Acórdão Inteiro Teor nº AIRR-87800-32.2008.5.05.0031 TST. Tribunal Superior do Trabalho 3ª Turma, 10 de Abril de 2013

Magistrado ResponsávelESTABILIDADE PROVISÓRIA DA GESTANTE. 1. O legislador constituinte, visando a garantir ao nascituro - como reflexo da própria dignidade da pessoa humana consagrada no art. 1º, III, da Constituição da República - condições mínimas de sobrevivência e a efetivar a proteção à maternidade - a que se refere o art. 6º da Carta Política-, optou por...
Data da Resolução10 de Abril de 2013
Emissor3ª Turma

TST - AIRR - 87800-32.2008.5.05.0031 - Data de publicação: 12/04/2013 [Anonymoused]

A C Ó R D Ã O

(Ac.

  1. Turma)

GMALB/aao/AB/mki AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA - DESCABIMENTO.

  1. DOENÇA GRAVE - NEOPLASIA MALIGNA. DESPEDIDA DISCRIMINATÓRIA. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO.

1.1. Dano moral consiste em lesão a atributos íntimos da pessoa, de modo a atingir valores juridicamente tutelados, cuja mensuração econômica envolve critérios objetivos e subjetivos. 1.2. A indenização por dano moral revela conteúdo de interesse público, na medida em que encontra ressonância no princípio da dignidade da pessoa humana, sob a perspectiva de uma sociedade que se pretende livre, justa e solidária (CF, arts. 1º, III, e 3º, I). 1.3. A evidência de conduta discriminatória da empresa e de prejuízo material para a autora que, acometida de displasia maligna, é discriminatoriamente despedida, autoriza a condenação ao pagamento de indenização por dano moral. Precedentes. 2. DANO MORAL. PARÂMETROS RELEVANTES PARA AFERIÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO. SISTEMA ABERTO. DOSIMETRIA DO "QUANTUM" INDENIZATÓRIO. 2.1. A dosimetria do "quantum" indenizatório guarda relação direta com a existência e a extensão do dano sofrido, o grau de culpa e a perspectiva econômica do autor e da vítima, razão pela qual a atuação dolosa do agente reclama reparação econômica mais severa, ao passo que a imprudência ou negligência clamam por reprimenda mais branda. 2.2. Assim, à luz do sistema aberto, cabe ao julgador, atento aos parâmetros relevantes para aferição do valor da indenização por dano moral, fixar o "quantum" indenizatório com prudência, bom senso e razoabilidade, sob pena de afronta ao princípio da restauração justa e proporcional. Agravo de instrumento conhecido e desprovido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento em Recurso de Revista n° TST-AIRR-87800-32.2008.5.05.0031, em que é Agravante BOMPREÇO BAHIA SUPERMERCADOS LTDA. e Agravada ANA RITA DE ALMEIDA BORGES.

Pelo despacho recorrido, originário do Eg. Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, denegou-se seguimento ao recurso de revista interposto (fls. 540/542).

Inconformado, o reclamado interpõe agravo de instrumento, sustentando, em resumo, que o recurso merece regular processamento (fls. 545/551-v).

Contraminuta a fls. 558/561 e contrarrazões a fls. 563/566.

Os autos não foram encaminhados ao . Ministério Público do Trabalho (RI/TST, art. 83).

É o relatório.

V O T O

ADMISSIBILIDADE.

Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do agravo de instrumento.

MÉRITO.

DOENÇA GRAVE

- NEOPLASIA MALIGNA. DESPEDIDA DISCRIMINATÓRIA. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO.

O Regional deu provimento ao apelo obreiro, para condenar o reclamado ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$11.928,00, acrescida de juros e correção monetária.

Assim está posto o acórdão:

"Pretende a reforma da decisão para que sejam reconhecidos todos os pleitos da inicial, em virtude dos danos sofridos com a dispensa imotivada, embora fosse portadora de câncer gástrico, o que revela o caráter discriminatório do ato de despedimento.

A defesa nega o caráter discriminatório da dispensa, invoca o direito potestativo que lhe é assegurado e a desvincula da doença, mas, ao contrário, mostrou-se regular e decorrente do exercício 'normal' de um direito, decorrente do princípio da livre iniciativa, previsto no art. 170, IV, da Constituição Federal e destaca o fato de que laborou um ano após o seu retorno do afastamento pelo INSS.

Alega, ainda, que os motivos que determinaram a rescisão contratual decorreram da conduta "negligente" da obreira, no exercício da função de caixa, com a constatação de diferenças de numerário de forma reiterada, o que lhe causava prejuízos.

Vejamos.

Destaco, inicialmente, que a sentença indeferiu os pedidos por não reconhecer a natureza acidentária das moléstias indicadas (Síndrome do Túnel do Carpo e o câncer gástrico), mas não analisou o pedido fundamentado na dispensa discriminatória, em razão da doença grave de que é portadora, mesmo instada por meio de Embargos de Declaração (fl. 466/469 e fl. 479), o que o faço nesta ocasião, com fundamento no art. 515, § 1º do CPC.

