Decisões Monocráticas nº 2279 de STF. Supremo Tribunal Federal, 8 de Diciembre de 2013

Data08 Dezembro 2013
Número do processo2279

DECISÃO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA – CONFLITO FEDERATIVO – INEXISTÊNCIA – DECLINAÇÃO DE COMPETÊNCIA

O Gabinete prestou as seguintes informações: Com a inicial de folha 2 a 66, Caiman Agropecuária Ltda.

formalizou ação sob o rito ordinário contra a Fundação Nacional do Índio – FUNAI e a União visando seja declarada a legitimidade do domínio da parte autora sobre a totalidade do imóvel rural denominado Fazenda Caiman, e anulado o Processo Administrativo FUNAI/BSB/0981/82, alusivo à identificação, delimitação e ampliação da Terra Indígena Cachoeirinha, localizada nos Municípios de Miranda e Aquidauana, Mato Grosso do Sul, e a Portaria nº 791/2007, do Ministro da Justiça, a qual implicou a declaração da posse permanente da área pelo grupo indígena Terena.

Consoante argumenta, é possuidora, ela mesma e antecessores, há mais de 150 anos, e proprietária, há quase 115 anos, do imóvel rural denominado Fazenda Caiman, com área registrada de 52.387,6 hectares, situado no Município de Miranda/MS, descrito e confrontado nas Matrículas nº 4.206 e 4.208 do 1º Tabelionato e Registro de Imóveis daquela Comarca.

Narra haver a Funai, sem a realização de vistoria, incluído parcela do imóvel – cerca de 1,8 mil hectares – no relatório fundiário elaborado para a demarcação dos limites da Terra Indígena Cachoeirinha.

Destaca remontar ao ano de 1849 a posse particular sobre a área, tendo sido reconhecida pelo ente estadual em processo de justificação do qual resultou a outorga do título.

Discorre sobre a cadeia dominial do bem.

Ressalta a inobservância ao disposto no Decreto nº 1.775/96, não tendo sido realizada vistoria física na área, nem cientificada a proprietária acerca dos trabalhos técnicos.

Argui a nulidade do relatório circunstanciado que instrui o processo de revisão da terra indígena.

Aponta olvidados os princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal.

Segundo argumenta, o processo de regularização fundiária aberto pela Funai em 1982 teve seu objeto alterado.

Embora, inicialmente, não estivesse voltado à ampliação da área, veio a incluir 34.000 hectares de terras produtivas pertencentes a particulares.

Assevera a precariedade da prova atinente à ocupação indígena da área.

Diz da ocorrência de equívocos quanto à localização de pontos referenciais dos limites citados pelos índios, especialmente no tocante à situação do retiro Olho D´Água e do Córrego Agachi.

Alude a mapa elaborado pelos indígenas em 1985, no qual consignado que a extensão da posse indígena seria de 2.600 hectares, quantitativo inferior ao resultante dos recentes estudos da Funai.

Aponta erro nos cálculos aritméticos feitos pelos técnicos da Autarquia.

Tece considerações sobre os critérios da imemorialidade e a tradicionalidade da ocupação, no que impossível conferir proteção retroativa a áreas abandonadas pelos silvícolas.

Apresenta relato histórico da vinda dos índios Terena para a região, destacando o processo de desenvolvimento econômico e aculturação daquela comunidade.

Ressalta os aspectos socioeconômicos da Fazenda Caiman e da importância de preservar a fauna e a flora locais, tendo sido criada, no imóvel, unidade de conservação.

Sustenta a impossibilidade de interpretar o artigo 231 da Carta da República de modo a reconhecer a posse indígena em relação a período anterior à promulgação da atual Lei Maior.

Cita o Verbete nº 650 da Súmula do Tribunal.

Evoca jurisprudência.

A ação foi proposta perante a 1ª Vara Federal da Seção Judiciária de Mato Grosso do Sul.

As contestações da Funai e da União encontram-se à folha 1.039 à 1.124 e a à folha 1.252 à 1.272, respectivamente.

À folha 1.275 à 1.284, a autora postulou a antecipação dos efeitos da tutela para suspender o procedimento de demarcação na Fazenda Caiman até pronunciamento definitivo neste processo.

A medida acauteladora foi deferida à folha 1.294 à 1.301.

Às folhas 1.306 e 1.307, a autora requereu a juntada de prova documental e a produção de perícia histórico-antropológica e agronômico-fundiária.

Consta à folha 1.314 à 1.318 cópia de decisão proferida no Agravo de Instrumento nº 2008.03.00.041981-0, na qual cassada a liminar.

A Funai, às folhas 1.374 e 1.375, e a União, à folha 1.377, afirmaram não ter outras provas a produzir.

À folha 11.382, o Juízo determinou a citação da Comunidade Indígena Cachoeirinha.

O Estado de Mato Grosso do Sul pleiteou, à folha 1.383 à 1.415, o ingresso na qualidade de assistente litisconsorcial da autora.

Postulou, ainda, a remessa do caso ao Supremo ante a ocorrência de conflito federativo.

A União e a Funai manifestaram-se pela inadmissão do ente estadual em razão da inexistência de interesse jurídico direto.

A autora disse ser favorável ao pedido.

Foi juntada, à folha 1.462, cópia de pronunciamento por meio do qual o Regional Federal da 1ª Região indeferiu o efeito suspensivo buscado pela autora no agravo de instrumento interposto contra a determinação de citação da Comunidade Indígena Cachoeirinha.

