Acórdão nº 2005/0080981-4 de T1 - PRIMEIRA TURMA

Número do processo2005/0080981-4
Data12 Junho 2007
ÓrgãoPrimeira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 755.741 - SP (2005/0080981-4)

RELATOR : MINISTRO LUIZ FUX
RECORRENTE : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA AGRICULTURA - CNA
ADVOGADO : LUIZ ANTÔNIO MUNIZ MACHADO E OUTRO(S)
RECORRIDO : I.P.
ADVOGADO : JOSÉ EDUARDO POZZA

EMENTA

PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. AÇÃO MONITÓRIA. PROVA ESCRITA. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL. PROPOSITURA REGULAR. LEGITIMIDADE ATIVA. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL. BASE DE CÁLCULO IDÊNTICA A DO IMPOSTO TERRITORIAL RURAL. ACÓRDÃO FUNDADO NA PREMISSA DE QUE INCONSTITUCIONAL A EXAÇÃO POR OFENSA À COMPETÊNCIA RESIDUAL DA UNIÃO. MATÉRIA CONSTITUCIONAL.

  1. A guia da contribuição sindical rural é documento hábil para a instrução de ação monitória, consoante é cediço no Superior Tribunal de Justiça.

  2. Isto por que o documento escrito a que se refere o legislador não precisa ser obrigatoriamente emanado do devedor, sendo suficiente, para a admissibilidade da ação monitória, a prova escrita que revele razoavelmente a existência da obrigação.

  3. Consequentemente, "A emissão do boleto bancário concernente à contribuição em apreço, emitido pela CNA, apesar de não possuir a anuência da parte devedora, constitui prova escrita suficiente para ensejar a propositura do procedimento monitório, tendo em vista que, gozando de valor probante, torna possível deduzir do título o conhecimento da dívida e a condição do devedor como contribuinte, por ostentar a qualificação cartular de proprietário rural" (RESP 423131/SP, Relator Ministro José Delgado, DJ de 02.12.2002).

  4. A ação monitória, a teor do art. 1.102, "a", do CPC, tem base em prova escrita sem eficácia de titulo executivo. A prova escrita consiste em documento, que, embora não prove diretamente o fato constitutivo do direito, possibilite ao juiz presumir a existência desse direito alegado.

  5. O procedimento injuntivo tem por objetivo obviar a formação do título executivo por meio da simplificação do processo de conhecimento e da concessão de executoriedade ao título executivo, ou seja, dar-lhe a certeza, a liqüidez e a exigibilidade de que é destituído.

  6. Multifários precedentes da Corte: REsp 855965/RS, Relator Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJ de 25.09.2006; REsp 595367/MG, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJ de 09.05.2005; REsp 287528/SP, Relator Ministro Franciulli Netto, Segunda Turma, DJ de 06.09.2004; REsp 309741/SP, Relatora Ministra Eliana Calmon, DJ de 12.04.2004; e REsp 204894/MG, Relator Ministro Waldemar Zveiter, DJ de 02.04.2001.

  7. A contribuição sindical rural, espécie de contribuição social hodiernamente encartada no artigo 149, da Constituição Federal de 1988, que não se confunde com a contribuição confederativa fixada em assembléia geral da categoria profissional (artigo 8º, IV, da Constituição Federal), restou instituída pelos artigos 578 e seguintes da CLT.

  8. O Decreto-Lei 1.166/71, que dispõe sobre o enquadramento e a contribuição sindical, atribuía ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA a capacidade tributária de proceder ao lançamento e cobrar a contribuição sindical devida pelos integrantes das categorias profissionais e econômicas da agricultura (artigo 4º).

  9. A Lei 8.022/90 alterou o sistema de administração das receitas federais, transferindo à Secretaria da Receita Federal as atividades de tributação, arrecadação, fiscalização e cadastramento das receitas arrecadadas pelo INCRA.

  10. Com a edição da Lei 8.847/94 foi afastada das atribuições da Secretaria da Receita Federal a cobrança da exação em tela, retornando-se ao statu quo ante, consoante se depreende da leitura do artigo 24, I, da norma em comento, verbis:

    Art. 24. A competência de administração das seguintes receitas, atualmente arrecadadas pela Secretaria da Receita Federal por força do art. 1º da Lei nº 8.022, de 12 de abril de 1990, cessará em 31 de dezembro de 1996:

    I - Contribuição Sindical Rural, devida à Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e à Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), de acordo com o art. 4º do Decreto-Lei nº 1.166, de 15 de abril de 1971, e art. 580 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT);(...)

  11. Infere-se, assim, que com a edição da Lei 8.847/94, a competência para a arrecadação da Contribuição em comento foi devolvida aos Sistemas Sindicais Rurais, uma vez que esta competência havia anteriormente sido delegada ao INCRA, por meio do artigo 4º, do Decreto-Lei 1.166/71.

