nº 2001.36.00.002938-8 de Tribunal Regional Federal da 1a Região, Quarta Turma, 22 de Febrero de 2005

Magistrado ResponsávelDesembargador Federal Hilton Queiroz
Data da Resolução22 de Febrero de 2005
EmissorQuarta Turma
Tipo de RecursoApelacao Civel

Assunto: Desapropriação Indireta

Autuado em: 1/9/2004 18:26:45

Processo Originário: 20013600002938-8/mt

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2001.36.00.002938-8/MT

RELATOR: EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL HILTON QUEIROZ

APELANTE: NOÊMIA DA GAMA ALBERNAZ

ADVOGADO: SALVADOR POMPEU DE BARROS FILHO E OUTRO(A)

APELADO: UNIÃO FEDERAL

APELADO: FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO - FUNAI

PROCURADOR: HÉLIA MARIA DE OLIVEIRA BETTERO

ACÓRDÃO

Decide a Turma negar provimento à apelação, à unanimidade.

4ª Turma do TRF da 1ª Região - 22/02/2005.

HILTON QUEIROZ

DESEMBARGADOR FEDERAL

RELATÓRIO

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL HILTON QUEIROZ (RELATOR):

Cuida-se de ação ordinária de indenização por desapropriação indireta, proposta por ODENIR VANDONI contra a UNIÃO e a FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO - FUNAI, pleiteando indenização do imóvel adquirido, originalmente, do Estado de Mato Grosso. Aduziu na inicial que, "nos termos da Portaria nº 369/N (doc. 19), de 26 de março de 1976, a FUNAI ao definir os limites para as atividades de caça e coleta necessárias à subsistência dos índios TXUCARRAMÃE destinou-lhes um perímetro de 271 quilômetros, encerrando a área de 292.000 hectares, e inclui no traçado geodésico do POSTO INDÍGENA JARINÃ descrito no memorial publicado no Diário Oficial do Estado de Mato Grosso (doc. 20), de 16 de março de 1977, a gleba de terra de propriedade do autor sem desapropriá-la" (fl. 24).

A sentença proferida pelo Juiz Federal da 1ª Vara de Mato Grosso, Dr. Julier Sebastião da Silva, julgou improcedente o pedido dos autores, concluindo que a área sub judice encontra-se sob o manto da ocupação tradicional e permanente indígena, tendo assim relatado a causa:

"Cuida-se de Ação Ordinária proposta pelo ESPÓLIO DE ODENIR VANDONI, devidamente qualificado nos autos, em desfavor da FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO - FUNAI, e UNIÃO FEDERAL, objetivando perceber indenização por desapropriação indireta, sob o fundamento de que a primeira Ré, agindo sem amparo jurídico, esbulhara uma área de terras de aproximadamente 98607 (noventa e oito mil e seiscentos e sete) hectares, cujo domínio pertencia ao Autor, implantando nesta uma reserva indígena, sendo o referido imóvel integrado ao patrimônio público federal.

Aduz o Autor que é legítimo proprietário de uma gleba de terras constituída por dez lotes rurais, com área de 98.607,3485 hectares, originária de 20 lotes com área total de aproximadamente 200.000 ha, havido no ano de 1966 em condomínio com Henrique Gomes da Silva e depois desmembrado em 09/12/1971, de adquirentes que, por sua vez, os haviam adquirido do Estado de Mato Grosso, tudo devidamente registrado no Cartório de Registro de Imóveis do 2° Oficio da Comarca de Cuiabá.

Diz que pelo Decreto Federal n° 50.455, de 1961, a FUNAI criou o Parque Nacional do Xingu, visando implantar reserva indígena, incluindo nesta a propriedade do Autor, a qual fora, a partir de então, interditada, e destinada exclusivamente aos silvícolas. Porém, no ano de 1971, tal área foi excluída deste Parque, mas que, pela Portaria n° 369/N, de 26 de maio de 1976, a Gleba Jarinã foi destinada para subsistência dos índios Txucarramãe.

Que a Gleba Jarinã não é área indígena, tal como definida pelo Estatuto do Índio, mas tão somente área reservada e, como tal, tem que ser indenizada pela União, conforme Exposição de Motivos Interministerial nº 62. Assim, toda a área pertencente ao Autor fora ocupada pela FUNAI, sem que houvesse a regular desapropriação e conseqüente pagamento do justo preço.

Ao final, requer a procedência da ação, condenando-se os Requeridos no pagamento de indenização por desapropriação indireta, a ser apurada por perícia, acrescidos de juros compensatórios, moratórios, correção monetária, custas processuais e honorários advocatícios.

Juntou procuração e os documentos de fls. 34 usque 281.

O Estado de Mato Grosso, em petição de fls. 287/311, trazendo os documentos de fls. 312/389, pediu sua admissão como litisconsorte ativo, o que foi deferido.

Citada, a FUNAI ofertou a contestação de fls. 414/467, juntando as procurações e documentos de fls. 433/467, subscrita pela UNIÃO FEDERAL, alegando, primeiramente, a prejudicial de nulidade absoluta do título do Autor e, em sede de preliminar, o conflito de competências entre União e Estado e a carência da ação, pois as terras localizam-se em habitat imemorial indígena e o Estado de Mato Grosso não tinha o poder de dispor das terras. No mérito, afirma que o Autor ocupava terras tradicionalmente habitadas pelos índios, tendo o Governo Federal em 16/04/61, através do Decreto n° 50.455, criado o Parque Nacional do Xingu, declarando expressamente estar a referida propriedade incluída na reserva indígena. As terras foram incorporadas ao Posto Indígena Jarinã pois sempre constituíram ocupação permanente das tribos indígenas que vivem ao norte da atual BR-080 e que os Txucarramãe nunca abandonaram seu habitat primário. Que o Estado de Mato Grosso, à época, não poderia ter alienado o imóvel, por saber que o mesmo era de ocupação imemorial dos índios. Requer, ao final, a improcedência da ação, com a condenação do Suplicante no pagamento das verbas de estilo.

