Acórdão nº 1.0145.04.185721-3/001(1) de TJMG. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, 2 de Febrero de 2006

Magistrado ResponsávelElpídio Donizetti
Data da Resolução 2 de Febrero de 2006
Tipo de RecursoApelação Cível
SúmulaDeram Parcial Provimento, Vencido ...

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0145.04.185721-3/001 - 2.2.2006

JUIZ DE FORA

AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO CUMULADA COM PEDIDO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER - PESSOA JURÍDICA - ESTATUTO SOCIAL - DISPENSA DE JUNTADA - RELAÇÃO DE CONSUMO - DEVER DE INFORMAÇÃO - PULSOS EXCEDENTES - DETALHAMENTO - ATOS ADMINISTRATIVOS - IMPOSSIBILIDADE DE RESTRIÇÃO DO ALCANCE LEGAL - OFENSA AO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO - INOCORRÊNCIA - AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ - REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO - IMPOSSIBILIDADE - JUROS MORATÓRIOS - CITAÇÃO VÁLIDA - CORREÇÃO MONETÁRIA - PAGAMENTO DE CADA PARCELA - PRESTAÇÕES PERIÓDICAS - INOCORRÊNCIA - OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER - MULTA.

- Não havendo dúvida quanto à pessoa que outorgou o mandato judicial em nome da pessoa jurídica, e não tendo havido impugnação oportuna a esse respeito, dispensa-se a juntada do estatuto social para fins de verificação dos pressupostos processuais.

- A informação quanto ao serviço prestado - no caso, serviço de telefonia fixa - é direito do consumidor (art. 6º, III, do CDC), devendo tal direito ser apreendido em uma acepção o mais ampla possível, razão pela qual essa informação deve ser efetivamente adequada e clara. Todavia, em se tratando de serviço de telefonia fixa, é notório o descumprimento do correlato dever de informação por parte das concessionárias que o prestam, como é o caso da apelada, uma vez que, sob a rubrica de "informação suficiente e adequada", limitam-se a informar aos usuários quantos pulsos - medida para cálculo do montante a ser cobrado pelo serviço prestado - excederam o limite da franquia concedida em razão da assinatura básica, sem, contudo, informar-lhes a título de que são devidos esses pulsos.

- O direito à informação, a par de decorrer diretamente do princípio da defesa do consumidor previsto em nível constitucional, está elencado em lei, que, obviamente, não pode ter seu conteúdo restringido por atos administrativos, mormente o Decreto Presidencial 4.733/03, que estabelece o detalhamento das ligações efetuadas como diretriz a ser seguida em janeiro de 2006 no setor de telefonia fixa comutada.

- Em sendo a informação dever a ser cumprido por qualquer fornecedor, e, em se tratando a telefonia fixa de serviço prestado a boa parte da população brasileira, as concessionárias prestadoras desse serviço deveriam, ao ingressar no mercado, haver se preparado para atender prontamente ao dever que lhes é legalmente imposto. Se não o fizeram, como é o caso da apelada, não é o usuário que deverá arcar com os ônus dessa falta de clareza, sob a alegação de ofensa ao equilíbrio econômico-financeiro.

- Deve-se entender como quantia indevida, para fins de restituição em dobro do indébito, aquela que, além de abusiva, é cobrada de má-fé, o que não é o caso dos valores referentes às ligações não discriminadas, porquanto a concessionária pautava sua conduta, ainda que de forma incorreta, por uma prática aceita na sociedade brasileira e até mesmo por alguns atos normativos, tais como o Decreto 4.733/03.

- Em se tratando de obrigação líquida e positiva sem termo, e não havendo prévia interpelação judicial ou extrajudicial (art. 397 do CC/02), incide a regra subsidiária de constituição em mora a partir da citação válida, conforme determina o caput do art. 219 do CPC.

- A correção monetária deve incidir a partir da data em que cada uma das parcelas a ser restituída foi despendida pelo consumidor, porquanto, a partir de então, os valores devidos passaram a ser corroídos pela inflação.

- Não se tratando a pretensão deduzida em juízo de cobrança de prestações periódicas decorrentes de obrigação que se protrai no tempo, mas sim de repetição do que indevidamente se pagou, não há que se falar em aplicação do art. 290 do CPC, que prevê a inclusão, na condenação, das parcelas vencidas e não pagas ao longo da relação processual.

- Reconhecida a ilegalidade quanto à cobrança de parcelas referentes a serviços que não foram devidamente discriminados, deve-se determinar que a operadora de telefonia fixa abstenha-se, sob pena de multa, de proceder a qualquer nova cobrança sem a observância do dever de prestar informação adequada e clara.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1.0145.04.185721-3/001 da Comarca de JUIZ DE FORA, sendo Apelante (s): MARIA DAS GRAÇAS SILVÉRIO ALVES e Apelado (a) (os) (as): TELEMAR - NORTE LESTE S.A.,

ACORDA, em Turma, a Décima Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, DAR PARCIAL PROVIMENTO, VENCIDO O REVISOR.

Presidiu o julgamento a Desembargadora EULINA DO CARMO ALMEIDA e dele participaram os Desembargadores ELPÍDIO DONIZETTI (Relator), FÁBIO MAIA VIANI (Revisor vencido) e FRANCISCO KUPIDLOWSKI (Vogal).

Produziu sustentação oral pela apelada, na sessão do dia 15/12/2005, o Dr. Lauro Bracarense Filho.

