Decisão da Presidência nº 642 de STF. Supremo Tribunal Federal, 30 de Septiembre de 2013

Data30 Setembro 2013
Número do processo642

Decisão: Vistos.

Trata-se de queixa-crime ajuizada por José Ursílio de Souza e Silva contra o deputado federal José Abelardo Guimarães Camarinha, a quem se imputa a prática do crime de injúria qualificada (CP, art. 140 c.

  1. 141, III).

    Assevera o querelante haver tido sua honra subjetiva atingida por matéria ofensiva veiculada por ordem do querelado, no periódico denominado Jornal da Manhã, datado de 28/3/10, com as seguintes afirmações: Consta da inicial que: O querelante é jornalista consagrado na cidade de Marília, local onde nasceu, aqui residente há mais de 46 anos, respeitado Editor do Jornal Diário de Marília, pai de um filho em idade escolar.

    Além de jornalista do jornal de maior circulação da cidade de Marília, é também seu editor chefe.

    Em 24 de março do corrente ano, decidiu este E.

    Tribunal, por unanimidade de votos, pelo recebimento da queixa-crime interposta pelo Querelante em face do Querelado, em virtude da prática do crime de calúnia, tendo em vista que o Querelado proferiu diversas acusações falsas em face do Querelante, acusando-o de ser o responsável pela morte de seu filho, Rafael Camarinha, em março de 2006 (inquérito 2503).

    Referida decisão da mais alta corte do país, virou manchete não só na imprensa local, como também nos principais sites de notícias, como Estadão.

    com, Folha Online, Istoé Dinheiro e o G1 da Rede Globo.

    Ocorre que, inconformado com o ocorrido, o Querelado deu início a mais uma série de ataques ao jornalista, através da Rádio 950 AM, TV Marília (Canal 4), Jornal da Manhã, Correio Mariliense e Jornal Bom Dia.

    Num desses ataques, feito através do Jornal da Manhã, de 28 de março de 2010 (página 6), o Querelado publica uma Nota de Esclarecimento, acompanhada de uma foto do Querelante nos arquivos da polícia, com o único intuito de caluniar, difamar e injuriar o Querelante, acusando-o, mais uma vez, de ser o responsável pela morte de seu filho (em anexo).

    Em diversas ocasiões, vislumbra-se o dolo do Querelado em ofender o Querelante, ofensas essas que configuram crime contra a honra em suas diversas modalidades (calúnia, difamação e injúria).

    Assim, desrespeitando os mais comezinhos princípios constitucionais e de boa-fé, passou o Querelado a atacar a honra de Querelante.

    Vejamos alguns trechos da publicação incriminada: (...) 4 – Não encontrando as ilusórias fortunas divulgadas pelo pseudo-jornalista José Ursílio, que faz uso de diploma falso comprado em Goiânia (GO), numa ação fria e covarde, atiraram à queima roupa contra a cabeça do meu querido filho, o jovem Rafael Almeida Camarinha, que, de acordo com os laudos periciais, estava de joelhos no quarto onde foi abordado. 5 – Continuo responsabilizando o elemento José Ursílio por esta irreparável tragédia que destruiu nossa família, nos condenando à prisão perpétua do sofrimento.

    Esse psicopata é dono de ema extensa ficha criminal com mais de 50 processos, sendo o réu com mais condenações no interior do Estado, envolvido com drogas e outros costumes não recomendados pela sociedade. 6 – Lamentável que nem mesmo essa atrocidade tenha inibido este pseudo-jornalista em suas ações criminosas usando os tais veículos de comunicação, difamando, caluniando e atacando famílias e pessoas de bem da sociedade, com folhas de bons serviços prestados, incluindo a comunidade católica, o saudoso padre Hércules, juízes da Comarca (acusados de venda de sentenças), autoridades e até um membro do próprio STF. (...) 8 – Camarinha estará pessoalmente no STF, fazendo sustentação oral aos ministros, apresentando memorandos, fitas, CDS, jornais e documentos, comprovando quem é o psicopata e criminoso José Ursílio. (...) (grifo nosso).

    Inicialmente, e sob o manto protetor de uma Nota de Esclarecimento, o Querelado tenta se justificar acerca do recebimento da queixa-crime pelo Supremo Tribunal Federal, dizendo estar satisfeito com a decisão, no sentido de esclarecer os fatos ocorridos em Marília.

