Decisões Monocráticas nº 16105 de STF. Supremo Tribunal Federal, 17 de Marzo de 2014

Número do processo16105
Data17 Março 2014

Decisão: Vistos.

Cuida-se de reclamação constitucional, com pedido de liminar, ajuizada por Edno Jose de Oliveira em face do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, cuja decisão teria afrontado a autoridade do Supremo Tribunal Federal e negado aplicação à Súmula Vinculante nº Utilizo-me do relatório da decisão de 12/8/13, através da qual indeferi a liminar: Os fundamentos apresentados na peça vestibular podem ser assim sintetizados: a) o reclamante é réu em ação civil pública por ato de improbidade movida pelo Parquet estadual, em que lhe é imputada a contratação ilegal, enquanto prefeito do Município de Perdizes, de empresa de propriedade de sua irmã e de seu cunhado; b) foi absolvido das acusações em primeira instância, tendo o juízo considerado a conduta legítima, pois o artigo 27 da Lei Orgânica do Município não vedava a contratação, pelo Município, de empresas cujos sócios fossem parentes do Prefeito municipal, desde que a contratação adviesse de processo licitatório; c) a sentença foi reformada por órgão fracionário do e.

TJMG, estando a decisão reclamada fundamentada, dentre outras razões, na inconstitucionalidade do referido dispositivo da Lei Orgânica municipal, em desrespeito à cláusula de reserva de plenário (art. 97 da CF/88 e SV nº 10).

Nesse tocante, argumenta que: ‘A 8ª C.

Cível do TJMG, no entanto, considerou que o parágrafo único do artigo 27 da LOM não poderia ser invocado pelo Reclamante em defesa de sua conduta, por dois fundamentos distintos: a) porque o contrato advindo de processo licitatório não constitui contrato de ‘cláusulas uniformes’, não incidindo ao caso a exceção prevista na nrma municipal e, porque também; b) seria ‘patente’ a ‘inconstitucionalidade’ do parágrafo único do artigo 27 da LOM.’ E conclui: ‘Não se desconhece que é legítima (ainda que não concorde o Reclamante) a interpretação dada pela 8ª C.

Cível do TJMG sobre o conceito de ‘cláusulas uniformes’ e suas consequências sobre a (i)legalidade da contratação.

Vale dizer: a interpretação dada pelo TJMG ao alcance da exceção prevista no parágrafo único do artigo 27 da LOM é tema que será inserido dentre aqueles que serão objeto dos competentes recursos que desafiam o v.

Acórdão e não é objeto da presente Reclamação. (…) Situação diversa, no entanto, é o caso do pronunciamento da 8ª C.

Cível do TJMG quanto à constitucionalidade da norma: no que concerne ao segundo fundamento invocado pelo v.

Acórdão, no sentido da norma municipal incorrer em ‘patente inconstitucionalidade’ por suposta violação da competência privativa da União de legislar sobre normas gerais de licitação e contratos administrativos, é certo que a 8ª C.

Cível não poderia considerá-la inconstitucional, havendo explícito desrespeito à Súmula Vinculante n. 10 deste c.

STF’ Requer que seja deferido o pedido de liminar para suspender os efeitos da decisão reclamada, bem como o andamento do processo.

No mérito, postula que seja julgada procedente a reclamação para determinar ao e.

TJMG que, no julgamento da constitucionalidade do art. 27, parágrafo único, da Lei Orgânica do Município de Perdizes, proceda a julgamento de acordo com o art. 97 da CF/88 e a Súmula Vinculante nº 10.

Devidamente intimada, a autoridade reclamada prestou as informações solicitadas, das quais destaco: (...) Consigno que, ao contrário do alegado pelo reclamante, a Turma Julgadora não afastou a incidência da norma legal supramencionada com fundamento no controle difuso de constitucionalidade, mas sim entendeu por sua não aplicação ao caso concreto, na medida em que a exceção nela contida diz respeito aos contratos cujas cláusulas e condições sejam uniformes, sendo certo que os contratos taxados de ilegais na ação de improbidade em cotejo, por terem sido precedidos de licitação, não se caracterizam como contratos de cláusulas uniformes.