Belo Horizonte, 2 de fevereiro de 2006.

DESEMBARGADOR ELPÍDIO DONIZETTI

Relator

DESEMBARGADOR FÁBIO MAIA VIANI

Revisor vencido

DESEMBARGADOR FRANCISCO KUPIDLOWSKI

Vogal

V O T O S

SESSÃO DO DIA 15/12/2005

O SR. DESEMBARGADOR ELPÍDIO DONIZETTI:

Ouvi, com atenção, o Dr. Lauro Bracarense Filho da tribuna, que fez sustentação oral pela apelada.

Trata-se de apelação interposta à sentença que, nos autos da ação de repetição de indébito cumulada com pedido de obrigação de não fazer ajuizada por Maria das Graças Silvério Alves em face de Telemar Norte Leste S/A, julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial.

Na sentença (f. 171-176), o juiz de primeiro grau rejeitou, inicialmente, a preliminar de existência de litisconsórcio necessário entre a ré e a Anatel, bem como a prejudicial de decadência, por não se discutir a prestação de serviço defeituoso, ressalvando, quanto à prejudicial de prescrição, que "tal matéria somente deve ser encarada ao final, se eventualmente ficar demonstrada a cobrança indevida" (f. 172).

Em seguida, acrescentou que, muito embora se aplique ao caso sob julgamento o Código de Defesa do Consumidor, não se afasta a aplicação de outros diplomas legais, como é o caso da Lei 9.472/97, que, por ser lei específica e posterior, sobrepõe-se ao CDC.

Por fim, salientou que, no caso de telefonia fixa, ainda não há tecnologia disponível para discriminação de todas as ligações, motivo pelo qual se justifica a postergação da disponibilidade desse serviço, não se devendo, por conseguinte, deferir a pretensão formulada pela autora.

Inconformada, a autora interpôs apelação (f. 178-196), alegando, em síntese, que:

  1. deve-se reconhecer a revelia da ré, porquanto não comprovou sua capacidade processual, o que deveria haver sido feito pela juntada de seu estatuto social;

  2. não há que se falar em obrigatoriedade da discriminação dos pulsos excedentes somente a partir de janeiro de 2006, uma vez que já está ocorrendo violação ao direito à informação assegurado ao consumidor;

  3. somente se pode cobrar pelo serviço efetivamente prestado, sendo que a aferição da efetiva prestação de serviço telefônico deve ser feita por meio da discriminação detalhada das ligações;

  4. não há que se falar em sobreposição da Lei Geral das Telecomunicações em relação ao Código de Defesa do Consumidor, uma vez que são leis que se completam, estabelecendo a proteção do consumidor;

  5. deve haver a repetição em dobro do indébito, pois não houve engano justificável da ré quanto à cobrança dos pulsos excedentes não discriminados;

  6. devem-se incluir, no valor da condenação, "as parcelas vincendas até a data do efetivo pagamento" (sic, f. 192), considerando-se que se trata de prestações de trato sucessivo;

  7. a correção monetária deve incidir a partir da data do pagamento das faturas;

  8. a ré deve ser compelida a abster-se de cobrar parcelas a título de pulsos além da franquia sem a devida discriminação, sob pena de multa diária de R$2.000,00.

    Desse modo, pede o provimento da apelação, reformando-se a sentença, a fim de se julgarem procedentes os pedidos formulados na inicial.

    A ré, por sua vez, apresentou contra-razões (f. 197-206), pugnando pela manutenção da sentença, ao fundamento de que:

  9. a pretensão da autora implica onerosidade excessiva à ré, porquanto terá de antecipar a disponibilidade de uma tecnologia que ainda não se encontra implementada, com prejuízos até mesmo para os outros usuários do serviço de telefonia fixa;

  10. a informação prestada nas contas dos usuários é suficiente e adequada, estando em consonância com a legislação e os regulamentos que dispõem sobre o serviço telefônico fixo comutado;

  11. a alteração da tecnologia atualmente disponível, "de forma que as centrais locais passem a identificar as chamadas originadas, demanda solução técnica complexa, que vem sendo atualizada afim de cumprir a determinação do Decreto nº 4.733/2003" (sic, f. 202);

  12. o termo fixado para a disponibilidade de tecnologia que permita a discriminação detalhada das ligações é janeiro de 2006, levando-se em consideração a necessidade de concessão de prazo razoável para implementação de sistema com esse intuito;

  13. não é cabível a restituição em dobro, uma vez que não agiu de má-fé, configurando-se o engano justificável.

    Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da apelação.

    Ressalva-se, inicialmente, antes de se adentrar na análise do mérito recursal, que, embora, na sentença, o juiz de primeiro grau haja tratado das questões preliminares - existência de litisconsórcio passivo necessário e incompetência da Justiça estadual - e prejudiciais de mérito - prescrição e decadência - suscitadas na contestação, tais questões já haviam sido resolvidas em decisão interlocutória (f. 131), contra a qual se interpôs agravo de instrumento (f. 132).

    Por sua vez, o referido agravo de instrumento (nº 487.338-9) já foi devidamente apreciado por este Tribunal de Justiça, em julgamento de que fui relator, restando afastadas as questões mencionadas acima.

    Assim, não estando pendente o julgamento quanto a quaisquer de tais alegações, passa-se a tratar do mérito da apelação.

    1 - DA ALEGAÇÃO DE REVELIA

    A autora (apelante) alega que se...

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