Acórdão nº 2004/0054775-0 de T1 - PRIMEIRA TURMA

Número do processo2004/0054775-0
Data03 Maio 2007
ÓrgãoPrimeira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 656.740 - GO (2004/0054775-0)

RELATOR : MINISTRO LUIZ FUX
RECORRENTE : L.L.B.
ADVOGADO : IZAIAS BATISTA DE ARAÚJO E OUTRO(S)
RECORRIDO : ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SEÇÃO GOIÁS
ADVOGADO : ANDREA BASTOS LAGE MONTEIRO

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. INSCRIÇÃO. ORDEM DOS ADVOGADOS. SECCIONAL. LICENCIAMENTO EX OFFICIO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. ALEGAÇÃO DE INCOMPATIBILIDADE FUNCIONAL. CARGO DE PRESIDENTE CONSELHO PENITENCIÁRIO E EXERCÍCIO DA ADVOCACIA. INEXISTÊNCIA. AGENTE HONORÍFICO. MUNUS PÚBLICO. ATUAÇÃO ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE PODER DECISÓRIO. PARECER OPINATIVO. COMPATIBILIDADE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL E VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC - NÃO-COMPROVAÇÃO.

  1. A expiração da eficácia do ato coator no curso do processo faz exsurgir a falta de interesse processual, conduzindo à extinção do mandamus. Precedente: RMS 1764/BA, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, DJ 26.09.1994)

  2. Mandado de Segurança impetrado pelo ora recorrente, com pedido liminar contra ato atribuído ao Presidente de Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, objetivando restabelecer sua inscrição junto àquela instituição, suspensa arbitrariamente, pela autoridade coatora, em razão de meras conjecturas, que imputavam impedimento profissional, sem qualquer respaldo legal, porquanto o cargo de Conselheiro do Conselho de Política Criminal não infringe o Estatuto da OAB, posto encerrar funções opinativas, cargo sem remuneração e impedimento apenas no que pertine aos valores objeto de apreciação pelo Colegiado.

  3. Restauração superveniente de todas as prerrogativas profissionais, em razão da extinção do mandato.

  4. Perda superveniente do interesse processual, sem repercussão na sucumbência, na forma da Súmula 105/STJ, que interdita honorários em writ.

  5. Mandamus extinto sem resolução do mérito.

  6. Nada obstante, e apenas obiter dictum, embora alegue a impetrada que a referida suspensão não revela punição, resta indubitável que tal procedimento não prescinde do contraditório, tanto mais que, a motivação para sua realização fora a ocupação de cargo público honorífico, sem remuneração e transitório, ensejando notório prejuízo ao sustento do impetrante, que por sua vez, não poderia mais auferir remuneração alguma, em decorrência daquela decisão.

  7. Consigne-se lição do professor Hely Lopes Meirelles, elucidativa acerca dos agentes honoríficos: "Agentes honoríficos: são cidadãos convocados, designados ou nomeados para prestar, transitoriamente, determinados serviços ao Estado, em razão de sua condição cívica, de sua honorabilidade ou de sua notória capacidade profissional, mas sem qualquer vínculo empregatício ou estatutário e, normalmente, sem remuneração. Tais serviços constituem o chamado múnus público, ou serviços públicos relevantes, de que são exemplos a função de jurado, de mesário eleitoral, de comissário de menores, de presidente ou membro de comissão de estudo ou de julgamento e outros dessa natureza.

    Os agentes honoríficos não são servidores públicos, mas momentaneamente exercem uma função pública e, enquanto a desempenham, sujeitam-se à hierarquia e disciplina do órgão a que estão servindo, podendo perceber um pro labore e contar o período de trabalho como de serviço público. Sobre estes agentes eventuais do Poder Público não incidem as proibições constitucionais de acumulação de cargos, funções ou empregos (art. 37, XVI e XVII), porque sua vinculação com o Estado é sempre transitória e a título de colaboração cívica, sem caráter empregatício. A Lei 9.608, de 18.02.1998, dispondo sobre o serviço voluntário, define-o como a atividade não remunerada prestada por pessoa física a entidade púbica de qualquer natureza ou instituição privada sem fins lucrativos com objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social, inclusive mutualidade. Tal serviço não gera vínculo empregatício, nem obrigações de natureza trabalhista, previdenciária ou afim entre prestador e tomador. A lei permite o ressarcimento das despesas comprovadamente realizadas pelo prestador, desde que estejam autorizadas pela entidade a que for prestado o serviço voluntário. Somente para fins penais é que esses agentes são equiparados a funcionários públicos quanto aos crimes relacionados com o exercício da função, nos expressos termos do art. 327 do CP." (in "Direito Administrativo Brasileiro, 28ª Edição, Editora Malheiros, página 79) (grifou-se)

