Acórdão nº 2008.33.00.013308-8 de Tribunal Regional Federal da 1a Região, Quarta Turma, 7 de Enero de 2014
Magistrado Responsável | Desembargador Federal I'talo Fioravanti Sabo Mendes |
Data da Resolução | 7 de Enero de 2014 |
Emissor | Quarta Turma |
Tipo de Recurso | Apelação Criminal |
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0013305-02.2008.4.01.3300 (2008.33.00.013308-8)/BA Processo na Origem: 200833000133088
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL I'TALO FIORAVANTI SABO MENDES
APELANTE: JUSTICA PUBLICA
PROCURADOR: ANDREA CARDOSO LEAO
APELADO: ANTONIO NATALINO MANTA DANTAS
ADVOGADO: ANTONIO VIEIRA
ACÓRDÃO
Decide a Turma, por unanimidade, negar provimento à apelação criminal.
4ª Turma do TRF da 1ª Região – 07/01/2014.
I'TALO FIORAVANTI SABO MENDES Desembargador Federal Relator
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 2008.33.00.013308-8/BA
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL ROSIMAYRE GONÇALVES DE CARVALHO (RELATORA AUXILIAR):-
Trata-se de apelação interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (fls. 173/196), contra a v. sentença de fls. 166/171, que julgou improcedente o pedido formulado na denúncia, absolvendo o réu ANTÔNIO NATALINO MANTA DANTAS da prática do delito previsto no art. 20, §2º, da Lei nº 7.716/89, com fundamento no art. 397, III, do Código de Processo Penal.
Em defesa de sua pretensão, alegou o apelante, em síntese, que:
1) (...) na hipótese em apreço, os documentos, a gravação magnética da entrevista, as notícias jornalísticas, os depoimentos de testemunhas sobre comportamentos racistas do Apelado, acostados à denúncia, são indícios contundentes e fortes evidências da ocorrência do delito, de modo que somente a instrução processual, com a oitiva das testemunhas arroladas pela acusação e defesa, poderia permitir, com a necessária segurança e devido grau de certeza, a conclusão pela absolvição do Denunciado (fls. 177/178);
2) A absolvição sumária foi, portanto, prematura, na medida em que a instrução processual permitira melhor apurar a verdade dos fatos, notadamente tendo em vista que no processo penal vigora o princípio da verdade real (fl. 180);
3) (...) não se pode olvidar que as declarações discriminatórias dirigidas aos afrodescendentes (grande maioria da população baiana), através de referências depreciativas a uma de suas manifestações culturais (berimbau) e ao sistema de cotas, caracterizam-se como expressões do preconceito de cor, raça e etnia, porquanto referentes a grupo de pessoas unidas por uma identidade cultural comum (fl. 183);
4) (...) cumpre dissociar o crime de racismo (Lei 7.716/89) do delito de injúria racial (art. 140, parágrafo terceiro, CPB), uma vez que aquele diz respeito a ofensa a um grupo de pessoas, e não a um indivíduo determinado, de modo que, sendo indistintamente atingida uma coletividade, a tipificação da conduta há de ser baseada na prática de racismo, e não do crime contra a honra (injúria racial) (fl. 184);
5) (...) no tocante ao perigo de lesão que envolve o fato típico, é igualmente inegável que as fortes expressões propaladas pelo Recorrido, dirigidas a milhares de ouvintes e leitores, apresentam potencialidade para influenciar e induzir inúmeros jovens e estudantes ainda em formação, suscetíveis de reproduzirem as idéias racistas e preconceituosas do discurso excludente e discriminador do professor (fl. 185);
6) (...) ganha relevo o fato de que o sujeito ativo não se trata de um homem comum, mas de um professor universitário, coordenador de um curso de medicina, que, na qualidade de educador, é um verdadeiro formador de opinião (fl. 185);
7) E nem seria razoável considerar simplesmente risível e folclórica a referência feita ao suposto “baixo QI dos baianos”, que teriam “deficit” de inteligência, e ao pretenso fato de que “o baiano toca berimbau porque só tem uma corda se tivesse mais, não conseguiria” e que “o berimbau é o tipo de instrumento do indivíduo que tem poucos neurônios” (fl. 187);
8) (...) vale gizar que, o tipo penal não criminaliza apenas a conduta de induzir ou incitar, mas também a prática de preconceito e do racismo, sendo certo que a segregação e a discriminação são realizadas também através de palavras, como no caso em apreço, sejam elas explicitas ou sub-receptícias (fl.
189);
9) (...) a retratação do Acusado somente veio à público em 05.05.2008 (fl. 136), quando a repercussão do fato já havia alcançado grande dimensões. Ademais, tal medida não exclui o crime ou extingue a punibilidade, nem mesmo em relação ao delito de injúria, apenada menos severamente, conforme se depreende do art. 143 do CPB (fl. 190);
10) (...) presentes indícios veementes da conduta dolosa, mesmo se considerada a existência de dolo eventual, bem como da potencialidade lesiva e da tipificação objetiva do fato narrado na denúncia, faz-se imperiosa a reforma da r. sentença que absolveu sumariamente o Recorrido, a fim de que seja determinado o regular processamento da ação penal, com início da fase instrutória do procedimento (fl. 195);
11) (...) o Parquet requer a este E. Tribunal ad quem que se digne de se manifestar expressamente acerca dos dispositivos legais e constitucionais mencionados no presente recurso, especialmente art. 5º, XLII da CF, art. 20, § 2º, Lei 7.716/89, art. 395, III, e art. 397, III, CPP (fl. 196).
Foram oferecidas contrarrazões pelo réu (fls. 223/251), requerendo seja negado provimento ao recurso.
No exercício da função de fiscal da lei, o Parquet Federal opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 263/265).
Processo encaminhado à Secretaria, para fins do art. 613, I, do Código de Processo Penal em 01/12/2009.
É o relatório.
ROSIMAYRE GONÇALVES DE CARVALHO Juíza Federal (Relatora Auxiliar)
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL I'TALO FIORAVANTI SABO MENDES (RELATOR):-
Por vislumbrar presentes os pressupostos de recorribilidade, conheço da apelação interposta.
Acerca dos fatos, naquilo em que, concessa venia, reputo como essencial para o deslinde da matéria em discussão, narra a denúncia que:
“1. No dia 30 de abril de 2008, ANTÔNIO NATALINO MANTA DANTAS, por vontade livre e consciente, praticou, induziu e incitou a discriminação e o preconceito de cor, etnia e procedência nacional, por intermédio de meios de comunicação social.
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O Acusado ANTÔNIO NATALINO MANTA DANTAS, na qualidade de Coordenador do Curso de Medicina da UFBA – Universidade Federal da Bahia (autarquia federal), concedeu entrevistas ao jornal de grande circulação ‘Folha de São Paulo’, em 29.04.2008 (publicada em 30.04.2008), e à emissora de rádio ‘Band News FM’ (99.1Mhz), em 30.04.2008, a respeito do baixo desempenho da UFBA no ENADE – Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes e no IDD – Indicador de Diferença entre os Desempenhos Observado e Esperado.
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Durante as...
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