Decisão da Presidência nº 681331 de STF. Supremo Tribunal Federal, 1 de Octubre de 2008

Magistrado ResponsávelMin. Ricardo Lewandowski
Data da Resolução 1 de Octubre de 2008
Tipo de RecursoAgravo de Instrumento

Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que negou seguimento a recurso extraordinário criminal interposto de acórdão que porta a seguinte ementa: 'PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL DA JUSTIÇA PÚBLICA. CRIME DE DESACATO. ART. 331 DO CÓDIGO PENAL. FUNÇÃO PÚBLICA. MENOSPREZO. ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO ESPECÍFICO. EVIDENCIADO. PERGUNTA EM TOM IRÔNICO E DESCABIDO. MAGISTRADO. PARCIALIDADE. TESTEMUNHAS DE ACUSAÇÃO. NÃO SUSPEITAS. REPRESENTAÇÃO DO CRIME DE INJÚRIA. DEMORA. NÃO INFLUÊNCIA NO CRIME DE DESACATO. AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA. LEI Nº 8.906/ EXPRESSÃO 'OU DESACATO'. SUSPENSA. ADIN. STF. IMUNIDADE. NÃO ABSOLUTA. AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADAS. CONDENAÇÃO DE RIGOR. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. ART. 59 CP. COMPROVAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA AGRAVANTE. ART. 61, III, G, CP. SUBSTITUICAO POR PENA RESTRITIVAS DE DIREITO. RECURSO PROVIDO. 1. O delito imputado ao apelado, tipificado no artigo 331 do Código Penal, tem por escopo a proteção do objeto jurídico Administração Pública, quanto aos seus interesses material e moral, só se configurando, portanto, se o ofendido, estiver no exercício de função pública ou em razão dela e se, por qualquer meio, o agente demonstrar o propósito de menoscabar, na sua função, o funcionário público. 2. A caracterização da infração penal do desacato demanda, ainda, a comprovação do elemento subjetivo do tipo específico, consubstanciado na finalidade de menosprezar a função pública do agente, o que restou evidenciado nas provas dos autos. 3. A formulação de pergunta, em tom irônico e descabido, insinuando possuir o julgador grau de parentesco com o reclamante, vem a menosprezar e a humilhar sua nobre função pública, na medida em que induz que o magistrado não estaria agindo com a imparcialidade devida. E mais, leva a crer que o juiz estaria agindo em prol de uma determinada pessoa, sem que, ao menos, tivesse se declarado suspeito ou impedido, fato este de gravidade ímpar na judicatura. 4. O indeferimento, pelo juiz, de perguntas formuladas pelo ora apelado, ao viés de virem a denotar parcialidade de sua parte, foram fundamentados, nos termos do preceito insculpido no artigo 93, IX, do Texto Constitucional, por serem, na sua maioria, inconvenientes ou impertinentes, ou seja, nada esclareciam no quadro fático existente ou não traziam relação com a causa, a não descaracterizar a conduta delituosa. 5. O simples fato das testemunhas de acusação serem adversárias do apelado na causa de fundo que levou a esta ação criminal não é suficiente a torná-las suspeitas, ou seja, não é só por esta razão que elas farão de tudo para que o acusado fosse condenado. 6. A demora em representar para o órgão ministerial quanto ao crime de injúria não tem o condão de excluir o crime objeto do presente recurso, até mesmo porque o crime de desacato é de ação penal pública incondicionada, ou seja, a representação do ofendido em nada interfere na sua apuração ou leva à sua decadência no transcorrer de certo lapso temporal. 7. O texto original §2º do artigo 7º da Lei nº 8.906/94 - Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, que dispõe que o advogado tem imunidade profissional com relação ao delito de desacato, no exercício de sua atividade, teve a expressão 'ou desacato' suspensa pelo Excelso Pretório, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1127-8 movida pela Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB, afastando, assim, qualquer suscitação de atipicidade da conduta do advogado. 8. A imunidade do advogado, tal como conferido pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, não é absoluta. Conquanto seja louvável e indispensável o papel do causídico nas questões judiciais, sua atuação tem limites, não só com relação aos membros do Poder Judiciário, como também de servidores da Justiça e até mesmo de colegas que naquele processo estejam patrocinando parte adversa. 9. Autoria e materialidade demonstradas, o édito condenatório é de rigor. 10. Pena-base aplicada em 01 (um) ano de detenção, nos termos do artigo 59 do Código Penal, notadamente nas suas acepções motivos e circunstâncias do crime e culpabilidade. 11. Configuração da circunstância agravante consubstanciada na violação de dever inerente à sua profissão de advogado (art. 61, II, 'g', do Código Penal). Pena definitiva fixada em 01 (um) ano e 02 (dois) meses de detenção. 12. Preenchidos os requisitos legais do artigo 44, do Código Penal, expressos na circunstância de a pena privativa de liberdade não ser, isoladamente considerada, superior a quatro anos, além de que não ser reincidente em crimes dolosos e, por fim, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do recorrido apresentam-se de certa forma favoráveis, deve a pena privativa de liberdade ser substituída por duas restritivas de direito. 13. Recurso provido, para o fim de julgar procedente a denúncia apresentada e condenar ANTONIO CARLOS CASTILHO GARCIA pela prática do crime tipificado no artigo 331 do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 01 (um) ano e 02 (dois) meses de detenção, que deverá ser substituída pela prestação de serviços à comunidade, expressa na prestação de assistência judiciária gratuita a pessoas carentes indicadas pelo Juízo das Execuções Criminais, por igual período, e, ainda, pela prestação pecuniária, também por igual período, expressa no fornecimento de uma cesta básica a cada mês, à instituição a ser designada também pelo Juízo das Execuções Criminais.' (fls. 937-939). Os embargos de declaração opostos foram parcialmente acolhidos. No recurso extraordinário, interposto com base nos arts. 102, III, a, da Constituição, alegou-se ofensa aos arts. 5º, XXXVI e LV, e 93, IX, da mesma Carta. O agravo não merece acolhida. A orientação desta Corte, por meio de remansosa jurisprudência, é a de que a alegada violação ao art. 5º, LV, da Constituição, pode configurar, em regra, situação de ofensa reflexa ao texto constitucional, por demandar a análise de legislação processual ordinária, o que inviabiliza o conhecimento do recurso extraordinário. Ademais, não há contrariedade ao art. 93, IX, da mesma Carta, quando o acórdão recorrido encontra-se suficientemente fundamentado. Nesse sentido, menciono as seguintes decisões, entre outras: AI 556.364-AgR/RJ, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; AI 589.240-AgR/RS, Rel. Min. Joaquim Barbosa; RE 450.137-AgR/SP, Rel. Min. Carlos Velloso; AI 563.516-AgR/SP, Rel. Min. Cezar Peluso; AI 450.519-AgR/SP, Rel. Min. Celso de Mello. Por fim, para se chegar à conclusão contrária à adotada pelo acórdão recorrido, necessário seria o reexame do conjunto fático-probatório constante dos autos, o que atrai a incidência da Súmula 279 do STF. Isso posto, nego seguimento ao recurso. Publique-se. Brasília, 1º de outubro de 2008. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI - Relator - 1

Partes

Autor(a/s)(es): Estado de São Paulo

adv.(a/S): Pge-Sp - Aylton Marcelo Barbosa da Silva

reu(É)(S): União

adv.(a/S): Advogado-Geral da União

Publicação

DJe-194 DIVULG 13/10/2008 PUBLIC 14/10/2008

Observação

Legislação Feita por:(Esb)

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