nº 2003.72.00.007540-8 de Tribunal Regional Federal da 4a Região, Sétima Turma, 19 de Octubre de 2004
Magistrado Responsável | Tadaaqui Hirose |
Data da Resolução | 19 de Octubre de 2004 |
Emissor | Sétima Turma |
Tipo de Recurso | Apelação Criminal |
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 2003.72.00.007540-8/SC
EMENTA
PENAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. ASSOCIAÇÃO PARA FINS DOS ARTS. 12 E 13 DA LEI Nº 6.368/76. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO. INOCORRÊNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO VERIFICADA. CORREÇÃO DO EQUÍVOCO. DESRESPEITO AO DIREITO AO SILÊNCIO. ERRO SANÁVEL. PROVA ILÍCITA. INOCORRÊNCIA. MANDADO DE BUSCA VÁLIDO. INDEFERIMENTO DE PROVA. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO-VERIFICADO. TRÁFICO. DEPOIMENTO DE POLICIAIS. VALIDADE. AUTORIA. DOLO NÃO DEMONSTRADO COM RELAÇÃO A TODOS OS RÉUS. INTERNACIONALIDADE DEMONSTRADA EM UMA DAS OCORRÊNCIAS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. FALTA DE PROVAS DA ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA. VÍNCULO ENTRE OS ACUSADOS. ELEMENTOS INSUFICIENTES. ABSOLVIÇÃO QUANTO AO ART. 14 DA LEI Nº 6.368/76. CONCURSO EVENTUAL DE AGENTES. MAJORANTE INSCRITA NO ART. 18, III. PENAS-BASES REDUZIDAS. CIRCUNSTÂNCIAS INERENTES AO TIPO OU SEM COMPROVAÇÃO. MINORANTE DO ART. 32, § 3º, IN FINE , DA LEI Nº 10.409/02. QUANTUM DE DIMINUIÇÃO MANTIDO. INAPLICABILIDADE AO CO-RÉU. RESTITUIÇÃO DOS BENS. NEXO INSTRUMENTAL E DE ORIGEM NÃO DEMONSTRADOS. 1. Não se verifica violação ao princípio do livre convencimento quando a decisão de primeiro grau, embora não sendo expressão da melhor técnica, encontra respaldo na prova produzida nos autos. 2. Embora se constate a condenação de um dos réus por fato não imputado no aditamento (tráfico), a anulação da sentença não é o remédio aplicável, pois somente se impõe quando não houver outra solução, o que não é o caso dos autos, onde é possível corrigir o equívoco simplesmente excluindo a condenação pelo crime inscrito no art. 12 da Lei nº 6.368/76. 3. O fato do magistrado singular ter utilizado o silêncio da ré na fase inquisitorial para embasar o decreto condenatório não importa em nulidade da sentença se, excluindo-se o fundamento equivocado, permanecem outros a sustentar a condenação como na hipótese. 4. Sendo o juiz livre para apreciar a prova, assim como para decidir as que devem ser produzidas, uma vez recusada, fundamentadamente, a juntada/produção de prova, não há falar em nulidade. 5. Ainda que não constasse do mandado de busca o nome do proprietário do imóvel, todas as outras especificações se fizeram constar, indicando o local, o motivo e os fins da diligência de forma correta, não havendo falar em nulidade por apreensão ilícita. 6. Além disso, em se tratando de investigações relativas a tráfico de entorpecentes, crime de natureza permanente, o mandado de busca e apreensão seria mesmo dispensável em virtude da situação de flagrância. 7. O depoimento de policiais, especialmente quando prestado em juízo, sob a garantia do contraditório, reveste-se de inquestionável eficácia para a formação do convencimento do julgador. Não se pode desqualificá-lo só pelo fato de emanar de agentes estatais incumbidos, por dever de ofício, da repressão penal. 8. Com relação à primeira apreensão de entorpecente, inegável que o réu paraguaio sabia do conteúdo da encomenda, transportando conscientemente a droga, pois, além do valor que receberia pela tarefa tornar difícil aceitar que desconhecia a natureza do transporte, o menor que o acompanhava narrou em detalhes a empreitada, relatando, inclusive, que tinham conhecimento sobre o produto. Condenação mantida. 9. Do mesmo modo, induvidosa a participação da co-ré, porquanto embarcava os estrangeiros no seu veículo quando foi abordada pela Polícia Federal, sem conseguir apresentar justificativa plausível para tanto. Condenação mantida. 10. Ainda, com relação à primeira ocorrência de tráfico, indiscutível a internacionalidade, porquanto o réu que transportava a droga relatou que a "encomenda" lhe foi entregue na cidade de Pedro Juan Caballero/PY, o que, também, foi narrado em detalhes pelo menor que o acompanhava. 11. No que pertine à segunda apreensão, o conjunto probatório demonstra de forma induvidosa a responsabilidade do réu proprietário do veículo no qual o estrangeiro acondicionava o entorpecente no momento do flagrante. 12. De fato, os testemunhos de acusação, dando conta de que vinha sendo investigado já há quatro meses por suspeitas de tráfico, aliados à delação do co-réu e ao fato de não ter trazido prova concreta das atividades profissionais que mencionou exercer, tornam inquestionável a atuação daquele acusado. 13. Para caracterização do delito inscrito no art. 12 da Lei nº 6.368/76, não é necessário que o agente esteja na posse direta do entorpecente ou comerciando. Indiferente, também, quem é o "proprietário" da droga, pois, tratando-se de crime múltiplo, perfectibiliza-se com a prática de qualquer das condutas ali descritas. Condenação mantida. 