Acórdão nº 2008/0038530-2 de T1 - PRIMEIRA TURMA
Magistrado Responsável | Ministro JOSÉ DELGADO (1105) |
Emissor | T1 - PRIMEIRA TURMA |
Tipo de Recurso | Agravo Regimental no Recurso Especial |
AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.033.794 - RS (2008/0038530-2)
RELATOR | : | MINISTRO JOSÉ DELGADO |
R.P/ACÓRDÃO | : | MINISTRO LUIZ FUX |
AGRAVANTE | : | P.L.S. - ARREDAMENTO MERCANTIL |
ADVOGADOS | : | ANA PAULA CAPITANI E OUTRO(S) |
M.T.C. E OUTRO(S) | ||
AGRAVADO | : | MUNICÍPIO DE SÃO LEOPOLDO |
ADVOGADO | : | C.R.N.G. E OUTRO(S) |
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. ISS. ARRENDAMENTO MERCANTIL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. CONCEITO PRESSUPOSTO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. AMPLIAÇÃO DO CONCEITO QUE EXTRAVASA O ÂMBITO DA VIOLAÇÃO DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL PARA INFIRMAR A PRÓPRIA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA CONSTITUCIONAL. ACÓRDÃO CALCADO EM FUNDAMENTO SUBSTANCIALMENTE CONSTITUCIONAL. INCOMPETÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. TEMA DIVERSO DO ENSEJADOR DA SÚMULA 138, DO STJ.
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O ISS na sua configuração constitucional incide sobre uma prestação de serviço, cujo conceito pressuposto pela Carta Magna eclipsa ad substantia obligatio in faciendo, inconfundível com a denominada obrigação de dar.
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Outrossim, a Constituição utiliza os conceitos de direito no seu sentido próprio, com que implícita a norma do artigo 110, do CTN, que interdita a alteração da categorização dos institutos.
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Consectariamente, qualificar como serviço a atividade que não ostenta essa categoria jurídica implica em violação bifronte ao preceito constitucional, porquanto o texto maior a utiliza não só no sentido próprio, como também o faz para o fim de repartição tributária-constitucional (RE 116121/SP).
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Sob esse enfoque, é impositiva a regra do artigo 156, III, da Constituição Federal de 1988, verbis:
"Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
I - propriedade predial e territorial urbana;
II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;
III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
(...)"
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A dicção constitucional, como evidente, não autoriza que a lei complementar inclua no seu bojo atividade que não represente serviço e, a fortiori, obrigação de fazer, porque a isso corresponderia franquear a modificação de competência tributária por lei complementar, com violação do pacto federativo, inalterável sequer pelo poder constituinte, posto blindado por cláusula pétrea.
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O conceito pressuposto pela Constituição Federal de serviço e de obrigação de fazer corresponde aquele emprestado pela teoria geral do direito, segundo o qual o objeto da prestação é uma conduta do obrigado, que em nada se assemelha ao dare, cujo antecedente necessário é o repasse a outrem de um bem preexistente, a qualquer título, consoante a homogeneidade da doutrina nacional e alienígena, quer de Direito Privado, quer de Direito Público.
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Envolvendo a atividade, bens e serviços, a realidade econômica que interessa ao Direito Tributário impõe aferir o desígnio final pretendido pelo sujeito passivo tributário, distinguindo-se a atividade meio, da atividade fim, esta última o substrato da hipótese de incidência.
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"A adulteração dos conceitos incorporados pelo Constituinte na criação da regra-matriz de incidência de cada exação fiscal é matéria constitucional, visto que viola as regras de repartição constitucional da competência tributária e, por conseqüência, atenta contra a organização federativa do Estado, que pressupõe a autonomia legislativa dos entes federados" (Parecer da lavra de Luiz Rodrigues Wambier, datado de 20.07.2006).
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As proposições acima conduzem à inequívoca inconstitucionalidade do item 79 e do subitem 15.09, da relação anexa ao Decreto-Lei 406/68, com a redação dada, respectivamente, pelas Leis Complementares 56/87 e 116/03, que prevêem a incidência do ISS sobre o arrendamento mercantil, por isso que se conjura a incompetência imediata do STJ para a análise de recurso que contenha essa antinomia como essência em face da repartição constitucional que fixa os lindes entre esta E. Corte e a Corte Suprema.
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Acórdão cuja conclusão alicerça-se em fundamento constitucional, qual seja, a violação do artigo 156, III, da Constituição Federal de 1988, e a inconstitucionalidade das listas constantes do Decreto-Lei 406/68 e da Lei Complementar 116/03, revela-se de integral competência do STF, máxime quando se sustenta um fundamento autônomo a exigir, na forma do verbete sumular, a interposição simultânea de ambos os apelos extremos (Precedentes da Primeira Turma: AgRg no REsp 684021/RS, desta relatoria, DJ de 22.08.2005; AgRg no REsp 697335/RS, desta relatoria, DJ de 29.08.2005; REsp 631547/MG, Relator Ministro José Delgado, DJ de 05.08.2004; e AgRg no AgRg no Ag 659539/MG, desta relatoria, DJ de 20.02.2006. Decisões monocráticas: RESP 628211/BA, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJ de 15.12.2004, e no REsp 822631/RS, Relator Ministro José Delgado, DJ de 31.03.2006).
