Decisões Monocráticas nº 15769 de STF. Supremo Tribunal Federal, 14 de Junio de 2013

Número do processo15769
Data14 Junho 2013

Decisão: Vistos.

Cuida-se de reclamação constitucional, com pedido de liminar, ajuizada pelo Sindicato dos Delegados de Polícia Civil do Estado de Rondônia – Sindepro e Outro(a/s) em face do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, cuja decisão teria afrontado a autoridade do Supremo Tribunal Federal e a eficácia da decisão proferida nos Mandados de Injunção n°s 670/ES, 708/PB e 712/PA.

Os fundamentos apresentados na peça vestibular podem ser assim sintetizados: a) na origem, cuida-se de Ação Cautelar Inominada ajuizada pelo Estado de Rondônia, com o objetivo de obstar o exercício do direito de greve pelos servidores substituídos pelas entidades sindicais autoras da presente reclamação, tendo requerido o prazo de 30 (trinta) dias para ingressar com ‘ação declaratória de nulidade da greve’; b) o relator do processo decidiu liminarmente a causa, tendo determinado o retorno de 100% dos integrantes da categoria ao trabalho, bem como fixado multa diária pelo inadimplemento no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).

Nesse tocante, os reclamantes defendem que: Tal decisão cerceia o direito de greve, atenta contra a liberdade sindical e ainda afronta a autoridade das decisões proferidas por esse Supremo Tribunal Federal nos Mandados de Injunção n° 670/ES, 708/PB e 712/PA, nos quais foi removido o obstáculo ao exercício do direito de greve.

  1. o direito de greve do servidor público está assegurado na Constituição Federal de 1988, tendo o Supremo Tribunal Federal, nas ações paradigmas, assentado a legitimidade do seu exercício nos termos da legislação editada para regulamentar o direito dos trabalhadores na iniciativa privada, razão pela qual a manutenção da decisão reclamada, que determin[ou] a suspensão total do movimento grevista, contraria não apenas a autoridade do STF, mas o disposto no art. 37, VII, da CF/88; Os reclamantes defendem que: (...) a r.

decisão que veda à categoria dos servidores da polícia civil o direito de livremente se manifestarem em oposição às condições de trabalho a que estão sendo submetidos, está eivada, data venia, de inequívoco retrocesso quanto às garantias fundamentais conquistadas pela cidadania ao longo da história universal.

Requerem que seja deferido o pedido de liminar para suspender os efeitos da decisão reclamada e, no mérito, que seja julgada procedente a reclamação constitucional, tronando definitivo o provimento cautelar.

A determinação de emenda da inicial, em respeito aos arts. 258 e 259 do CPC, foi atendida pelos autores (Petição nº 26244/2013).

Compulsados os autos, entendo que os documentos juntados pela parte reclamante a fim de comprovar suas alegações e instruir o processo são suficientes para a compreensão da controvérsia, motivo pelo qual deixo de requisitar informações à autoridade impetrada.

Dispenso, ainda, a oitiva da Procuradoria-Geral da República ante o caráter iterativo da controvérsia (art. 52, parágrafo único, RISTF).

É o relatório.

Os reclamantes juntaram documentos por meio eletrônico, dentre eles cópia da decisão proferida pelo e.

TJRO indicada como ato reclamado, cujos termos transcrevo abaixo: (...) Trata-se de pedido liminar formulado em ação cautelar, na qual o Estado de Rondônia pretende seja determinada a imediata suspensão do movimento grevista deflagrado pelos servidores da Polícia Civil (SINSEPOL, SINDEPRO, SINPEC), com fixação de multa diária por descumprimento da medida, com o fundamento de que a greve é abusiva por não atender aos requisitos legais e diante da existência de ameaça à ordem social.

Forçosa, neste momento, a análise tão somente dos pressupostos que animam as liminares, quais sejam, a fumaça do bom direito e o perigo da demora, os quais, no presente caso, visualizo de plano ante a essencialidade dos serviços inerentes à segurança pública e o crescimento exponencial da violência neste Estado.

Por entendimento do Supremo Tribunal Federal, não há dúvida quanto a serem os servidores públicos titulares do direito de greve.

Todavia, embora reconheça aos servidores públicos o direito constitucional à greve, equipara a categoria da Polícia Civil à Militar, em razão da essencialidade do serviço e à segurança pública.

É importante salientar que a Constituição Federal é uma totalidade de direitos harmônica e não um conjunto de enunciados soltos que se possa ler palavra por palavra de forma estanque, é todo um complexo de direitos e deveres interligados.

Neste sentido há que ser ponderado que entre alguns serviços públicos a coesão social impõe sejam prestados de forma plena, em sua totalidade, especialmente os incumbidos diretamente da segurança pública e saúde, pois são assegurados à sociedade, de forma basilar, como direitos fundamentais, devendo tais direitos prevalecerem sobre o direito de greve dos servidores públicos.

