Acórdão nº 2007/0031547-1 de T1 - PRIMEIRA TURMA

Número do processo2007/0031547-1
Data14 Agosto 2007
ÓrgãoPrimeira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 933.345 - SP (2007/0031547-1)

RELATOR : MINISTRO FRANCISCO FALCÃO
RECORRENTE : Z.F.P.
ADVOGADO : FERNANDO ANTÔNIO NEVES BAPTISTA E OUTRO(S)
RECORRIDO : FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADOR : ANNA CARLA AGAZZI E OUTRO(S)
INTERES. : OSWALDO FERNANDES PAES
INTERES. : M.D.P. -S. : A.C.P. E OUTROS
ADVOGADO : CORALDINO SANCHES VENDRAMINI E OUTRO

EMENTA

AÇÃO DISCRIMINATÓRIA. TERRAS DEVOLUTAS DO ESTADO. ÔNUS DA PROVA. POSSE DE MÁ-FÉ. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AUSÊNCIA DE INTERESSE DA UNIÃO. LITISPENDÊNCIA NÃO VERIFICADA. DESAPARECIMENTO DA OUTRA AÇÃO. SÚMULA 7/STJ. COISA JULGADA E DIREITO ADQUIRIDO. PERDA DO OBJETO. PROVAS. UTILIZAÇÃO DO ARTIGO 515, § 3º, DO CPC. PROVA EMPRESTADA. CABIMENTO. PRECEDENTES. ACÓRDÃO QUE REJULGOU OS DECLARATÓRIOS. ERRO MATERIAL. PRECLUSÃO. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS. POSSIBILIDADE.

I - Trata-se de ação discriminatória movida pela Fazenda do Estado de São Paulo contra a ora recorrente, na qual, por força do julgamento do recurso de apelação, foi acolhido o pedido autoral, declarando-se devolutas as respectivas terras, com o cancelamento do registro imobiliário e a conseqüente imissão do Estado na posse.

II - O acórdão recorrido entendeu devidamente comprovado pelo ente estatal, o direito alegado quanto ao pedido discriminatório, esbarrando no óbice da Súmula 7/STJ qualquer discussão acerca do ônus probatório na presente instância.

III - Também incide o enunciado da mencionada Súmula no tocante à qualquer verificação sobre ser de boa ou má-fé a posse da recorrente.

IV - Descabida a alegação de violação a dispositivo da Lei nº 6.386/76 que cuida do processo de terras devolutas da União, uma vez que inexiste, no presente feito, qualquer interesse por parte da União, por se estar diante de terras devolutas do Estado.

V - Ainda que se possa alegar estranheza quanto ao desaparecimento de ação ajuizada no ano de 1938, não se pode invocar litispendência entre ambas as ações, até porque o decisum considerou que não existia nem identidade de partes, nem de pedidos entre elas, verificação esta inviável também no âmbito do recurso especial - Súmula 7/STJ.

VI - Afastada a alegação de litispendência, resta sem objeto o pedido recursal no sentido da violação ao direito adquirido e à coisa julgada.

VII - Incidência, ao caso, do § 3º artigo 515 do CPC, que permite ao Tribunal julgar desde logo a causa, naqueles casos de extinção do feito sem julgamento de mérito, se versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento. O Tribunal a quo deliberou que os autos foram instruídos com os documentos necessários e suficientes ao exame do mérito da lide.

VIII - A prova emprestada tem cabimento quando utilizada em conjunto com outros meios de convicção e observado o contraditório, o que ocorreu na hipótese. Precedentes: REsp nº 499.177/RS, Rel. Min. PAULO GALLOTTI, DJ de 02.04.07, REsp nº 81.094/MG, Rel. Min. CASTRO MEIRA, DJ de 06.09.04.

IX - Preclusão da matéria relativa a possível erro material contido no decisum em relação à data do registro da referida posse, porque não objeto do recurso próprio para discuti-la.

X- Impropriedade de alegação de afronta à Lei nº 6.383/76, também no tocante à natureza da ação discriminatória, porque tal legislação diz respeito ao processo discriminatório de terras da União, não se verificando, por outro lado, violação ao artigo 292, I e II, do CPC que, ao contrário, foi devidamente observado no procedimento.

XI - Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, decide a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, vencido o Sr. Ministro JOSÉ DELGADO por diferentes e autônomos fundamentos (voto-vista), conhecer parcialmente do recurso especial e, nessa parte, negar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Os Srs. Ministros TEORI ALBINO ZAVASCKI e DENISE ARRUDA votaram com o Sr. Ministro Relator. Não participou do julgamento o Sr. Ministro LUIZ FUX (RISTJ, art. 162, § 2º, primeira parte). Custas, como de lei.

Brasília (DF), 14 de agosto de 2007 (data do julgamento).

MINISTRO FRANCISCO FALCÃO

Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 933.345 - SP (2007/0031547-1)

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO FRANCISCO FALCÃO: Z.F.P. interpôs anterior recurso especial contra acórdão assim ementado pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

"Ação discriminatória - Litispendência afastada - Ação ajuizada em 1938, desaparecida em 1940, sem que os autos fosse localizados, sem permitir afirmar que, agora, se repete ação em andamento - Inexistência, ademais, de identidade de partes, de causa de pedir e de pedido - Julgamento do mérito autorizado pelo parágrafo 3º do art. 515 do CPC, acrescido pela Lei 10.352/01 - Ação discriminatória que tem natureza jurídica de ação de divisão, de demarcação, de conteúdo reinvidicatório - Prescrição inexistente - Inviabilidade da usucapião de bens públicos, porque fora do comércio, insuscetíveis de posse por particulares (Súmula 340 do STF - C. Civil, de 1916, art. 520, III, c.c. o art. 69 e parágrafo único do art. 191 da CF/88) - Invalidade do título de domínio exibido pelos requeridos, por se filiar a registro de terras em outra localidade, muito distante do Pontal do Paranapanema - Inviabilidade da retenção por benfeitorias, pelo fato dos requeridos não serem considerados possuidores do imóvel, sem que tivessem, de outra parte, boa-fé (C. Civil, arts. 516 e 491 do anterior e 1219 e 1220 do atual) - Procedência da ação - Terras declaradas devolutas, operada a imissão da Fazenda Pública na posse da área, cancelado o registro imobiliário do título exibido pelos réus, sem possibilidade de retenção por benfeitorias. Recursos providos" (fl. 759).

Por decisão monocrática dei provimento àquele recurso, fulcrado em afronta ao artigo 535, I e II, do CPC, determinando o retorno dos autos ao Tribunal de origem para manifestação expressa sobre toda a matéria articulada nos embargos de declaração (fls. 1189/91).

Após o rejulgamento, os declaratórios restaram decididos nos termos da seguinte ementa:

"Embargos de declaração - Ação discriminatória - Acórdão que não revela omissão, contradição ou obscuridade - Matéria que se insere da competência da Justiça Comum, sem que a União tenha manifestado interesse no deslinde da questão - Ação que se inclui entre as ações divisórias - É demarcatória típica e tem caráter reivindicatório - Aplicabilidade do § 3º do art. 515 do CPC - Normas processuais que têm aplicação imediata - Cerceamento de defesa inexistente - Contraditório respeitado - As provas destinam-se ao convencimento do magistrado que deve indeferir as protelatórias e inúteis, velando pela rápida solução do litígio (CPC, arts. 125, II, 130 e 131) - Laudo, sentença e acórdão de outro processo que instruíram a inicial - Fato que não significa prova emprestada, porque sentença não é prova: com ela, demonstra-se somente a existência de um precedente judiciário que pode ser muito valioso, como no caso - Inviabilidade de usucapião de terras públicas, devolutas (CF, art. 191 e C. Civil de 1916) - Inexistência de coisa julgada - Apenas as sentenças judiciais produzem coisa julgada (LICC, art. 6º) - Inaplicabilidade do DL Estadual 14.916/45, Lei Morato - Embargos rejeitados" (fl. 1202).

No presente recurso especial, interposto novamente por Z.F.P., com fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição Federal, alega-se, em síntese, violação aos seguintes dispositivos de lei federal:

  1. artigo 23, da Lei nº 6.383/76, afirmando que a União não teve oportunidade de se manifestar sobre eventual interesse de intervir na demanda, e nesse aspecto, a competência é da Justiça Federal, e não estadual, invocando também a Súmula 150/STJ;

  2. artigos 267, V, 301, §§ 1º, 2º e 3º e 1063, todos do CPC, sustentando a existência de litispendência entre a presente demanda e a anteriormente ajuizada, não tendo o condão de ser ela afastada, tão-somente porque o Estado abandonara a primeira ação;

  3. artigo 6º, §§ 2º e 3º, da LICC, afirmando que aquela primeira decisão judicial, nunca reformada, importou no reconhecimento estatal do domínio particular que milita em favor da recorrente, reconhecimento este que gerou direito adquirido, com a mesma força e intensidade da coisa julgada, flagrantemente violada pelo decisum;

  4. artigos 130, 330, I e 515, § 3º, do CPC, em razão do feito ter sido julgado por antecipação, sem que o Tribunal tivesse deferido às partes a produção de provas pleiteadas, estas imprescindíveis ao deslinde da controvérsia;

  5. artigo 1256, I, do CPC, por ter valido o Tribunal a quo de prova emprestada, ou seja, de provas feitas pela Fazenda do Estado em processos que a recorrente efetivamente não teve participação;

  6. artigo 333, I, do CPC, pois cabia à autora provar suas alegações no sentido de que as terras pretendidas são realmente devolutas;

  7. artigos 1238, parágrafo único, 1241, 1242, parágrafo único e 1243, todos do Código Civil c/c os artigos 550, 551 e 552, do mesmo Codex, sustentando que o acórdão dos declaratórios incorreu em erro material ao asseverar que a posse foi registrada em 1947, sendo como correta a data de 1847 e, assim, tendo em conta o fato da posse muito antiga, o usucapião é cabível e nem toda terra que não está legitimamente no domínio do particular ou do poder público é devoluta;

  8. artigos 125, I e 475, I, ambos do CPC, bem como aos artigos 1201, parágrafo único e 1202, do Código Civil, ao ser atribuída indevidamente à recorrente, a pecha de posse de má-fé, e, por fim,

  9. artigos 292, I e II, do CPC c/c o artigo 22, da Lei nº 6.383/76, considerando que a ação discriminatória de terras devolutas tem natureza declaratória, não comportando execução, a não ser de honorários advocatícios, e assim a cumulação de pedido de cancelamento de registros e matrículas...

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