Acórdão nº 2006.37.00.000258-2 de Tribunal Regional Federal da 1a Região, Quarta Turma, 25 de Octubre de 2011

Data25 Outubro 2011
Número do processo2006.37.00.000258-2

APELAÇÃO CÍVEL N. 2006.37.00.000258-2/MA RELATOR(A): JUIZ FEDERAL KLAUS KUSCHEL - CONVOCADO

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

PROCURADOR: REGIS RICHAEL PRIMO DA SILVA

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

PROCURADOR: JOAQUIM PEREIRA DOS SANTOS

APELADO: CELSO DA CONCEICAO COUTINHO

ADVOGADO: HONORINE DE JESUS DUARTE COSTA

ACÓRDÃO

Decide a Quarta Turma do TRF da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento às apelações, nos termos do voto Relator.

Brasília (DF), 10 de outubro de 2011.

Juiz Federal Klaus Kuschel Relator Convocado

APELAÇÃO CÍVEL N. 2006.37.00.000258-2/MA

RELATÓRIO

Trata-se de apelações interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (fls. 84/114) e pela UNIÃO FEDERAL (fls. 118/127) contra sentença (fls. 60/81), proferida pelo ilustre Juízo Federal da 5ª Vara da Seção Judiciária do Maranhão/MA, que, nos autos da Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa n. 2006.37.00.000258-2, indeferiu a inicial, julgando extinto o processo sem resolução do mérito, com fulcro no art.

267, I c/c 295, parágrafo único, III, CPC, pela impossibilidade jurídica do pedido, por entender que não se aplica o regime da Lei nº 8.429/92 aos agentes políticos, no presente caso, ao ex-prefeito do Município de Guimarães/MA.

Sustenta o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, em síntese, destaco:

- “(...) O Douto Juiz a quo houve por bem indeferir a petição inicial e assim extinguir o feito, sem resolução do mérito, em decisão que funda-se basicamente no precedente do acórdão proferido pelo Eg. STF no julgamento da Recl. nº 2.138/DF, aviada pelo ex-Ministro de Estado Carlos Sardenberg”;

- “(...) Em reforço à tese esposada, cita o il. Juiz a quo, ainda, os acórdãos proferidos pelo STJ quando do julgamento do RESP nº 456.649-MG e Recl. 2.790/SC”;

- (...) A tese defendida na Reclamação 2.138-6/DF-STF, que não tem efeito vinculante e não traduz entendimento predominante, foi acolhida por “apertada votação (6x5) e sob a égide de composição diversa daquela Corte, não havendo que se falar, pois, em jurisprudência definitiva do Supremo acerca da matéria até novo pronunciamento”, sendo que “Ministros da nova composição já manifestaram seu entendimento favorável à aplicação da lei, por ocasião da Petição 3923”;

- “(...) toda a discussão travada pela Corte Suprema acerca dos regramentos constitucionais que regem o cargo de Ministro de Estado, feita nos autos da Recl. 2.138, afigura-se estéril diante do estatuto constitucional aplicável aos Prefeitos, posto que visivelmente distinto”;

- “(...) somente a alguns agentes políticos a Constituição Federal impôs regras especiais para a deposição do cargo público ocupado, inexistindo, quanto aos demais (Prefeitos incluídos), qualquer regramento impeditivo. Em relação a estes, apresenta-se ausente o fundamento adotado pelo STF no julgamento da Recl. 2.138, qual seja, a previsão constitucional de regime específico de responsabilização político-administrativa, com foro igualmente estatuído na Carta Magna para julgamento desses delitos funcionais”;

- “(...) é cediço na jurisprudência que os ‘crimes de responsabilidade’ tipificados no art. 1º do Decreto-lei nº 201/67 tem a natureza jurídica de infrações penais comuns. Por outro lado, as condutas descritas no art. 4º daquele diploma constituem-se em infrações político- administrativas, cujo julgamento, de caráter meramente político, incumbe à Câmara de Vereadores, sequer dispondo o referido dispositivo acerca da sanção de inabilitação para exercício de cargos públicos, inerente aos crimes de responsabilidade”;

- “(...) no que tange à Recl. 2.790/SC, transcrita no decisum ora atacado, temos que se trata de julgamento o qual, para além de monocrático (refletindo, pois, isolado posicionamento do Ministro Relato), apresenta-se inquinado por vício de incompetência”; (grifo original)

- “(...) ainda que prevalecente a tese manifestada na Recl.

2.138, a hermenêutica constitucional ancorada na interpretação sistemática da Carta Magna e o atual cenário jurisprudencial recomendam a manutenção da tramitação das ações de improbidade em desfavor de Prefeitos”;

- (...) a professora MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO “defende a aplicação da lei de improbidade administrativa em relação a todos os agentes públicos, somente ressalvando a inviabilidade da aplicação da sanção de perda da função pública em relação àqueles agentes resguardados por procedimento específico no ponto (parlamentares federais e estaduais), bem como aqueles sujeitos foro especial para crimes de responsabilidade”;

- “(...) a previsão de foros específicos para julgamento de crimes de responsabilidade praticados por agentes políticos não possui o condão de afastar a disciplina da Lei de Improbidade Administrativa em relação a estes, mas quanto muito excluiria a aplicação da sanção de perda da função pública pelo magistrado”.

Diante disso, requer: “o provimento do presente recurso, com a reforma total do decisum a quo, para fins de recebimento da peça inicial e normal prosseguimento do feito” (fl. 114).

