Acórdão nº 2007.01.00.045874-2 de Tribunal Regional Federal da 1a Região, Quinta Turma, 27 de Noviembre de 2013

Data27 Novembro 2013
Número do processo2007.01.00.045874-2
ÓrgãoQuinta turma

RELATORA: DESEMBARGADORA FEDERAL SELENE MARIA DE ALMEIDA

AGRAVANTE: ALTINO DA CRUZ E OUTRO(A)

ADVOGADO: ISAC TOLENTINO DE ARAUJO JUNIOR E OUTROS(AS)

AGRAVADO: RITA DE CASSIA SALGADO DE SANTANA

ADVOGADO: DJALMA HAROLDO PICADO FERNANDES E OUTROS(AS)

ACÓRDÃO

Decide a Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 1a Região, à unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do voto da Exma. Sra. Desembargadora Federal Selene Maria de Almeida.

Brasília, 27 de novembro de 2013.

SELENE ALMEIDA

Desembargadora Federal – Relatora

RELATÓRIO

A Exma. Srª Desembargadora Federal SELENE ALMEIDA (Relatora):

Trata-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão proferida pelo Juízo Federal da 11ª Vara da Seção Judiciária do Estado da Bahia, que, nos autos da ação possessória nº 2007.33.00.005218-8, deferiu o pedido liminar de reintegração.

Os réus da demanda, Altino da Cruz e Anselmo Ferreira de Jesus, ora agravantes, afirmam fazerem parte da Comunidade Remanescente de Quilombo São Francisco do Paraguaçu, cuja posse imemorial da área em litígio é fato público e notório, reconhecido por instituições públicas e provado pelas próprias testemunhas levadas pela agravada em audiência de justificação.

Asseveram que a posse imemorial da comunidade é atestada pelo Parecer nº 002/2007 do Núcleo de Regularização Fundiária de Territórios Quilombolas do INCRA SR-05, pelo qual está demonstrado que o “imóvel denominado Sítio Shangrilá, de propriedade da Sra. Rita de Cássia Salgado de Santana está inserido na sua totalidade no território tradicional quilombola de São Francisco do Paraguaçu.”

Alegam que tanto o Ministério Público Federal quanto à Fundação Cultural Palmares reconhecem a posse secular da comunidade em outros processos judiciais em que lititgam a comunidade quilombola de São Francisco do Paraguaçu e a família Santana.

Afirmam que alguns fatos narrados na inicial são desmentidos pelas próprias testemunhas da agravada em audiência de justificação, evidenciando a má-fé da agravada na tentativa de iludir o Poder Judiciário.

Requer, ao final, o benefício da assistência judiciária gratuita e o provimento do recurso.

O recurso foi inicialmente convertido em agravo retido. (fls.

300-302)

O Ministério Público Federal interpôs agravo regimental, ao qual foi dado provimento para afastar a decisão que converteu o agravo, mantendo- se, contudo, o indeferimento do pedido de antecipação de tutela. (fl. 417).

É o relatório.

DESEMBARGADORA FEDERAL SELENE MARIA DE ALMEIDA

VOTO

A Exma. Srª Desembargadora Federal SELENE ALMEIDA (Relatora):

Inicialmente, concedo o benefício da justiça gratuita, conforme requerido.

A decisão agravada restou redigida nos seguintes termos:

RITA DE CÁSSIA SALGADO DE SANTANA ajuizou a presente AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE, com pedido liminar, contra ALTINO DA CRUZ e ANSELMO FERREIRA DE JESUS, objetivando a expedição de mandado liminar de reintegração na posse do imóvel rural dito de sua propriedade, denominado “Sítio Shangri-la”, Alto do São Francisco, desmembrado da Fazenda São Francisco, medindo 99,09 hectares, registrado no Cartório de Registro de Imóveis da comarca de Cachoeira, Bahia, sob a matricula n°. 2.331 A.

Afirmou ser senhora legítima proprietária da área de terra que constitui o imóvel Sítio Shangri-la situado no Município de Cachoeira — Bahia, área fronteiriça com a Fazenda Alto do São Francisco, de propriedade de sua irmã Ângela Salgado, outrora invadida pelos réus, ambas originárias por desmembramento da Fazenda São Francisco, pertencente ao seu genitor e doadas aos filhos em vida.

Afirma que o Sitio Shangri-la faz divisa com a Fazenda Alto do São Francisco, cuja delimitação se dá por cerca de arame farpado e que após a reintegração da posse desta, ocorrida em 15103/2007, os réus colocaram seus animais nas terras de propriedade da autora, e passaram a promover desmatamento, derrubada de mata atlântica, roçagem e plantios diversos, bem como a edificação de barracos, o que foi objeto de queixa policial na circunscrição local.

Alega que o esbulho praticado pelos réus e demais invasores, mais de duas dezenas de pessoas, data de menos de ano e dia e que a propriedade apesar de pequena, é produtiva e valorizada, abrigando mais de 40 (quarenta) rezes “gado bovino”, pertencentes à autora, bem como terceiros em regime de aluguel de pastagens, que também exercem atividade extrativa, e, ainda, uma área de Mata Atlântica preservada, objeto também do desmatamento.

Juntou procuração e documentos às fls. 17/68.

Remetidos os autos à V Vara a fim da verificação acerca da existência de eventual dependência com os autos de n°.

