Acórdão nº REsp 1193789 / SP de T4 - QUARTA TURMA

Magistrado ResponsávelMinistro RAUL ARAÚJO (1143)
EmissorT4 - QUARTA TURMA
Tipo de RecursoRecurso Especial

RECURSO ESPECIAL Nº 1.193.789 - SP (2010⁄0085036-6)

RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO
RECORRENTE : C.A.F.F.
ADVOGADOS : C.C.D.R.M.E.O. REINALDOG.E.O. TIAGOA.R.L. E OUTRO(S)
C.C.V.R. E OUTRO(S)
RECORRIDO : A.V.B.D.C. - ESPÓLIO E OUTRO
REPR. POR : R.C.B. - CURADOR ESPECIAL
ADVOGADO : ANTÔNIO IVO AIDAR E OUTRO(S)
INTERES. : CTD CONSTRUÇÕES E EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS E OUTROS

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA (CC⁄2002, ART. 50). EX-SÓCIO DE SOCIEDADE LIMITADA. JULGAMENTO DE ANTERIOR AGRAVO PELA CORTE LOCAL. VIOLAÇÃO À COISA JULGADA. OCORRÊNCIA. REQUISITOS DA APLICAÇÃO DA TEORIA DA DISREGARD DOCTRINE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. RECURSO PROVIDO.

  1. Tendo a Corte local, em anterior julgamento de agravo de instrumento, decidido pela inexistência de pressupostos processuais e materiais necessários à aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, com decisão transitada em julgado, é incabível a rediscussão da matéria sob o único argumento de que teria a parte exequente sanado algum defeito processual que maculara o primeiro requerimento de aplicação da disregard doctrine, porquanto esse fundamento mostrava-se, por si só, insuficiente para superar a decisão anterior, fundada em várias outras razões, as quais permaneceram incólumes.

  2. Além do fato de a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica estar revestida pelo manto preclusivo da coisa julgada, o v. acórdão recorrido não aponta nenhum fundamento de, pelo menos, razoável aceitação para se aplicar a desconsideração da personalidade jurídica antes rejeitada. Nada se diz sobre ocorrência de atos fraudulentos, confusão patrimonial ou desvio de finalidade. Sem esses substratos, não se pode cogitar da desconsideração da personalidade jurídica. Precedentes.

  3. Recurso especial provido.

    ACÓRDÃO

    Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista da M.M.I.G., conhecendo parcialmente do recurso especial e, nessa parte, negando-lhe provimento, divergindo do relator, e o voto do M.A.C.F., acompanhado o relator, e o voto do Ministro Marco Buzzi, no sentido da divergência, e o voto do Ministro Luis Felipe Salomão, acompanhando o relator, a Quarta Turma, por maioria, decide conhecer e dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do relator. Votaram vencidos os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti (voto-vista) e Marco Buzzi. Os Srs. M.A.C.F. e Luis Felipe Salomão votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Brasília, 25 de junho de 2013(Data do Julgamento)

    MINISTRO RAUL ARAÚJO

    Relator

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.193.789 - SP (2010⁄0085036-6)

    RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO
    RECORRENTE : C.A.F.F.
    ADVOGADOS : C.C.D.R.M.E.O. REINALDOG.E.O. TIAGOA.R.L. E OUTRO(S)
    C.C.V.R. E OUTRO(S)
    RECORRIDO : A.V.B.D.C. - ESPÓLIO E OUTRO
    REPR. POR : R.C.B. - CURADOR ESPECIAL
    ADVOGADO : ANTÔNIO IVO AIDAR E OUTRO(S)
    INTERES. : CTD CONSTRUÇÕES E E.I. E OUTROS

    RELATÓRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO: Cuida-se de Recurso Especial, amparado no art. 105, III, “a” e “c”, da Constituição Federal, interposto por C.A.F.F., que desafia acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo assim ementado:

    "CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - Regular citação - Nova apreciação do pedido de desconsideração da personalidade jurídica - Deferimento - Presença dos requisitos do art. 50 do CC - Determinação de penhora apenas sobre os direitos econômicos da participação societária que o agravante detém sobre empresa - Decisão agravada mantida - Recurso desprovido." (fl. 2.301).

    Opostos embargos declaratórios, foram rejeitados por ausência de omissões e contradições e por impossibilidade de se conferir efeitos modificativos ao acórdão embargado.

    Com a rejeição, o recorrente interpôs o recurso especial apontando violação ao art. 50 do Código Civil de 2002 e aos arts. 468 e 470 a 474 do Código de Processo Civil, além de dissídio jurisprudencial. Incidentalmente, pediu atribuição de efeito suspensivo ao ora examinado recurso especial, oportunidade em que foi deferida a medida liminar.

    Dessa decisão anterior, deste relator, transcrevo os tópicos mais essenciais, em que também ficaram narrados pontos indispensáveis para a exata compreensão das questões veiculadas no presente feito, que igualmente são adotados como relatório, a saber:

    "No presente requerimento, esclarece o requerente o seguinte:

    'Trata-se a lide de caso em que antigo sócio de sociedade limitada (da qual havia se retirado em 1982), com capital totalmente integralizado, é responsabilizado diretamente, com levantamento do véu da pessoa jurídica, mais de 20 anos após, em decisão proferida sem observância ao princípio do contraditório.

