Decisão Monocrática nº 5018210-11.2013.404.0000 de Tribunal Regional Federal da 4a Região, Terceira Turma, 13 de Agosto de 2013

Número do processo5018210-11.2013.404.0000
Data13 Agosto 2013

Vistos, etc.

Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que, em mandado de segurança objetivando a imediata liberação do veículo descrito no auto de infração e apreensão de veículo nº termo de retenção nº 11969.002995/2006-25, indeferiu o pedido de liminar porque "o devido processo legal, garantia assegurada na Constituição Federal, é de observância também no âmbito administrativo para aplicação de qualquer penalidade. Todavia, tal garantia constitucional não restou violada na hipótese dos autos, pois a apreensão, medida cautelar que é, também pode ser feita pela autoridade administrativa, não violando o 'due process of law', pois objetiva assegurar o resultado útil do processo" (DECLIM1, evento 17 na origem).

A parte agravante sustenta "que não houve qualquer procedimento administrativo que respeitasse o Princípio do Contraditório e da Ampla Defesa, previsto como Direito Fundamental da Constituição Federal da República, e ainda mais, na ação mandamental interposta, o ora agravante provou e comprovou sua propriedade do bem irregularmente apreendido, e sendo assim, a restituição do mesmo é medida que se impõe, e o ônus de comprovação de qualquer outro eventual crime é de cargo do Ministério Público Federal, não podendo ser o veículo feito de "refém" da justiça para garantia de nada, nem mesmo de pagamento de multa, conforme já decidiu e pacificou o Superior Tribunal de Justiça" (fl. 03, INIC1, evento 1).

DECIDO.

A decisão DECLIM1 do evento 17 na origem indeferiu o pedido de liminar, nos seguintes termos, verbis:

O autor ajuizou a presente ação mandamental pugnando pela anulação de ato administrativo consistente na aplicação da pena de perdimento da caminhonete Nissan Patrol, ano 1998, Chassi JN1WRGY60Z0252714, Placa AEA225, matriculada no Paraguai, apreendida pela Receita Federal sob a alegação de o bem ter sido internalizado irregularmente no país.

O autor narrou que, em 19/06/2013, agentes da Polícia Federal abordaram e apreenderam o referido veículo, que, no momento da apreensão era conduzido por Antonio Carlos de Souza, o qual tinha permissão transcrita em Cartório para a condução do veículo por tempo determinado.

Afirma que não foi encontrada qualquer mercadoria ou irregularidade em relação ao seu veículo e que não poderia ser penalizado com o perdimento de seu bem por atos anteriores de terceiro que o conduzia por ocasião da apreensão. Além disso, alega ter sido violado o seu direito de defesa, já que não restou informado da apreensão.

Requereu, liminarmente, a liberação do veículo apreendido (evento 1).

A União requereu seu ingresso no feito (evento 10).

O Delegado da Receita Federal prestou informações e juntou documentos (evento 13).

O feito veio concluso para apreciação do pedido de liminar.

Para concessão da medida liminar, exige a lei do mandado de segurança que haja (a) relevância dos motivos em que se assenta o pedido - fumus boni iuris - e (b) possibilidade de ineficácia do provimento judicial, se concedido somente ao final - periculum in mora, requisitos que serão a seguir analisados. Como é sabido, a pluralidade de ordenamentos jurídicos e de economias faz com que o convívio em regiões de fronteira apresente espectro próprio.

Sobretudo em função do custo de vida nas economias fronteiriças, várias são as situações em que os nacionais dos respectivos países buscam tirar proveito dessas peculiaridades.

Caso extremamente comum é a aquisição de veículo (geralmente carros de passeio) em país vizinho. Nestes casos, os adquirentes vivem no Brasil, trazem o veículo para o Brasil, mas mantém o registro do veículo no país onde foi adquirido.

Ou seja, os adquirentes acabam internando irregularmente esses veículos no Brasil.

No caso das cidades que divisam com países integrantes do Mercosul, tão comum quanto a aquisição e internação, é a alegação de que estão amparados pelas regras comunitárias, ou seja, que mesmo possuindo domicílio no Brasil podem possuir veículos matriculados no exterior.

A controvérsia, portanto, reside na verificação da possibilidade de assegurar-se à parte impetrante o direito de transitar livremente com seu veículo adquirido no exterior em território brasileiro, afastando-se provável apreensão e perdimento do automóvel.

