Decisão Monocrática nº 5020247-11.2013.404.0000 de Tribunal Regional Federal da 4a Região, Quarta Turma, 4 de Septiembre de 2013

Número do processo5020247-11.2013.404.0000
Data04 Setembro 2013

Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - CREMERS contra decisão, proferida em ação civil pública, que indeferiu antecipação da tutela.

Sustenta o Agravante que a atuação dos médicos que ingressaram pelo Programa Mais Médicos sem o diploma revalidado e sem proficiência em Língua Portuguesa certificada coloca em risco a saúde da população.

Assevera que a Medida Provisória nº 621/2013 ao dispor no art. 10 que "O médico intercambista exercerá a medicina no âmbito das atividades de ensino, pesquisa e extensão do Projeto Mais Médicos para o Brasil, dispensada, para tal fim, a revalidação de seu diploma nos termos do §2º do art. 48 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996" é inconstitucional por ferir o Princípio da Isonomia (art. 5º caput, CF/88) e por violar o art. 5º, inciso XIII da CF/88 que determina: "é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;"

Aduz ser necessário o exame de proficiência em Língua Portuguesa na medida em que o atendimento médico envolve uma compreensão adequada e suficiente por parte do médico sobre os sintomas que o paciente e/ou familiares descrevem, sob pena de um diagnóstico absolutamente equivocado e até fatal.

Requer a reforma da decisão recorrida com a concessão de antecipação da tutela "para que o CREMERS não seja obrigado a efetuar o registro provisório dos médicos intercambistas que aderirem ao Projeto Mais Médicos para o Brasil, sem a comprovação documental da revalidação dos diplomas emitidos por universidades estrangeiras, bem como da apresentação de Certificado CELPE/BRAS para os estrangeiros até que o mérito desta questão possa ser analisado pelo Poder Judiciário em cognição exauriente."

A decisão agravada foi proferida nos seguintes termos (evento 10) pelo MM. Juiz Federal Bruno Brum Ribas:

"O CREMERS propôs a presente ação civil pública contra a UNIÃO, postulando, como antecipação de tutela, provimento judicial que lhe assegure o direito a que 'não seja obrigado a efetuar o registro provisório dos médicos intercambistas que aderirem ao Projeto Mais Médicos para o Brasil, sem a comprovação documental da revalidação dos diplomas emitidos por universidades estrangeiras, bem como da apresentação de certificado CELPE/BRAS para os estrangeiros'.

Sustentou, em síntese, que a Medida Provisória n. 621, que institui o Programa Mais Médicos, ao dispensar o médico denominado intercambista (formado em instituição de educação superior estrangeira com habilitação para exercício da medicina no exterior) de revalidar seu diploma no País e de comprovar o domínio do idioma nacional, através da apresentação do Certificado de Proficiência em Língua Portuguesa para Estrangeiros, violou as Leis nº 3.268/57 e nº 9.394/96 (LDB), que exige a revalidação do diploma obtido em universidade estrangeira (art. 48), o princípio da isonomia previsto no artigo 5º da Constituição Federal, já que dá tratamento privilegiado a profissionais formados no exterior; o inciso XIII do mesmo artigo que autoriza o livre o exercício profissional, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer, bem como o artigo 196 da Constituição, que assegura a prestação de um serviço de saúde adequado aos cidadãos.

Intimada, a União manifestou-se sobre o pedido de antecipação de tutela (evento 08). Alegou, em resumo: conexão com a ação civil pública nº 0038673-28.2013.4.01.3400 ajuizada pelo Conselho Federal de Medicina junto à 22ª Vara Federal do Distrito Federal, tendo mesmo objeto e causa de pedir; inadequação da via processual eleita. Uso da ação civil pública como sucedâneo da ação direta de inconstitucionalidade; ausência de interesse processual, tendo em vista que o bem jurídico tutelado pode e deve ser buscado pelos debates políticos, democráticos e dialéticos na instância parlamentar; vedação à concessão de medida antecipatória que esgote o objeto da ação; ausência de verossimilhança do direito, implicando restrição à independência e harmonia dos poderes (art. 2º da CF) e ao sistema presidencialista de governo; discorreu sobre o Programa Mais Médicos, a preservação do acesso aos cargos públicos mediante concurso, sobre o afastamento da necessidade de revalidação do diploma; a necessidade de proficiência em língua portuguesa; a inexistência de ofensa ao princípio da isonomia; defendeu a inexistência de periculum in mora, que ocorreria de modo inverso, em prejuízo da Administração que ficaria tolhida de prosseguir o Programa; - afirmou a impossibilidade jurídica do pedido, por pretender que o Judiciário pratique atos de gestão próprios da Administração; no que denominou mérito, discorreu sobre a constitucionalidade da MP 621/2013; por fim, postulou a limitação territorial da decisão à subseção judiciária de Porto Alegre.

