Decisões Monocráticas nº 12814 de STF. Supremo Tribunal Federal, 17 de Noviembre de 2011

Número do processo12814
Data17 Novembro 2011

RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL.

ALEGAÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE TESE FIXADA POR ESTA CORTE APENAS EM SEDE DE CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE, E NÃO EM SEDE ABSTRATA.

IMPOSSIBILIDADE DE MANEJO DE RECLAMAÇÃO COMO SUCEDÂNEO DE RECURSOS ORDINÁRIOS.

APLICAÇÃO DA ORIENTAÇÃO FIRMADA NO JULGAMENTO DA RECLAMAÇÃO Nº 10.793/SP, REL.

MIN.

ELLEN GRACIE, AUTORIZANDO O JULGAMENTO MONOCRÁTICO.

RECLAMAÇÃO NÃO CONHECIDA.

Decisão: Cuida-se de Reclamação Constitucional, com pedido de liminar, em face de decisão proferida pela 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro nos autos do Habeas Corpus nº 0043236-17.2011.8.19

O Reclamante alega que foi processado perante o juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Niterói, acusado pela prática de homicídio doloso na direção de veículo automotor sob a influência de álcool, tendo sido condenado nas penas do art. 121, caput, do Código Penal.

Informa que a sentença foi mantida pelo Tribunal de Justiça e atualmente pende de julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça.

Segundo narra, o juiz da 3ª Vara Criminal da Comarca de Niterói teria determinado o cumprimento do acórdão do Tribunal de Justiça, expedindo carta de sentença ao Juízo da Vara de Execuções Penais.

Sustenta que o magistrado de origem incidiu em equívoco ao considerar que o processo já havia transitado em julgado.

Entende que a decisão combatida afronta a autoridade da decisão tomada pelo Supremo no julgamento do RHC 92.852/MC, onde se teria entendido que verificado o não exaurimento da instância ordinária, deve ser permitido que o réu permaneça em liberdade.

Tal decisão estaria em consonância com a tese esposada no HC 84.078, assim ementada: EMENTA: HABEAS CORPUS.

INCONSTITUCIONALIDADE DA CHAMADA 'EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA'.

ART. 5º, LVII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.

DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.

ART. 1º, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1.

O art. 637 do CPP estabelece que '[o] recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância para a execução da sentença'.

A Lei de Execução Penal condicionou a execução da pena privativa de liberdade ao trânsito em julgado da sentença condenatória.

A Constituição do Brasil de 1988 definiu, em seu art. 5º, inciso LVII, que 'ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória'. 2.

Daí que os preceitos veiculados pela Lei n. 7.210/84, além de adequados à ordem constitucional vigente, sobrepõem-se, temporal e materialmente, ao disposto no art. 637 do CPP. 3.

A prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente pode ser decretada a título cautelar. 4.

A ampla defesa, não se a pode visualizar de modo restrito.

Engloba todas as fases processuais, inclusive as recursais de natureza extraordinária.

Por isso a execução da sentença após o julgamento do recurso de apelação significa, também, restrição do direito de defesa, caracterizando desequilíbrio entre a pretensão estatal de aplicar a pena e o direito, do acusado, de elidir essa pretensão. 5.

Prisão temporária, restrição dos efeitos da interposição de recursos em matéria penal e punição exemplar, sem qualquer contemplação, nos 'crimes hediondos' exprimem muito bem o sentimento que EVANDRO LINS sintetizou na seguinte assertiva: 'Na realidade, quem está desejando punir demais, no fundo, no fundo, está querendo fazer o mal, se equipara um pouco ao próprio delinqüente'. 6.

A antecipação da execução penal, ademais de incompatível com o texto da Constituição, apenas poderia ser justificada em nome da conveniência dos magistrados --- não do processo penal.

A prestigiar-se o princípio constitucional, dizem, os tribunais [leia-se STJ e STF] serão inundados por recursos especiais e extraordinários e subseqüentes agravos e embargos, além do que 'ninguém mais será preso'.