Nos termos do art. 5º, inc. XV, da CF/88, 'é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo, qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens' (grifei).

A entrada de veículos no país está sujeita à incidência do Imposto de Importação, nos termos do artigo 19 do Código Tributário Nacional, devendo-se atentar ao fato de que, entretanto, caracterizar-se-á a importação somente quando a entrada do veículo no país for realizada com objetivo de interná-lo, tornando-o parte da economia nacional.

Ainda, dispõe a legislação aduaneira no artigo 23, I e § 1º, do DL nº 1.455/76 (com redação dada pela Lei 10637/2002):

Art. 23. Consideram-se dano ao Erário as infrações relativas às mercadorias:

I - importadas, ao desamparo de guia de importação ou documento de efeito equivalente, quando a sua emissão estiver vedada ou suspensa na forma da legislação específica em vigor;

(..)

§ 1º O dano ao Erário decorrente das infrações previstas no 'caput ' deste artigo será punido com a pena de perdimento das mercadorias. (redação dada pela Lei 10637/2002)

Com efeito, a internação do veículo em caráter definitivo vem sendo feita com muita freqüência ao arrepio da lei e sem o pagamento de qualquer tributo, sejam eles incidentes sobre o ato de importação (com danos ao erário federal), sejam eles incidentes sobre a circulação de mercadorias ou sobre a propriedade de veículos automotores (ICMS/IPVA, com danos ao erário estadual), sem falar nos prejuízos aos revendedores de veículos, que jamais terão preços competitivos, pois expostos à pesada carga tributária interna, configurando verdadeira concorrência desleal.

Todavia, cabe lembrar que é permitida a permanência temporária de veículos em território brasileiro (pertencentes a estrangeiros ou brasileiros radicados no exterior), aplicando-se o regime de admissão temporária, que, segundo o artigo 306, do Regulamento Aduaneiro, consiste na suspensão da incidência de tributos sobre a importação de bens que permanecerão no país por prazo e finalidade determinada.

Em inúmeras situações, no entanto, conforme dito anteriormente, o que se vê não é a admissão temporária, mas sim a própria internação, em caráter definitivo.

No que tange aos veículos com placas paraguaias o que se vê são brasileiros residentes no Brasil querendo o melhor de dois mundos: o melhor do Brasil, onde elegem viver, estudar etc., e o melhor do Paraguai, onde os preços dos veículos - em face das características de sua economia - são pelo menos 50% mais baratos que no Brasil.

A internação de veículos novos ou usados, matriculados no exterior, não é permitida em nosso país, ainda que tais veículos sejam matriculados nos países que compõem o Mercosul.

Nada obstante, para forjar uma pretensa aparência de legalidade nessas situações, tem-se invocado o instituto do duplo domicílio civil e o do regime de tráfego fronteiriço.

Entretanto, qualquer que seja o enfoque pelo qual se analise a questão, constata-se grave divergência com os preceitos legais em vigor.

No que tange às normas relativas à circulação de veículos no âmbito do Mercosul, o Grupo de Mercado Comum expediu a Resolução nº 131/94, estabelecendo normas para os veículos matriculados em qualquer um dos Estados Partes de uso particular exclusivo de turistas.

De acordo com essa Resolução, é considerado turista toda pessoa que ingresse no território de um Estado Parte distinto daquele que tem sua residência habitual, e nele permaneça sem exceder o prazo máximo permitido que estabeleça a legislação migratória do Estado Parte.

E mais: os veículos somente poderão ser conduzidos pessoalmente pelo proprietário ou pessoa por ele autorizada conforme legislação vigente, sempre que ambos sejam residentes no Estado Parte onde esteja matriculado o bem (veículo).

Por fim, às transgressões dessa Resolução aplicam-se as penalidades previstas nas legislações vigentes no Estado Parte em que forem detectadas.

A vigência da Resolução nº 131/94, no território brasileiro, foi determinada com fulcro no artigo 84, IV, da Constituição Federal de 1988, pelo Decreto nº 1.765, de 28.12.1995, e regulamentada pela Portaria nº 16/95, do Ministério da Fazenda.

Foi expedida em Buenos Aires, ainda, a Resolução nº 35, de 20.06.2002, a qual corrobora o teor da Resolução nº 131/94, acima citada, enfatizando que: 'o condutor deverá ser residente no Estado Parte de registro ou matrícula do veículo' (artigo 8º, item...

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