2007.33.00.005218-8, foi proferido despacho à ti. 86, determinando a intimação da Fundação Cultural Palmares, da União e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA para que se manifestassem sobre o interesse no feito, o que restou atendido pelos dois últimos, às fls. 104 e 92/95, respectivamente.

Às fls. 144/145 foi proferida decisão, determinando a remessa à livre distribuição, vindo os autos a este juizo.

Às fls. 171/186, a Fundação Cultural Palmares manifestou- se acerca do interesse no feito.

À fl. 189 foi designada a realização de audiência de Justificação Prévia, tendo a autora apresentado o rol de testemunhas às fis. 196/197 e o MPF, à fl.198, manifestado o seu interesse em intervir no feito, reservando-se a exarar pronunciamento após a instrução processual.

Audiência realizada, conforme Termo de fls.200/201 e assentadas de 115.202/216.

É o relatório. D E C IDO.

Em cognição sumária, reputo presente os requisitos necessários à proteção limine litis da posse alegada na Inicial (CPC, art. 927).

Com efeito, restou sumariamente demonstrado nos autos que a Autora exerce, de longa data, os poderes inerentes ao domínio sobre e área litigiosa, seja para lá se deslocando a passeio, seja a explorando economicamente, mediante plantio de culturas diversas, criação de gado e atividade extrativista, É o que se vê, a título ilustrativo, dos trechos abaixo transcritos das testemunhas ouvidas em audiência de justificação:

“...que antes, em uma terra só, dos avós da autora e herdadas por seu pai, que a dividiu entre os seus três filhos, que nenhum dos três moram no local, mas para lá se dirigiam frequentemente em finais de semana e ocasiões de festa.., que os empregados tomavam conta do gado, plantavam aimpim, trabalhavam em cercas etc (Testemunha Antônio Rozeno do Carmo —fi. 208) “...que a Autora mora em Cachoeira; que de vez em quando a autora vai olhar as suas terras; que tem um rapaz que morava nestas terras, cujo apelido era “cabo”; que “cabo” plantava aimpim, mandioca para a proprietária (Testemunha José Garcia da Silva — fl.205) “...que nessas terras morava um trabalhador conhecido como “Cabo” que tomava conta e plantava mandioca, aimpim, etc; que a Autora também tinha gado no local..

(Testemunha José Nélio Garcia Santos fl. 214).

Oportuno dizer que também restou evidenciado que a área litigiosa é também ocupada por terceiros, dentre os quais um dos réus, que ali fazem suas roças. Esta ocupação, todavia, pelo que restou apurado em Justificação Prévia, é autorizada pela promovente desta ação, mediante contrato escrito de arrendamento ou parceria agrkola, conforme se depreende dos enxertos a seguir transcritos dos depoimentos testemunhais:

“...que tem roceiros na área de Rita; que na área de Rita, quem estava autorizado para plantar era o Sr.

Altino, além de Baga e Roze; que todos eles eram autorizados a plantar no local, cor contrato escriln que o produto da plantação ficava unicamente com os roceiros...” (Testemunha José Garcia da Silva - fi.

205) “...que dente invasores sabe que tem Altino e Anselmo, além de Maria; que a depoente conhece muitos dos ocupantes; que antes de ocuparem o imóvel litigioso, essas pessoas moravam na mesma região, onde possuíam roças; que antes de ocuparem o imóvel litigioso, os atuais ocupantes, já plantavam nas terras de Rita e de Angela, que plantavam mandioca, aimpim etc; que as proprietárias sabiam destas plantações e as permitiam... “que os réus plantavam na terra da Autora, autorizados por contrato escrito...” (Testemunha Lucinda Sanches Ferreira — fl.203) Daí se segue que tal ocupação não afasta a posse da promovente sobre as áreas não ocupadas por parceiros ou arrendatários, nem elide a sua posse indireta especificadamente sobre essas áreas (CC, art.1.197).

Portanto, quando um dos possuidores diretos — no caso, o Réu Altino da Cruz — intenta afastar a posse indireta do proprietário, este merece a proteção possessória, dada a caracterização da posse direta como injusta.

Há, por outro lado, também prova sumária dos atos espoliativos, ocorridos há menos de ano e dia, mais precisamente em março deste ano, quando os Réus, ao serem desalojados, por determinação judicial, da área lindeira, de propriedade da irmã da Autora, ingressaram ilicitamente na área litigiosa, inclusive derrubando Cercas, onde até o momento permanecem com animus domini, levantando moradias e fazendo plantios.

Por pertinentes, transcrevo, a título ilustrativo, os seguintes trechos dos depoimentos testemunhais, referentes à ocorrência e à data do esbulho, bem como à perda da posse da Autora:

“... que os sem terra prime iro entraram na Fazenda de Angela e depois na de Rita; que a Fazenda Santana é dividida, uma parte de Angela e a outra da Autora;

que tanto uma quanto outra, possuem estas terras a muitos anos; que a invasão ocorreu em março deste ano, depois de ter ocorrido a invasão nas terras de Ângela...” (Testemunha Lucinda Sanches Ferreira- fL 203) “...que a invasão ocorreu em março deste ano; que os invasores saíram da parte de Angela e passaram para a parte de Rita; que abriram o arame e passaram para dentro do pasto; que dentro do pasto já tem roças e casas armadas; que depois do fato, a autora não foi mais às suas terras...” (Testemunha José Gracia da Silva—fi. 206) “...que primeiro invadiram a parte de Ângela, há cerca de um ano, e...

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