Acórdão nº 2007/0244182-2 de T1 - PRIMEIRA TURMA

Data05 Junho 2008
Número do processo2007/0244182-2
ÓrgãoPrimeira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 997.158 - RS (2007/0244182-2)

RELATOR : MINISTRO JOSÉ DELGADO
R.P/ACÓRDÃO : MINISTRO LUIZ FUX
RECORRENTE : FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR : DOLIZETE FÁTIMA MICHELIN E OUTRO(S)
RECORRIDO : O.S.S.L.
ADVOGADO : CRISTIANO COLOMBO E OUTRO(S)

EMENTA

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURÍDICA E CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS, EXECUÇÃO DE CIRURGIAS E EXAMES ENDOSCÓPICOS, APOIO DIAGNÓSTICO E DE RECUPERAÇÃO DO ESTADO DE SAÚDE. ALÍQUOTA INCIDENTE SOBRE A RECEITA BRUTA. ART. 15, § 1º, III, ALÍNEA "A", DA LEI N. 9.249/95.

  1. A entidade hospitalar, para fins do disposto no art. 15, § 1º, inciso III, alínea “a”, da Lei nº 9.240/95, é aquela cujo complexo de atividades exercidas proporcione internamento do paciente para tratamento de saúde, com a oferta de todos os processos exigidos para prestação de tais serviços ou do especializado.

  2. É que a lei tributária interpreta-se literalmente por força do princípio da legalidade, inadmitindo interpretação analógica que implique exoneração ou benefícios não previstos em lei (art. 111 do CTN).

  3. Deveras, depreende-se da ratio essendi do dispositivo que a norma dirige-se aos hospitais, tout court, conceito certo e determinado, inalterável para fins tributários (art. 110 do CTN).

  4. É que a IN 306/03, que dispunha sobre a retenção de tributos e contribuições nos pagamentos efetuados a pessoas jurídicas por órgãos, autarquias e fundações da administração pública federal, equiparou diversos serviços clínicos e médicos a hospitais, in verbis:

    "Art. 23. Para os fins previstos no art. 15, § 1º inciso III, alínea "a", da Lei nº 9.249, de 1995, poderão ser considerados serviços hospitalares aqueles prestados por pessoas jurídicas, diretamente ligadas à atenção e assistência à saúde, que possuam estrutura física condizente para a execução de uma das atividades ou a combinação de uma ou mais das atribuições de que trata a Parte II, Capítulo 2, da Portaria GM nº 1.884, de 11 de novembro de 1994, do Ministério da Saúde, relacionadas nos incisos seguintes:

    (omissis)"

  5. Entrementes, essa Instrução Normativa restou revogada pela IN SRF 480/04, que limitou a interpretação acerca do significado do termo "serviços hospitalares", litteris:

    Art. 27. Para os fins previstos nesta Instrução Normativa, são considerados serviços hospitalares somente aqueles prestados por estabelecimentos hospitalares.

    § 1º Para os efeitos deste artigo, consideram-se estabelecimentos hospitalares, aqueles estabelecimentos com pelo menos 5 (cinco) leitos para internação de pacientes, que garantam um atendimento básico de diagnóstico e tratamento, com equipe clínica organizada e com prova de admissão e assistência permanente prestada por médicos, que possuam serviços de enfermagem e atendimento terapêutico direto ao paciente, durante 24 horas, com disponibilidade de serviços de laboratório e radiologia, serviços de cirurgia e/ou parto, bem como registros médicos organizados para a rápida observação e acompanhamento dos casos.

  6. Posteriormente, foi editada a IN RFB 791/07, atualmente em vigor, que, alterando a redação do indigitado art. 27, manteve a interpretação restritiva acerca da extensão da aludida expressão, verbis:

    "Art. 27. Para os fins previstos nesta Instrução Normativa, são considerados serviços hospitalares aqueles prestados por estabelecimentos assistenciais de saúde que dispõem de estrutura material e de pessoal destinada a atender a internação de pacientes, garantir atendimento básico de diagnóstico e tratamento, com equipe clínica organizada e com prova de admissão e assistência permanente prestada por médicos, que possuam serviços de enfermagem e atendimento terapêutico direto ao paciente, durante 24 horas, com disponibilidade de serviços de laboratório e radiologia, serviços de cirurgia e/ou parto, bem como registros médicos organizados para a rápida observação e acompanhamento dos casos.

    Parágrafo único. São também considerados serviços hospitalares, para os fins desta Instrução Normativa, aqueles efetuados pelas pessoas jurídicas:

    I - prestadoras de serviços pré-hospitalares, na área de urgência, realizados por meio de UTI móvel, instaladas em ambulâncias de suporte avançado (Tipo "D") ou em aeronave de suporte médico (Tipo "E"); e

    II - prestadoras de serviços de emergências médicas, realizados por meio de UTI móvel, instaladas em ambulâncias classificadas nos Tipos "A", "B", "C" e "F", que possuam médicos e equipamentos que possibilitem oferecer ao paciente suporte avançado de vida.

  7. Sob esse ângulo, o Tribunal a quo, consignou que:

    "O cerne da presente demanda repousa em se delimitar a exata extensão da expressão "serviços hospitalares", para fins de incidência de IRPJ e CSLL sobre base de cálculo reduzida, nos termos do art. 15, § 1º, III, alínea "a", da Lei n. 9.249/95.

