Acordão nº 0000750-50.2010.5.04.0281 (RO) de Tribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul), 22 de Noviembre de 2012

Data22 Novembro 2012
Número do processo0000750-50.2010.5.04.0281 (RO)
ÓrgãoTribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Porto Alegre - RS) (Brasil)

PROCESSO: 0000750-50.2010.5.04.0281 RO

IDENTIFICAÇÃO

Origem: Vara do Trabalho de Esteio

Prolator da

Sentença: JUIZ MAURICIO DE MOURA PEÇANHA

EMENTA

RECURSO ORDINÁRIO DA RÉ. DOENÇA OCUPACIONAL. FATOR DE CONCAUSA. Caso em que está demonstrado que as atividades laborais do autor contribuíram para o desencadeamento de perda auditiva. Fator de concausa que não afasta a responsabilidade do empregador, restando caracterizada a culpa deste pela exposição do trabalhador a condições de trabalho nocivas. Recurso da ré desprovido no aspecto.

ACÓRDÃO

por maioria, parcialmente vencido o Juiz Convocado Fernando Luiz de Moura Cassal, DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO ORDINÁRIO DA RÉ para: a) reduzir o valor da indenização por dano moral para R$ 15.000,00 (quinze mil reais); b) excluir da condenação a indenização por danos materiais. Por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ADESIVO DO AUTOR. Valor da condenação reduzido em R$ 30.000,00 (trinta mil reais) para todos os efeitos legais.

RELATÓRIO

Inconformadas com a sentença das fls. 273-276, complementada à fl. 283, as partes recorrem.

A ré interpõe recurso ordinário, fls. 287-296, arguindo nulidade processual por cerceamento de defesa e se insurgindo contra o julgado em relação às indenizações por danos materiais e por dano moral, bem como quanto aos valores fixados para essas reparações, honorários periciais e juros e correção monetária.

O autor recorre adesivamente, fls. 308-309, pretendendo a reforma daquela quanto aos honorários de assistência judiciária gratuita.

Com contrarrazões do autor, fls. 304-306, e da ré, fls. 314-315, os autos são remetidos a este Tribunal para apreciação.

VOTO RELATOR

DESEMBARGADOR WILSON CARVALHO DIAS:

A) RECURSO ORDINÁRIO DA RÉ

1. Nulidade processual. Cerceamento de defesa

A ré argui nulidade processual por cerceamento de defesa em razão de o Juízo ter indeferido o retorno dos autos ao perito médico para responder quesitos complementares, o depoimento pessoal do autor e a oitiva de testemunha. Sustenta que a matéria não é eminentemente técnica, porquanto pretendia provar a entrega, o uso e a fiscalização dos equipamentos de proteção e que seus questionamentos ao perito médico eram de fundamental importância para solução da lide.

Sem razão.

Quanto aos quesitos complementares, fls. 269-270, verifico que os elementos já constantes dos autos eram suficientes para a formação do convencimento do Juízo, de modo que a resposta aos questionamentos da ré não teria influência na solução dada à lide. Destaco que os questionamentos são retóricos, já possuem resposta nos autos ou são relativos à interpretação das informações prestadas pelo perito médico e não alterariam a conclusão do Juízo quanto à análise da prova.

Demais disso, o Juízo já tinha deferido o retorno dos autos ao perito para responder a quesitos da ré em 3 (três) oportunidades, fls. 210, 242 e 253, o que afasta sobremaneira a tese de cerceamento de defesa, reforçando, diferentemente, a conclusão de desnecessidade ressaltada pelo Juízo na ata de fl. 271. Registro, de qualquer forma, que o Juízo sequer está adstrito à conclusão pericial, conforme dispõe o art. 436 do CPC.

Por todo o exposto, não há falar em manifesto prejuízo processual à recorrente e, por consequência, em nulidade processual, à luz do que dispõe o art. 794 da CLT.

Em relação ao depoimento pessoal e à prova testemunhal, o indeferimento da produção da prova também não implica cerceamento de defesa ou nulidade processual, uma vez que a controvérsia estabelecida nos autos respeita, basicamente, a questões de ordem médica. Registro, inclusive, que o assistente técnico indicado pela ré participou da inspeção pericial, conforme foi registrado à fl. 178, tendo juntado seu laudo às fls. 199v.-200.

Cumpre notar, de qualquer forma, que a ré sequer esclareceu, especificamente, por ocasião da audiência, fl. 271, quais fatos seriam objeto da prova oral. Apenas agora, na fase recursal, refere que pretendia a produção de prova oral para demonstrar o fornecimento, uso e fiscalização do uso de EPI, questões sobre as quais o perito já se pronunciara no laudo, tanto no "Parágrafo 2", quanto em respostas aos quesitos de ambas as partes, fls. 179-181. Friso, aliás, que essas conclusões não foram impugnadas oportunamente pela ré, a qual, pelo contrário, aduziu, fl. 198:

Diante dessas informações não há o que responsabilizar a reclamada, ainda mais quando há prova nos autos de entrega e uso de EPI, tendo o reclamante usado referidos equipamentos e, ainda, sendo este uso devidamente fiscalizado. [grifei]

Dessa maneira, se a própria ré, na primeira oportunidade para se manifestar sobre o laudo pericial, afirma a existência de prova nos autos da entrega, uso e fiscalização do uso de EPI, reputo impertinente a arguição de nulidade, não identificando o manifesto prejuízo a que alude o art. 794 da CLT. Refiro, de todos os modos, que a prova pretendida pela ré seria insuficiente para alterar a convicção, seja do Juízo de origem, não pautada na circunstância do fornecimento e do uso de EPI, fl. 274, seja desta Turma julgadora, conforme adiante será exposto.

