Acórdão nº 2.0000.00.447334-9/000(2) de TJMG. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, 14 de Abril de 2005

Magistrado ResponsávelMárcia de Paoli Balbino
Data da Resolução14 de Abril de 2005
SúmulaDeclararam Nulo o Julgamento de F. 142/172 e Negaram Provimento Ao Apelo, Concedendo, Porém, a Gratuidade Judicial à Apelante

ACIDENTE DO TRABALHO - INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 736 DO STF.

- A competência para ação de acidente do trabalho típico ou atípico, cuja causa de pedir seja o descumprimento de normas relativas à segurança do trabalho, à saúde e higiene do trabalhador, respectivamente, é da Justiça do Trabalho, conforme entendimento contido na Súmula 736 do STF, editada em dezembro de 2003, que não excepcionou o disposto no art. l09, I, da CF.

- O art. l09, I, da CF apenas fixa a competência da Justiça Federal, excluindo, dentre outras, competência para conhecer e julgar as ações submetidas à Justiça Eleitoral e também as ações submetidas à Justiça do Trabalho. Portanto, este dispositivo constitucional não exclui a competência da Justiça do Trabalho para as ações de acidente do trabalho, pois apenas prevê que ações de acidente do trabalho e ações que competem à Justiça do Trabalho, dentre outras, não serão julgadas pela Justiça Federal, fazendo clara distinção, portanto e somente, entre a competência da Justiça Federal e a competência da Justiça do Trabalho.

- A Súmula 736 do STF, que foi editada recentemente, revoga súmulas anteriores menos abrangentes que tratavam diversamente do tema.

- Ao editar a Súmula 736 e fixar a competência da Justiça do Trabalho, o STF não apresentou qualquer ressalva de abrangência, e o fez também levando em conta o disposto nos arts. l09-I, ll3 e ll4 da CF, pois, atente-se, em todo julgamento, muito mais quando o julgamento dá origem a uma súmula, o julgador o faz necessariamente vinculado à interpretação sistemática de todo o ordenamento jurídico, sendo irrelevante, para a fixação da competência, a natureza das normas, de Direito Civil, a serem aplicadas nas ações de acidente do trabalho.

- Súmulas anteriores que tratavam diversamente do tema, do próprio STF e do STJ, devem ser entendidas como revogadas e superadas, ante posição atual do STF, especialmente no que se refere ao tema de Direito Constitucional, porquanto órgão máximo do Judiciário, a quem incumbe exatamente interpretar a Constituição. Não ocorre, portanto, hipótese de súmulas divergentes nem de hipóteses distintas a ensejar não aplicação da Súmula 736 do STF, pois esta abrange acidentes típicos e atípicos.

- O Direito Sumular não permite interpretação de súmula, de forma a restringir seu campo de abrangência. Somente ao STF, caso venha entender como equivocada a redação da súmula editada, competirá modificar ou até cancelar a Súmula 736. Enquanto vigorar, todavia, caberá ao juiz e aos tribunais inferiores aplicá-la, segundo regra processual cogente já mencionada.

- A prescrição de dois anos prevista na CLT aplica-se somente às verbas salariais decorrentes do contrato de trabalho rescindido, não tendo aplicação nas ações de indenização por danos decorrentes de acidente típico ou atípico do trabalho, cujo prazo prescricional é o de direito comum, ou seja, de 20 anos. E o fato de ser obrigatória a adoção de prazo prescricional de direito comum, assim como a observância das normas de direito comum, não determina a competência da Justiça Comum, pois o que vincula o juiz é a interpretação sistemática de todo o ordenamento jurídico ao decidir.

Competência declinada para uma das Varas da Justiça do Trabalho.

- Anula-se a sentença proferida por juiz absolutamente incompetente antes de remeterem-se os autos ao que seja competente para julgá-los.

V.v.- É de competência da Justiça Estadual processar e julgar os litígios decorrentes de acidente do trabalho.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível Nº 447.334-9 da Comarca de BELO HORIZONTE, sendo Apelante (s): MARIA DA PENHA GOMES e Apelado (a) (os) (as): TENGE - TÉCNICAS DE ENGENHARIA LTDA.,

ACORDA, em Turma, a Nona Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais ANULAR A SENTEÇA, DECLINAR DA COMPETÊNCIA PARA A JUSTIÇA DO TRABALHO, VENCIDOS PARCIALMENTE A RELATORA E O VOGAL.

Presidiu o julgamento o Juiz WALTER PINTO DA ROCHA e dele participaram os Juízes MÁRCIA DE PAOLI BALBINO (Relatora, vencida parcialmente), HÉLCIO VALENTIM (Revisor convocado e Relator para o Acórdão) e MARINÉ DA CUNHA (Vogal, vencido parcialmete).

Belo Horizonte, 30 de abril de 2004.

JUÍZA MÁRCIA DE PAOLI BALBINO

Relatora, vencida parcialmente

JUIZ HÉLCIO VALENTIM

Revisor convocado e Relator para o Acórdão

JUIZ MARINÉ DA CUNHA

Vogal, vencido parcialmente

V O T O S

A SRª. JUÍZA MÁRCIA DE PAOLI BALBINO:

Recebo o recurso, em face da presença de todos os requisitos que o autorizam.