Extrai-se, portanto, que as atividades desenvolvidas pela Polícia Civil são análogas, para esse efeito, às dos militares, em relação aos quais a Constituição Federal expressamente proíbe a greve (art. 142, §3º, IV). (…) Destaca-se do voto a manifestação do douto Ministro Cezar Peluso [na Rcl nº 6.568/SP], um dos que endossaram plenamente o voto de Eros Grau, a observação de que a Polícia Civil não pode ser autorizada, como ocorreu em São Paulo, a funcionar com apenas 80% de seus efetivos, se nem com 100% deles consegue garantir plenamente a ordem pública e garantir ao cidadão a segurança física e a proteção de seus bens, assegurada pela Constituição.

Portanto, diante da situação análoga neste ente da federação, é de se ponderar que a presente situação extrapola simples questões de ordem negocial entre a administração do Estado de Rondônia e seus servidores pertencentes à carreira policial, pois a orquestração de movimentos paredistas arranham a ordem política do Estado, já fragilizado, o que impulsiona o Poder Judiciário a evitar o caos social resultante do efeito cascata nefasto à sociedade.

Assim, concedo a liminar para determinar que seja mantido em atividade normal todo o quadro efetivo da Polícia Civil, proibidos, também, atos que contrariem esta decisão, atentatórios ao patrimônio público, como o esvaziamento de pneus de viaturas e aglomerações nas entradas de delegacias e demais prédios públicos, impedindo a execução das atividades policiais como a troca de plantões e saída de viaturas, sob pena de multa diária para cada requerido no valor de R$ 50.000, até o julgamento final desta demanda.

Alegam os reclamantes violação da eficácia da decisão proferida nos Mandados de Injunção n°s 670/ES, 708/PB e 712/PA, nos quais esta Suprema Corte, após reconhecer a mora legislativa na regulamentação do direito previsto no art. 37, VII, da CF/88, adotou solução normativa e determinou (...) a aplicação das Leis nos 7.701/1988 e 7.783/1989 aos conflitos e às ações judiciais que envolvam a interpretação do direito de greve dos servidores públicos civis, respeitadas especificações contidas na decisão.

Por atribuição constitucional, presta-se a reclamação para preservar a competência do STF e garantir a autoridade de suas decisões (art. 102, inciso I, alínea l, da CF/88), bem como para resguardar a correta aplicação de súmula vinculante (art. 103-A, § 3º, CF/88).

Em torno desses conceitos, a jurisprudência desta Corte desenvolveu parâmetros à utilização dessa figura jurídica, dentre os quais se destaca a necessidade de aderência estrita do objeto do ato reclamado ao conteúdo das decisões paradigmáticas do STF.

Os atos questionados em qualquer reclamação - nos casos em que se sustenta desrespeito à autoridade de decisão do Supremo Tribunal Federal - hão de se ajustar, com exatidão e pertinência, aos julgamentos desta Suprema Corte invocados como paradigmas de confronto, em ordem a permitir, pela análise comparativa, a verificação da conformidade, ou não, da deliberação estatal impugnada em relação ao parâmetro de controle emanado deste Tribunal (Rcl nº 6.534/MG-AgR, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Celso de Mello, DJe-197, de 17/10/08).

Nos Mandados de Injunção n°s 670/ES, 708/PB e 712/PA, o direito de greve foi analisado por esta Suprema Corte sob a perspectiva do art. 37, VII, da CF/88, que dispõe que: Art

A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (…) VII - o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica; A autoridade reclamada, ao decidir a matéria, equiparou a categoria da Polícia Civil à Militar, em razão da essencialidade do serviço e à (sic) segurança pública, tendo fundamentado a permanência na atividade normal pela totalidade do efetivo da Polícia Civil do Estado de Rondônia no art. 142, § 3º, IV, da CF/88, que assim dispõe: IV - ao militar são proibidas a sindicalização e a greve; Conforme assentado na decisão reclamada, há precedente colegiado do STF em que se analisou a amplitude da decisão proferida no julgamento do mandado de injunção n. 712, oportunidade em que se decidiu que as atividades desenvolvidas pela polícia civil são análogas, para esse efeito, às dos militares, em relação aos quais a Constituição expressamente proíbe a greve [art. 142, § 3º, IV].

O precedente possui a seguinte ementa: RECLAMAÇÃO.

SERVIDOR PÚBLICO.

POLICIAIS CIVIS.

DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE.

SERVIÇOS OU ATIVIDADES PÚBLICAS ESSENCIAIS.

COMPETÊNCIA PARA CONHECER E JULGAR O DISSÍDIO.

ARTIGO 114, INCISO I, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.

DIREITO DE GREVE.

ARTIGO 37, INCISO VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.

LEI N. 7.783/89.

INAPLICABILIDADE AOS SERVIDORES PÚBLICOS.

DIREITO NÃO ABSOLUTO.

RELATIVIZAÇÃO DO DIREITO DE GREVE EM RAZÃO DA ÍNDOLE DE DETERMINADAS ATIVIDADES PÚBLICAS.

