Acordão nº 0000566-52.2011.5.04.0801 (RO) de Tribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul), 27 de Febrero de 2013

Número do processo0000566-52.2011.5.04.0801 (RO)
Data27 Fevereiro 2013
ÓrgãoTribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Porto Alegre - RS) (Brasil)

PROCESSO: 0000566-52.2011.5.04.0801 RO

EMENTA

ACIDENTE DE TRABALHO. ROUBO SEGUIDO DE MORTE DE EMPREGADO. RESPONSABILIDADE INDENIZATÓRIA. CULPA DA EMPRESA. Caso em que o de cujus trabalhava como vigia noturno de oficina de caminhões e foi morto após ter sido alvejado com tiro de arma de fogo em roubo ocorrido na empresa. Restou comprovado que a empresa não dotou o empregado de meios que pudessem assegurar a efetiva proteção à sua integridade física e tampouco cumpriu sua obrigação legal (art. 157, II, da CLT) de instruí-lo, mediante ordens de serviço, quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidente de trabalho. Culpa do empregador e nexo causal entre o acidente e a morte do empregado que se reconhece. Responsabilidade civil indenizatória da empresa. Sentença mantida.

ACÓRDÃO

preliminarmente, por unanimidade, não conhecer dos documentos juntados pelo reclamado em grau recursal, por extemporâneos. No mérito, por maioria, vencida em parte a Desembargadora Maria Helena Lisot, DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADO para reduzir a indenização por danos morais para 200 salários mínimos vigentes à época da prolação da sentença, ou seja, a R$ 124.400,00 (cento e vinte e quatro mil e quatrocentos reais). Valor da condenação que se reduz para R$ 124.400,00 (cento e vinte e quatro mil e quatrocentos reais).

RELATÓRIO

O reclamado interpõe recurso ordinário (fls. 224-9) contra a sentença de procedência parcial da ação.

O recurso versa sobre prescrição do direito de ação; acidente de trabalho; indenização por danos morais; e honorários assistenciais.

A parte autora não apresenta contrarrazões (fl. 236).

Os autos são remetidos a este Tribunal para julgamento.

VOTO RELATOR

DESEMBARGADOR JOSÉ FELIPE LEDUR:

PRELIMINARMENTE. NÃO CONHECIMENTO DOS DOCUMENTOS JUNTADOS EM GRAU RECURSAL

O reclamado anexa ao seu recurso os documentos das fls. 231-4, sem justificar porque não os juntou aos autos durante a fase instrutória. Tampouco alega que se refiram a fato posterior à sentença. Diante disso, aplica-se ao caso a Súmula 8 do TST e não se conhece dos documentos juntados extemporaneamente em grau recursal.

MÉRITO

1 PRESCRIÇÃO DO DIREITO DE AÇÃO. ACIDENTE TÍPICO DE TRABALHO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS

Segundo a sentença, no período anterior à Emenda Constitucional 45/2004 (quando ocorreu o acidente) deve-se levar em conta o entendimento majoritário dos Tribunais nessa época. O Juízo aplicou a prescrição prevista no CC de 1916 conforme a regra de transição fixada no art. 2028 do CC em vigor. Fundamentou que o acidente que causou a morte do empregado ocorreu em 31-8-2002 (fls. 19-20) e o CC atual entrou em vigor em 12-01-2003, quando não havia transcorrido metade do prazo prescricional de vinte anos previsto no CC de 1916. Considerou que a prescrição, no caso, somente seria implementada em 31-8-2022.

A relamada recorre ao argumento de que a prescrição aplicável ao caso é a prevista no art. 7º, XXIX, da CF. Requer seja reconhecida a prescrição do direito de ação.

À análise.

Observa-se, de início, que o juízo se confundiu ao aplicar a lei civil no tempo. Em realidade, o não transcurso de metade do prazo prescricional do CC revogado à data da vigência do atual importaria a aplicação do prazo do novo Código, e não o prazo do anterior - de 20 anos. De qualquer modo, mantém-se a sentença por fundamento diverso mediante a aplicação da regra prescricional do art. 7º da Constituição, mas com a modulação necessária devido à natureza do crédito - resultante de ilícito absoluto - que determina a aplicação da prescrição parcial.

A respeito do prazo de prescrição das pretensões pessoais a reparações oriundas de acidentes do trabalho ou de doenças ocupacionais a ele equiparadas, verifica-se largo dissenso doutrinário e jurisprudencial na área de competência da Justiça do Trabalho. Para efeito de definição sobre qual a regra prescricional incidente e o modo de sua aplicação, importa que, antes, se estabeleçam distinções acerca dos direitos fundamentais em causa.