Eis o que poderia ser apontado como incitação à 'jurisprudência defensiva', que, no extremo, reduz a amplitude ou mesmo amputa garantias constitucionais.

A comodidade, a melhor operacionalidade de funcionamento do STF não pode ser lograda a esse preço. 7.

No RE 482.006, relator o Ministro Lewandowski, quando foi debatida a constitucionalidade de preceito de lei estadual mineira que impõe a redução de vencimentos de servidores públicos afastados de suas funções por responderem a processo penal em razão da suposta prática de crime funcional [art. 2º da Lei n. 2.364/61, que deu nova redação à Lei n. 869/52], o STF afirmou, por unanimidade, que o preceito implica flagrante violação do disposto no inciso LVII do art. 5º da Constituição do Brasil.

Isso porque --- disse o relator --- 'a se admitir a redução da remuneração dos servidores em tais hipóteses, estar-se-ia validando verdadeira antecipação de pena, sem que esta tenha sido precedida do devido processo legal, e antes mesmo de qualquer condenação, nada importando que haja previsão de devolução das diferenças, em caso de absolvição'.

Daí porque a Corte decidiu, por unanimidade, sonoramente, no sentido do não recebimento do preceito da lei estadual pela Constituição de 1.988, afirmando de modo unânime a impossibilidade de antecipação de qualquer efeito afeto à propriedade anteriormente ao seu trânsito em julgado.

A Corte que vigorosamente prestigia o disposto no preceito constitucional em nome da garantia da propriedade não a deve negar quando se trate da garantia da liberdade, mesmo porque a propriedade tem mais a ver com as elites; a ameaça às liberdades alcança de modo efetivo as classes subalternas. 8.

Nas democracias mesmo os criminosos são sujeitos de direitos.

Não perdem essa qualidade, para se transformarem em objetos processuais.

São pessoas, inseridas entre aquelas beneficiadas pela afirmação constitucional da sua dignidade (art. 1º, III, da Constituição do Brasil).

É inadmissível a sua exclusão social, sem que sejam consideradas, em quaisquer circunstâncias, as singularidades de cada infração penal, o que somente se pode apurar plenamente quando transitada em julgado a condenação de cada qual Ordem concedida. (HC 84078, Relator(a): Min.

EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 05/02/2009, DJe-035 DIVULG 25-02-2010 PUBLIC 26-02-2010 EMENT VOL-02391-05 PP-01048) Pede a concessão de liminar para suspender o processo de Execução Penal nº 0164643-84.2011.8.19.0001, no que se refere à eventual expedição de mandado de prisão, e, ao final, a procedência da Reclamação.

É o relatório.

Passo a decidir.

Em primeiro lugar, insta ressaltar que o trecho citado pelo Reclamante do RHC 92.852/MC não diz respeito a nenhuma decisão do Supremo Tribunal Federal, mas sim a ementa de acórdão do Superior Tribunal de Justiça mencionada em relatório de decisão monocrática proferida pelo Ministro Joaquim Barbosa.

Ademais, ainda que considerado o julgado do HC 84.078 do Supremo Tribunal Federal, não se mostra cabível, na linha do que vem sendo reiterado pela jurisprudência desta Corte, o manejo de reclamação nos casos em que o precedente paradigma, cuja autoridade se reputa violado, tenha sido proferido em sede de controle difuso de constitucionalidade.

Nesse sentido, à guisa de exemplo, cito o quanto decidido no julgamento da Reclamação nº 10.793/SP, Rel.

Min.

Ellen Gracie, cuja ementa passo a transcrever: RECLAMAÇÃO.

ALEGAÇÃO DE INOBSERVÂNCIA POR MAGISTRADO DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DA DECISÃO PROFERIDA PELO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO JULGAMENTO DO MÉRITO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 583.955-RG/RJ.

INSTITUTO DA REPERCUSSÃO GERAL.

COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS DE ORIGEM PARA SOLUCIONAR CASOS CONCRETOS.