Nego provimento ao recurso.

2. Doença ocupacional. Indenizações por danos materiais e moral

A ré não se conforma com a sentença em que reconhecido o nexo causal entre o trabalho desempenhado pelo autor na ré e a perda auditiva a que restou acometido, com a sua condenação ao pagamento de indenizações por danos materiais (no valor de R$ 6.191,20) e moral (no valor correspondente à vinte vezes a maior remuneração bruta percebida pelo reclamante no curso do contrato de trabalho). Sustenta a recorrente que o autor não teve diminuídas a capacidade de trabalho nem as perspectivas de novo emprego foram obstadas. Afirma que o perito se contradiz, pois ora assenta perda auditiva no ouvido esquerdo, ora assenta que este ouvido possui audição normal. Argumenta que a perda auditiva, quando instalada, é definitiva, não sofrendo melhora nem piora, mas se estabiliza, o que não ocorreu no caso dos autos. Refere que essa doença nunca compromete frequências baixas e que, por ocasião do exame demissional, foi o autor considerado apto para o trabalho. Aduz que o perito concluiu que a doença advém de diversas causas, inclusive alheias ao trabalho como prática de tiro no Exército, tabagismo e perda natural da audição pela idade, de forma que não pode ser responsabilizada, porque há prova da entrega e do uso fiscalizado de EPI e não há como saber o quanto concorreu cada causa para o quadro. Sustenta que o autor nunca esteve afastado do trabalho, durante o contrato, por conta de problemas auditivos e não se queixa de zumbido, um dos sintomas mais comuns da patologia. Diz que o perito concluiu que a perda auditiva é apenas no ouvido esquerdo, o que comprova não ser bilateral, o que seria fundamental para concluir que o problema do autor não decorre apenas do ruído e que, sendo a audição normal, não há dano a indenizar. Reitera que o laudo pericial não comprova com precisão a doença alegada, eis que afirma o médico que a doença auditiva é uma "PAIR ULTRA PRECOCE", doença que não existe na literatura especializada, nem na Portaria 19 do Ministério do Trabalho, além de abrir margem para existência de participação de concausa. Alega que, sendo a doença multicausal, os fatores referidos pelo perito somam-se independentemente de estar o autor em local ruidoso, o que não restou provado nos autos. Invoca o laudo elaborado pelo seu assistente técnico, no qual restaria provada a inexistência do nexo causal. Em caso de entendimento diverso, pleiteia a redução do valor da indenização por dano moral para, no máximo, 10 (dez) salários mínimos, uma vez que o autor não provou os fatos alegados, devendo haver prova de culpa dela, recorrente, para que a indenização seja fixada conforme sua intensidade, com base em elementos objetivos, dentro da razoabilidade, devendo o dano ser comprovado e não presumido. Com relação à indenização por danos materiais, pretende sua exclusão, porquanto o autor está apto ao trabalho, sem redução da capacidade laborativa, não restando provados os fatos invocados na peça inicial, nem havendo sua exclusão do mercado de trabalho. Alega, ainda, que os conceitos e critérios previdenciários e civis não se confundem com os trabalhistas, não havendo presunção de culpa, nexo e dano. Em caso de outro entendimento, requer a redução do valor da indenização, já que não há prejuízo comprovado.

Examino.

É incontroverso que o autor trabalhou para a ré de 14.03.1974 a 10.08.2009, demonstrando o termo de resilição da fl. 98 apenas o último vínculo, vigente desde 04.12.1984. Exerceu o autor as funções de servente, auxiliar mecânico, mecânico ajustador, fresador, mandrilador e operador programador, conforme os termos da defesa e da ficha de registro de empregado, fls. 50-51 e 70-74, e sempre no setor de usinagem a partir de 1996.

O perito médico nomeado pelo Juízo, após anotar que o autor se queixava de perda auditiva em ambos os ouvidos, vinculada ao elevado nível de pressão sonora existente no local de trabalho na ré, fl. 178, procedeu à anamnese clínica e ocupacional, ao exame físico, assim como à análise dos documentos e das audiometrias juntados aos autos, fls. 178-179. Descreveu as atividades do autor e referiu que não lhe era exigido o uso de EPIs auditivos até 2003, somente utilizando os do tipo "plugue", embora disponíveis os do tipo "concha", fl. 179. Assentou que os Atestados de Saúde Ocupacional (ASO) revelam o ruído como risco ocupacional nas seguintes intensidades: mandriladora 84 dB, fresas 72 dB, fresadora CNC 80 dB, bancada de polimento de matizes 91 dB e lixamento dos cabos 98 dB, fl. 179. Depois de efetuar o descarte de patologias que podem ocasionar a perda auditiva, fl. 179, concluiu o perito, fls. 179-180:

Concluo que o reclamante é portador de Perda Auditiva de Causa Híbrida de grau leve (considerando os graus mínimo, leve, moderado, grave e profundo) correspondendo a...

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