Inicialmente, deve-se ter presente o teor do art. 7º, XXIX, da Constituição, que prevê "ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois após a extinção do contrato de trabalho". O direito fundamental é a ação quanto aos créditos. Já a segunda parte da norma estabelece limites ao exercício da ação, carreando-lhe a restrição da prescrição de cinco anos, até dois anos após a extinção do contrato de trabalho. É importante assinalar, aqui, que a expressão "até dois anos" não mantém, necessariamente, conexão com a contagem do prazo de prescrição de cinco anos, uma vez que os dois anos constituem prazo também válido para direitos e pretensões pós-contratuais. Insiste-se nisso: a regra prescricional não é o direito fundamental, mas a restrição que lhe foi imposta, devendo, por isso mesmo, ser estrita, o menos prejudicial, a sua aplicação.

O direito fundamental à reparação de danos por acidente de trabalho ou por doenças ocupacionais a ele equiparadas está assentado no art. 7º, XXVIII, da Constituição, que impõe ao empregador a obrigação de indenização, em caso de dolo ou culpa. Cumpre destacar que a fonte dessa obrigação não está na vontade negocial, em ilícito relativo à autonomia da vontade, mas no ilícito absoluto da infração à Constituição e à lei, consistente no descumprimento do dever geral de não causar dano a outrem por meio da infringência de normas de proteção à saúde, higiene e segurança do trabalho. O fato de a fonte imediata da obrigação estar em ilícito absoluto não afasta, ao contrário, supõe o seu fundamento remoto, que está na relação de trabalho.

O direito de ação antes referido não faz qualquer distinção acerca dos créditos por ele visados. De qualquer modo, trata-se de direito que integra o rol de direitos fundamentais do mesmo art. 7º da Constituição Federal. Esse rol constitui elemento específico do Estado Social adotado pela Constituição. É relevante referir que as obrigações relacionadas à prevenção ou indenização por danos oriundos de acidentes do trabalho mantêm vínculos históricos com a origem e consolidação do Estado Social. O direito privado, sob o Estado Liberal, não cogitava de responsabilidade civil nesses casos, mesmo porque, via de regra, imputava-se a culpa ao trabalhador que sofria o acidente. Assim, a reparação por esses danos, dado o seu significado socioeconômico, possui natureza social, ainda que, no caso, o obrigado a isso seja o empregador ou tomador dos serviços. Por isso mesmo, não parece haver dúvida de que na hipótese de ações de indenização por acidentes do trabalho não cabe aplicar regras de prescrição do Código Civil, mas sim a regra geral prevalente para as pretensões de natureza laboral ou mesmo previdenciárias previstas na Constituição, uma vez que o direito de ação antes referido inclui créditos de natureza trabalhista atípica, os quais estão sistematicamente vinculados ao Direito Social.

Em conclusão, a prescrição aplicável às ações que envolvem pedidos de indenização por acidente do trabalho ou doenças ocupacionais a ele equiparadas é a prevista no art. 7º, XXIX, da Constituição.

Entretanto, e pela natureza trabalhista atípica do crédito, está em questão o modo dessa aplicação. A prescrição será total ou parcial? Quanto a isso, desde logo se evidencia que, objetivando situações diferentes, a extinção do contrato de trabalho pela morte do trabalhador, não acarreta, necessariamente, a desconstituição da causa da obrigação de indenização por danos decorrentes de acidente do trabalho.

Ante a relevância social dos direitos, pretensões e obrigações que resultam de acidentes do trabalho e de doenças ocupacionais, supõe-se que o Direito do Trabalho não haverá de negar concreção e aplicação àqueles princípios jurídicos, pois estão em sintonia com a sua especialidade.

No âmbito trabalhista, a prescrição parcial é a regra. Nesse sentido, no tocante à origem legal dos direitos, afirma a Súmula 294 do TST que não prescreve o direito à reparação de danos oriundos da violação à lei, mas tão-só as prestações sucessivas.

No caso, o sofrimento moral das autoras, filhas do de cujus, decorre do vínculo de afeição que mantinham com o seu genitor. O evento que vitimou o pai das demandantes não é apagado da memória destas pelo decurso do tempo, assim como os danos morais a elas advindos pela morte violenta e perda abrupta do seu genitor. O transcurso de tempo entre o acidente de trabalho (31-8-02) e o ajuizamento da demanda (23-4-08) somente tem o efeito de minorar os danos morais, mas não os extingue, uma vez que tratam-se de direitos da personalidade irrenunciáveis, nos termos do art. 11 do CC.

Por tais fundamentos, rejeita-se a alegação de prescrição do direito de ação.

2 RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DO TRABALHO

A sentença, com fundamento no art. 7º, XXVIII, da CF reconheceu a responsabilidade civil do réu em decorrência do acidente de trabalho sofrido pelo de cujus, genitor das autoras. Fundamentou que, segundo a prova dos autos, não havia...

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