Decisão da Presidência nº 17336 de STF. Supremo Tribunal Federal, 27 de Febrero de 2014
Número do processo | 17336 |
Data | 27 Fevereiro 2014 |
DECISÃO MEDIDA CAUTELAR EM RECLAMAÇÃO.
CONSTITUCIONAL.
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO.
ALEGAÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DA DECISÃO PROFERIDA NA AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE N. 16 E DA SÚMULA VINCULANTE N. 10 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
MEDIDA LIMINAR DEFERIDA.
PROVIDÊNCIAS PROCESSUAIS.
Relatório Reclamação, com pedido de medida liminar, ajuizada pelo Município de Bento Gonçalves/RS, em 26.2.2014, contra decisão proferida no Agravo de Instrumento no Recurso de Revista n. 0001570-21.2011.5.04.0512, pela 7ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, que teria afastado a aplicação do art. 71, § 1º, da Lei n. 8.666/1993, desrespeitado o que decidido na Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 16 e descumprido a Súmula Vinculante n. 10 do Supremo Tribunal Federal. 2.
A decisão impugnada é a seguinte: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA.
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA.
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS.
A contratação de empresa prestadora de serviços, por meio de regular licitação, não basta para excluir a responsabilidade do ente público.
Nos termos do item V da Súmula nº 331 do TST, editado à luz da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na ADC nº 16/DF, em se tratando de terceirização de serviços, os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta responderão subsidiariamente pelas dívidas trabalhistas das empresas prestadoras, quando forem negligentes em relação ao dever de fiscalizar o cumprimento das obrigações contratuais e legais da contratada.
No presente caso, o Tribunal Regional, soberano na análise do conjunto probatório, registrou que o ente público não se desincumbiu do ônus de comprovar a correta fiscalização do cumprimento do contrato com a empresa prestadora.
Assim, ao atribuir responsabilidade subsidiária ao recorrente decidiu em plena sintonia com o verbete acima mencionado.
Agravo (AIRR-1570-21.2011.5.04.0512). 3.
Afirma o Reclamante que a decisão reclamada contrariaria a Súmula Vinculante n. 10 deste Supremo Tribunal, motivo pelo qual deve[ria] ser cassada ( ) para que se manifest[asse] quanto à observância da cláusula de reserva de plenário (fl. 4).
Sustenta que a decisão atacada é passível de reclamação por afronta à Súmula Vinculante n. 10/STF, bem como ao que foi decidido na Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 16/DF, que reconheceu expressamente a constitucionalidade o dispositivo contido no art. 71, § 1º, da Lei n. 8.666, que exclui de responsabilidade a Administração, dentre elas a responsabilidade subsidiária atribuída pela Justiça do Trabalho, contrariando assim tanto a Súmula Vinculante n. 10 do STF, o art. 71, § 1º, da Lei n. 8.666/93, e o entendimento do STF no julgamento da ADC n. 16-DF, além das decisões proferidas em idênticas reclamações acostadas a petição, que cassaram as decisões trabalhistas proferidas em desacordo ou que exorbitem com o entendimento adotado pelo STF (fls. 7-8).
Requer medida liminar para suspensão do curso do processo em que se tenha verificado o ato reclamado (fl. 8).
No mérito, pede seja cassada a decisão proferida pela Justiça do Trabalho sem a observância da Súmula Vinculante nº 10/STF, art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93, e em face ao desrespeito ao que ficou decidido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento na Ação Direta de Constitucionalidade nº 16/DF, determinando-se seja proferida nova decisão que leve em conta os dispositivos legais acima referidos (fl. 9).
Examinados os elementos havidos nos autos, DECIDO . 4.
O que se põe em foco na reclamação é se, ao aplicar a Súmula n. 331 do Tribunal Superior do Trabalho para declarar a responsabilidade subsidiária da Administração Pública pelo cumprimento de obrigações trabalhistas, a 7ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (AIRR 1570-21.2011.5.04.0512) teria desrespeitado o que decidido na Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 16 e descumprido a Súmula Vinculante n. 10 do Supremo Tribunal Federal. 5.
