Acórdão Inteiro Teor nº RR-33800-14.2011.5.21.0005 TST. Tribunal Superior do Trabalho Conselho Superior da Justiça do Trabalho, 5 de Febrero de 2014

Número do processoRR-33800-14.2011.5.21.0005
Data05 Fevereiro 2014

A C Ó R D Ã O

7ª TURMA VMF/lm/zh/drs RECURSO DE REVISTA

- COMPLEMENTO DE RMNR - BASE DE CÁLCULO DA RMNR

- PRINCÍPIO DA BOA-FÉ - FUNÇÃO HERMENÊUTICO-INTEGRATIVA - OBSERVÂNCIA DOS DIFERENCIAIS - DESCONSTRUÇÃO DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE - IMPOSSIBILIDADE. A boa-fé é um princípio que tem por escopo conformar a autonomia privada, cria deveres anexos às partes de determinada relação jurídica, limita direitos subjetivos destas e exerce função hermenêutico-integrativa. A boa-fé deve ser resguardada antes e após a relação obrigacional. Portanto, exsurge como parâmetro interpretativo na busca da completude da relação obrigacional no que não foi previsto pelas partes, com o objetivo de se garantir a finalidade do pactuado. Assim, nesse ponto, a boa-fé se aplica na interpretação da cláusula para se restabelecer o equilíbrio contratual e assegurar as situações diferenciadas que se estabelecem. Na espécie, a interpretação conferida à norma coletiva pela empresa-demandada encerra processo de desconstrução deletéria dos princípios constitucionais do direito do trabalho, entre eles, o da igualdade. Nas palavras do Min. Alberto Bresciani: "Se o Direito empresta a determinadas situações - no caso, regimes e condições especiais de trabalho - força de fator distintivo, atribuindo-lhes tratamento jurídico desigual, como forma de realizar o princípio da igualdade material, não cabe aos aplicadores, ainda que sob a alegação de dar efetividade ao princípio constitucional da isonomia, desconsiderar esses elementos de diferenciação, que, volto a frisar, contam com tutela legal e constitucional. (Processo TST-RR-887-20.2011.5.05.0006, DEJT de 20/9/2013). Assim, a isonomia reversa inscrita na sugestão de tratamento dos desiguais como se iguais fossem, ou seja, ensejando a desconsideração de diferenciais estabelecidos pela própria norma para os desiguais, não merece nenhuma guarida. A isonomia substancial parte do tratamento desigual para aqueles que estão em situação desigual. Desigual está, sim, aquele que trabalha em condição perigosa ou insalubre e aquele que não trabalha nas mesmas condições. Nessas circunstâncias, não se pode incluir, para efeito de dedução da incidência do cálculo da RMNR, o valor desses adicionais que dependem da prestação de trabalho. É prestação, não é uma eventualidade, não é um benefício, não é uma cláusula; é trabalho em condições diferenciadas. Precedentes da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais.

Recurso de revista conhecido e provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-33800-14.2011.5.21.0005, em que é Recorrente JOSÉ GIL DE BRITO e são Recorridos PETRÓLEO BRASILEIRO S.A. - PETROBRAS e UNIÃO (PGF).

O 21º Tribunal Regional do Trabalho, mediante o acórdão a fls. 939-949, deu provimento ao recurso ordinário interposto pela reclamada para reformar a sentença de origem, sintetizando seu entendimento na seguinte ementa, a fls. 939:

PETROBRÁS - RMNR - NATUREZA E FINALIDADE DO INSTITUTO - INTERPRETAÇÃO DA NORMA COLETIVA QUE CRIA O COMPLEMENTO DE RMNR. A natureza da RMNR - Remuneração Mínima por Nível e Regime não é de rubrica de salarial. Ela é, ao contrário, um parâmetro remuneratório mínimo estabelecido em norma coletiva. É uma espécie de piso. E sua finalidade é de instrumentalizar o princípio constitucional da isonomia. Neste sentido, supor que a expressão "sem prejuízo de eventuais outras parcelas pagas, podendo resultar em valor superior a RMNR", contida no final da regra coletiva que trata da forma de apuração do "Complemento de RMNR" indicasse que um empregado cuja remuneração mensal seja superior à própria RMNR (por causa de agregação de adicionais resultantes de regime e/ou condições especiais de trabalho) possa receber, cumulativamente, tais adicionais e também a própria complementação de RMNR, implica uma interpretação tal que atribui a esse instituto natureza salarial (não prevista nos instrumentos normativos), e conduz à idéia (igualmente absurda) que desvirtua também a finalidade do instituto, porque cria uma espécie de "supersalário" para os empregados que eventualmente laborem em regime e/ou condições especiais de trabalho, promovendo odiosa e indesejável discriminação, afastando-se do princípio da isonomia para cuja instrumentalização foi coletivamente criado.

  1. Recurso conhecido e provido para julgar improcedente a reclamação.

Inconformado, o reclamante interpõe o presente recurso de revista, com fulcro nas alíneas "a" e "c" do art. 896 da CLT, a fls. 980-999, postulando a revisão do julgado quanto ao tema supracitado.

O recurso foi admitido pela decisão singular a fls. 1022-1024, merecendo contrariedade a fls. 1029-1053.

