Acórdão Inteiro Teor nº RR-1010-52.2011.5.05.0221 TST. Tribunal Superior do Trabalho 3ª Turma, 12 de Febrero de 2014

Número do processoRR-1010-52.2011.5.05.0221
Data12 Fevereiro 2014
Órgão3ª Turma

A C Ó R D Ã O

(3ª Turma)

GMMGD/gus/vln/rm RECURSO DE REVISTA. 1. PRELIMINAR DE NULIDADE POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. 2. PRESCRIÇÃO. 3. REFLEXOS SOBRE O ANUÊNIO. O recurso de revista não preenche os requisitos previstos no art. 896 da CLT, pelo que inviável o seu conhecimento. Recurso de revista não conhecido, nos aspectos. 4. REMUNERAÇÃO MÍNIMA POR NÍVEL E REGIME (RMNR). INTERPRETAÇÃO DE NORMA COLETIVA. VERBAS DEDUTÍVEIS PARA O CÁLCULO DO COMPLEMENTO DE RMNR. ADICIONAIS. CONFRONTO DO CRITÉRIO CONSTITUCIONAL DE PRESTÍGIO À NEGOCIAÇÃO COLETIVA TRABALHISTA COM OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO IMPÉRIO DA CONSTITUIÇÃO E DAS LEIS IMPERATIVAS DA REPÚBLICA E TAMBÉM DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL ANTIDISCRIMINATÓRIO. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA ADEQUAÇÃO SETORIAL NEGOCIADA EM APLICAÇÃO.

1) No Estado Democrático de Direito estruturado pela Constituição de 1988, prevalece o império do Texto Máximo da República e das leis federais imperativas, salvo nos aspectos que essa normatividade superior indubitavelmente franquear maior espaço de criatividade jurídica à negociação coletiva trabalhista.

2) O império normativo heterônomo acentua-se quando se tratar de regras constitucionais ou legais que buscam fixar vantagens adicionais para trabalhadores que laborem em circunstâncias tipificadas mais gravosas, situação desfavorável que o Direito busca compensar. Desconsiderar a negociação coletiva esse fato - ainda que sob o artificioso epíteto de restauração da isonomia - é não compreender a estrutura e lógica normativas do Estado Democrático de Direito de 1988, como também criar regras coletivas negociadas manifestamente discriminatórias, que acentuam as vantagens de quem trabalha em circunstâncias mais benéficas, em detrimento de quem trabalha em circunstâncias reconhecidamente mais penosas.

3) O caso dos autos diz respeito à interpretação a ser conferida à cláusula normativa que fixou o critério a ser utilizado para o cálculo da parcela denominada "Complemento de RMNR - Remuneração Mínima por Nível e Regime" - instituída pela Petrobras, via negociação coletiva. Registre-se que a RMNR consiste na estipulação de um valor mínimo, por nível e região, e que seria pago - segundo a norma coletiva brandida pela Reclamada - aos empregados como forma de equalizar os valores por eles percebidos. A aludida norma coletiva determina que, para a apuração do valor a ser pago a título de "Complemento de RMNR", serão deduzidas da RMNR as seguintes parcelas: "o salário básico, a vantagem pessoal - acordo coletivo de trabalho (VP-ACT) e a vantagem pessoal - subsidiária (VP-SUB), sem prejuízo de eventuais outras parcelas pagas". Na hipótese dos autos, o cerne da discussão repousa, precisamente, na possibilidade de se considerar (ou não) os adicionais percebidos pelo Reclamante como parcelas dedutíveis para o cálculo do "Complemento de RMNR".

4) Ora, sabe-se que os adicionais, regra geral, consistem em parcelas contraprestativas suplementares devidas ao empregado em virtude do exercício do trabalho em circunstâncias tipificadas mais gravosas. Ou seja: paga-se um plus em virtude do desconforto, desgaste ou risco vivenciados, da responsabilidade e encargos superiores recebidos, do exercício cumulativo de funções, etc. Nesse contexto, acolher a norma coletiva analisada, em todo o seu teor, ou o modelo de interpretação proposto pela Reclamada, no sentido de que o pagamento da parcela "Complemento de RMNR" deve se dar com a dedução do valor devido a título, por exemplo, de adicional de periculosidade, significa desvirtuar toda a ideia de isonomia e, principalmente, antidiscriminação - isonomia curiosamente mencionada pelo instrumento normativo -, uma vez que estar-se-ia proporcionando aos empregados que não se submetem a situações gravosas de trabalho o mesmo padrão remuneratório concedido àqueles empregados que se submetem a tais condições.

5) Frise-se que, pelo princípio da adequação setorial negociada, as normas autônomas juscoletivas construídas para incidirem sobre uma certa comunidade econômico-profissional podem prevalecer sobre o padrão geral heterônomo justrabalhista desde que respeitados certos critérios objetivamente fixados. São dois esses critérios autorizativos: a) quando as normas autônomas juscoletivas implementam um padrão setorial de direitos superior ao padrão geral oriundo da legislação heterônoma aplicável; b) quando as normas autônomas juscoletivas transacionam setorialmente parcelas justrabalhistas de indisponibilidade apenas relativa (e não de indisponibilidade absoluta). Na hipótese, contudo, a despeito da norma coletiva implementar padrão setorial superior, concedendo vantagem não prevista em lei, transaciona normas de indisponibilidade absoluta, afastando critério de diferenciação salarial criado pela própria Constituição da República e pela Lei Federal Imperativa, devendo ser considerada inválida, portanto, nesse específico aspecto.