O Ministério Público Federal opinou, na origem, à folha 1.468 à 1.472, pela admissão da intervenção anômala do Estado de Mato Grosso do Sul, assim como pela competência do Juízo federal.

À folha 1.476 à 1.482, a Comunidade Indígena Cachoeirinha sustenta a improcedência do pedido.

À folha 1.483 à 1.486, ante o fato de vislumbrar a presença de conflito federativo e de conexão com a Ação Cível Originária nº 1.383, em curso neste Tribunal, o Juízo de origem determinou o encaminhamento do processo ao Supremo. 2.

Percebam os parâmetros do caso.

O processo foi remetido ao Supremo em virtude da conexão com a Ação Cível Originária nº 1.383 e da ocorrência de possível conflito federativo, motivado pelo antagonismo dos interesses, de um lado, do Estado de Mato Grosso do Sul e, de outro, da Funai e da União.

O ente estadual aponta a possibilidade de ser responsabilizado pela emissão dos títulos dominiais se o pedido formulado pela autora for julgado improcedente.

A situação não atrai a aplicação do artigo 102, inciso I, alínea f, da Carta da República.

Ao reapreciar a preliminar de incompetência na Ação Cível Originária nº 1.513, na qual também se discute a ampliação da Reserva Indígena Cachoeirinha, considerados os limites de determinado imóvel rural – Fazenda Charqueada do Agachy –, assim decidi em 23 de maio de 2012: [...] 2.

A presença de entes federativos em polos opostos da lide é requisito para que seja fixada a competência originária do Supremo decorrente do previsto no artigo 102, inciso I, alínea f, da Carta Federal.

Sob esse ângulo, verifico não ter havido sequer análise do requerimento de ingresso formalizado pelo Estado de Mato Grosso do Sul.

De início, portanto, revela-se inviável a apreciação da demanda diretamente pelo Tribunal Constitucional.

Há mais.

Exige-se que o conflito judicializado se mostre suficientemente grave, a ponto de causar risco à estabilidade do pacto federativo.

Precedente: Questão de Ordem na Ação Cível Originária nº 1.048, relator Ministro Celso de Mello.

Somente matérias dotadas de relevância são alçadas ao Supremo e é inegável que os parâmetros deste processo não se amoldam a esse requisito.

O caso concreto versa simplesmente ação proposta por particulares contra a União, entes autárquicos e comunidades indígenas objetivando afastar o decreto que implicou a demarcação de reserva indígena, considerado certo imóvel localizado no Estado de Mato Grosso do Sul.

O interesse indicado no pedido de assistência é de natureza puramente econômica e não passa de conjectura, ou seja, o Estado teme a possível responsabilização resultante da perda da propriedade imobiliária que poderá recair sobre os autores.

Cito o acórdão relativo ao exame da Ação Cível Originária nº 519/MT, relator Ministro Néri da Silveira, que ficou assim ementado: 1.

Ação cível originária. 2.

Ação ordinária de nulidade de título dominial cumulada com pedido de cancelamento de matrícula de registro imobiliário, movida pela União Federal. 3.

Pleito de desconstituição do título por inteiro ou apenas na parte relativa à incidência em área de reserva de aldeamento indígena. 4.

Contestação pedindo, em preliminar, a substituição processual alegando resguardo ao direito dos réus, pelo art. 530, do Código Civil, e pela Constituição. 5.

Declinação de competência em favor da Vara Federal de Marabá. 6.

Pleiteia o Instituto de Terras do Pará - ITERPA admissão no feito como litisconsorte passivo necessário, oferecendo contestação.

Admitido o ITERPA, declinou de sua competência, para o STF, o Juiz Federal da Vara Única de Marabá-PA. 7.

Parecer da Procuradoria-Geral da República pelo não conhecimento da ação. 8.

Ação movida pela União Federal contra particular.

Inocorrente hipótese do art. 102, I, alínea f, da Constituição, por não configurada a existência de causa ou conflito entre União Federal e o Estado do Pará. 9.

Competência, para processar e julgar a demanda, do Juízo Federal de primeiro grau.

Precedentes desta Corte. 10.

Ação cível originária não conhecida. 3.

Ante o quadro, reconsidero a decisão de folha 1610 a 1616, assentando a ausência de competência do Supremo para apreciar a controvérsia.

Devolvam o processo ao Juízo remetente, cabendo-lhe decidir sobre a manutenção, ou não, da antecipação de tutela implementada. 4.

Publiquem.

O declínio da competência em favor do Juízo de origem é providência que se impõe em todas as ações nas quais o interesse do Estado de Mato Grosso do Sul – tal como ocorre na espécie – possui natureza econômica e parte do mero receio de vir a ser responsabilizado perante os particulares na hipótese de consignar-se a improcedência do pedido, por eles formulado, de declaração de nulidade do processo administrativo cujo objeto é a ampliação da terra indígena. 3.

Ante o quadro, assento a incompetência do Supremo para apreciar a controvérsia.

Devolvam o processo ao Juízo remetente. 4.

Publiquem.

Brasília, 8 de dezembro de 2013.

Ministro MARCO AURÉLIO Relator

Partes

Recte.(s) : Estado de SÃo Paulo

proc.(a/S)(Es) : Procurador-Geral do Estado de SÃo Paulo

recdo.(a/S) : Canguru VeÍculos Ltda

adv.(a/S) : Vera LÚcia Sundfeld Silva e Outro(a/S)

Publica��o

DJe-248 DIVULG 13/12/2013 PUBLIC 16/12/2013

Observa��o

05/02/2014

legislação Feita por:(Bru)

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