Peço venia aos eminentes pares integrantes desta Nona Câmara Cível, que adotam posicionamento diverso, para argüir a preliminar de incompetência da justiça estadual, para processamento e julgamento do recurso, tendo em vista que uma das causas de pedir, expostas na inicial do empregado demandante contra a empregadora, é a inobservância de normas relativas à segurança, saúde ou higiene do trabalhador e, em razão da nova orientação decorrente do teor da recente Súmula 736 do STF, que determina ser competência da Justiça do Trabalho as ações que tenham tal causa de pedir, tudo conforme motivos que adiante exponho.

Inicialmente, consigne-se que o fato de ter sido admitida a inicial e processada a ação pela Justiça Estadual não torna preclusa para o julgador, mesmo em segundo grau, a verificação e conhecimento posteriores de questões não verificadas ao início, verificação que pode ocorrer até a data da sentença.

Nesse sentido:

"De outro lado, ao menos em três dispositivos o Código explicita casos em que a possibilidade de apreciar certos atos do processo não preclui, a saber: a) no Art. 113, onde estabelece que a incompetência absoluta comporta alegação pelas partes ou conhecimento de ofício pelo Juiz em qualquer tempo e grau de jurisdição; b) no § 3º do Art. 267, onde também manda o Juiz conhecer de ofício e sempre que não haja proferido sentença toda a matéria relativa aos pressupostos processuais, condição da ação, litispendência e coisa julgada; c) nos incisos do Art. 485, pelos quais possíveis fundamentos de defesa sobrevivem ao próprio processo e resistem à coisa julgada, autorizando revisão da sentença pela via da ação rescisória" (Cândido Rangel Dinamarco, Intituições de Direito Processual Civil, 4 ed., São Paulo: Malheiros, v. 2,2004, p.457).

Por outro lado, também não se verifica qualquer prejuízo ou lesividade para a parte, decorrente da decisão do Juiz Estadual que declina da competência, de ordem absoluta, para a Justiça Especializada, no caso para a Justiça do Trabalho, sendo entendimento da doutrina processualista que nesse caso sequer seria cabível recurso, conforme entendimento dos coordenadores e autores Nelson Nery Júnior e Teresa Arruda Alvim Wambier e outros Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis e de Outros Meios de Impugnação às Decisões Judiciais, São Paulo: RT, 2003, v. 7, p.232-235, em que lecionam:

"Não somente pela ausência de competência e pela improrrogabilidade da jurisdição o não conhecimento do recurso se impõe, mas também pela ausência de lesividade que a decisão declinatória da competência causa cabe a motivação pela rejeição do recurso liminarmente.

Por ausência de lesividade, é irrecorrível o ato judicial que declara a incompetência absoluta em razão da matéria, pois somente o conflito negativo de jurisdição pode ensejar o conhecimento da matéria para instância superior, desde que suscitado (Art. 116 do CPC).

Faz parte da administração do judiciário, considerada a jurisdição sob o aspecto da competência interna de seus órgãos, o acertamento entre os juízes e Tribunais a respeito do processamento e julgamento de processos, com definição prévia da competência, em caso de equívoco quando do ajuizamento da demanda e sua posterior regularização por meio de decisões ou da palavra definitiva do STJ.

Tal "desacerto" momentâneo decorre da diversidade de matérias e das limitações impostas pela Constituição aos órgãos do Poder Judiciário, assim como a interpretação correta que deve ser dada ao dispositivo que gerou a diversidade de entendimentos.

Caso seja suscitado o conflito negativo de jurisdição, esse hiato existente até a remessa dos autos ao STJ não pode ser tido como fator que obsta o acesso ao judiciário, em face da necessidade de se firmar a jurisdição competente para processar e julgar o pedido. É, na verdade, a maneira mais célere para o acertamento da jurisdição, o que não macula a entrega da prestação jurisdicional de forma rápida e eficaz, em face da necessidade que tal incidente reclama.

O conflito de competência tem previsão em lei e tem natureza de incidente processual, que limita o poder jurisdicional de cada um destes órgãos, ou seja, traça o âmbito dentro do qual poderá exercê-la e a " determinação das competências pelos órgãos de jurisdição, isto é, o preestabelecimento legal dos limites de cada qual, não se faz de modo arbitrário, mas sim respeitados certos critérios. São os chamados critérios determinativos" (Moacyr Amaral Santos).

Se a lei atribui a cada órgão do Poder Judiciário a fixação de suas atribuições, não há que se falar em atraso ou morosidade da justiça ou até mesmo em atribuição de culpa ao Judiciário por não ter recebido o pedido e ter prolongado a discussão a respeito da competência, em face do não recebimento da inicial, até definição pelo STJ sobre o Juízo competente para conhecê-lo. E se a lei é o referencial para a discussão, não há lesividade à parte capaz de ensejar recurso de agravo, posto que o conflito de competência é o meio adequado para solucionar a controvérsia, lembrando sempre que "a questão incidente, que é o objeto da decisão interlocutória, tem sempre caráter processual e nunca de direito material" (Antônio Cláudio da Costa Machado)

No STJ outro não é o entendimento: (...)

Do STF extrai-se o seguinte excerto: (...)

"Os Tribunais Estaduais, Federais e do Trabalho, repelindo liminarmente os recursos interpostos contra tais decisões, enaltecem a desejada redução de recursos desnecessários que invadem diariamente...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT