrato-realidade e configura-se independentemente da vontade das partes. Em face do princípio da primazia da realidade, a intenção inicial das partes não se reveste de força vinculativa para a determinação da natureza jurídica da relação estabelecida. Ainda que recusem as posições de empregado e empregador, estarão ligados por contrato de trabalho, uma vez verificados os requisitos legais. É o primado da realidade sobre a forma que determina o reconhecimento do vínculo empregatício uma vez configurados todos os seus elementos constantes do art. 3º da CLT.

Evidencia-se, portanto, que admitida a prestação de serviço, presume-se a existência do contrato de trabalho, salvo prova em contrário. No presente caso, tendo a ré confirmado o trabalho dito voluntário do autor a ela pertence o ônus de comprovar, consoante os arts. 818 da CLT e 333, II, do Código de Processo Civil, fato impeditivo do direito vindicado - de que a relação estabeleceu-se nos moldes em que noticia, bem como de forma, impessoal, eventual e sem subordinação.

A prova produzida nos autos não indica a existência de vínculo de emprego entre as partes, desvirtuamento da...

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