O processo foi à Corte Suprema (ACOR 305-9), onde o Ministério Público Federal manifestou-se, às fls.

985/1005, pelo proferimento do saneador, haja vista que as partes são legítimas e não ocorrem nulidades.

O Estado de Mato Grosso, às fls. 1015/1073 e 1123/1148 manifesta-se sobre o incidente de nulidade do título e sobre o mérito da própria ação, pois as terras eram devolutas e de domínio dos Estados e da União e que a CF de 1934 não elencava as terras indígenas como bens federais, só ocorrendo em 1946. Que a União deveria valer- se da ação discriminatória para demarcar tais terras e que só em 1976 os Txucarramãe foram transferidos pela FUNAI, ocorrendo o apossamento administrativo. Verbera que os Txucarramãe residiam, em 1953, conforme a própria FUNAI, há cerca de 40 quilômetros da margem esquerda do Rio Xingu, perto da Cachoeira Von Martius, e não nas terras do Autor e que tal tribo permanecia no Parque Nacional do Xingu quando a FUNAI resolveu definir os limites para aumentar as atividades de caça e coleta, criando, a partir de então, a Reserva Jarinã.

Em despacho saneador, foi determinada, à fl. 1239, a oitiva das testemunhas arroladas pelas partes e a realização de perícia avaliatória e antropológica.

Foram ouvidas as testemunhas da FUNAI Orlando Villas Boas e Álvaro Villas Boas, às fls. 1451 e 1451-verso, que relatam que na Gleba Jarinã sempre moraram os índios Juruna, inimigos dos Txucarramãe, que habitavam a área Porori, muito próxima, ao norte da BR-080; que esta região foi sempre habitada pelos índios Txucarramãe e que os "brancos " nunca habitaram tal região.

0 laudo pericial antropológico foi juntado, com anexos, às fls. 2075/2200 e o laudo pericial avaliatório, às fls.

2061/2063. O assistente-técnico da FUNAI quanto ao laudo avaliatório trouxe, às fls. 2207/2214, documentos que comprovariam uma super-avaliação da perícia do perito judicial, já que aquele avaliara as terras em questão, sem benfeitorias e longínquas, com preços bastante superiores aos praticados em terras perto da Capital, com as mais variadas benfeitorias e próximas ao asfalto.

Já a assistente-técnica da FUNAI para o laudo antropológico, discordando do perito judicial, traz suas avaliações às fls. 2216/2260, com mapas e anexos de fls.

2262/2270.

Por despacho de fl. 2291, o então Ministro Relator Oscar Corrêa deu por finda a instrução e abriu vista para manifestação das partes.

A FUNAI, às fls. 2299/2303, requereu a reunião com a ACOR n° 79, por notória conexividade, entre as ações, ou a reunião com a ACOR nº 365-2, ou a suspensão do presente feito, pela prejudicialidade em relação às outras ações.

Por último, requereu a reconsideração do despacho que encerrou a instrução. Juntou os documentos de fls.

2304/2399.

O Ministério Público Federal, em manifestação de fls.

2401/2427, requer a extinção do feito, sem exame do mérito, pois o título dominial apresentado pelo Autor está eivado de flagrante nulidade. A CF de 1946 vedava a alienação ou concessão de terras públicas com área superior a dez mil hectares. Assim, não poderia o Autor obter títulos dominiais incidentes sobre área com dimensão de 10 mil quilômetros quadrados, utilizando-se de "testas- de-ferro" e comprando áreas contíguas que não ultrapassaram 10 mil hectares e, imediatamente, reunindo- as, com o fito de burlar o art. 156, § 2°, da CF/1946. O Autor exercera a função de agrimensor junto ao Departamento de Terras do Estado de Mato Grosso e, portanto, não causa surpresa que tenha, com facilidade, associado a Henrique Martins, conseguido amealhar títulos dominiais com dimensão superior a 200.000 ha.

Coincidentemente, também, assevera o MPF os títulos foram expedidos em 18. 01.1961, ou seja, 3 meses antes da criação do Parque Indígena do Xingu, fazendo presumir-se que os documentos poderiam ter sido adulterados para legitimar o pleito reivindicatório; ou ainda, o Autor conseguiu a transcrição dos títulos dominiais em 11.03.1966 relativos a imóveis situados dentro da área do Parque Nacional do Xingu, e registrou a escritura de divisão em 04.12.1971. Assim, todo o procedimento de alienação de terras no Estado de Mato Grosso fora fraudulento, conforme comprovado pela CPI da Terra. Assim, o MPF requer, ao final, que seja oficiado ao INTERMAT a fim de determinar a apresentação dos procedimentos administrativos que deram origem à área do Autor e, ao final, a extinção do processo.

Razões finais, sendo estas apresentadas pelo Autor, às 2540/2589, e pelo Estado de Mato Grosso, às fls.

2714/2746.

Às fls. 2767/2789, a União Federal peticiona para que se oficie ao Governador do Estado para que este informe a imobiliária que intermediou a concessão de títulos aos adquirentes originários, a fim de verificar a nulidade dos títulos em desrespeito às normas constitucionais.

Às fls. 2711/2789 a União Federal requereu esclarecimentos dos peritos...

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