Acordão nº 0000513-98.2011.5.04.0016 (RO) de Tribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul), 30 de Octubre de 2012

Magistrado ResponsávelLucia Ehrenbrink
Data da Resolução30 de Octubre de 2012
EmissorTribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul)
Nº processo0000513-98.2011.5.04.0016 (RO)

PROCESSO: 0000513-98.2011.5.04.0016 RO

IDENTIFICAÇÃO

Origem: 16ª Vara do Trabalho de Porto Alegre

Prolator da

Sentença: JUÍZA LUCIANA KRUSE

EMENTA

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ACIDENTE DE TRABALHO TÍPICO. Comprovada a ocorrência do acidente típico, e sendo presumível o dano sofrido pelo empregado, é devido o pagamento de indenização por danos morais, já que a relação havida entre as partes gera para a empresa o dever de reparação, sendo ela responsável pelas consequências dos riscos a que expõe seus empregados.

HORAS EXTRAS. INTERVALOS INTRAJORNADA. O intervalo intrajornada constitui medida de higiene, saúde e segurança do empregado, está previsto nos artigos 71 da CLT e 7º, XXII, da Constituição Federal e a sua concessão parcial importa no pagamento do período correspondente ao intervalo não gozado, ou seja a uma hora extra. Aplicação do disposto no § 4º do artigo 71 da CLT e na Orientação Jurisprudencial 307 da SDI-I do TST.

ACÓRDÃO

por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso ordinário da reclamante para acrescer à condenação o pagamento da indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso ordinário da reclamada para determinar que seja aplicado o salário mínimo como base de cálculo do adicional de insalubridade. Valor da condenação alterado para R$ 10.000,00, e das custas para R$ 200,00, para os fins legais.

RELATÓRIO

Inconformados com a sentença das fls. 196-202 e complementada à fl. 210 (embargos de declaração), a autora e a ré interpõem recursos ordinários.

A autora pretende a reforma da sentença nos seguintes aspectos: indenização por danos morais decorrente de acidente do trabalho (fls. 213-217).

A ré, por sua vez, objetiva a reforma da sentença quanto aos seguintes aspectos: horas extras - intervalos intrajornada; adicional de insalubridade em grau máximo; honorários periciais; e, base de cálculos do adicional de insalubridade (fls. 218-224).

O depósito recursal foi efetuado no valor legal (fl. 226) e as custas processuais foram satisfeitas (fl. 225).

Intimados contra-arrazoam a autora às fls. 230-232 e a ré às fls. 233-235.

Conclusos para julgamento (fl. 239).

VOTO RELATOR

DESEMBARGADORA LUCIA EHRENBRINK:

I - RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE.

DANOS MORAIS. ACIDENTE DO TRABALHO.

A recorrente não se conforma com a rejeição dos pedidos em destaque. Alega que a sentença de improcedência está equivocada pois restou comprovado que sofreu acidente do trabalho (ferimento "punctório"), decorrente de picada com seringa mal acondicionada em lixo comum, ao invés de estar depositada em local próprio para descartáveis desta natureza (caixa de perfuro cortantes). Afirma que o acidente ocorreu pela desídia da ré em relação ao acondicionamento do lixo. Invoca a prova oral colhida a fim de demonstrar o sofrimento que lhe foi causado, pois teve de ser submetida a tratamento com um coquetel de drogas anti-HIV e outras patologias, cujos efeitos colaterais são de conhecimento público (náuseas, vômitos, tonturas e diversas outras reações adversas). Salienta que durante o evento viveu grande angústia e tormento decorrente de culpa exclusiva da reclamada, tendo sido despedida antes mesmo dos resultados dos exames finais. Suscita jurisprudência em seu favor. Requer a reforma da decisão de origem, postulando o pagamento de indenização por dano moral no valor de 40 salários mínimos.

O Juízo a quo julgou improcedente o pedido de indenização formulado pela reclamante, por entender que não restaram preenchidos o requisitos que caracterizam o dano moral.

Analisa-se.

A teor dos arts. 818 da CLT e 333 do CPC, aplicável subsidiariamente, nos moldes do art. 8º da CLT, cumpre à autora o ônus da demonstração dos fatos constitutivos de seu direito e à ré dos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos.

Na petição inicial, a demandante alega que sofreu ferimento "punctório" através de seringa que se encontrava acondicionada em lixo comum, quando deveria estar depositada em local próprio. Diz que em razão do risco do ferimento dessa natureza, bem como o desconhecimento acerca da procedência da seringa e do paciente que a tinha utilizado, foi submetida a tratamento anti-HIV e outras patologias. Afirma ter sido submetida a um coquetel fortíssimo de drogas e medicamentos que lhe causaram náuseas, vômitos, tonturas e diversas reações, mas mesmo assim foi obrigada a continuar trabalhando. Aduz que a angústia pela incerteza de estar ou não acometida por uma doença grave perdurou pelos vários meses de tratamento. Salienta que no momento de maior fragilidade vivido a reclamada não hesitou em despedi-la. Postula o pagamento de indenização por dano moral no valor de 40 salários mínimos.