    De forma manifesta, essa decisão optou por não valorizar o conteúdo de anterior manifestação judicial transitada em julgado, da lavra do próprio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que reconhecera inexistir motivos para afastar a personalidade das empresas rés na ação ordinária, precisamente por não se ter comprovado a prática de fraude (requisito material) e tampouco o devido processo legal (requisitos processuais) em face do ora recorrente.

    A citada decisão transitada em julgado foi da lavra da 5a. Câmara de Direito Privado do TJ⁄SP, lançada em 17⁄12⁄2003, nos autos do Agravo de Instrumento 271.510-4⁄5, cuja ementa teve o seguinte teor:

    'INDENIZAÇÃO - LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA - Doutrina da desconsideração da personalidade jurídica da empresa para comprometimento de patrimônio de sócio - Não comprovação da existência de fraude - Inaplicabilidade - Impossibilidade, ademais, de alcançar terceiro que não foi parte na ação - Violação, aliás, ao art. 611, do CPC - Recurso provido.'

    Ainda em relação ao agravo de instrumento acima indicado, interposto por C.A.F.F. e outros, faz-se mister indicar as razões defendidas por este para o provimento do recurso, senão vejamos:

    (i) a desconsideração deve ser apoiada em fatos concretos, não se podendo arbitrariamente presumir a fraude;

    (ii) a desconsideração não pode ser decretada incidentalmente no processo de execução, sob pena de desobediência ao devido processo legal, sobretudo quando se trata de sócio que se retirou da sociedade há vários anos, não havendo possibilidade do mesmo valer-se da personalidade da empresa para perpetuar fraudes, promover confusão patrimonial, enfim, subsidiar interesses próprios;

    (iii) o negócio jurídico, que originariamente gerou o litígio, foi formalizado apenas entre as seguintes pessoas: Whinner - C.I.L., os Agravados (Antônio Victor Baptista de Carvalho e Beatriz Nilda Bonaldi de Carvalho) e Sérgio Niederauer, em 5⁄12⁄1981. Ocorre que a ação judicial só foi ajuizada em 04⁄11⁄1993, dela não figurando como parte C.A.F., do que resulta a nulidade da decisão que estende a coisa julgada a terceiro que não integrou a respectiva relação processual, de conformidade com o art. 472 do CPC.

    Acolhendo essas razões recursais, a 5a. Câmara de Direito Privado do TJ⁄SP sustentou, ainda, que sequer houve citação das rés solidariamente sucumbentes (...), o que afrontaria o revogado art. 611 do CPC (julgada a liquidação, a parte promoverá a execução, citando pessoalmente o devedor).

    Ademais, a decisão transitada em julgado alertou para a necessidade de se explicitar, concretamente, os pressupostos para a correta aplicação do instituto do disregard doctrine (...).

    Nada obstante a coisa julgada material, a parte contrária continuou insistindo junto ao Juízo de 1o. grau pelo reconhecimento da desconsideração da personalidade jurídica.

    A insistência, inadvertidamente, surtiu efeito, pois, em 30⁄10⁄2008 (quando já havia passado inclusive o prazo decadencial para eventual ação rescisória), foi novamente deferido o mesmo pedido de desconsideração em relação a C.A.F.F. (...).

    A mesma 5a. Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça, posteriormente, em composição totalmente renovada, negou provimento ao recurso de C.A.F., por acórdão unânime de 3⁄6⁄2009, pelos fundamentos seguintes: (i) não haveria coisa julgada, porquanto a primeira decisão do tribunal 'foi fundamentada na inexistência de citação das empresas executadas à época, e que, após regular citação, houve nova apreciação do pedido de desconsideração, o qual restou deferido'; (ii) 'a desconsideração da personalidade jurídica da empresa executada, in casu, foi bem aplicada, com fundamento no art. 50 do CC, diante do abuso' (...).

    Desta sorte, em face da manifesta ofensa aos dispositivos federais suscitados, não restou ao peticionante outra medida senão a interposição do recurso especial para a reforma do acórdão vergastado, o qual se encontra tramitando neste C. Tribunal sob o nº 1193789⁄SP.' (fls. 2463⁄2468)

    O requerente afirma a presença do fumus boni iuris, reiterando as argumentações tecidas nas razões do apelo nobre, destacando a violação à coisa julgada e a incorreta aplicação da tese da desconsideração da personalidade jurídica pela decisão combatida. Aduz, ainda, que não lhe foram franqueados os legítimos e constitucionais direitos da ampla defesa e do contraditório.

    Sustenta que o periculum in mora, na hipótese vertente, consiste no fato de estar prestes a sofrer graves e indevidas constrições em seu patrimônio, mormente pelo fato de ter havido designação de interventor⁄administrador, com encargo de depositar em Juízo os direitos econômicos pertinentes às quotas sociais pertencentes ao ora requerente, a serem penhoradas, com a constrição de seus haveres, como comprovado nos autos (fls. 2419⁄2429).

    É o relatório.

    Como cediço, a concessão de tutela cautelar com o fito de atribuir efeito suspensivo a recurso especial demanda a presença do chamado fumus boni iuris, consistente na plausibilidade do direito invocado nas razões recursais, bem como do periculum in mora, cuja caracterização exige o risco de dano irreparável ou de difícil reparação com a execução do acórdão recorrido.

    Em exame perfunctório dos autos, é possível verificar-se a plausibilidade das razões invocadas no apelo nobre, com destaque para a inobservância, pelas...

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