Acórdão nº 2007/0047616-5 de T6 - SEXTA TURMA

Número do processo2007/0047616-5
Data27 Setembro 2007
ÓrgãoSexta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 932.784 - RS (2007/0047616-5)

RELATOR : MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO
RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
RECORRIDO : WILSON TELLES JÚNIOR (PRESO)
ADVOGADO : HELENA MARIA PIRES GRILLO - DEFENSORA PÚBLICA E OUTROS

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. FURTO QUALIFICADO. CONCURSO DE AGENTES. APLICAÇÃO DA CAUSA DE AUMENTO DE PENA PREVISTA NO ARTIGO 157, PARÁGRAFO 2º, DO CÓDIGO PENAL. INCABIMENTO. AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA. NE BIS IN IDEM. REINCIDÊNCIA E MAUS ANTECEDENTES. ELEMENTOS DIVERSOS. BIS IN IDEM. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. OCORRÊNCIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

  1. A lei ela mesma estabelece, no parágrafo 4º do artigo 155 do Código Penal, por força de agravantes qualificadoras, o aumento dos limites máximo e mínimo de pena in abstracto do delito de furto simples, incabendo, de forma evidente, converter a forma qualificada do delito patrimonial em exame em causa de aumento de pena, sob o pretexto, injustificável por todos os títulos, de aplicação isonômica e proporcional do parágrafo 2º do artigo 157 do Código Penal. Precedentes.

  2. Caracterizada a reincidência, de bis in idem não há falar, porque não se está punindo o agente duas vezes pelo mesmo fato-crime, mas, sim, considerando a reincidência produzida ou aprofundada pelo novo delito, na perspectiva de sua personalidade, como elemento obviamente influente na resposta penal a ser editada, expressão da reprovação que se lhe faz pelo novo crime praticado.

  3. Não há entre as denominadas circunstâncias judiciais e as circunstâncias legais, diferença ontológica qualquer, afastando, por isso, a reincidência os maus antecedentes, enquanto circunstância judicial, pois que tem a mesma função, determinada pela mesma causa, possuindo apenas força e grau de intensidade diversas.

  4. Recurso parcialmente provido.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. A Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura e os Srs. Ministros Carlos Fernando Mathias (Juiz convocado do TRF 1ª Região) e Nilson Naves votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo Gallotti. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

    Brasília, 27 de setembro de 2007 (Data do Julgamento).

    MINISTRO Hamilton Carvalhido, Relator

    RECURSO ESPECIAL Nº 932.784 - RS (2007/0047616-5)

    RELATÓRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO (Relator):

    Recurso especial interposto pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, com fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição da República, contra acórdão da Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que, dando parcial provimento aos apelos do Parquet e de Wilson Telles Júnior, reduziu-lhe as penas para 1 ano, 1 mês e 10 dias de reclusão e 10 dias-multa, no processo da ação penal a que responde pela prática do delito tipificado no artigo 155, parágrafo 4º, inciso IV, combinado com artigo 14, inciso II, do Código Penal.

    Além da divergência jurisprudencial, funda a insurgência especial a violação do artigo 155, parágrafo 4º, inciso IV do Código Penal, cujos termos são os seguintes:

    "Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

    § 4º. A pena é de reclusão de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa, se o crime é cometido:

    IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas."

    E teria sido violado porque "a Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, aplicando o percentual de aumento da pena do roubo majorado pelo concurso de agentes ao delito de furto em igual condição, acabou por negar vigência ao próprio artigo 155, parágrafo 4º, inciso IV, do Código Penal, que prevê pena de 2 a 8 anos de reclusão" e que "(...) a interpretação analógica é excepcional, devendo ser utilizada somente quando o julgador não encontrar na lei a solução para o problema que lhe é trazido, e, in casu, inviável seu emprego, pois não há omissão legislativa" (fl. 293).

    Por outro lado, além da divergência jurisprudencial, aduz o recorrente a violação dos artigos 59 e 61, inciso I, do Código Penal, verbis:

    Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime.

    "Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:

    I - a reincidência;"

    E teriam sido violados porque "segundo os trechos do acórdão hostilizado, verifica-se que a Quinta Câmara do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul afastou a aplicação dos antecedentes do recorrido na fixação da pena-base, bem assim a agravante da reincidência, por entender que representam bis in idem e fazem vigorar o não-democrático direito penal do autor" (fl. 300).