6) Registre-se, ademais, que a própria Constituição Federal de 1988, no âmbito dos direitos fundamentais, mais precisamente em seu art. 7º, XXIII, exige tratamento distinto para o trabalho realizado em situações perigosas. Com efeito, dar guarida a semelhante norma coletiva negociada e a tal exegese proposta pela Reclamada seria o mesmo que admitir, ainda que tacitamente, a supressão, por exemplo, do adicional de periculosidade - o que não se cogita, por se tratar de medida de saúde e segurança do trabalho, garantida por norma de ordem pública (art. 7º, XXIII, CF; art. 193, § 1º, CLT).

7) Ademais, não cabe à negociação coletiva estabelecer suposto e exótico tratamento isonômico quando o próprio ordenamento jurídico - visando instrumentalizar o princípio constitucional da igualdade substancial e da não discriminação - exigir e determinar o tratamento diferenciado.

8) Esclareça-se que somente as vantagens oriundas da Constituição ou de lei imperativa é que não podem ser desconsideradas pela negociação coletiva em análise, por criarem vantagem especial diferenciada, condicionada, em sobreposição ao complexo salarial. No tocante a verbas sem direta imperatividade constitucional ou legal (parcelas criadas por CCT ou ACT ou por regulamento de empresa), naturalmente que não prevalece o limite ora especificado, sendo soberana a regra convencional.

9) Por fim, a corroborar tal entendimento, registre-se que a SBDI-1 desta Corte, na sessão realizada no dia 26.09.2013, em análise ao processo: E-RR-848-40.2011.5.11.0001, decidiu que a interpretação dada à clausula do acordo coletivo que instituiu a RMNR não pode resultar na igualdade entre os empregados que têm direito aos adicionais previstos na ordem jurídica e os que não têm direito a adicional algum, inclusive porque alguns desses adicionais estão previstos, na Constituição, como direitos fundamentais. Recurso de revista conhecido e parcialmente provido, quanto ao tema.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-1010-52.2011.5.05.0221, em que é Recorrente PETRÓLEO BRASILEIRO S.A. - PETROBRAS e Recorrido ALMIR PASSOS FIALHO FILHO.

Em face da decisão do Tribunal Regional do Trabalho de origem, a Parte interpõe o presente recurso de revista, que foi admitido pelo TRT.

Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 83, § 2º, do RITST.

PROCESSO ELETRÔNICO.

É o relatório.

V O T O

I) CONHECIMENTO

PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS

Atendidos todos os pressupostos comuns de admissibilidade, examino os específicos do recurso de revista.

PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS

  1. PRELIMINAR DE NULIDADE POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. 2. PRELIMINAR DE LITISPENDÊNCIA. 3. PRESCRIÇÃO.

Quanto aos temas em epígrafe, o Tribunal Regional assim se manifestou:

MÉRITO

PRESCRIÇÃO

Suscita, a reclamada, a prejudicial de mérito consubstanciada na aplicabilidade da prescrição bienal no caso concreto, afirmando que a reclamação trabalhista só foi ajuizada quando ultrapassados muito mais de dois anos da alegada aplicação incorreta dos termos do ACT assinado em julho de 2007, oportunidade em que foi instituída a RMNR questionada.

Nota-se que a pretensão perseguida pelo autor envolve prestações sucessivas, cujas lesões se renovam mês a mês, razão pela qual a prescrição aplicável é a parcial e não a total como defende a reclamada.

A parcela pleiteada foi instituída em 01/09/2007, sendo que a prescrição quinquenal afetaria apenas os direitos anteriores a 15/06/2006, lapso anterior ao quinquênio contado retroativamente à data de ajuizamento da demanda.

No caso dos autos, entendo inaplicável a súmula 294 invocada pela reclamada, porquanto as prestações perseguidas pelo autor não decorreram de alteração contratual do acordo coletivo, sendo certo que a RMNR foi instituída pelo ACT em julho de 2007, consoante afirma a própria reclamada na sua defesa.

Mantenho, pois, a decisão.

(...)

REFLEXO NO ANUÊNIO

Insurge-se a reclamada, por fim, em face do deferimento do pedido de reflexo do complemento da RMNR sobre o anuênio.

Sustenta que o anuênio é previsto na cláusula quinta do ACT 2009-2011, chamado de adicional por tempo de serviço, sendo seu valor fixado conforme o anexo III do documento, de acordo com o número de anos do obreiro na empresa, num percentual sobre o salário previsto na tabela.

Conclui, assim, que esta parcela não sofre influência de diferenças oriundas do complemento da RMNR pagas ao reclamante.

Examino.

Data venia das considerações apresentadas pela Recorrente constata-se que a RMNR nada mais é do que contraprestação salarial. Sendo salário, sobre ele deve sim incidir o anuênio como corretamente decidido pelo a quo.

Mantenho.

No julgamento dos embargos de declaração ficou consignado o seguinte entendimento:

MÉRITO

PREQUESTIONAMENTO. OMISSÃO. RMNR.

Sustenta a embargante que no caso dos autos, em que há matéria a ser discutida em sede de recurso extremo, é imprescindível a oposição dos embargos declaratórios visando prequestionamento de matéria relevante à sustentação do referido recurso, à luz do...

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