14. Quanto ao acusado que dirigia o veículo relacionado à segunda apreensão, a circunstância de estar fazendo favores para o co-réu, que conhecia há poucos dias, enquanto seu irmão permanecia hospitalizado, é no mínimo curiosa, já que afirmou ter ido a Florianópolis apenas para assisti-lo. 15. Do mesmo modo, inverossímil que o co-réu fosse incumbir da tarefa de recepção do entorpecente indivíduo que não confiasse e se não tivesse certeza de que agiria de acordo com as determinações, bem como é de se estranhar o fato de receber sérias ameaças do co-réu sem que tivesse qualquer envolvimento e soubesse sobre o tráfico. 16. Ainda, não se sustenta a tese de que sua conduta traduziu-se em meros atos preparatórios, porquanto, segundo os depoimentos, ele dirigiu até o ponto de ônibus às margens da rodovia, abriu a porta do carona para o estrangeiro, que acondicionou uma das sacolas no banco traseiro do veículo, só tendo sido abordados no momento em que a segunda sacola era colocada. Irrelevante, assim, que não tenha chegado a transportar a droga, pois o tráfico já havia se consumado na modalidade de receber . Condenação mantida. 17. É relevante o fato do primeiro paraguaio ter sido contratado por valor bem superior ao que receberia o segundo, que ainda teria que custear as passagens rodoviárias. Isso aliado às condições pessoais deste último estrangeiro, indivíduo de baixo grau de instrução, e à circunstância do peso da droga não ser de causar estranheza ao que simulava ser (rolos de lixa), tornam crível que não desconfiasse estar transportando produto diverso. 18. Ademais, o ônus de provar o dolo é do Ministério Público, o que não logrou fazer na hipótese. Aliás, as testemunhas de acusação corroboram a tese contrária, pois relatam que o acusado mostrou-se surpreso com a prisão. Absolvição. 19. A existência de bilhete rodoviário do Paraguai e o fato de ter sido aliciado em outro país ou ser estrangeiro, por si, não comprovam a internacionalidade do entorpecente. 20. O que há de mais consistente nos autos com relação à procedência da droga é a palavra do acusado que a transportava, que narrou em detalhes, em todas etapas, como pegou a encomenda em Foz do Iguaçu/PR. Majorante inscrita no art. 18, I, da Lei nº 6.368/76 afastada quanto a esta ocorrência. 21. Inexiste nos autos prova cabal do animus associativo capaz de caracterizar o crime insculpido no art. 14 da Lei nº 6.368/76. Os elementos coligidos bastam para a comprovação de mero concurso de agentes, não tendo o poder de ir além para demonstrar a existência de estabilidade criminosa. 22. De fato, o único elemento buscando comprovar a existência da organização criminosa é o testemunho dos policiais relatando que dois réus foram vistos, cerca de duas semanas antes do primeiro fato, adentrando na residência de outro acusado, o que não se mostra suficiente para demonstrar o vínculo associativo de caráter estável e permanente necessário para configuração do tipo penal. 23. Além disso, o terceiro acusado de integrar a organização, comprovou exercer ocupação lícita e conhecer apenas um dos co-réus, em função justamente da sua atividade profissional. Absolvição quanto a este delito. 24. Em virtude da absolvição pelo crime descrito no art. 14 da Lei nº 6.368/76, é aplicável a majorante estabelecida no art. 18, III, da mesma lei, quanto a dois dos réus, visto que, nas ocorrências de tráfico em que tomaram parte, atuaram em concurso eventual de agentes. A incidência de tal causa de aumento de pena não implica mutatio libelli , pois apenas foi desconsiderada a associação permanente descrita na denúncia para mero concurso de agentes em caráter eventual. Precedentes. 25. Na fixação das penas-bases, de todos os condenados, foram consideradas circunstâncias inerentes ao tipo ou sem comprovação nos autos. Redução que se impõe. 26. Mantido o grau de diminuição de pena pela minorante insculpida no art. 32, § 3º, da Lei nº 10.409/02 para o réu que conduzia o veículo relacionado à segunda apreensão de entorpecente, porquanto sua contribuição não foi tão expressiva na apuração dos fatos. 27. Não incide a referida minorante para o estrangeiro preso no primeiro flagrante de tráfico, uma vez que este não trouxe qualquer elemento que pudesse auxiliar nas investigações, sendo sua situação totalmente distinta do outro réu beneficiado. 28. Com relação aos bens apreendidos consoante doutrina e jurisprudência, é preciso demonstrar a existência de nexo instrumental ou de origem entre o bem e a traficância, o que não se verifica de forma suficiente nos autos a respeito dos veículos, celulares e dinheiro apreendido na residência de um dos réus. Perdimento revogado. 29. Já quanto ao numerário apreendido em poder da ré, mantém-se o perdimento, pois as circunstâncias evidenciaram que se destinava ao pagamento do co-réu estrangeiro pelo transporte da droga.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento aos apelos de ANGEL e LEANDRO, bem como parcial provimento ao recursos de LUCIANO e MARIANO e, por maioria, dar parcial provimento aos apelos de SAUL, ROSINA, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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