Acórdão nº 2006/0092669-7 de T1 - PRIMEIRA TURMA

Número do processo2006/0092669-7
Data18 Dezembro 2007
ÓrgãoPrimeira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 851.090 - SP (2006/0092669-7)

RELATOR : MINISTRO LUIZ FUX
RECORRENTE : L.C.S.
ADVOGADO : JOSÉ HENRIQUE DE ARAÚJO E OUTRO(S)
RECORRENTE : C.P.D.C.C.
ADVOGADO : CARLOS RONALDO MONTEIRO DE BARROS E OUTRO(S)
RECORRENTE : SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS - SUSEP
PROCURADOR : G.B.C.D.S. E OUTRO(S)
RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RECORRIDO : OS MESMOS
RECORRIDO : EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS ECT
ADVOGADO : MARA TEREZINHA DE MACEDO E OUTRO(S)
RECORRIDO : J.C.R.L. E OUTRO
ADVOGADO : JANDUIR LEITE CATANHA E OUTRO
RECORRIDO : J.C.T.
ADVOGADO : LUIZ NOGUEIRA E OUTRO

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO POPULAR. ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. AUTORIZAÇÃO. COMERCIALIZAÇÃO DOS TÍTULOS DE CAPITALIZAÇÃO. DENOMINADOS "TELESENA". NULIDADE DE CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE VENDA E RESGATE DO VALOR DOS TÍTULOS. INÉPCIA DA INICIAL. ILEGITIMIDADE ATIVA DO AUTOR POPULAR PARA A DEFESA DE INTERESSES DOS CONSUMIDORES. IMPOSSILIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO DE CONDENAÇÃO DOS PREJUÍZOS EVENTUALMENTE CAUSADOS. AUSÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO DO REVISOR NO JULGAMENTO DA APELAÇÃO. NULIDADE ABSOLUTA. PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. JULGAMENTO EXTRA E ULTRA PETITA. ARTS. 460 e 461, DO CPC. JUNTADA DE DOCUMENTO IRRELEVANTE AO JULGAMENTO. VISTA À PARTE CONTRÁRIA. DESNECESSIDADE. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 165; 458, II; 463, II e 535, I e II, DO CPC. NÃO CONFIGURADA. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF.

  1. A concessão de emissão de títulos de capitalização, obedecida a reserva legal, não resta eivada de vícios acaso a empresa de capitalização, ad argumentadum tantum, empreenda propaganda enganosa, insindicável esta pelo E. S.T.J à luz do verbete sumular nº 07.

  2. O autor popular não pode manejar esse controle da legalidade dos atos do Poder Público para defesa dos consumidores, porquanto instrumento flagrantemente inadequado mercê de evidente ilegitimatio ad causam (art. 1º, da Lei 4717/65 c/c art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal).

  3. A Superintendência de Seguros Privados-SUSEP, posto autarquia com personalidade jurídica própria, exime a União de legitimatio ad causam para a ação in foco na qual o pedido versa anulação de contratos entre a pessoa jurídica acima indicada e outras entidades, acrescida da tutela anômala da defesa dos consumidores.

  4. A carência de ação implica extinção do processo sem resolução do mérito e, a fortiori: o provimento não resta coberto pelo manto da res judicata (art. 468, do CPC).

  5. O autor na ação popular não ostenta legitimidade tampouco formula pedido juridicamente possível em ação desta natureza para vindicar a devolução dos valores obtidos com a venda dos títulos de capitalização.

  6. As ações populares que tramitam em graus diversos de jurisdição não são reunidas, porquanto a gênese da conexão pressupõe a possibilidade de simultaneus processus viabilizador da um único julgamento.

  7. A capitalização coadjuvada por sorteios obedece o princípio da legalidade, porquanto autorizada pelo Decreto-lei 261/67 e DL 6259/44, art. 41.

  8. A autorização da SUSEP à empresa de capitalização em 23.08.1991 (fl. 1247), mediante Processo nº 001-002875/91, obedeceu os requisitos legais, por isso que, se esta desvirtua o ato liberatório, a hipótese é de cassação da autorização pelo Poder Público, restando incabível a Ação Popular, ajuizada em 27.05.1992, para esse fim.

    8.1. Ademais, é inviável a revisão do processo administrativo em sede de recurso especial, sendo certo que foi considerado formalmente regular, mercê de o Tribunal a quo não ter considerado relevante a sua legalidade.

  9. A autorização, in casu, ato administrativo com base normativa, é vinculado e somente pode ser revogado nos casos legais, obedecendo o due process of law, impondo as indenizações cabíveis em face da outorga ordinária pelo Poder Público (Súmula 473 do STF).

  10. Sob esse enfoque é categórica a doutrina ao vaticinar:"Atos vinculados seriam aqueles em que, por existir prévia e objetiva tipificação legal do único possível comportamento da Administração em face da situação igualmente prevista em termos de objetividade absoluta, a Administração ao expedi-los não interfere com apreciação subjetiva alguma..." e arremata: "(...)Licença - é o ato vinculado, unilateral, pelo qual a Administração faculta a alguém o exercício de uma atividade, uma vez demonstrado pelo interessado o preenchimento dos requisitos legais exigidos. A licença para edificar, que depende do competente alvará, exemplifica a hipótese. A licença de importação ou a de exercício de atividade profissional são outros tantos exemplos. Uma vez que cumpridas as exigências legais, a Administração não pode negá-la. Daí seu caráter vinculado, distinguindo-se, assim, da autorização(...)" Celso Antônio Bandeira de Mello, in Curso de Direito Administrativo, 20ª edição, 2005, pp. 401 e 407.