Os autos vieram conclusos para decisão.

Conexão.

A União alega conexão com a ação civil pública nº 0038673-28.2013.4.01.3400 ajuizada pelo Conselho Federal de Medicina junto à 22ª Vara Federal do Distrito Federal, tendo mesmo objeto e causa de pedir. Afirma que se está a contemplar verdadeira pulverização de lides de mesma natureza nos diversos foros da Justiça Federal e que é necessário que se evitem decisões conflitantes, por força dos princípios da economia processual e segurança jurídica.

Ocorre que a própria União, ao final das suas informações e como faz costumeiramente em defesas em ações civis públicas, alega a incidência do art. 16 da Lei 9.494/97, que a partir da edição de uma medida provisória (ou seja, pela vontade do Executivo Federal) pretendeu restringir os efeitos da coisa julgada da sentença da ACP, nos limites da competência territorial do órgão prolator.

Mesmo nas ações que tratam efetivamente de direitos difusos ou coletivos, a União pretende sejam decididas em todas as subseções judiciárias da Justiça Federal. Já na presente ação se insurge contra a possibilidade de que cada Conselho Regional de Medicina ajuíze uma ação, pois, efetivamente, todos os Conselhos estaduais detêm legitimidade para discutir uma obrigação que lhes é imposta pela Lei, ou seja, deferir o registro provisório aos médicos sem a observância dos requisitos até então exigidos.

Portanto, não há como obrigar o CREMERS a demandar a União, na defesa de interesse próprio (e não interesse difuso ou coletivo), como será analisado no tópico seguinte, em Brasília.

O parágrafo único do art. da Lei 7.347/85, que determina que a propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações posteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto, refere-se à competência de juízos com a mesma competência territorial de que fala o art. 16 da mesma Lei.

Afasto a alegação, portanto.

Da mesma forma não há que se falar em limitação territorial da decisão, visto que o pedido de se ver desobrigado de efetuar o registro provisório dos médicos não comporta divisão ou limitação, por não se referir a direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos.

Inadequação da via eleita.

Em relação ao cabimento da presente ação como forma de impugnação dos efeitos da Medida Provisória recém editada, entendo que não assiste razão à União quando alega a inadequação da via processual eleita.

Isso porque a presente ação civil pública não está sendo usada como sucedâneo da ação direta de inconstitucionalidade, visto que o provimento postulado é de cunho declaratório e diz respeito unicamente à parte autora, havendo inequívoca limitação objetiva e subjetiva.

Não se trata de provimento genérico, próprio de ADI, muito embora, dada a especificidade da questão, o acolhimento da pretensão implique praticamente a inviabilização da execução da lei, visto que o exercício da medicina sem o competente registro junto aos conselhos profissionais constituiria exercício irregular da profissão. Todavia, a inconstitucionalidade alegada é mera causa de pedir, de forma que pode ser veiculada por meio de ação civil pública, nos termos da jurisprudência do excelso Supremo Tribunal Federal.

O objeto da ação se define pelo pedido. E aqui postula-se o julgamento de procedência para que o CREMERS não seja obrigado a efetuar o registro provisório dos médicos intercambistas que aderirem ao Projeto Mais Médicos para o Brasil, sem a comprovação documental da revalidação dos diplomas emitidos por universidades estrangeiras, bem como da apresentação de certificado CELPE/BRAS para os estrangeiros.

Ou seja, cuida-se de mera ação declaratória negativa, pela qual a parte autora (única beneficiada pela decisão judicial postulada - o que demonstra que não se trata de ação coletiva) pretende não cumprir uma determinação legal, sob o fundamento de que a norma que a estabelece é inconstitucional, tratando-se, tipicamente, de hipótese de controle difuso de constitucionalidade.

A ação civil pública é espécie de processo coletivo a respeito do qual lecionam Fredie Didier Jr e Hermes Zaneti Jr:

Conceitua-se processo coletivo como aquele instaurado por ou em face de um legitimado autônomo, em que se postula um direito coletivo lato sensu ou se afirma a existência de uma situação jurídica coletiva passiva, com o fito de obter um provimento jurisdicional que atingirá uma coletividade, um grupo ou um determinado número de pessoas. (p. 45)

Para classificar um direito como difuso, coletivo ou individual deduzido na ação, a pedra de toque do método classificatório é o tipo de tutela jurisdicional que se pretende quando se propõe a competente ação judicial. (NERY JÚNIOR, Nelson, Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto, 4ª Ed. - Rio de janeiro, Forense Universitária, 1995,p. 130).

Portanto, a presente ação não veicula nenhuma pretensão de natureza coletiva, tendo em vista a especificidade do pedido deduzido. Tanto é assim que basta supor que a parte autora não fosse legitimada para propor ação civil pública e que houvesse classificado a presente...

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