CORREÇÃO DA EVENTUAL DESOBEDIÊNCIA À ORIENTAÇÃO ESTABELECIDA PELO STF PELA VIA RECURSAL PRÓPRIA, EM JULGADOS DE MÉRITO DE PROCESSOS COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.

RECLAMAÇÃO NÃO CONHECIDA. 1.

As decisões proferidas pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal quando do julgamento de recursos extraordinários com repercussão geral vinculam os demais órgãos do Poder Judiciário na solução, por estes, de outros feitos sobre idêntica controvérsia. 2.

Cabe aos juízes e desembargadores respeitar a autoridade da decisão do Supremo Tribunal Federal tomada em sede de repercussão geral, assegurando racionalidade e eficiência ao Sistema Judiciário e concretizando a certeza jurídica sobre o tema. 3.

O legislador não atribuiu ao Supremo Tribunal Federal o ônus de fazer aplicar diretamente a cada caso concreto seu entendimento. 4.

A Lei 11.418/2006 evita que o Supremo Tribunal Federal seja sobrecarregado por recursos extraordinários fundados em idêntica controvérsia, pois atribuiu aos demais Tribunais a obrigação de os sobrestarem e a possibilidade de realizarem juízo de retratação para adequarem seus acórdãos à orientação de mérito firmada por esta Corte. 5.

Apenas na rara hipótese de que algum Tribunal mantenha posição contrária à do Supremo Tribunal Federal, é que caberá a este se pronunciar, em sede de recurso extraordinário, sobre o caso particular idêntico para a cassação ou reforma do acórdão, nos termos do art. 543-B, § 4º, do Código de Processo Civil. 6.

A competência é dos Tribunais de origem para a solução dos casos concretos, cabendo-lhes, no exercício deste mister, observar a orientação fixada em sede de repercussão geral. 7.

A cassação ou revisão das decisões dos Juízes contrárias à orientação firmada em sede de repercussão geral há de ser feita pelo Tribunal a que estiverem vinculados, pela via recursal ordinária. 8.

A atuação do Supremo Tribunal Federal, no ponto, deve ser subsidiária, só se manifesta quando o Tribunal a quo negasse observância ao leading case da repercussão geral, ensejando, então, a interposição e a subida de recurso extraordinário para cassação ou revisão do acórdão, conforme previsão legal específica constante do art. 543-B, § 4º, do Código de Processo Civil. 9.

Nada autoriza ou aconselha que se substituam as vias recursais ordinária e extraordinária pela reclamação. 10.

A novidade processual que corresponde à repercussão geral e seus efeitos não deve desfavorecer as partes, nem permitir a perpetuação de decisão frontalmente contrária ao entendimento vinculante adotado pelo Supremo Tribunal Federal.

Nesses casos o questionamento deve ser remetido ao Tribunal competente para a revisão das decisões do Juízo de primeiro grau a fim de que aquela Corte o aprecie como o recurso cabível, independentemente de considerações sobre sua tempestividade. 11.

No caso presente tal medida não se mostra necessária. 12.

Não-conhecimento da presente reclamação. (Rcl 10793, Relator(a): Min.

ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 13/04/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-107 DIVULG 03-06-2011 PUBLIC 06-06-2011 RT v. 100, n. 910, 2011, p. 379-392) Ex positis, e diante da autorização, constante da ata da sessão de julgamento da Reclamação nº 10.793/SP, para que a tese ali firmada seja aplicada monocraticamente em casos similares, não conheço da presente reclamação (RISTF, art. 21, § 1º).

Publique-se.

Brasília, 17 de novembro de 2011.

Ministro Luiz Fux Relator Documento assinado digitalmente

Partes

Agte.(s) : Emanoel Roberto Pereira de Souza

adv.(a/S) : Emanoel Roberto Pereira de Souza

agdo.(a/S) : Valdir Santana da Silva

adv.(a/S) : LaÉrcio Arruda Guilhem

Publica��o

PROCESSO ELETRÔNICO

DJe-225 DIVULG 25/11/2011 PUBLIC 28/11/2011

Observa��o

Legislação Feita por:(Dys)

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