Acórdão nº 2004/0107495-3 de CE - CORTE ESPECIAL

Magistrado ResponsávelMinistro PAULO GALLOTTI (1115)
EmissorCE - CORTE ESPECIAL
Tipo de RecursoAção Penal

AÇÃO PENAL Nº 369 - PE (2004/0107495-3)

RELATOR : MINISTRO PAULO GALLOTTI
AUTOR : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RÉU : A A DA S J
ADVOGADO : D.T.D.S.D. E OUTRO(S)

EMENTA

AÇÃO PENAL. ARTIGO 129, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL E ARTIGO 232 DO ECA. CARÊNCIA DE AÇÃO POR FALTA DE REPRESENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA. COMPARECIMENTO DA MÃE DA VÍTIMA PERANTE A AUTORIDADE POLICIAL. INTERESSE NA VERIFICAÇÃO DA RESPONSABILIDADE PENAL DO DENUNCIADO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. ARTIGO 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. EXIGÊNCIA DA DESCRIÇÃO DA CONDUTA DELITUOSA, COM AS SUAS CIRCUNSTÂNCIAS. IRREGULARIDADE. DENÚNCIA REJEITADA.

  1. O comparecimento da mãe da vítima à Delegacia de Apuração de Crimes contra Crianças e Adolescentes, relatando a agressão que teria sido praticada contra seu filho, bem assim requerendo fossem adotadas as providências pertinentes, traduz inequívoco interesse na apuração da responsabilidade penal do denunciado, suprindo eventual falta de representação, que prescinde de qualquer formalidade.

  2. A denúncia, apta a dar início à persecução penal, deve conter os requisitos estabelecidos no artigo 41 do Código de Processo Penal, de modo que o denunciado, tomando conhecimento da acusação que lhe é feita, possa exercer, de maneira ampla, sua defesa.

  3. Revela-se manifesta a inépcia formal da peça acusatória que deixa de descrever, ainda que sucintamente, a conduta do denunciado e as circunstâncias em que teriam sido praticados os delitos, inclusive não arrolando testemunhas, impondo-se, de rigor, a sua rejeição.

  4. Denúncia rejeitada.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, rejeitar a denúncia, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

    Os Srs. Ministros Luiz Fux, João Otávio de Noronha, Teori Albino Zavascki, Arnaldo Esteves Lima, Nilson Naves, Francisco Peçanha Martins, Ari Pargendler, José Delgado, F.G., C.A.M.D., Felix Fischer, Aldir Passarinho Junior, G.D. e Eliana Calmon votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Ausentes, justificadamente, a Sra. Ministra Laurita Vaz e, ocasionalmente, os Srs. Ministros Antônio de Pádua Ribeiro, H.G. deB., Cesar Asfor Rocha, Hamilton Carvalhido e Francisco Falcão.

    Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Barros Monteiro.

    Brasília (DF), 15 de agosto de 2007. (data do julgamento)

    MINISTRO BARROS MONTEIRO, Presidente

    MINISTRO PAULO GALLOTTI, Relator

    AÇÃO PENAL Nº 369 - PE (2004/0107495-3)

    RELATÓRIO

    O SENHOR MINISTRO PAULO GALLOTTI: O Ministério Público Federal oferece denúncia contra A.A. daS.J., Procurador Regional do Trabalho, imputando-lhe a prática dos crimes previstos nos artigos 129, caput, do Código Penal, e 232 do Estatuto da Criança e do Adolescente, por fatos ocorridos em 22/8/2003.

    Encaminhado o termo circunstanciado ao Juiz de Direito do Juizado Especial Criminal de Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco, este declinou da competência, remetendo os autos à Justiça Federal, que os enviou ao Superior Tribunal de Justiça em virtude de o denunciado possuir, aqui, foro por prerrogativa de função, nos termos do art. 105, I, "a", da Constituição Federal.

    Notificado, a teor do disposto no art. 4º da Lei 8.038/90 e do art. 220 do Regimento Interno desta Corte, o denunciado apresentou defesa na qual argüiu, preliminarmente, existir carência da ação por falta de representação para a instauração do inquérito e da ação penal, ressaltando que "o termo de representação de fl. 16, firmado no dia 22 de agosto de 2003, não se refere ao menor B. deB.S., muito menos ao ora denunciado. Ali diz que compareceu um certo Ricardo Matias, 'o qual manifestou o interesse de representar, na forma da Lei nº 9.099, de 27/9/1995, em relação a L.M. daS.'." (fl. 76)

    Alega, ainda, como preliminar, a decadência do direito de representação, assim também que teria havido conciliação entre as partes, com retratação da representante legal do menor.

    Sustenta, ainda, no que interessa:

    "II.1 - DA PSICOLOGIA APLICADA AO DIREITO DE FAMÍLIA

    Sem embargo de se tratar de uma demanda cujo objeto é um suposto ilícito penal, urge, ao ensejo, tecer algumas considerações acerca da psicologia aplicada ao direito de família, uma vez que, de um lado, encontram-se, como representante legal e vítima, respectivamente, ex-esposa e filho, e, do outro, ex-marido e pai.

    Pois bem.

    O direito de família, com o advento da Constituição Federal de 1988, adquiriu pela sua própria constitucionalização e ante a sua maior abrangência, abrigando novas entidades familiares, maiores atenções e exigências de uma abordagem multidisciplinar.