    Sustenta, ainda sobre o tema, que "(...) pelo que se depreende da folha de antecedentes criminais (fls. 140-142), (...) o recorrido apresenta três condenações transitadas em julgado anteriormente à prática do delito em tela, configurando-se, portanto, a reincidência específica em delitos contra o patrimônio, revelando sua especial tendência anti-social" (fl. 300).

    Aduz, mais, que "resta claro e evidente, portanto, a possibilidade do reconhecimento da circunstância dos maus antecedentes e, também, da aplicação da agravante da reincidência, em razão de serem decorrentes de elementos diversos" (fl. 302).

    Pugna, ao final, pelo provimento do recurso para que "(...) seja aplicada ao réu a pena abstratamente prevista ao delito de furto qualificado, bem assim, considerada, na fixação da pena-base, a circunstância dos antecedentes do recorrido e,na fixação da pena-provisória, a agravante da reincidência, em razão de os aumentos decorrerem de elementos diversos" (fl. 311).

    Recurso tempestivo (fl. 285), respondido (fls. 313/329) e admitido na origem (fls. 341/343v).

    Em contra-razões, aponta o recorrido a ausência de comprovação da divergência jurisprudencial, bem como a falta de prequestionamento dos dispositivos tidos como violados.

    O Ministério Público Federal veio pelo provimento do recurso, em parecer assim sumariado:

    "CRIMINAL. RECURSO ESPECIAL. FURTO QUALIFICADO PELO CONCURSO DE AGENTES. IMPOSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DA PENA DO FURTO SIMPLES COM MAJORANTE DE ROUBO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. MAUS ANTECEDENTES E REINCIDÊNCIA NÃO CONFIGURAM INCONSTITUCIONALIDADE. A AGRAVANTE GENÉRICA TEM APLICAÇÃO OBRIGATÓRIA. NEGATIVA DE VIGÊNCIA EVIDENCIADA.

    Vige no direito penal o princípio da estrita legalidade, razão pela qual revela-se inadmissível a aplicação, por analogia, da norma do artigo 157, § 2º, inciso II, do Código Penal se há previsão normativa, no art. 155, § 4º, inciso IV, do mesmo diploma legal, de qualificação do crime de furto praticado em concurso de pessoas.

    A aplicação da agravante de reincidência não é faculdade do magistrado,mas imposição legal, nos termos do artigo 61, inciso I, do Código Penal.

    O agravamento da pena, em função da consideração dos maus antecedentes e da reincidência do réu não são inconstitucionais e nem configura bis in idem, pois não se pretende punir novamente o crime anteriormente praticado. Nos maus antecedentes, dá-se efetividade à individualização da pena e à isonomia, porquanto, considera-se os fatos objetivos que maculam e ferem a reputação ilibada e a vida impoluta do Réu a fim de fixar a pena base e a reincidência é reveladora da necessidade de uma reprimenda mais rigorosa em faze da reiteração delituosa, razão pela qual são plenamente aplicáveis os arts. 59 e 61, inciso I, do Código Penal, às hipóteses como a que aqui se examina.

    Parecer pelo conhecimento e provimento do Recurso especial" (fls. 351/352).

    É o relatório.

    RECURSO ESPECIAL Nº 932.784 - RS (2007/0047616-5)

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO (Relator): Senhor Presidente, recurso especial interposto pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, com fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição da República, contra acórdão da Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que, dando parcial provimento aos apelos do Parquet e de Wilson Telles Júnior, reduziu-lhe as penas para 1 ano, 1 mês e 10 dias de reclusão e 10 dias-multa, no processo da ação penal a que responde pela prática do delito tipificado no artigo 155, parágrafo 4º, inciso IV, combinado com artigo 14, inciso II, do Código Penal.

    Além da divergência jurisprudencial, funda a insurgência especial a violação do artigo 155, parágrafo 4º, inciso IV do Código Penal, cujos termos são os seguintes:

    "Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

    § 4º. A pena é de reclusão de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa, se o crime é cometido:

    IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas."

    E teria sido violado porque "a Quinta...

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