  8. O cargo de Presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária está abrangido pela exceção contida no parágrafo 2º, do art. 28, do Estatuto dos advogados, porquanto desprovido de poder decisório, já que apenas emite pareceres opinativos, consoante se extrai dos artigos que ora se transcreve: "Art. 28. A advocacia é incompatível, mesmo em causa própria, com as seguintes atividades: (...) III - ocupantes de cargos ou funções de direção em Órgãos da Administração Pública direta ou indireta, em suas fundações e em suas empresas controladas ou concessionárias de serviço público; (...) § 2º Não se incluem nas hipóteses do inciso III os que não detenham poder de decisão relevante sobre interesses de terceiro, a juízo do conselho competente da OAB, bem como a administração acadêmica diretamente relacionada ao magistério jurídico."(Lei 8.906/94)

    "Art. 23 - Ao presidente do CNPCP incumbe dirigir, coordenar e supervisionar as atividades do Conselho e, especificamente:

    I - representar o CNPCP nos autos em que se fizerem necessários;

    II - convocar e presidir as reuniões do Conselho Pleno, bem como executar as suas deliberações e as das Câmaras;

    III - elaborar a pauta das reuniões do Conselho Pleno e Câmaras do CNOCP;

    IV - assinar as atas das reuniões e, juntamente com os Relatores, as Resoluções;

    V - indicar, dentre os membros do Conselho, o Relator de matéria a ser apreciada nas reuniões;

    VI - expedir ad referendum do Conselho, normas complementares relativas a seu funcionamento e à ordem dos trabalhadores;

    VII - designar Membros do Conselho para inspecionar, fiscalizar ou visitar estabelecimentos ou de execução penal das diversas unidades da Federação;

    VIII - criar Comissões Especiais e designar os seus integrantes." (Portaria nº 543, de 28 de agosto de 1996)"

  9. Deveras, não se verifica, dentre as atribuições do cargo de Presidente do referido Conselho, nos termos da Portaria nº 543, de 28 de agosto de 1996 (que vigorava à época em que o impetrante fora nomeado para exercer aquele cargo) qualquer competência decisória, porquanto os atos praticados pelo Conselho Nacional de Política Criminal são meramente opinativos, é dizer, que sua atuação restringia-se à esfera administrativa, o que atrai a incidência do parágrafo 2º, do art. 28, do Estatuto dos Advogados, que consagra a compatibilidade do exercício simultâneo da presidência daquele Conselho e a advocacia.

  10. A atuação do impetrante na advocacia criminal sofre temperamentos, em face do impedimento, legal e moral, de se valer o impetrante do cargo de "conselheiro" para fins de "captação indevida de clientes", tendo em vista o dever de ofício em comunicar à autoridade competente impedimento desta natureza, sob pena de punição disciplinar, in verbis: "Art. 19. A autoridade ou servidor que incorrer em impedimento deve comunicar o fato à autoridade competente, abstendo-se de atuar. Parágrafo único. A omissão do dever de comunicar o impedimento constitui falta grave, para efeitos disciplinares."

  11. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o tribunal de origem pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.

  12. A divergência jurisprudencial, ensejadora de conhecimento do recurso especial, deve ser devidamente demonstrada, conforme as exigências do parágrafo único do art. 541 do CPC, c/c o art. 255 e seus parágrafos, do RISTJ.

  13. Visando a demonstração do dissídio jurisprudencial, impõe-se indispensável avaliar se as soluções encontradas pelo decisum recorrido e os paradigmas tiveram por base as mesmas premissas fáticas e jurídicas, existindo entre elas similitude de circunstâncias.

  14. In casu, impõe-se reconhecer a não demonstração da similaridade, indispensável à configuração do dissídio jurisprudencial, porquanto os acórdãos paradigmas tratam de situação fática diversa, impõe-se reconhecer a não demonstração da similaridade, indispensável à configuração do dissídio jurisprudencial, porquanto os acórdãos paradigmas tratam de situação fática diversa, na qual fora aplicada sanção disciplinar, o que não se verificou no presente feito, em que ocorreu o licenciamento ex officio do recorrente, e não a suspensão da sua inscrição junto à Ordem dos Advogados.

  15. Destarte, o acórdão recorrido versou acerca da incompatibilidade do exercício da advocacia com o cargo de Presidente de Conselho, restando silente o aresto paradigma acerca desta questão, manifestando-se apenas quanto à possibilidade de rejeição de parecer do Conselho Penitenciário, acerca de livramento condicional, quando houver fundamentação emitida por perito em sentido diverso. Ademais, insubsistentes os paradigmas apontados para demonstrar a violação do devido processo legal, tendo em vista tratarem de situações genéricas, desconsiderando-se as peculiaridades decorrentes da hipótese fática posta nos autos.

  16. Recurso especial não conhecido.

    ACÓRDÃO
    Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da PRIMEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Denise Arruda e Francisco Falcão votaram com o Sr. Ministro Relator.
    Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro José Delgado.
    Brasília (DF), 03 de maio de 2007(Data do Julgamento)
    MINISTRO LUIZ
    ...

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