    A matéria era controversa no âmbito desta Corte, sendo que a Primeira Turma tinha um entendimento mais restritivo do conceito, no sentido de que, para fazer jus a alíquota menor na apuração da base de cálculo do lucro presumido, a pessoa jurídica deveria, em princípio, enquadrar-se como entidade hospitalar, de modo a prestar atendimento global ao paciente, mediante internação e assistência médica integral. A Segunda Turma, no entanto, tinha um entendimento mais flexível, no sentido de que o que se apresentava relevante era a essência do serviço, importando que se tratasse de atendimento à saúde que, por sua natureza, tivesse as características de serviços hospitalares, embora prestados fora do ambiente do hospital.

    Em razão desse dissenso, a Primeira Seção desta Corte (07/12/2006), provocada a apreciar a matéria, ao julgar os Embargos Infringentes na AC nº 2004.71.00.037040-8, rel. o Des. Federal Dirceu de Almeida Soares, deixou assentado, em relação às clínicas de radioimagem, o seguinte entendimento: "as empresas prestadoras de serviços de apoio a diagnóstico médico por imagem (radiologia) enquadram-se na concepção de "serviços hospitalares" inserta no art. 15, § 1º, inciso III, alínea "a", segunda parte, da Lei nº 9.249/95, estando sujeitas à alíquota de 8% (oito por cento) sobre a receita bruta mensal a título de Imposto de Renda Pessoa Jurídica", restando esclarecido em seu voto que o importante é a essência do serviço prestado em si, bastando que se tratem de serviços que apóiem ou complementem aqueles prestados pelo hospital, sendo irrelevante elementos externos, como local ou subordinação.

    (...)

    Quando do julgamento do dia 07/12/2006, acompanhei o voto exarado pelo relator, Des. Federal Dirceu de Almeida Soares, por estar fundamentado em exaustivo e percuciente estudo sobre a matéria. Com efeito, tenho que deva prevalecer a interpretação mais favorável ao contribuinte no sentido de que, se a lei deixa de explicitar o que seria "serviço hospitalar", não cabe à administração suprir, por atos próprios, dita imprecisão, mormente se estes atos regulamentares virem a impor condições de observância a elementos estranhos àquela norma, de tal sorte que venham a representar gravame ao contribuinte. Como bem anotado no voto paradigma da Seção, "cabe ao Poder Judiciário avaliar a disciplina complementar administrativa para verificar se a competência discricionária foi exercitada dentro dos limites ditados pelo ordenamento jurídico, ou seja, se a Administração, em atuação discricionária densificadora (prognose) respeitou a totalidade dos princípios jurídicos, entendidos na sua devida dimensão" (EIAC 2004.71.00.037040-8).

    (...)

    Ora, segundo consta da inicial e do Contrato Social (fl. 24), a autora tem, como objetivo contratual, a "prestação de serviços médicos, execução de cirurgias e exames endoscópicos, apoio diagnóstico e de recuperação do estado de saúde". Demais disso, juntou laudo fotográfico, com o intuito de demonstrar que está instalada junto ao Hospital Moinhos de Vento, nesta capital (fls. 123-131).

    Desta forma - sob a ótica até aqui desenvolvida - tenho que a autora enquadra-se no conceito de serviços hospitalares, porquanto, por sua própria natureza, os serviços acima descritos sempre apoiam ou complementam a atividade hospitalar propriamente dita."

  8. Destarte, é forçoso concluir que, arrimando-se em matéria exclusivamente de direito, no tocante ao termo "serviços hospitalares", o acórdão recorrido adotou interpretação dissonante do entendimento perfilhado por esta Corte Superior, bem assim, da legislação regente da matéria, razão pela qual merece ser reformada.

  9. In casu, infere-se dos autos que a empresa autora presta serviços de eletrocardiograma, teste ergométrico, ultrassonografia, punção de tireóide, punção de mama, coloscopia, cauterização, vulvoscopia, esclerose de varizes, dentre outros, o que não requer estrutura complexa e permanente necessária aos casos de internação e funcionamento ininterrupto.

  10. Recurso Especial provido.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da PRIMEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, vencido o Sr. Ministro Relator, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto-vista do Sr. Ministro Luiz Fux, que lavrará o acórdão. Votaram com o Sr. Ministro Luiz Fux (voto-vista) os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki e Denise Arruda.

    Não participou do julgamento o Sr. Ministro Francisco Falcão (RISTJ, art. 162, § 2º, primeira parte).

    Brasília (DF), 05 de junho de 2008(Data do Julgamento)

    MINISTRO LUIZ FUX

    Relator p/ Acórdão

    ERTIDÃO DE JULGAMENTO

    PRIMEIRA TURMA

    Número Registro: 2007/0244182-2 REsp 997158 / RS

    Números Origem: 200504010334681 200571000184812

    PAUTA: 18/12/2007 JULGADO: 18/12/2007

    Relator

    Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DELGADO

    Presidente da Sessão

    Exmo. Sr. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI

    Subprocuradora-Geral da República

    Exma. Sra. Dra. DEBORAH MACEDO DUPRAT DE BRITTO PEREIRA

    Secretária

    Bela. MARIA DO SOCORRO MELO

    AUTUAÇÃO

    RECORRENTE : FAZENDA NACIONAL
    PROCURADOR : DOLIZETE FÁTIMA MICHELIN E OUTRO(S)
    RECORRIDO : O.S.S.L.
    ADVOGADO :
    ...

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