    Não há negar a imperatividade de uma abordagem multidisciplinar no moderno direito de família, reconhecida a sua complexidade no trato de temas conflituosos e a interdisciplinariedade dos ramos da ciência para o estudo e solução dos casos posto ao julgamento judicial.

    É ponderável registrar que a noção fundamental de 'interesse da criança', constante do art. 3º da Convenção Internacional dos Direitos da Criança, adotada pela Assembléia Geral das Nações Unidas (26/1/1990), é havida como consideração primordial em todas as decisões que lhe concerne, inclusive pelos Tribunais, o que leva à inarredável conclusão da imperativa avaliação psicológica dos impactos que um processo criminal, envolvendo pais e filho, pode ter em suas relações futuras, pois inegavelmente, a confiança, o carinho, a atenção, enfim, todos os sentimentos que os ligam restarão sensivelmente abalados.

    II.2 - DO EXERCÍCIO DO PODER FAMILIAR

    Como cediço, o poder familiar engloba normas atinentes aos direitos e deveres dos pais quanto à pessoa dos filhos menores, contidas no art. 1.634 do novel Código Civil. No caso concreto, relevante são os mandamentos insculpidos nos incisos I e VII, in verbis:

    'Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:

    I - dirigir-lhes a criação e educação;

    II - tê-los em sua companhia e guarda;

    III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;

    IV - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;

    V - representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;

    VI - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;

    VII - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.'

    Com o escopo de melhor deslindar a matéria, de plano, será abordado o 'dever' de que trata o inciso I dos dispositivo supracitado, para, então, enfrentar o 'direito' a que alude o inciso VII.

    II.2.1 - DO DEVER DE DIRIGIR A CRIAÇÃO E EDUCAÇÃO DOS FILHOS

    Maria Helena Diniz, sobre o inciso I do art. 1.634 do Código Civil, doutrina que:

    'Criação e educação dos filhos. Os pais deverão dirigir a criação e educação dos filhos menores, proporcionando-lhes meios materiais para sua subsistência e instrução, de acordo com suas posses econômicas e condição social, amoldando sua personalidade e dando-lhes boa formação moral e intelectual.'

    Como dito alhures, sempre cumpri com o meu dever de pai no sentido de proporcionar aos meus filhos, que são 5 (cinco), os meios materiais para sua subsistência e instrução, me preocupando, de forma quase que incansável, em amoldar suas personalidades e dando-lhes boa formação moral e intelectual. Veja-se:

    1 - pagamento de pensão alimentícia em percentual maior do que o determinado pela justiça;

    2 - pagamento, inobstante o valor da pensão alimentícia, de escolas, boas e caras, o que demonstra cabalmente o relevante amor pelo estudo;

    3 - convívio, em todo o período em que passou no Estado de Alagoas, quando das férias escolares, com os filhos, cumprindo os deveres de pai, mesmo à distância.

    4 - Abdicação da vaga de Juiz do Tribunal Regional do Trabalho da 19ª Região, no Estado de Alagoas, pelo quinto constitucional do Ministério Público, em virtude de problemas com o estudo de B. e P. H., pois ambos sempre moraram em Recife.

    5 - Abdicação do cargo de Procurador-Chefe da Procuradoria do Trabalho da 19ª Região, no Estado de Alagoas, e conseqüente remoção para o Estado de Pernambuco, com vistas a acompanhar de forma mais efetiva o crescimento dos filhos;

    6 - Despesas com professor particular;

    7 - Despesas com curso de pré-vestibular.

    Resplandece, portanto, que jamais me esquivei de cumprir com meus deveres de genitor no sentido de fornecer os meios materiais necessários para sua subsistência e instrução, assim como de formar sua personalidade e caráter, ao revés, sempre cumpri com além de minhas obrigações, revelando-se, pois, se suscetível de classificação, em um, no mínimo, 'bom' pai.

    II.2.2 - DO DIREITO DOS PAIS DE EXIGIR DOS FILHOS QUE LHES PRESTEM OBEDIÊNCIA E RESPEITO.

    A mesma renomada civilista, ao comentar, por sua vez, o inciso VII do mesmo dispositivo, pontifica que:

    'Exigência de obediência, respeito e serviço por parte do menor. O filho deverá não só obedecer e respeitar os pais, como também prestar serviços compatíveis com sua idade e condição, participando na mantença da família (CLT, arts. 403 e 404; Lei nº 8.069/90, arts. 60, 64 e 67; CF/88, art. 7º, XXXIII).'

    É princípio lógico do direito, registre-se, oportune tempore, que: a todo direito corresponde um dever e a todo dever corresponde um direito.

    Ora, se o denunciado cumpre religiosa e integralmente com todos os seus deveres, respeitando, por consectário, os direitos de seus filhos, como lhe negar o direito de exigir obediência e respeito dos mesmos?

    De outra parte, se tem o menor direito à educação, logo, tem o dever de estudar!!! De nada adiantará ter o menor direito à educação se não tiver, por outro lado, o pai o poder/dever de lhe exigir o estudo!!!

    Finalmente, no dia da queixa entreguei o menor a queixosa pela manhã, sem escoriações, tanto que compareci com ele às dependências da sua escola e conversei por duas horas com a psicóloga, que tentou convencê-lo a ficar sob...

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