Acórdão Inteiro Teor nº RR-404-71.2010.5.09.0019 TST. Tribunal Superior do Trabalho Conselho Superior da Justiça do Trabalho, 17 de Abril de 2013

Data da Resolução17 de Abril de 2013
EmissorConselho Superior da Justiça do Trabalho

TST - RR - 404-71.2010.5.09.0019 - Data de publicação: 26/04/2013 [Anonymoused]

A C Ó R D Ã O

7ª TURMA VMF/vbl/pcp/drs RECURSO DE REVISTA - TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO

- ELASTECIMENTO DA JORNADA DE TRABALHO DE SEIS HORAS

- EXISTÊNCIA DE HABITUAL LABOR EXTRAORDINÁRIO

- INOBSERVÂNCIA DOS LIMITES PREVISTOS NA SÚMULA Nº 423 DO TST

- NEGOCIAÇÃO COLETIVA - INVALIDADE. O inciso XIV do art. 7º da Constituição Federal de 1988 estabelece jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva, mediante a qual é possível o elastecimento da jornada de trabalho. Tal elastecimento, consoante disposto na Súmula nº 423 do TST, somente se afigura possível até a oitava hora diária. Isso porque o trabalho nas mencionadas condições sujeita o empregado a um desgaste físico e mental superior àquele suportado pelo trabalhador em turnos fixos, pois constantemente tem que se adaptar às mudanças de sua rotina de vida, em função das atividades desenvolvidas na empresa. Dessa forma, a prestação de horas extraordinárias habituais além da oitava diária, em patente afronta ao limite imposto na Súmula nº 423 do TST, descaracteriza o ajuste coletivo e malfere a norma constitucional inserta no art. 7º, XIV, da Constituição, sendo devidas as 7ª e 8ª horas diárias como extraordinárias.

Recurso de revista não conhecido.

ACÚMULO DE FUNÇÕES

- MOTORISTA E COBRADOR - COMPATIBILIDADE

- ACRÉSCIMO SALARIAL INDEVIDO. A norma contida no art.

456, parágrafo único, da CLT estabelece que, à falta de prova ou inexistindo cláusula expressa a tal respeito, entender-se-á que o empregado se obrigou a prestar todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal. Com base no disposto no mencionado dispositivo legal, constata-se que, no direito do trabalho, não se há de cogitar no pagamento de acréscimo salarial por acúmulo de funções, na ausência de prova ou previsão contratual nesse sentido, de maneira que são remuneradas pelo salário todas as tarefas desempenhadas dentro da jornada de trabalho. Nessa quadra, o entendimento jurisprudencial desta Corte preconiza que não caracteriza acúmulo de funções, que importe acréscimo remuneratório, o exercício da atribuição de cobrança de passagens por motorista de transporte coletivo, em virtude de a atividade de emissão de passagens revelar compatibilidade com as funções contratuais de motorista. Precedentes.

Recurso de revista conhecido e provido.

INTERVALO INTERJORNADAS

- SUPRESSÃO - EFEITOS. O desrespeito ao intervalo de descanso mínimo de onze horas entre jornadas acarreta os mesmos efeitos que o § 4º do art. 71 da CLT atribui ao descumprimento do intervalo intrajornadas. Assim, ainda que sejam pagas as horas excedentes do limite legal diário, persiste a obrigação de o empregador pagar a integralidade das que foram subtraídas do intervalo mínimo entre jornadas, fixado no art. 66 da CLT, com o respectivo adicional. Entendimento consagrado na Orientação Jurisprudencial nº 355 da SBDI-1 do TST.

Recurso de revista não conhecido.

INTERVALO INTRAJORNADA SUPERIOR A DUAS HORAS

- NEGOCIAÇÃO COLETIVA GENÉRICA - AUSÊNCIA DE PRÉVIA ESPECIFICAÇÃO DOS HORÁRIOS

- INVALIDADE. No caso dos autos, não obstante a reclamada tenha preenchido o requisito do art. 71, caput, da CLT, alusivo à instituição do intervalo intrajornada superior a duas horas mediante previsão em contrato de trabalho individual ou ajuste coletivo, não há como conferir validade ao acordo individual ou coletivo que não prevê precisamente a duração máxima do intervalo intrajornada. Isso porque cláusula desse jaez, avençada em linhas genéricas, revela-se abusiva, à luz do disposto no art. 187 do Código Civil, porquanto acaba por tornar a jornada de trabalho imprevisível, pois deixa ao alvedrio exclusivo do empregador definir o tempo de repouso e alimentação do empregado, que não poderá usufrui-lo como melhor lhe aprouver, o que desatende à finalidade legal do intervalo intrajornada relacionada à medicina e segurança do trabalho e à proteção da saúde física e mental do trabalhador.

Recurso de revista não conhecido.