A douta Procuradoria-Geral da República manifestou-se pela improcedência da reclamação, cuja ementa restou assim redigida: Reclamação.

Prática de ato de improbidade administrativa atribuída ao Prefeito do Município de Perdizes, consistente na contratação de empresa de propriedade de parentes seus.

Alegação de ofensa à Súmula Vinculante nº 10 do Supremo Tribunal Federal.

Medida liminar indeferida.

Parecer pela improcedência da reclamação.

É o relatório.

Decido.

Por atribuição constitucional, presta-se a reclamação para preservar a competência do STF e garantir a autoridade de suas decisões (art. 102, inciso I, alínea l, CF/88), bem como para resguardar a correta aplicação das súmulas vinculantes (art. 103-A, § 3º, CF/88).

O reclamante aponta como paradigma de confronto na presente reclamação a Súmula Vinculante nº 10, assim redigida: Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.

Edno Jose de Oliveira alega que, nos autos da Apelação nº 1.0498.10.002200-9/008, foi condenado por improbidade administrativa, em decisão de órgão fracionário do TJMG, por suposta inconstitucionalidade do art. 27, parágrafo único, da Lei Orgânica do Município de Perdizes, sem a necessária submissão da matéria à cláusula de reserva de plenário, o que evidencia o desrespeito à autoridade do STF e à eficácia da súmula vinculante nº 10.

O acórdão reclamado foi proferido pela 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, a qual deu provimento ao reexame necessário em ação civil público e condenou o ora reclamante por ato de improbidade administrativa com fundamento no art. 9º da Lei nº 8.666/93, nos termos: Nesse contexto, à luz do disposto na Lei nº 8.666/93, patente a ilegalidade na participação da empresa GERALDÃO MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO LTDA nos procedimentos licitatórios que culminaram com a celebração de diversos contratos administrativos - treze, ao todo, conforme narrado na inicial - para fornecimento de materiais de construção à municipalidade, na medida em que servidora pública municipal – JUCÉLIA DE OLIVEIRA MAGALHÃES - figura como sócia proprietária da empresa contratada, fato esse incontroverso nos autos.

A ilegalidade na participação da empresa nas licitações, e via de consequência, dos contratos celebrados é evidente e decorre da configuração de situação objetiva expressa na lei, que veda a participação direta ou indireta de servidor público vinculado ao ente contratante nas licitações por ele promovidas.

A autoridade reclamada reformou decisão de primeira instância que, com fundamento no art. 27, parágrafo único, da Lei Orgânica do Município de Perdizes, teria concluído pela legitimidade do ato do prefeito em contratar, após processo licitatório, empresa de propriedade de sua irm㠖 que é servidora municipal - e de seu cunhado.

Dispõe a norma local: Art. 27 - O Prefeito, o Vice-Prefeito, os Vereadores e os servidores municipais, bem como as pessoas ligadas a qualquer deles por matrimônio ou parentesco, afim ou consanguíneo, até o segundo grau, ou por adoção, não poderão contratar com o Município, subsistindo a proibição até seis meses após findas as respectivas funções.

Parágrafo único - Não se incluem na proibição do artigo os contratos cujas cláusulas e condições sejam uniformes para todos os interessados.

Sob a perspectiva assentada em primeira instância – de que o dispositivo acima referido [integraria] o ordenamento que regula as licitações no Município, de forma que, há, no âmbito administrativo (...) regra de direito local que dá sustentação jurídica à conduta dos réus no ato de habilitar, adjudicar o objeto da licitação e contratar a empresa ré - a autoridade reclamada afirmou a patente inconstitucionalidade [da norma], decorrente da violação literal e expressa ao disposto na Lei nº 8.666/93, tendo em vista ser competência privativa da União legislar sobre licitação e contratos administrativos.

Ocorre, entretanto, que o TJMG apresentou um segundo fundamento para afastar a incidência da norma ao caso concreto e, em consequência, condenar o prefeito do Município de Perdizes por conduta ímproba, qual seja: que a exceção nela contida - contratos cujas cláusulas e condições sejam uniformes para todos os interessados - não se aplica aos contratos precedidos de licitação.