    10.1. Nesse viés, abalizada doutrina sobre thema assenta que: "Admitir que qualquer cidadão conteste a validade de um ato administrativo praticado por agente competente, de acordo com a lei e os regulamentos aprovados pelos Poderes Constitucionais legítimos, apenas com base no conceito vago de imoralidade, é deixar a sorte da administração ao sabor variável e influenciável da opinião pública e dos humores políticos. Se a Administração age dentro da lei, sem desvio de finalidade, não há como aceitar a intervenção do Poder Judiciário através da ação popular(...)." Hely Lopes Meirelles, in Mandado de Segurança, 28ª ed., Malheiros, São Paulo, Ed. Malheiros,n 2005, p. 137.

    10.2.Ademais, a jurisprudência desta Corte já assentou que:"Não ha desvio de finalidade, se o ato, quando foi praticado, observou permissivo então existente. (REsp 8970/SP, Rel. DJ 09.03.1992)

    10.3. A Susep, ao conceder a autorização para a comercialização da "Telesena", praticou "ato vinculado", porquanto a referida autarquia federal não tem a liberdade de escolha quanto à aprovação ou não dos planos de capitalização, devendo apenas observar as normas e diretrizes estabelecidas pelo CNSP.

    10.4. O "ato vinculado" não enseja nulidade por desvio de finalidade, que é vício inerente ao ato administrativo discricionário, consoante jurisprudência deste E. Tribunal (RMS 8831/RS, DJ de 23.08.1999).

    10.5. A violação ao art. 2º, "e", parágrafo único, "e", da Lei 4717/65, no caso sub judice, inocorreu.

  11. In casu, o Decreto-Lei nº 261/67 e a Circular SUSEP nº 23/91 regulamentavam, à época, as operações, os planos e as condições dos títulos de capitalização, sendo certo que a Resolução CNSP nº 15/91 veio introduzir inovações na regulamentação das operações de capitalização. Consectariamente era lícito à SUSEP, no exercício de sua competência legal, ou seja, como executora da política de capitalização traçada pelo CNSP, conceder ou não as respectivas autorizações para as empresas operarem no mercado de capitalização, sempre fundamentando sua conduta nas regras previamente estabelecidas nos referidos diplomas legais.

  12. O panorama legal em confronto com o atendimento pela entidade dos requisitos impostos por normas primárias e secundárias, denotam carecer a ação popular do requisito de procedência da ilegalidade, mercê de especulativa a lesividade, inaferível pelo E. S.T.J à luz dos argumentos subjetivos do aresto recorrido. Sob esse enfoque a 1ª Seção decidiu no EREsp 260821/SP, verbis:

    "ADMINISTRATIVO. AÇÃO POPULAR. CABIMENTO. ILEGALIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. LESIVIDADE AO PATRIMÔNIO PÚBLICO. COMPROVAÇÃO DO PREJUÍZO. NECESSIDADE.

  13. O fato de a Constituição Federal de 1988 ter alargado as hipóteses de cabimento da ação popular não tem o efeito de eximir o autor de comprovar a lesividade do ato, mesmo em se tratando de lesão à moralidade administrativa, ao meio ambiente ou ao patrimônio histórico e cultural.

  14. Não há por que cogitar de dano à moralidade administrativa que justifique a condenação do administrador público a restituir os recursos auferidos por meio de crédito aberto irregularmente de forma extraordinária, quando incontroverso nos autos que os valores em questão foram utilizados em benefício da comunidade.

  15. Embargos de divergência providos." (EREsp 260821/SP, DJ 13.02.2006 p. 654)

  16. O vetor legal indica que: (a) O advento do Decreto-lei nº 204/67, o foi com o fito de regular a exploração dos serviços de loteria; lex specialis, portanto, em relação ao mercado de capitalização tanto que quanto ao mesmo a norma incidente admitia o sorteio. O art. 41, "e", do Decreto-lei nº 6.259/44 quando muito estava inserido no capítulo relativo a loterias proibidas e sorteios permitidos, embora não expressamente, restou revogado pelo Decreto-lei nº 204/67, a teor do art. 2º, § 1º, da LICC; (b) A partir da vigência do Decreto-lei nº 261/67, todas as operações das sociedades de capitalização restaram subordinadas às disposições do presente Decreto-lei" (art. 1º), sendo certo que o controle do Estado passou a ser exercido pelo CNSP ou pela SUSEP, a quem competia disciplinar as operações das sociedades de capitalização, inclusive, os sorteios por ela realizados, inerentes às operações de capitalização (arts. 2º, caput, e 3º, §§ 1º e 2º); (c) O CNSP e a SUSEP, no exercício dessa competência, expediram, respectivamente, a Resolução nº 15/91 e as Circulares nºs 12/85, 06/87 e 23/91, autorizando as sociedades de capitalização a realizarem sorteios e dando-lhes plena liberdade para fixarem o valor dos prêmios nele oferecidos, respeitando o valor máximo de 5% de seu patrimônio líquido, sendo certo que, in casu, é fato incontroverso, reconhecido pelo acórdão recorrido, que a "Telesena" atendeu e atende todas as normas do CNSP e da SUSEP; (d) O art. 41, "e", do Decreto-lei nº 6.259/44, por ser incompatível com o disposto nos arts. 1º, "caput", 2º, caput, e 3º §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 261/67, foi por ele revogado, razão porque, se assim não se entender, todos os planos de capitalização disponíveis no mercado restariam em situação ilegal, porquanto, como é cediço, os prêmios por ele oferecidos são sempre superiores ao "capital garantido"; e (e)...

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