    No entanto, perde o foco do raciocínio e passa a atacar, como de costume, o Querelante, identificando-o como pseudo-jornalista, elemento, psicopata, criminoso, ter extensa ficha criminal, envolvido com drogas e outros costumes não recomendados pela sociedade e usar diploma falso comprado em Goiânia.

    Embora num primeiro momento usar diploma falso comprado em Goiânia e envolvido com drogas possa parecer calúnia, na verdade, trata-se de injúria por não ter o autor especificado outras circunstâncias de tempo e local do fato, o que descaracteriza o delito de calúnia, ocorrendo, destarte, mera injúria.

    Sem dúvida, para um pai de família como o Querelante, ser chamado publicamente de envolvido com drogas é uma conduta abominável.

    Tal afirmação é leviana e passa muito longe da verdade.

    Utilizar-se, ainda, de termos abjetos para se referir ao Querelante como: pseudo-jornalista, elemento, psicopata, criminoso, com o único intuito de desonrar-lhe e desmoralizar-lhe perante a opinião pública, fere profundamente sua dignidade.

    Nesse tocante, claramente comete o Querelado o delito descrito no artigo 140 do Código Penal.

    Assim, por toda a extensão da denominada Nota de Esclarecimento, o que se vislumbra é a nítida intenção, o dolo subjetivo e específico do Querelado de injuriar o Querelante, conduta essa que deve ser repelida e sancionada pelo Judiciário.

    Esses são apenas alguns exemplos dos absurdos pronunciados pelo Deputado Federal, Abelardo Camarinha, na citada publicação feita no Jornal da Manhã, o que não pode ser tolerado pelo Direito! (fls. 3/6).

    Afirma-se na inicial que as ofensas seriam uma retaliação ao recebimento por essa Corte, em 24/3/2010, da queixa-crime ajuizada pelo querelante contra o querelado nos autos do Inquérito nº 2503 desta Suprema Corte.

    Os autos foram instruídos com o exemplar do Jornal da Manhã, de 28/3/2010 (fls. 11).

    O querelado apresentou resposta à queixa-crime às fls. 28/33, oportunidade em que ratificou as afirmações proferidas na imprensa acerca do querelante, referentes (i) à utilização de diploma falso; (ii) ao fomento da sanha assassina de malfeitores propiciado pela divulgação de que eram guardados milhões de reais em sua residência, dando causa à morte de seu filho Rafael Camarinha.

    Sustentou que sua conduta não configura um ilícito penal em razão da ausência de dolo, que, segundo ele, pode ser constatada por dois motivos: o primeiro é que o querelante, de forma rotineira apregoa ser inimigo capital do querelado e atua como tal, ofendendo, sem maiores rodeios e cuidados a honra e família do querelado e, isso não passa de mero debate quando o querelado faz saber quem de fato é o homem público José Ursílio de Souza e Silva é, na pior das hipóteses, liberdade de imprensa; o segundo é que o querelante passou a arrostar o rótulo de político (ainda que fracassado) e, sendo assim, deve ter a couraça mais grossa, porque o eleitor necessita saber quem de fato é o querelante, ou seja, sua 'ficha' precisa ser submetida a opinião do eleitor e, alguém precisa divulgar seus (pecaminosos) feitos, inclusive próprias do debate político.

    Recebida a queixa (fls. 482/499), o querelado ofereceu defesa prévia (fls. 516/519), pugnando, ainda, pelo oferecimento de proposta de transação penal por parte do Ministério Público.

    Fundamentou o pedido na circunstância de que o fato de ser a ação penal de iniciativa privada não retira a possibilidade da transação penal (fl. 523) e de que é necessário que seja o Procurador-Geral, ainda que a ação seja de iniciativa privada, quem formule as condições de oferta da transação penal (fl. 524), o que restou indeferido nos termos da decisão de fls. 527/ Contra essa decisão, interpôs o querelante competente agravo regimental (fls. 531/537), tendo o querelante (fls. 559/562) e o Ministério Público Federal (fls. 566/569) se manifestado pelo não provimento do recurso.

    Procedeu-se à instrução do feito, com a inquirição das testemunhas arroladas pelo querelado (fls. 108/122 do apenso) bem como o interrogatório do querelado (fls. 640/642).

    Em sede de alegações finais, o querelante requereu a procedência da queixa, com a condenação do querelado pelos crimes que lhe são imputados, em continuidade delitiva, vez que não podem as ofensas que lhe foram irrogadas pelo querelado ser considerados atos de retorsão ou decorrente do abalo psicológico sofridos em razão da morte de seu filho, estando devidamente comprovado o elementos volitivo, no sentido de ofender, achincalhar e desqualificar o querelante (fls. 674/681).