  12. Precedentes das Turmas de Direito Público que corroboram a legitimidade ativa da Confederação Nacional da Agricultura para cobrança da Contribuição Sindical Rural: REsp 825436/SP, Relator Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJ de 15.08.2006; REsp 820826/MS, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJ de 24.04.2006; REsp 734034/SP, Relator Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJ de 01.07.2005; REsp 712965/PR, Relator Ministro José Delgado, Primeira Turma, DJ de 06.06.2005; REsp 649997/MG, Relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ de 08.11.2004.

  13. Nada obstante, forçoso se demonstra o não conhecimento do recurso especial. Isto porque o decisum hostilizado apreciou a questão de fundo cuja índole é eminentemente constitucional, apta, por si só, a preservar o resultado do julgamento do Tribunal, qual seja:

    "Permitir-se que a base de cálculo seja a mesma do ITR, estar-se-á a infringir o art. 154, da Constituição da República, que veda expressamente a instituição de tributos, que não os já previstos por ela própria, que tenha fato gerador ou base de cálculo próprios daqueles, ou seja, os mesmos para mais de um tributo. O Imposto Territorial Rural é de competência da União, já tem previsão legal no art. 153, inciso VI, da Constituição da República, assim, qualquer outro tributo que tenha base de cálculo idêntica, é de ser considerado inconstitucional, sob pena de se admitir incidir em bitributação. De qualquer ângulo, que se analise a matéria em debate, chega-se a conclusão de que é a autora carecedora da ação."

  14. Desta sorte, ostenta natureza eminentemente constitucional o argumento regional que, com espeque no artigo 154, da Constituição Federal de 1988, considerou inconstitucional a exação, uma vez que caracterizada a bitributação em razão da base de cálculo e do fato gerador da Contribuição Sindical Rural identificarem-se com a do Imposto Territorial Rural.

  15. Fundando-se o acórdão recorrido em interpretação de matéria eminentemente constitucional, descabe a esta Corte examinar a questão, porquanto reverter o julgado significaria usurpar competência que, por expressa determinação da Carta Maior, pertence ao Colendo STF, e a competência traçada para este Eg. STJ restringe-se unicamente à uniformização da legislação infraconstitucional.

  16. Recurso especial não conhecido.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da PRIMEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Denise Arruda, José Delgado e Francisco Falcão votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Brasília (DF), 12 de junho de 2007(Data do Julgamento)

    MINISTRO LUIZ FUX

    Relator

    RECURSO ESPECIAL Nº 755.741 - SP (2005/0080981-4)

    RELATÓRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX (Relator): Trata-se de recurso especial interposto pela Confederação Nacional da Agricultura - CNA, com fulcro nas alíneas "a" e "c", do permissivo constitucional, no intuito de ver reformado acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que negou provimento à apelação da ora recorrente, que pretendia reformar a sentença que julgou extinta a ação monitória sem apreciação do mérito.

    Noticiam os autos que a CNA ajuizou ação monitória em face de Ivan Paslar, alegando ser credora da quantia de R$ 554,61 (quinhentos e cinqüenta e quatro reais e sessenta e um centavos), a título de contribuição sindical rural do exercício de 1997.

    O acórdão regional manteve a sentença extintiva, considerando a entidade sindical carecedora da ação, nos termos da seguinte ementa:

    "CONTRIBUIÇÃO SINDICAL - CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA AGRICULTURA.

    COMPETÊNCIA. JUSTIÇA COMUM ESTADUAL.

    AÇÃO MONITÓRIA. INCABÍVEL À ESPÉCIE. O simples boleto bancário, emitido por ordem da Confederação, não implica em prova suficiente para justificar a propositura de ação monitória.

    LEGITIMIDADE ATIVA. INEXISTÊNCIA. A redação dada a Lei n.º 8.847/94, não implica na conclusão de que eventuais créditos tivessem passado a ser exclusivamente da CNA, e que tivesse ela passado a ter legitimidade isolada para efetuar cobranças.

    CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL. ILEGALIDADE DA COBRANÇA. Na verdade, a presente Contribuição que ora se discute, é a chamada Confederativa, que está prevista no artigo 8.º, IV, da Constituição da República e tem por fim o custeio do sistema confederativo, sendo estipulada em assembléia geral, não se trata de norma Constitucional auto-aplicável, pois, depende de regulamentação por lei ordinária, inexistindo ela, à toda evidência , está patente a ilegalidade da cobrança. Não há como sustentar que as Leis n.ºs 8.022/90, 8.847/94 e a 9.396/96, e menos ainda, o Decreto n.º 1.166/71, dão sustentáculo a sua legalidade, isto porque, não criaram a contribuição, mas limitaram-se, apenas, a estabelecer competências e formas de cobranças. Permitir-se que a base de cálculo seja a mesma do ITR, estar-se-á a infringir o art. 154, da Constituição da República, que veda expressamente a instituição de tributos, que não os já previstos por ela própria, que tenha fato gerador ou base de cálculo próprios daqueles, ou seja, os mesmos para mais de um tributo. O Imposto Territorial Rural é de competência da União, já tem previsão legal no art. 153, inciso VI, da Constituição da República, assim, qualquer outro tributo que tenha base de cálculo idêntica, é de ser considerado inconstitucional, sob pena de se admitir incidir em bitributação. De qualquer ângulo, que se...

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