Desnecessária a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 83, § 2º, inciso II, do Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho.

É o relatório.

V O T O

1 - CONHECIMENTO

Presentes os pressupostos extrínsecos de admissibilidade do recurso de revista, concernentes à tempestividade (fls. 978 e 980) e à representação processual (fls. 1000), passo ao exame dos seus pressupostos específicos de admissibilidade.

1.1 - COMPLEMENTAÇÃO DE RMNR

- PETROBRAS

A Corte regional deu provimento parcial ao recurso ordinário da empresa e julgou improcedente a pretensão de diferenças de complemento "RMNR", consoante os fundamentos estampados a fls. 939-949:

2.2. Complementação de RMNR.

A eminente Juíza Convocada Lygia Maria de Godoy Batista Cavalcanti, Relatora do sorteio, negava provimento ao recurso, mantendo a sentença que havia condenado a Petrobrás a pagar diferença de complemento de RMNR, com reflexos em gratificação natalina, férias proporcionais (com o terço constitucional), e também no FGTS.

Divergi, sendo acompanhado pelo eminente Desembargador Eridson Medeiros, obtendo assim a maioria da E. 2ª Turma, motivo por que fui designado para lavrar o acórdão.

Prima facie, saliente-se que a controvérsia é exclusivamente sobre matéria de direito, atinente à interpretação de normas insertas nos Acordos Coletivos de Trabalho de 2005 (Termo Aditivo); de 2007; e de 2009.

A parte autora afirma que a Petrobrás vem incluindo outros descontos no cômputo do seu "Complemento de RMNR", descontando, além do Salário Básico (SB), da Vantagem Pessoal - Acordo Coletivo de Trabalho (VP-ACT) e da Vantagem Pessoal - Subsidiária (VP-SUB); outras parcelas remuneratórias; sendo que tais descontos são vedados por lei (art. 462 da CLT).

Em suma, alega que a demandada não está efetuando o pagamento do "Complemento de RMNR" conforme o estabelecido na cláusula 35 do Acordo Coletivo de Trabalho de 2007; e na cláusula 36 do Acordo Coletivo de Trabalho de 2009.

Nas citadas normas coletivas, a regra que dispõe sobre o pagamento dessa parcela "Complemento de RMNR" está assim redigida:

"Será paga sob o título de 'Complemento da RMNR' a diferença resultante entre a 'Remuneração Mínima por Nível e Regime' de que trata o caput e: o Salário Básico (SB), a Vantagem Pessoal - Acordo Coletivo de Trabalho (VP-ACT) e a Vantagem Pessoal - Subsidiária (VP-SUB), sem prejuízo de eventuais outras parcelas pagas, podendo resultar em valor superior a RMNR" (grifos acrescidos).

A r. sentença acolheu tal tese, tendo a julgadora de piso destacado que a sede da controvérsia residia na interpretação da expressão continuativa "sem prejuízo de eventuais outras parcelas pagas, podendo resultar em valor superior a RMNR".

Segundo ela, essa regra, tal qual redigida, sugere sempre que a verba "Complemento de RMNR" decorreria da diferença aritmética entre a rubrica RMNR e o conjunto formado pelo Salário Básico (SB), a Vantagem Pessoal - Acordo Coletivo de Trabalho (VP-ACT), e a Vantagem Pessoal - Subsidiária (VP-SUB); e que a locução acima transcrita em negrito seria o alerta às partes convenentes de que o cômputo do "Complemento de RMNR") não tem o condão de prejudicar o recebimento (pelos empregados) de eventuais outras parcelas, fato este - que consoante consignado na r. sentença - pode resultar, inclusive, no pagamento em valor superior a RMNR.

Assim, segundo a r. sentença, essa expressão contida no final da regra sob comento teria por escopo assegurar que mesmo recebendo remuneração mensal superior à própria RMNR (por causa de agregação de parcelas outras, tais como adicional noturno, adicional de periculosidade ou mesmo de insalubridade), tal fato não obstaria o recebimento dessa complementação, e tampouco o recebimento de ditas parcelas adicionais.

A recorrente, por sua vez, alega que a interpretação dada pela julgadora de piso, à expressão contida no final da regra coletiva em debate (= "sem prejuízo de eventuais outras parcelas pagas, podendo resultar em valor superior a RMNR") e conduz a um grave equívoco. Nesse passo, argumenta: "o que de fato pode ultrapassar a RMNR não é o seu complemento, mas a própria remuneração bruta do empregado quando somadas todas as parcelas a que o mesmo pode fazer jus" (fl. 509, item 25).

Nessa linha de argumentação, ela transcreve trecho da sentença da Juíza do Trabalho da 19ª Vara do Trabalho de Manaus, prolatada em 11/02/2011, nos autos da RT nº 0000056.62-2011.5.11.0019 (fl. 406, linhas 01/10), de seguinte teor, claris verbis:

"Note-se que se a pretensão do reclamante vingar, sua remuneração correspondente com a exclusão do adicional de periculosidade, adicional noturno e adicional de HRA, o complemento de RMNR tornar-se-ia bem superior à percebida pelos demais empregados não sujeitos às condições de risco, revezamento e trabalho noturno, o...

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