Acórdão nº 2005/0144813-2 de T1 - PRIMEIRA TURMA

Data22 Abril 2008
Número do processo2005/0144813-2
ÓrgãoPrimeira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 778.168 - DF (2005/0144813-2)

RELATORA : MINISTRA DENISE ARRUDA
RECORRENTE : B.O.S.
ADVOGADO : LUÍS FELIPE BELMONTE DOS SANTOS E OUTRO(S)
RECORRIDO : B.C.D.B.
PROCURADOR : JOSE OSORIO LOURENCAO E OUTRO(S)
RECORRIDO : M.P.S.
ADVOGADO : ALBERTO GOMES DA ROCHA AZEVEDO JUNIOR E OUTRO(S)

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. CONTRATO ADMINISTRATIVO DE CESSÃO DE CRÉDITOS FIRMADO ENTRE O B.E.O.B.O.S. PEDIDO ALTERNATIVO DE NULIDADE OU RESCISÃO CONTRATUAL CUMULADO COM RESSARCIMENTO DE VALORES. DISSÍDIO PRETORIANO NÃO-DEMONSTRADO. ALEGADA VIOLAÇÃO DOS ARTS. 82 E 145 DO CC/1916. REEXAME DOS ASPECTOS FÁTICOS DA LIDE E (RE)INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS 5 E 7 DO STJ. SUPOSTA OFENSA AOS ARTS. 10, § 1º, DA LEI 4.595/64, E 535 DO CPC. NÃO-OCORRÊNCIA.

  1. A divergência jurisprudencial deve ser devidamente demonstrada e comprovada (CPC, art. 541, parágrafo único; RISTJ, art. 255, §§ 1º e 2º), sob pena de não-conhecimento.

  2. O TRF da 1ª Região concluiu que: (I) o objeto do contrato administrativo impugnado é a cessão de créditos entre o BACEN e o B.O.S., e não a alienação onerosa de carta-patente; (II) o negócio jurídico preencheu os requisitos legais quanto à competência, objeto, forma, motivo e finalidade, sem afrontar o interesse público, tendo sido celebrado livremente entre pessoas capazes. Logo, o julgamento da suposta ofensa aos arts. 82 e 145 do CC/1916 - seja para se reavaliar a natureza jurídica do contrato administrativo e admitir a ilicitude do objeto (alienação onerosa de carta-patente), seja para se admitir o suposto desvio de finalidade das autoridades monetárias - depende do reexame dos aspectos fáticos da lide, bem como da (re)interpretação de cláusulas contratuais, atividade cognitiva vedada nesta instância superior (Súmulas 5 e 7 do STJ).

  3. Não houve ofensa aos arts. 97 e 104 do CC/1916, pois sequer foram utilizados como razões de decidir. O TRF da 1ª Região tão-somente considerou que a solução da lide, à luz dessas normas de Direito Privado, conduziria, sumariamente, à improcedência da pretensão, pois o recorrente não poderia alegar dolo comum ou simulação para invalidar o contrato ou reclamar indenização.

  4. A competência privativa do BACEN para conceder autorização às instituições financeiras será exercida com base nas normas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional, instituído pela Lei 4.595/64 com a finalidade de formular a política monetária do país (art. 2º), competindo-lhe, dentre outras atribuições, "regular a constituição, funcionamento e fiscalização dos que exercerem atividades subordinadas a esta lei, bem como a aplicação das penalidades previstas" (art. 4º, VIII).

  5. "O Conselho Monetário Nacional, no exercício das atribuições previstas no inciso VIII deste artigo, poderá determinar que o B.C. daR. doB. recuse autorização para o funcionamento de novas instituições financeiras, em função de conveniências de ordem geral" (Lei 4.595/64, art. 4º, § 1º).

  6. O BACEN agiu de acordo com as normas do CMN que, por meio de Resolução 1.060/85, suspendeu as autorizações para o funcionamento de novas instituições das Áreas Bancárias, do Mercado de Capitais e Imobiliário, bem como de novas sedes, agências e dependências, tendo em conta o nível da capacidade instalada no Sistema Financeiro Nacional.

  7. Não viola o art. 535 do CPC, nem importa negativa de prestação jurisdicional, o acórdão que decide, motivadamente, todas as questões argüidas pela parte, julgando integralmente a lide.

  8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça: Prosseguindo no julgamento, a Turma, por unanimidade, conheceu parcialmente do recurso especial e, nessa parte, negou-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros José Delgado (voto-vista), Luiz Fux e Teori Albino Zavascki votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Francisco Falcão.

    Brasília (DF), 22 de abril de 2008(Data do Julgamento).

    MINISTRA DENISE ARRUDA

    Relatora

    RECURSO ESPECIAL Nº 778.168 - DF (2005/0144813-2)

    RELATORA : MINISTRA DENISE ARRUDA
    RECORRENTE : B.O.S.
    ADVOGADO : LUÍS FELIPE BELMONTE DOS SANTOS E OUTRO(S)
    RECORRIDO : B.C.D.B.
    ADVOGADO : JOSE OSORIO LOURENCAO E OUTRO(S)

    RELATÓRIO

    A EXMA. SRA. MINISTRA DENISE ARRUDA (Relatora):

    Trata-se de recurso especial interposto por B.O.S. com fundamento no art. 105, III, a e c, da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região sintetizado na seguinte ementa (fl. 382):

    "ADMINISTRATIVO. CONTRATO DE CESSÃO DE CRÉDITOS DE DIFÍCIL LIQUIDAÇÃO DAS MASSAS LIQUIDANDAS. COBERTURA COM RECURSOS DA RESERVA MONETÁRIA. ANUÊNCIA DO BACEN. ANULAÇÃO. CAUSAS TIDAS COMO NÃO CONFIGURADAS. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. APELAÇÃO. CONSISTÊNCIA PARCIAL DO INCONFORMISMO, APENAS QUANTO À CARACTERIZAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO.