Entendeu a autoridade reclamada que o contrato firmado após processo licitatório não se enquadra no conceito de contratos cujas cláusulas e condições sejam uniformes para todos os interessados, razão pela qual não haveria subsunção do fato concretamente analisado à norma aplicada pelo juízo de primeiro grau, sendo provida a remessa necessária, nos termos: Isso porque, além de sua patente inconstitucionalidade, decorrente da violação literal e expressa ao disposto na Lei nº 8.666/93, que contém normas gerais de licitação e contratos administrativos, tendo sido promulgada pela União no exercício de competência constitucional legislativa privativa, fato é que a exceção nela contida - contratos cujas cláusulas e condições sejam uniformes para todos os interessados - não se aplica aos contratos precedidos de licitação.

Nesse sentido, eventual procedência da reclamação para anular o acórdão, na parte em que este afirma a patente inconstitucionalidade [da norma] por afronta à Súmula Vinculante nº 10, seria destituída de qualquer eficácia, haja vista a manutenção dos seus efeitos por fundamento autônomo não alcançado por esta reclamatória.

Vide jurisprudência plenária acerca do tema: RECLAMAÇÃO - ACÓRDÃO DO SUPREMO - DUPLO FUNDAMENTO DO ATO ATACADO.

Constando do ato atacado fundamento não versado no acórdão do Supremo, descabe assentar a adequação do pedido (Rcl nº 3.779/RS-AgR, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Marco Aurélio, DJe de 30/11/07).

Por atribuição constitucional, presta-se a reclamação para preservar a competência do STF e garantir a autoridade das decisões deste Tribunal (art. 102, inciso I, alínea l, CF/88), bem como para resguardar a correta aplicação das súmulas vinculantes (art. 103-A, § 3º, CF/88).

Em torno desses conceitos, a jurisprudência desta Corte desenvolveu parâmetros para a utilização dessa figura jurídica, entre os quais se destacam: 1.

Inadequação da reclamação para reexame do mérito da demanda originária.

A reclamação não se configura instrumento viabilizador do reexame do conteúdo do ato reclamado (Rcl nº 6.534/MA-AgR, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Celso de Mello, Dje de 17/10/08). 2.

Reclamação não pode se confundir com sucedâneo recursal, ação rescisória ou emprestar efeito suspensivo a RE.

O instituto da Reclamação não se presta para substituir recurso específico que a legislação tenha posto à disposição do jurisdicionado irresignado com a decisão judicial proferida pelo juízo a quo (Rcl nº 5.703/SP-AgR, Tribunal Pleno, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJe-195 de 16/10/09).

Precedentes: Rcl nº 5.926/SC-AgR, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Celso de Mello, DJe-213 de 13/11/09; Rcl nº 5.684/PE-AgR, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJe-152 de 15/8/08. 3.

Caráter estrito da competência do STF no conhecimento das reclamações.

A competência originária do Supremo Tribunal Federal não comporta a possibilidade de ser estendida a situações que extravasem os limites fixados pelo rol exaustivo inscrito no art. 102, I, da Constituição.

Precedentes (Rcl nº 5.411/GO-AgR, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJe-152 de 15/8/08).

A jurisprudência desta Suprema Corte é firme no sentido de que a o art. 97 da CF/88 e Súmula Vinculante nº 10 não se aplicam a toda e qualquer hipótese em que a autoridade judiciária deixa de acolher a pretensão da parte de fazer incidir determinada norma ao caso concreto em debate.

Vide: 'RECLAMAÇÃO.

SÚMULA VINCULANTE N. 10.

REVISÃO DE BENEFÍCIO.

LEI N. 9.032/95.

DECISÃO DA SEXTA TURMA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

RESERVA DE PLENÁRIO.

NÃO CONFIGURADO O DESCUMPRIMENTO DA SÚMULA VINCULANTE N. 10 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 1.

A simples ausência de aplicação de uma dada norma jurídica ao caso sob exame não caracteriza, apenas por isso, violação da orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal. 2.