Em defesa, a demandada informa que a partir da informação prestada acerca do acidente, encaminhou a reclamante para acompanhamento médico com a orientação dos procedimentos de estilo, constituídos de procedimentos necessários preconizados pelos protocolos de saúde hoje vigentes para prevenção de eventual exposição a qualquer tipo de contaminação. Assevera que foi emitida a respectiva CAT. Diz que foi prescrito o tratamento denominado Profilaxia Pós Exposição Ocupacional ao HIV, que consiste na administração de retrovirais, mediante o uso de um KIT de medicamentos específicos que visam prevenir, combater e inibir a possibilidade e crescimento viral. Aduz que a autora também foi submetida a exames laboratoriais e acompanhamento médico. Salienta que a reclamante não ficou incapacitada nem mesmo temporariamente para o trabalho. Alega que a autora recebeu todo acompanhamento e atenção por parte da equipe médica durante todo o tratamento.

Impende ressaltar, também, que em conformidade com o art. 19 da Lei 8.213/91, entende-se que:

Art. 19. Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho .

§ 1º A empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador. (grifei)

No caso em exame, é incontroversa a ocorrência do acidente do trabalho noticiado pela reclamante, inclusive tendo a reclamada juntado boletim de atendimento de emergência (fl. 93) e CAT (fl. 85).

Geralmente, quando configurada a hipótese de acidente do trabalho típico, a presença do nexo causal é bem evidente e, conforme Sebastião Geraldo de Oliveira, "A simples leitura da comunicação do acidente do trabalho indicará o dia, a hora, o local e os detalhes da ocorrência. A descrição mencionada facilita a percepção do vínculo de causalidade do infortúnio com a execução do contrato laboral." (in Indenizações por acidente do trabalho ou doença ocupacional - Editora LTr, 3ª edição - pág. 138).

Assim, tem-se que restou demonstrado o evento danoso e o nexo de causalidade entre este e os danos invocados pela reclamante como subtrato da indenização - sofrimento que lhe foi causado quando submetida a tratamento com coquetel de drogas anti-HIV e outras patologias, cujos efeitos colaterais são de conhecimento público - náuseas, vômitos, tonturas e diversas outras reações adversas.

Desta forma, o dano resta plenamente demonstrado diante da narração fatídica e do pedido da autora, pois segundo preleciona, Carlos Alberto Bittar in Reparação Civil por Danos Morais, 3ª ed. São Paulo, RT, 1999:

...danos morais são aqueles suportados na esfera dos valores da moralidade pessoal ou social, e, como tais, reparáveis, em sua integralidade, no âmbito jurídico. Perceptíveis pelo senso comum - porque ligados à natureza humana - podem ser identificados, em concreto, pelo juiz, à luz das circunstâncias fáticas e das peculiaridades da hipótese sub item, respeitado o critério básico da repercussão do dano na esfera do lesado. - (sem grifos no texto originário).

Destarte, uma vez que o maior patrimônio do trabalhador é a sua capacidade laborativa, e tendo ocorrido acidente do trabalho típico e incontroverso (em 22-09-2010 - CAT da fl. 85), evidenciado está o ato faltoso e o nexo de causalidade, sendo que em relação ao dano, em virtude da própria natureza é desnecessária a prova do prejuízo, pois plenamente presumível, sendo a responsabilidade decorrente do simples fato da violação. Melhor dizendo, o dano moral está ínsito na ilicitude do ato praticado, decorre da gravidade do ilícito em si, sendo desnecessária sua efetiva demonstração, ou seja, como já sublinhado: o dano moral existe 'in re ipsa' (STJ, 1ª Turma, REsp 608.918/RS, Rel. Ministro José Delgado, julgado em 20.05.04, DJ 21.06.04, p. 176). Tais fatos, por si só, caracterizam o dever de indenizar da ré, frente à teoria objetiva adotada por esta julgadora.

Diante dessas circunstâncias, considera-se configurada a responsabilidade da reclamada em relação ao evento, sendo aplicável a Teoria do Risco para fins de determinar o pagamento da indenização. É do entendimento desta relatora que é irrelevante para a definição da responsabilidade da ré o elemento culpa, aplicando-se a Responsabilidade Objetiva, pelo risco criado em razão das atividades da empresa reclamada, que como bem confirmou a preposta da reclamada...

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