Acórdão nº 1.0026.10.002002-8/001 de TJMG. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, 21 de Febrero de 2013

Magistrado Responsáveláurea Brasil
Data da Resolução21 de Febrero de 2013
Tipo de RecursoApelação Cível

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - OMISSÃO DO PODER PÚBLICO - ACESSIBILIDADE DE DEFICIENTES - ADAPTAÇÃO DE PRÉDIOS PÚBLICOS - DESCUMPRIMENTO DE DETERMINAÇÕES LEGAIS E REGULAMENTARES - ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO - POSSIBILIDADE, EM OBSERVÂNCIA A PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS - AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO À SEPARAÇÃO DOS PODERES.

  1. A Constituição da República estabelece, em seu art. 227, §2º, que "lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência".

  2. Embora se trate de norma constitucional de eficácia limitada, a Lei Federal n. 10.098/2000 e o Decreto n. 5.296/2004 regulamentaram-na, dando-lhe plena aplicabilidade.

  3. Compete, à União, a edição de normas gerais acerca da "proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência", cabendo ao Município apenas suplementar a legislação nacional.

  4. Em regra, é vedado ao Poder Judiciário adentrar no mérito dos atos administrativos de efetivação de políticas públicas, cabendo-lhe unicamente examiná-los sob o aspecto de legalidade e moralidade. Todavia, diante de flagrante descumprimento pela Administração Municipal das normas legais e regulamentares da Lei n. 10.098/2000 e do Decreto n. 5.296/2004, é permitido ao Judiciário impor ao Executivo Municipal o cumprimento das disposições normativas respectivas.

  5. As medidas que não são obrigatoriamente determinadas por lei não podem ser impostas ao réu, sob pena de acarretar-lhe ônus excessivo.

  6. Sentença parcialmente reformada, em reexame necessário conhecido de ofício. Prejudicado o recurso voluntário.

    APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0026.10.002002-8/001 - COMARCA DE ANDRADAS - APELANTE(S): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS - APELADO(A)(S): MUNICIPIO DE ANDRADAS

    A C Ó R D Ã O

    Vistos etc., acorda, em Turma, a 5ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em REFORMAR PARCIALMENTE A SENTENÇA, EM REEXAME NECESSÁRIO CONHECIDO DE OFÍCIO. PREJUDICADO O RECURSO VOLUNTÁRIO.

    DESEMBARGADORA ÁUREA BRASIL

    RELATORA

    DESA. ÁUREA BRASIL (RELATORA)

    V O T O

    Trata-se de apelação cível interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS contra a r. sentença de f. 107/111, proferida pelo MM. Juiz de Direito Eduardo Soares de Araújo, que, nos autos de ação civil pública proposta pelo ora apelante em face do Município de Andradas, julgou improcedente o pedido inicial.

    Em suas razões (f. 114/118), o apelante sustenta que: a) a sentença contraria o art. 227, §2º da Constituição Federal, que foi regulamentado pela Lei Federal n. 10.098/2000, que contém normas gerais sobre a promoção de acessibilidade às pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida; b) a Lei 10.098/2000 tem status nacional, sendo plenamente aplicável aos Municípios, que tem competência para suplementar suas previsões, e não desprezá-las; c) relegar à discricionariedade do Município a implementação suplementar da legislação federal significa, na prática, negar vigência aos direitos das pessoas portadoras de deficiência, ignorar a prioridade que o ordenamento jurídico lhes confere, é ignorar a Constituição e as normas constitucionais (sic); d) o art. 12 da Lei 10.098/2000 impõe a adequação dos locais de espetáculo às pessoas com deficiência física, não as condicionando à realização de construções, reformas ou ampliações; e) as adaptações indicadas na inicial devem ser realizadas, visto que já esgotado o prazo estabelecido no art. 19, §1º do Decreto 5.296/04; f) o próprio Município confessa que realizou reformas no Teatro "José Stivanin" posteriores à Lei 10.098/00, o que ensejaria o dever de promover as adequações previstas no citado diploma; g) a condenação imposta pelo Poder Judiciário pode ser modulada, compatibilizando-se, assim, o direito dos portadores de deficiência com o controle orçamentário do Município.

    Sem contrarrazões (f. 114v).

    Remetidos os autos à douta Procuradoria-Geral de Justiça, manifestou-se o culto Procurador, Dr. Geraldo Magela Carvalho Fiorentini, pela reforma da sentença, em reexame necessário, prejudicado o recurso voluntário (f.120/133).

    Conheço, de ofício, do reexame necessário, nos termos do art. 4º, §1º, da Lei n. 7.853/89, e do recurso voluntário, porquanto presentes os pressupostos de admissibilidade.

    A presente ação civil pública foi proposta pelo Ministério Público Estadual para garantir a acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência física ao Teatro Municipal "José Stivanin", através da promoção das adaptações necessárias, enumeradas nas Leis Federais n. 10.098/2000 e 10.048/2000, no Decreto Federal 5.296/04 e nas NBRs 9077/00, 9050/04, 13994/200, da ABNT.

    O representante do Parquet elenca, na inicial, uma série de irregularidades no Teatro Municipal (como ausência de corrimãos e rampa na escadaria de entrada; portas de acesso com largura inferior a 80 cm; espaços de circulação com largura inferior a 120 cm; escada de acesso ao segundo pavimento sem corrimãos e ausência de elevador; sanitários não adaptados às pessoas com deficiência). Assinalou que, por diversas vezes, tentou solucionar a questão administrativamente, tendo sido reiteradamente solicitada dilação de prazos pela Municipalidade, restando essa, por fim, inerte. Trouxe aos autos o laudo técnico arquitetônico de f. 45/55, no qual são enumeradas as adaptações necessárias, de acordo com as normas da ABNT, Lei Estadual n. 11.666/94 e Decreto Federal n. 5.296/04.

    Em contestação, o Município alegou que a norma do art. 227, §2º da CF/88 é de eficácia contida e que a Lei Federal n. 10.098/2000 não estipulou prazo para os demais entes federativos cumprirem as medidas ali indicadas, ficando tal questão a cargo do poder suplementar de cada municipalidade, não existindo, no Município de Andradas, lei específica sobre a matéria. Salientou que o Poder Judiciário não poderia substituir o...

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