Penso que razão parcial assiste à recorrente. Trabalhou como caixa de loja, de 06/10/2003 a 02/04/2007 e durante esse período, afastou-se três vezes por doença: de 21/07/2004 a 24/11/2005, de 07/03/2006 a 04/06/2006 e de 05/04/2007 a 20/09/2008 (conforme documentos de fl. 53/55 389), fatos consignados, ainda, na sentença proferida no Juizado Especial Federal Cível, em que são partes a Autora e o INSS (fl. 400/401).

De acordo, ainda, com determinação contida na mencionada sentença, o órgão previdenciário deveria converter o auxílio-doença cassado em 30/01/2009 em aposentadoria por invalidez, diante da comprovação de sua incapacidade total e definitiva, 'sem possibilidade de readaptação para o exercício de outra atividade, em decorrência de ´neoplasia maligna´' (fl. 400).

Ora, o diagnóstico de câncer data de, pelo menos, junho/2004, conforme exames e relatórios médicos juntados aos autos (fls. 61/64 e 66/67), tendo sido feita, inclusive, cirurgia, em 21/07/2004, conforme registro em relatório médico (fl. 67).

Essa é a grande questão. Ainda que não tenha sido a causa direta, será mesmo que o empregador poderia concretizar a dispensa?

A resposta negativa se impõe. O alegado poder potestativo - em relação ao qual tenho as minhas reservas a partir da Constituição de 1988, que assegura o direito de proteção contra a despedida arbitrária, ainda que tenha limitado a proteção ao aspecto pecuniário - não constitui um direito absoluto.

Isso porque o exercício da atividade econômica, premissa legitimado em um sistema capitalista de produção, está condicionado pelo art. 170 da Constituição à observância dos princípios nele enumerados, entre os quais se incluem a valorização do trabalho humano, a existência digna, de acordo com a justiça social (caput) e a função social da propriedade (inciso III), este último perfeitamente lido como função social da empresa.

Ademais, estabelece vínculo direto e indissociável com os princípios contidos no art. 1º da Constituição, que fundamentam o Estado Democrático de Direito, entre os quais se incluem os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (inciso IV), sem se falar na dignidade da pessoa humana (inciso III).

Denominados princípios políticos constitucionalmente conformadores ou princípios constitucionais fundamentais, caracterizam-se por explicitarem as valorações políticas fundamentais do legislador constituinte, condensarem as opções políticas nucleares e refletirem a ideologia dominante da constituição.

Significa afirmar, com base nesses princípios, a possibilidade de limitação do alegado direito potestativo de dispensa quando a ele se sobrepõe um bem jurídico relevante, protegido pela ordem jurídica, especialmente constitucional.

Veja-se, a propósito, o que afirma Eros Roberto Grau que, em passagens diversas (aqui transcritas), aponta esse condicionamento social imposto ao exercício da livre iniciativa:

Nesta segunda consagração constitucional, a dignidade da pessoa humana assume a mais pronunciada relevância, visto comprometer todo o exercício da atividade econômica [...] com o programa de promoção da existência digna.

[...]

No quadro da Constituição de 1988, de toda sorte, da interação entre esses dois princípios e os demais por ela contemplados - particularmente o que define como fim da ordem econômica (mundo do ser) assegurar a todos existência digna - resulta que valorizar o trabalho humano e tomar com fundamental o valor social do trabalho importa em conferir ao trabalho e seus agentes (os trabalhadores) tratamento peculiar.

Esse tratamento, em uma sociedade capitalista moderna, peculiariza-se na medida em que o trabalho possa receber proteção não meramente filantrópica, porém politicamente racional. Titulares de capital e de trabalho são movidos por interesses distintos, ainda que se o negue ou se pretenda enunciá-los como convergentes.

[...]

Em sua interação com os demais princípios contemplados no texto constitucional, expressa prevalência dos valores do trabalho na conformação da ordem econômica - prevalência que José Afonso da Silva reporta como prioridade sobre os demais valores da economia de mercado.

[...]

Não é isso, no entanto, o que exprime o preceito. Este em verdade enuncia, como fundamentos da República Federativa do Brasil, o valor social do trabalho e o valor social da livre iniciativa.

Isso significa que a livre iniciativa não é tomada, enquanto fundamento da República Federativa do Brasil, como expressão individualista, mas sim no quanto expressa de socialmente valioso.

Já no art. 170, caput, afirma-se dever estar a ordem econômica fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa. Note-se, assim, que esta é então tomada singelamente e aquele - o trabalho humano - é consagrado como objeto a ser valorizado. É neste sentido que assiste razão a José Afonso da Silva, ao sustentar que a ordem econômica dá prioridade aos valores do trabalho humano sobre todos os demais valores da economia de mercado.

Segue a mesma toada, ao se referir ao princípio da função social da propriedade, também como fundamento da ordem econômica, e qualificá-la como função social ativa, caracterizada como um poder-dever no sentido de condicionar o exercício do poder a uma finalidade e conclui:

O que mais releva enfatizar, entretanto, é o fato de que o princípio da função social da propriedade impõe ao proprietário - ou a quem detém o poder de controle, na empresa - o dever de exercê-lo em benefício de outrem e não, apenas, de não o exercer em prejuízo de outrem. Isso significa que a função social da propriedade atua com fonte da imposição de comportamentos positivos - prestação de fazer, portanto, e não meramente, de não fazer - ao detentor do poder que deflui da propriedade.

[...]

O princípio da função social da...

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