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Deveras, a conceituação de serviços encarta-se na mesma competência que restou exercida pela Corte Suprema na análise prejudicial dos conceitos de faturamento e administradores e autônomos para os fins de aferir hipóteses de incidência, mercê de a discussão travar-se em torno da legislação infraconstitucional que contemplava essas categorizações, reproduzindo as que constavam do texto maior.
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Aliás não é por outra razão que o CPC dispõe no artigo 543 que:
"Art. 543. Admitidos ambos os recursos, os autos serão remetidos ao Superior Tribunal de Justiça.
(...)
§ 2º Na hipótese de o relator do recurso especial considerar que o recurso extraordinário é prejudicial àquele, em decisão irrecorrível sobrestará o seu julgamento e remeterá os autos ao Supremo Tribunal Federal, para o julgamento do recurso extraordinário.
(...)"
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A Súmula 138, do E. STJ, não se aplica in casu, por isso que, analisando sua ratio essendi e os arestos que lhe serviram de gênese, inafastável concluir que a mesma foi editada para o fim de defender-se a aplicação do Decreto-Lei 406/68, após a edição da Lei Complementar 56/87, porquanto, anteriormente, a tributação municipal do leasing era engendrada via aplicação analógica do primeiro diploma legal. Nada obstante, em nenhuma passagem dos arestos geradores da súmula restou posta a questão constitucional ora enfrentada.
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Sobressai, desta sorte, imprescindível a manifestação da Corte Suprema sobre o thema iudicandum, suscitado de forma explícita ou implícita em todas as causas que versam sobre a competência tributária municipal, essência manifesta das decisões que tem acudido ao E. STJ.
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In casu, o aresto objurgado decidiu que: "APELAÇÃO. ARRENDAMENTO MERCANTIL. ISS. INEXIGIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. A inclusão na Lista de Serviço de fatos que não configuram prestação de serviço, por afastada a idéia de trabalho, de esforço humano, de um "facere", afronta o disposto no artigo 156, III da Constituição Federal. Assim se dá na locação de bens móveis, como já proclamou o Supremo Tribunal Federal. Assim também e por identidade de razões no arrendamento mercantil. É que não importa esteja listado o serviço; importa, sim, se o fato que lá está descrito se caracteriza como tal. A Lista não é critério ou não é o único critério para descrever o fato gerador do ISS, até porque não define o tipo, não conceitua o que seja prestação de serviço. É ou ao menos deveria ser exemplificativa, jamais definidora do tipo. Na verdade, a noção de serviço, traço essencial do ISSQN, não dispensa e idéia de trabalho, de esforço humano, tal como disciplinado no Código Civil, ao qual há de socorrer-se o intérprete em obediência ao que dispõe o artigo 110 do CTN, ante o vazio normativo tributário. Apelo provido." (Apelação Cível nº 70009640657, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Relator Desembargador Genaro José Baroni Borges, Julgado em 03.11.2004).
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As conclusões e premissas de índole notadamente constitucional, sem as quais não sobreviveria o aresto recorrido impõem timbrar seu fundamento constitucional para, na forma da jurisprudência cediça na Corte, não conhecer do especial (Precedentes: AgRg no Ag 757416/SC, Relator Ministro José Delgado, Primeira Turma, DJ de 03.08.2006; AgRg no Ag 748334/SP, Relatora Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, DJ de 30.06.2006; REsp 754545/RS Ministro Franciulli Netto, Segunda Turma, SEGUNDA TURMA DJ 13.03.2006; AgRg no REsp 778173/MG, Relator Ministro José Delgado, Primeira Turma, DJ de 06.02.2006; AgRg no REsp 658392/DF, Relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ de 21.03.2005).
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Nesse sentido, restou pacificada a jurisprudência desta Corte por ocasião do julgamento do Resp 805317/RS, Relator para acórdão Min. Luiz Fux, DJ de 21/09/2006.
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Agravo regimental desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da PRIMEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, após o voto-vista do Sr. Ministro Luiz Fux acompanhando o voto do Sr. Ministro Relator, por outro fundamento, por maioria, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto-vista do Sr. Ministro Luiz Fux, que lavrará o acórdão. Votaram com o Sr. Ministro Luiz Fux (voto-vista) os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki e Denise Arruda.
Não participou do julgamento o Sr. Ministro Francisco Falcão (RISTJ, art. 162, § 2º, primeira parte).
Brasília (DF), 05 de junho de 2008(Data do Julgamento)
MINISTRO LUIZ FUX
Relator p/ Acórdão
AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.033.794 - RS (2008/0038530-2)
RELATOR : MINISTRO JOSÉ DELGADO AGRAVANTE : P.L.S. - ARREDAMENTO MERCANTIL ADVOGADOS : ANA PAULA CAPITANI E OUTRO(S) M.T.C. E OUTRO(S) AGRAVADO : MUNICÍPIO DE SÃO LEOPOLDO ADVOGADO : CLÁUDIO ROBERTO NUNES GOLGO E OUTRO(S) RELATÓRIO
O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO (RELATOR): Cuida-se de agravo regimental contra decisão que negou seguimento a recurso especial.
Acórdão a quo segundo o...
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