    O querelado, a seu turno, sustenta que a morte de seu filho decorreria de notícias que o querelante fez divulgar em seu periódico, dando conta da existência de grande quantidade de dinheiro em sua moradia, o que acabou por aguçar a sanha de malfeitores, no que culminou na morte trágica de seu filho Rafael Camarinha Assevera que as expressões por ele divulgadas, em parte, tem conteúdo verdadeiro, e, no mais, que as ofensas perpetradas se justificavam diante do fato de haver o querelante dado causa ao homicídio de seu filho (do querelado).

    Sustenta, ainda, que o uso do termo 'psicopata apenas advém de uma reação exaustiva do querelado que já não mais suporta os ataques do querelante', não se podendo dela inferir a presença do necessário dolo para a configuração do delito.

    Pede, ainda, que não fazendo o querelante referência aos fatos objeto da AP nº 674, mas apenas aos fatos narrados nesta ação penal, sem que tenha o querelante comparecido pessoalmente às audiências de instrução, seja aplicado o disposto no art. 60, inciso III, do CPC, reconhecendo-se a perempção da queixa e a declaração da extinção da punibilidade do agente.

    A final, requer a improcedência da presente ação penal (fls. 684/691).

    O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do ilustre Procurador-Geral da República, Dr.

    Roberto Monteiro Gurgel Santos, manifestou-se pela procedência da pretensão punitiva, com a condenação do querelado nos termos do art. 140 c.

  2. 141, III e 71, todos do Código Penal (fls. 696/702).

    Examinados, decido.

    O fato imputado ao querelado deu-se aos 28/3/2010.

    A presente queixa-crime foi recebida por decisão do Plenário desta Suprema Corte, aos 19/5/2011 (fls. 482 a 499).

    Verifico, assim, que se consumou a prescrição da pretensão punitiva estatal contra o querelado em relação ao crime capitulado no art. 140 do Código Penal (injúria), mesmo presente a causa de aumento prevista nos inciso III do art. 141 do mesmo codex, devendo ser declarada, in limine, a extinção da punibilidade do agente por essa infração.

    Como se vê, tem-se que da data do último marco interruptivo da prescrição (19/5/2011) até a presente, já transcorreu lapso temporal superior a 2 (dois) anos, encontrando-se prescrito o crime previsto no art. 140 do CP.

    Isso porque o delito em apreço tem sanção estabelecida de no máximo seis (6) meses de detenção, ou multa, acrescida de um terço (1/3) em razão da causa especial de aumento prevista no inciso III do art. 141 do mesmo diploma legal, totalizando pena máxima de oito (8) meses de detenção, ou multa, razão pela qual a consumação da prescrição da pretensão punitiva, de acordo com o estatuído no inciso VI do art. 109 do Código Penal, com sua redação anterior à Lei nº 12.234/10 (fato anterior a 5/5/2010), dá-se no interregno de lapso temporal superior a dois (2) anos.

    Nessa conformidade, com fundamento no art. 21, XV , do RISTF e no art. 3º, inciso I, da Lei nº 8.038/90, nos termos do que dispõe o inciso IV do art. 107, c.

    c.

    o inciso VI do art. 109 e art. 111, todos do Código Penal, DECLARO EXTINTA A PUNIBILIDADE do querelado pelo delito de injúria que lhe é imputado nos autos.

    Em consequência, declaro igualmente PREJUDICADO o agravo regimental interposto pelo querelado.

    Transitada em julgado, arquivem-se.

    Publique-se.

    Brasília, 30 de setembro de 2013.

    Ministro Dias Toffoli Relator Documento assinado digitalmente

    Partes

    Agte.(s) : Lizete Maria Tonetto Burtet e Outro(a/S)

    adv.(a/S) : Raimar AbÍlio Bottega

    agdo.(a/S) : UniÃo

    proc.(a/S)(Es) : Advogado-Geral da UniÃo

    agdo.(a/S) : Funai - FundaÇÃo Nacional do Índio

    proc.(a/S)(Es) : Procurador-Geral Federal

    agte.(S) : LeÔnidas Burtet

    agte.(S) : JÚlia Marchezan Tonetto

    Publica��o

    DJe-194 DIVULG 02/10/2013 PUBLIC 03/10/2013

    Observa��o

    13/11/2013

    legislação Feita por:(Vlr)

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT