Acórdão nº 2007/0183280-0 de T1 - PRIMEIRA TURMA
Data | 24 Junho 2008 |
Número do processo | 2007/0183280-0 |
Órgão | Primeira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil) |
RECURSO ESPECIAL Nº 976.730 - RS (2007/0183280-0)
RELATOR | : | MINISTRO FRANCISCO FALCÃO |
R.P/ACÓRDÃO | : | MINISTRO LUIZ FUX |
RECORRENTE | : | CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - CREMERS |
ADVOGADO | : | GUSTAVO MOREIRA PESTANA E OUTRO(S) |
RECORRIDO | : | B.O.F.D.S. |
ADVOGADO | : | RICARDO SELAIMEN FINKELSTAIN E OUTRO(S) |
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. PLEITO DE DANOS MORAIS. INDEPENDÊNCIA DAS AÇÕES PROPOSTAS CONTRA O ENTE OU ENTIDADE PÚBLICA E A AÇÃO DE REGRESSO. INTERESSE PROCESSUAL QUE SE MANTÉM MESMO QUANDO AFASTADA EVENTUAL RESPONSABILIDADE DO FUNCIONÁRIO PÚBLICO. RETORNO DOS AUTOS QUE SE IMPÕE PARA JULGAMENTO DA AÇÃO CONTRA O CONSELHO PROFISSIONAL, QUE RESPONDE OBJETIVAMENTE POR SEUS ATOS.
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Ação de indenização por danos morais em razão de conduta de médico que divulgou informações sigilosas de procedimento administrativo em tramitação no Conselho Profissional ao qual encontrava-se inscrito, a qual restou julgada improcedente, ensejando a extinção, pelo juízo a quo, de outra ação proposta diretamente contra à citada autarquia, por perda de objeto,sob a seguinte fundamentação: "a responsabilidade imputada ao réu decorre exclusivamente da alegada conduta culposa do médico A.C.B.G., de modo que, tendo sido julgada improcedente a ação contra este, não há como condenar o Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul; (...) o réu CREMERS não pode ser condenado no presente feito porque, tendo sido absolvido o médico, a quem o autor imputou os fatos pelos quais responsabiliza o CREMERS, ficaria inviabilizada a ação regressiva contra o causador direto dos alegados danos." (fls. 312)
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A propositura de ação de responsabilidade civil aforada pelo particular contra o autor do fato causador do dano não afasta o direito à ação para demandar contra o ente público, que responde objetivamente pelos danos causados a terceiros.
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A responsabilidade civil do Estado objetiva nos termos do artigo 37, § 6º da Constituição Federal, não se confunde com a responsabilidade subjetiva dos seus agentes, perquirida em ação regressiva ou em ação autônoma.
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Extrai-se da Constituição Federal de 1988 a distinção entre a possibilidade de imputação da responsabilidade civil, de forma direta e imediata, à pessoa física do agente estatal, pelo suposto prejuízo a terceiro, e o direito concedido ao ente público de ressarcir-se, mediante ação de regresso, perante o servidor autor de ato lesivo a outrem, nos casos de dolo ou de culpa.
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Consectariamente, essas ações não geram coisa julgada prejudicial, umas em relação às outras, e a fortiori, não autorizam a extinção terminativa dos feitos.
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O Supremo Tribunal Federal já se manifestou no seguinte sentido, verbis: No tocante à ação regressiva, asseverou-se a distinção entre a possibilidade de imputação da responsabilidade civil, de forma direta e imediata, à pessoa física do agente estatal, pelo suposto prejuízo a terceiro, e entre o direito concedido ao ente público, ou a quem lhe faça as vezes, de ressarcir-se perante o servidor praticante de ato lesivo a outrem, nos casos de dolo ou de culpa. Em face disso, entendeu-se que, se eventual prejuízo ocorresse por força de agir tipicamente funcional, não haveria como se extrair do citado dispositivo constitucional a responsabilidade per saltum da pessoa natural do agente. Essa, se cabível, abrangeria apenas o ressarcimento ao erário, em sede de ação regressiva, depois de provada a culpa ou o dolo do servidor público. Assim, concluiu-se que o mencionado art. 37, § 6º, da CF, consagra dupla garantia: uma em favor do particular, possibilitando-lhe ação indenizatória contra a pessoa jurídica de direito público ou de direito privado que preste serviço público; [...] A Min. Cármen Lúcia acompanhou com reservas a fundamentação. (RE 327904/SP, rel. Min. Carlos Britto, 15.8.2006 - RE-327904 - Informativo 436)
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A marca característica da responsabilidade objetiva é a desnecessidade de o lesado pela conduta estatal provar a existência da culpa do agente ou do serviço. O fator culpa, então, fica desconsiderado como pressuposto da responsabilidade objetiva (...)", sendo certo que a caracterização da responsabilidade objetiva requer, apenas, a ocorrência de três pressupostos: a) fato administrativo: assim considerado qualquer forma de conduta comissiva ou omissiva, legítima ou ilegítima, singular ou coletiva, atribuída ao Poder Público; b) ocorrência de dano: tendo em vista que a responsabilidade civil reclama a ocorrência de dano decorrente de ato estatal, latu sensu; c) nexo causal: também denominado nexo de causalidade entre o fato administrativo e o dano, consectariamente, incumbe ao lesado, apenas, demonstrar que o prejuízo sofrido adveio da conduta estatal, sendo despiciendo tecer considerações sobre o dolo ou a culpa. (José dos Santos Carvalho Filho, in Manual de Direito Administrativo, 12ª Edição, 2005, Editora Lumen Iuris, Rio de Janeiro, páginas 497-498)
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In casu, prospera o entendimento exposto no voto divergente da apelação, que prevaleceu na Corte de origem ao dar provimento ao apelo do autor, in verbis:
(...) Cabe ao ente público avaliar a oportunidade, a pertinência da ação de regresso. O funcionário não responde diretamente ao particular, pois não pratica ato pessoal, mas sim como agente da Administração.Em outra hipótese, o lesado, como cidadão, pode até desejar que o funcionário culpado efetue o ressarcimento à União pelo dano indenizado por esta. No entanto, isso não afasta a necessidade de demandar contra o ente público e se assim desejar, incluindo o funcionário mediante causa de pedir específica.O que houve no caso em tela, foi um erro da ação aforada pelo particular contra o Conselheiro do Conselho Regional de Medicina, enquanto pessoa física.Diante do exposto, voto no sentido de dar provimento à apelação para determinar a remessa dos autos ao juízo a quo para que após a instrução do feito profira outra sentença.
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Recurso Especial desprovido, divergindo do Relator porque as ações de indenização principal e a de regresso possuem objetivos distintos, sendo independentes entre si, razão pela qual mantenho incólume a ordem de realização de novo julgamento, determinando-se o retorno dos autos à instância a quo, consoante explicitado no voto da apelação supratranscrita.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da PRIMEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, vencido o Sr. Ministro Relator, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto-vista do Sr. Ministro Luiz Fux, que lavrará o acórdão. Votaram com o Sr. Ministro Luiz Fux (voto-vista) os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki e Denise Arruda (RISTJ, art. 162, § 2º, segunda parte).
Ausentes, justificadamente, o Sr. Ministro Hamilton Carvalhido, e, nesta assentada, o Sr. Ministro Francisco Falcão, Relator.
Brasília (DF), 24 de junho de 2008(Data do Julgamento)
MINISTRO LUIZ FUX
Relator p/ Acórdão
RECURSO ESPECIAL Nº 976.730 - RS (2007/0183280-0)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO FRANCISCO FALCÃO: B.O.F.D.S. ajuizou ação de indenização contra o CONSELHO REGIONAL DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL visando à condenação do réu ao pagamento de indenização por dano moral, em decorrência de fatos revelados por A.C.B.G., dos quais teve ciência, segunda afirmava, por ser conselheiro do réu.
O feito foi extinto, sem julgamento de mérito, por falta de interesse jurídico do autor, tendo em conta anterior demanda ajuizada por ele, contra o referido médico, pelos mesmos fatos indicados na inicial em questão (fls. 311/12).
Reformando tal entendimento, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu a lide nos termos da seguinte ementa:
"ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CONTRA O AUTOR DO FATO DANOSO JULGADA IMPROCEDENTE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. AÇÃO DE REGRESSO.
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A ação aforada pelo particular contra o autor do fato causador do dano não afasta o direito à ação para demandar contra o ente público, porquanto dentro do conceito de responsabilidade objetiva e ação de regresso, o cidadão...
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