A UNIÃO FEDERAL alega em seu recurso:

- “(...) o STF afastou a incidência do regramento da Lei de Improbidade sob o fundamento de que os Ministros de Estado são agentes políticos cujos atos são subsumíveis á disciplina da Lei nº 1.079/50, que trata dos chamados crimes políticos”;

- “(...) os Prefeitos Municipais encontram-se sujeitos a disciplina diversa, não se submetendo às infrações políticas previstas na lei de crimes de responsabilidade”;

- “(...) o STF, em decisão recente da lavra do Min. GILMAR MENDES no bojo da Recl. 6.254, ratificou a impossibilidade de aplicação do entendimento adotado no julgamento da Recl. 2.138 no que se refere a agentes políticos insubmissos ao regime da Lei nº 1.079/50”;

- “(...) mesmo que venha a prevalecer a tese sufragada pelo STF no julgamento da Reclamação nº 2.138, os fundamentos adotados naquela ocasião limitam-se aos agentes políticos regidos pela lei que tipifica os chamados crimes de responsabilidade, não alcançando os demais agentes públicos”.

Dessa forma, pede que “seja conhecido e provido o apelo ora interposto, para que seja anulada a sentença impugnada e restabelecido o trâmite da ação no Juízo de 1º grau” (fl. 127).

Com contra-razões (fl. 658), os autos subiram a esta Corte onde receberam parecer ministerial “pelo provimento dos recursos” (fls.

665/668).

É o relatório.

Juiz Federal Klaus Kuschel Relator Convocado APELAÇÃO CÍVEL N. 2006.37.00.000258-2/MA

VOTO

Insurgem-se os apelantes contra a r. sentença que indeferiu a inicial da Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa, por impossibilidade jurídica do pedido, ao fundamento de que o regime da Lei nº 8.429/92 não se aplica aos agentes políticos, no presente caso, ao ex- prefeito do Município de Guimarães/MA.

A quaestio juris sob exame já foi enfrentada várias vezes por este Tribunal (cf. Ap 2005.37.00.007785-1/MA; Ap 2008.37.00.005038-5/MA; Ap 2006.37.00.000338-9/MA; AI 2008.01.00.069791-0/PI, entre outros). Mais recentemente, na sessão de 26/05/2009, também foi julgada a Ap 0005056- 38.2004.4.01.4000-PI, de minha relatoria, concluindo que aos agentes políticos, no presente caso, ex-Prefeito, aplica-se a Lei 8.429/92, com fulcro no entendimento atual do colendo Supremo Tribunal Federal, do egrégio Superior Tribunal de Justiça e do TRF/1ª Região sobre o assunto.

Como dito, a respeitável decisão recorrida, para extinguir o processo, sem resolução do mérito, esposou a tese da inaplicabilidade da Lei 8.429/92 a agentes políticos, vitoriosa no STF, por apertada maioria, no julgamento da Reclamação 2.138-6/DF, em 13/06/2007, publicação em 18/04/2008 (DJe-070, de 17/04/2008), em caso que envolveu Ministro de Estado, de que foi Relator o eminente e então Ministro do STF Nelson Jobim, e Relator para o acórdão o não menos eminente Ministro Gilmar Mendes.

Contudo, não obstante a tenaz argumentação jurídica que a edificou, não perde vigor e contundência, também jurídica, a tese oposta – defendida por boa parte dos doutrinadores e de outros Ministros do STF –, tese que tem prevalecido, nesta Corte e no egrégio STJ, pelo menos quanto aos agentes políticos não previstos no art. 102, I, c, da CF/88 e cujos crimes de responsabilidade estão regulados pela Lei 1.079/1950 – tese enfrentada pelo colendo STF, na referida Reclamação 2.138-6/DF.

Essencialmente, entendeu o STF, no julgamento da citada Reclamação 2.138-6/DF, que a “Constituição não admite a concorrência entre dois regimes de responsabilidade político-administrativa para os agentes políticos: o previsto no art. 37, § 4º (regulado pela Lei n° 8.429/92) e o regime fixado no art. 102, I, “c”. (disciplinado pela Lei n° 1.079/50).” No voto, sustentou o Relator que os crimes de responsabilidade absorvem os ilícitos previstos na Lei 8.429/92, sendo aplicável aos agentes políticos, tão somente, a respectiva norma que rege os crimes de responsabilidade.

Assim, por analogia, no caso destes autos, em que figura no pólo passivo ex- Prefeito, a norma aplicável seria o Decreto-Lei 201/67.

Embora se reconheça a semelhança entre algumas condutas ilícitas presentes na Lei 8.429/92 e no Decreto-Lei 201/67, opõe-se à tese abraçada pela decisão recorrida o argumento de que é harmonizável a coexistência desses dois sistemas punitivos, quanto a Prefeitos e Vereadores.

Primeiro, pela consagrada independência entre as instâncias civis, penais e administrativas. A própria Constituição Federal, no art.

37, § 4º, ao citar punições a que estão sujeitos os que praticam atos de improbidade, ressalva que serão elas aplicadas “sem prejuízo da ação penal cabível”. A Lei 8.429/92, por sua vez, em seu art. 12, destaca que as sanções que enumera são aplicáveis independentemente das sanções penais, civis e administrativas “previstas na legislação específica”. Há ilícitos que, por força de lei, implicam responsabilização concomitante nas esferas cível, penal e administrativa. Isso não é novidade, mas elastecer a interpretação dada pelo colendo STF, na Reclamação 2.138-6/DF, para excluir...

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