AMPLITUDE DA DECISÃO PROFERIDA NO JULGAMENTO DO MANDADO DE INJUNÇÃO N. 712.

ART. 142, § 3º, INCISO IV, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.

INTERPRETAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO.

AFRONTA AO DECIDIDO NA ADI 3.395.

INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO PARA DIRIMIR CONFLITOS ENTRE SERVIDORES PÚBLICOS E ENTES DA ADMINISTRAÇÃO ÀS QUAIS ESTÃO VINCULADOS.

RECLAMAÇÃO JULGADA PROCEDENTE. 1.

O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o MI n. 712, afirmou entendimento no sentido de que a Lei n. 7.783/89, que dispõe sobre o exercício do direito de greve dos trabalhadores em geral, é ato normativo de início inaplicável aos servidores públicos civis, mas ao Poder Judiciário dar concreção ao artigo 37, inciso VII, da Constituição do Brasil, suprindo omissões do Poder Legislativo. 2.

Servidores públicos que exercem atividades relacionadas à manutenção da ordem pública e à segurança pública, à administração da Justiça --- aí os integrados nas chamadas carreiras de Estado, que exercem atividades indelegáveis, inclusive as de exação tributária --- e à saúde pública.

A conservação do bem comum exige que certas categorias de servidores públicos sejam privadas do exercício do direito de greve.

Defesa dessa conservação e efetiva proteção de outros direitos igualmente salvaguardados pela Constituição do Brasil. 3.

Doutrina do duplo efeito, segundo Tomás de Aquino, na Suma Teológica (II Seção da II Parte, Questão 64, Artigo 7).

Não há dúvida quanto a serem, os servidores públicos, titulares do direito de greve.

Porém, tal e qual é lícito matar a outrem em vista do bem comum, não será ilícita a recusa do direito de greve a tais e quais servidores públicos em benefício do bem comum.

Não há mesmo dúvida quanto a serem eles titulares do direito de greve.

A Constituição é, contudo, uma totalidade.

Não um conjunto de enunciados que se possa ler palavra por palavra, em experiência de leitura bem comportada ou esteticamente ordenada.

Dela são extraídos, pelo intérprete, sentidos normativos, outras coisas que não somente textos.

A força normativa da Constituição é desprendida da totalidade, totalidade normativa, que a Constituição é.

Os servidores públicos são, seguramente, titulares do direito de greve.

Essa é a regra.

Ocorre, contudo, que entre os serviços públicos há alguns que a coesão social impõe sejam prestados plenamente, em sua totalidade.

Atividades das quais dependam a manutenção da ordem pública e a segurança pública, a administração da Justiça --- onde as carreiras de Estado, cujos membros exercem atividades indelegáveis, inclusive as de exação tributária --- e a saúde pública não estão inseridos no elenco dos servidores alcançados por esse direito.

Serviços públicos desenvolvidos por grupos armados: as atividades desenvolvidas pela polícia civil são análogas, para esse efeito, às dos militares, em relação aos quais a Constituição expressamente proíbe a greve [art. 142, § 3º, IV]. 4.

No julgamento da ADI 3.395, o Supremo Tribunal Federal, dando interpretação conforme ao artigo 114, inciso I, da Constituição do Brasil, na redação a ele conferida pela EC 45/04, afastou a competência da Justiça do Trabalho para dirimir os conflitos decorrentes das relações travadas entre servidores públicos e entes da Administração à qual estão vinculados.

Pedido julgado procedente. (Rcl nº 6.568/SP, Relator o Ministro Eros Grau, Tribunal Pleno, DJe de 25/9/09.

Grifei) Ressalto que não há que se pleitear para o caso dos autos o resultado obtido na decisão acima relatada, uma vez que o juízo de procedência deferido na Rcl nº 6.568/SP deu-se com fundamento na ADI nº 3.395/DF-MC, garantindo-se o julgamento da ação originária pela Justiça comum, e não pela Justiça do Trabalho.

No caso dos autos, a ADI nº 3.395/DF-MC não foi apontada como paradigma de confronto, bem como a autoridade reclamada é o Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, razões pela qual entendo não existir juízo de procedência possível nesta via reclamatória.

Ante o exposto, nego seguimento à reclamação, nos termos do artigo 21, § 1º, do RISTF, prejudicada a análise do pedido liminar.

Publique-se.

Int..

Brasília, 14 de junho de 2013.

Ministro Dias Toffoli Relator Documento assinado digitalmente

Partes

Recte.(s) : JoÃo Manuel Ribeiro de Oliveira

adv.(a/S) : Luis Carlos Moraes Caetano

recdo.(a/S) : MinistÉrio PÚblico do Estado de SÃo Paulo

proc.(a/S)(Es) : Procurador-Geral de JustiÇa do Estado de SÃo Paulo

Publica��o

PROCESSO ELETRÔNICO

DJe-122 DIVULG 25/06/2013 PUBLIC 26/06/2013

Observa��o

02/07/2013

legislação Feita por:(Vlr)

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