  9. O contrato, a cujo respeito as partes controvertem, é, como se lê de seu teor, de cessão de créditos entre o Banco Central do Brasil, intitulado cedente, o B. deI.O.S.A., intitulado cessionário, COMIND S.A. de Crédito Imobiliário, em liquidação extrajudicial, intitulado interveniente-anuente, e OK Benfica Companhia Nacional de Pneus, intitulada interveniente-garante. É de natureza administrativa, preenchendo os requisitos que o legitimam quanto à competência, objeto, forma, motivo e finalidade, sem afrontar o interesse público, tendo sido celebrado entre pessoas capazes de nele intervir. Seu objeto não é o de venda de carta-patente, nem se fundou na Resolução nº 1.060, do CMN, na medida em que esta suspendeu 'as autorizações para o funcionamento de novas instituições das Áreas Bancárias, do Mercado de Capitais e Imobiliários, bem como de novas sedes, agências e dependências, tendo em conta o nível atual da capacidade instalada no Sistema Financeiro Nacional, representado por 75. 142 pontos'.

  10. A autorização concedida à autora, como previsto no contrato, resultou da cassação das atividades de uma financeira em liquidação, inexistindo norma legal impeditiva desse negócio, que trouxe para a autora a vantagem de expandir as suas atividades, vez que ficou subordinado à concessão de autorização para funcionamento na modalidade operacional de banco de investimento, não tendo ela demonstrado que o Banco Central haja descumprido esta sua obrigação.

  11. O contrato, tanto à luz do Direito Privado, quanto do Direito Público, é irretocavelmente hígido, como demonstrado no voto da relatora.

  12. Imprescindibilidade da reinclusão na lide do interveniente-anuente, como litisconsorte passivo necessário, já que a demanda objetiva a desconstituição de negócio de que participou, sendo beneficiado.

  13. Apelação parcialmente provida.”

    Os embargos declaratórios opostos foram rejeitados (fl. 430).

    O recorrente aponta, além de divergência jurisprudencial, violação dos arts. 535, do Código de Processo Civil, 10, § 1º, da Lei 4.595/64, 82, 97, 104 e 145 do Código Civil de 1916. Sustenta, em resumo, que:

    (a) o aresto regional é nulo por negativa de prestação jurisdicional, porquanto não se manifestou sobre questões essenciais à solução da controvérsia, notadamente sobre a ilicitude do objeto, a natureza do contrato, a constitucionalidade do ato normativo, a superveniência de norma constitucional impeditiva do negócio jurídico e as causas de rescisão contratual;

    (b) a Resolução 1.060/85, do Conselho Monetário Nacional: (I) é ilegal, porque "foi editada sem o devido respaldo legal, uma vez que o art. 10, § 1º, da Lei nº 4.595/64, em que supostamente se basearia, estabelece, verbis: '§ 1º No exercício das atribuições a que se refere o inciso IX deste artigo, com base nas normas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional, o B.C. daR. doB., estudará os pedidos que lhe sejam formulados e resolverá conceder ou recusar a autorização pleiteada, podendo incluir as cláusulas que reputar convenientes ao interesse público.'" (fl. 447); (II) "não permitia sequer o estudo dos pedidos, significando sumário e prévio indeferimento geral, naturalmente que sem motivação válida e com evidente desvio de finalidade, pois visava exatamente dar valor às autorizações em funcionamento existentes, e que haviam sido concedidas gratuitamente" (fl. 447); (III) foi editada com desvio de finalidade, "pois não visava preservar o interesse público, que seguramente estaria atendido até mesmo com a ampliação da possibilidade de autorizar-se novas instituições financeiras, em substituição a três grupos financeiros liquidados", mas criou um "sistema de 'pontos', com o que autorizações de funcionamento, coisa fora do comércio, concedida a título precário e de caráter personalíssimo, passaram a ter valoração monetária" (sic - fls. 447/448);

    (c) a carta-patente instrumentaliza a autorização - de natureza precária, personalíssima e gratuita - conferida pelo Poder Público, através do BACEN, para o funcionamento de instituição financeira, de modo que, na condição de coisa fora do comércio, é insuscetível de alienação, penhora ou caução;

    (d) "a retomada da legalidade, com a previsão contida no art. 192, § 1º, da Constituição Federal de 1988 e a edição das Resoluções nº 1.524 e 1.527, são provas eloqüentes de reconhecimento da irregularidade e nulidade dos procedimentos anteriormente adotados e do manifesto desvio de finalidade daquela atuação prevista na Resolução nº 1.060" (fl. 455);

    (e) "o ato é nulo, em face da eiva de se perseguir objeto ilícito, qual seja, a efetiva, objetiva e concreta venda de carta-patente, mediante ato simulado imposto ao Recorrente, em...

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