Para caracterização da contrariedade à súmula vinculante n. 10, do Supremo Tribunal Federal, é necessário que a decisão fundamente-se na incompatibilidade entre a norma legal tomada como base dos argumentos expostos na ação e a Constituição. 3.

O Superior Tribunal de Justiça não declarou a inconstitucionalidade ou afastou a incidência dos arts. 273, § 2º, e 475-o, do Código de Processo Civil e do art. 115, da Lei n. 8.213/91, restringindo-se a considerá-los inaplicáveis ao caso. 4.

Reclamação julgada improcedente' (Rcl nº 6.944/DF, relatora a Ministra Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe de 13/8/0) LEI – INCONSTITUCIONALIDADE VERSUS INTERPRETAÇÃO – VERBETE VINCULATE Nº 10 DA SÚMULA DO SUPREMO – INADEQUAÇÃO.

Estando o pronunciamento judicial baseado em simples interpretação de norma legal, descabe cogitar de enfrentamento de conflito desta com o texto constitucional e, assim, da adequação do Verbete Vinculante nº 10 da Súmula do Supremo (Rcl nº 14.158/SP-AgR, Relator o Ministro Marco Aurélio, Tribunal pleno, DJe de 126/13).

PROCESSUAL CIVIL.

CONSTITUCIONAL.

ENSINO SUPERIOR.

SUPLETIVO.

IDADE MÍNIMA NÃO ALCANÇADA.

SÚMULA STF 10.

ART. 97, CF: INAPLICABILIDADE. 1.

Para a caracterização de ofensa ao art. 97 da Constituição, que estabelece a reserva de plenário ( full bench ), é necessário que a norma aplicável à espécie seja efetivamente afastada por alegada incompatibilidade com a Constituição Federal. 2.

Não incidindo a norma no caso e não tendo sido ela discutida, não se caracteriza ofensa à Súmula Vinculante 10, do Supremo Tribunal Federal. 3.

O embasamento da decisão em princípios constitucionais não resulta, necessariamente, em juízo de inconstitucionalidade. 4.

Agravo regimental a que se nega provimento (Re nº 575.895/BA-AgR, Relatora a Ministra Ellen Gracie, Segunda turma, DJe de 5/4/11).

O inconformismo com o entendimento de que os contratos precedidos de processo licitatório não configuram contrato uniforme para fins de aplicação do art. 27, parágrafo único, da Lei Orgânica do Município de Perdizes deve ser suscitado pelos meios processuais colocados à disposição do reclamante perante a autoridade judiciária competente para conhecer da matéria.

Há necessidade de aderência estrita do objeto do ato reclamado ao paradigma apto a instaurar a competência do STF em sede reclamatória.

Nesse sentido, a Rcl nº 6.534/MA-AgR, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Celso de Mello, DJe-197 de 17/10/08, cuja ementa transcrevo parcialmente: (...) – Os atos questionados em qualquer reclamação - nos casos em que se sustenta desrespeito à autoridade de decisão do Supremo Tribunal Federal - hão de se ajustar, com exatidão e pertinência, aos julgamentos desta Suprema Corte invocados como paradigmas de confronto, em ordem a permitir, pela análise comparativa, a verificação da conformidade, ou não, da deliberação estatal impugnada em relação ao parâmetro de controle emanado deste Tribunal. (grifos no original).

Ante o exposto, nego seguimento à reclamação, nos termos do artigo 21, § 1º, do RISTF, prejudicada a apreciação do pedido liminar.

Publique-se.

Intime-se.

Brasília, 17 de março de 2014.

Ministro Dias Toffoli Relator Documento assinado digitalmente

Partes

Reclte.(s) : Município de Itapuí

adv.(a/S) : Rafael de Almeida Ribeiro

adv.(a/S) : Alexandre Luis Marques

recldo.(a/S) : Juiz do Trabalho da 1ª Vara do Trabalho de Jaú

intdo.(a/S) : Marco Fernando Butignon

adv.(a/S) : Felipe Celulare Marangoni

Observação

PROCESSO ELETRÔNICO

DJe-055 DIVULG 19/03/2014 PUBLIC 20/03/2014

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