DANOS MORAIS

- SUBMISSÃO DO EMPREGADO A JORNADAS DE TRABALHO EXTENUANTES

- OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA DO TRABALHADOR

- CONFIGURAÇÃO. O dano moral individual caracteriza-se como lesão aos direitos da personalidade de um indivíduo a partir da prática de conduta ilícita culposa por outrem. Pode-se afirmar que os direitos da personalidade são direitos subjetivos, que têm por objeto os elementos que constituem a personalidade do seu titular, considerada em seus aspectos físico, moral e intelectual. São direitos inatos e permanentes, nascem com a pessoa e a acompanham durante toda sua existência, tendo como finalidade primordial a proteção das qualidades e dos atributos essenciais da pessoa humana, ou seja, são direitos mínimos que asseguram e resguardam a dignidade da pessoa humana. Os direitos da personalidade dividem-se com base nos critérios corpo, mente e espírito. Portanto, são classificados de acordo com a proteção à integridade física (corpo vivo, cadáver, voz), integridade intelectual e psíquica (liberdade, criações, intelectuais, privacidade e segredo) e identidade moral (honra, imagem, identidade pessoal). Em relação especificamente ao direito à integridade física, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (in Novo Curso de Direito Civil, Parte Geral, vol. I, 11ª ed., Editora Saraiva, p. 155) prelecionam que o direito tutelado é "a higidez do ser humano no sentido mais amplo da expressão, mantendo-se, portanto, a incolumidade corpórea e intelectual, repelindo-se as lesões causadas ao funcionamento normal do corpo humano". Trata-se, na verdade, de direito correlato ao direito à vida. A gama de direitos da personalidade, examinada à luz do ambiente de trabalho, desenvolve no patrimônio jurídico do trabalhador o direito de se ativar em um ambiente de trabalho hígido em suas condições físicas e também no que atine ao bem-estar físico e psíquico daqueles que laboram. A manutenção de um ambiente de trabalho saudável e seguro é dever do empregador, que decorre do disposto nos arts. 7º, XXII, e XXIII, 200, VIII, e 225, § 3º, da Carta Constitucional. Cabe ao sujeito passivo da relação de emprego assegurar a higidez do ambiente de trabalho. Fixadas essas premissas, o caso concreto afigura-se como hipótese ensejadora de indenização por danos morais. Isso porque a sujeição do reclamante a jornadas de trabalho tão elastecidas e desgastantes, com turnos ininterruptos de revezamento, no desempenho das atividades de motorista de transporte coletivo de passageiros, sem necessidade urgente que justificasse essa prática adotada pela empresa-ré, atinge notadamente e diretamente a integridade física do empregado, visto que expõe o trabalhador a situações de extremo stress e fadiga física e mental, colocando, inclusive, em risco a sua vida, a dos passageiros e das pessoas que trafegam nas pistas e rodovias, além de não permitir ao trabalhador tempo necessário para o lazer e convívio familiar. Portanto, no caso dos autos, ao contrário do alegado pela reclamada, restou configurado o vilipêndio a direitos da personalidade do reclamante.

Recurso de revista não conhecido.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

- AUSÊNCIA DE ASSISTÊNCIA DO SINDICATO DA CATEGORIA PROFISSIONAL. Na Justiça do Trabalho, o deferimento de honorários advocatícios sujeita-se à constatação da ocorrência concomitante de dois requisitos: o benefício da justiça gratuita e a assistência do sindicato. Inteligência da Orientação Jurisprudencial nº 305 da SBDI-1 e das Súmulas nºs 219 e 329 do TST.

Recurso de revista conhecido e provido.

COMPENSAÇÃO DE VALORES PAGOS - CRITÉRIO GLOBAL. Ressalvado o posicionamento deste Relator, a SBDI-1 pacificou o entendimento de que a compensação das horas extraordinárias pagas pela empresa com as deferidas judicialmente deve ser integral e aferida pelo total das horas extraordinárias quitadas durante o período imprescrito do contrato de trabalho, e não mês a mês. Inteligência da Orientação Jurisprudencial nº 415 da SBDI-1.

Recurso de revista conhecido e provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-404-71.2010.5.09.0019, em que é Recorrente VIAÇÃO GARCIA LTDA. e Recorrido MILTON DA SILVA.

O 9º Tribunal Regional, mediante acórdão a fls. 422-468, complementado pelas decisões a fls. 488-499 e 512-514, proferidas, respectivamente, nos primeiros e segundos embargos de declaração opostos pela reclamada, deu parcial provimento ao recurso ordinário do reclamante, para acrescer à condenação o pagamento de diferenças salariais decorrentes do acúmulo de funções e pagamento de PPR-I e PPR-II, referente ao mês de agosto de 2008; horas extraordinárias e reflexos além da 6ª diária e 36ª semanal; horas extraordinárias correspondentes ao tempo superior a duas horas do intervalo intrajornada; devolução do valor de R$ 216,62 (duzentos e dezesseis reais e sessenta e dois centavos), descontado a título de indenização por danos; indenização por danos morais no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais); honorários assistenciais de 15% sobre o valor líquido da condenação e, por fim, determinar a exclusão dos juros de mora do cálculo do imposto de renda e a expedição de ofícios. Doutra banda, negou provimento ao recurso ordinário adesivo da reclamada.

Inconformada, a empresa-ré interpõe recurso de revista a fls.

518-565. Indica violação de dispositivos constitucionais e legais, bem como a existência de divergência jurisprudencial.

O recurso de revista foi admitido por decisão singular a fls. 576-578, por violação do inciso V do art. 5º da Constituição Federal.

Foram apresentadas contrarrazões a fls. 582-605.

Processo não submetido a parecer do Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 83, § 2º, do RITST.

É o relatório.

V O T O

1 - CONHECIMENTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, concernentes à tempestividade (fls. 516 e 518), à representação processual (fls. 96-97 e...

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