Na sessão plenária de 24.11.2010, o Supremo Tribunal Federal julgou procedente a Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 16 e reconheceu a constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei n. 8.666/1993: RESPONSABILIDADE CONTRATUAL.
Subsidiária.
Contrato com a administração pública.
Inadimplência negocial do outro contraente.
Transferência consequente e automática dos seus encargos trabalhistas, fiscais e comerciais, resultantes da execução do contrato, à administração.
Impossibilidade jurídica.
Consequência proibida pelo art. 71, § 1º, da Lei federal n. 8.666/93.
Constitucionalidade reconhecida dessa norma.
Ação direta de constitucionalidade julgada, nesse sentido, procedente.
Voto vencido.
É constitucional a norma inscrita no art. 71, § 1º, da Lei federal n. 8.666, de 26 de junho de 1993, com a redação dada pela Lei n. 9.032, de 1995 (ADC 16, Relator o Ministro Cezar Peluso, Plenário, DJe 9.9.2011).
Nesse julgamento, ressaltei que imputar responsabilidade subsidiária à Administração Pública, com base no art. 37, § 6º, da Constituição da República, por comportamento irregular ou omisso na fiscalização do contrato de prestação de serviço, seria rigorosamente, fragorosamente e exemplarmente contrário à Constituição, porque o artigo 37, § 6º, trata de responsabilidade objetiva patrimonial ou extracontratual.
Aqui é responsabilidade contratual (ADC 16). 6.
Além disso, presumem-se legais os atos da Administração Pública.
Assim, as declarações e informações oficiais de agentes públicos no exercício de seu ofício têm presunção relativa (juris tantum) de legitimidade e devem prevalecer até prova idônea em sentido contrário.
Cabe ao Interessado demonstrar o nexo de causalidade entre a conduta da Administração Pública e o dano sofrido.
Sem a produção dessa prova, subsiste o ato administrativo e a Administração Pública exime-se da responsabilidade subsidiária por obrigações trabalhistas de empregado que não compõe os seus quadros. 7.
No caso em pauta, a 7ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento ao agravo de instrumento no recurso de revista, nos termos seguintes: A contratação de empresa prestadora de serviços, por meio de regular licitação, não basta para excluir a responsabilidade trabalhista do ente público.
O tomador dos serviços que opta por essa forma de contratação tem o dever de averiguar a idoneidade financeira da prestadora, no que se refere à possibilidade de solvência das obrigações trabalhistas.
Também deve fiscalizar continuamente o cumprimento das obrigações contratuais assumidas pela empresa contratada ( ) A própria Administração Pública federal reconhece a necessidade de fiscalizar as empresas por ela contratadas, no tocante ao cumprimento das obrigações trabalhistas, e prevê a possibilidade de aplicar-lhes sanções, dentre as quais a rescisão contratual ( ) Ao negligenciar no cumprimento dos seus deveres contratuais, o ente público permite que o empregado trabalhe em proveito de seus serviços essenciais, sem que haja o cumprimento dos direitos decorrentes do contrato laboral.
Sob esse aspecto, em razão das culpas in eligendo e in vigilando, responde, ainda que de forma subsidiária, pelas obrigações contraídas pela prestadora perante o empregado.
Em que pese o artigo 71 da Lei nº 8.666/93 prever a ausência de responsabilidade da Administração Pública pelo pagamento dos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais, resultantes da execução do contrato, a eficácia de tal dispositivo não é absoluta, porquanto se encontra em escala valorativa hierarquicamente inferior aos princípios constitucionais que tutelam o trabalho humano. ( ) Não se pode olvidar a aplicação, ao processo do trabalho, da teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, incumbindo-o à parte que melhor tem condições de produzi-la.
Nesse contexto, é evidente que incumbe ao ente público comprovar sua diligência na fiscalização do contrato de terceirização, inclusive manter, em seu poder, a documentação própria que a demonstre.
Foge ao razoável pretender que o empregado demonstre a negligência da Administração Pública.
No presente caso, o Tribunal Regional, soberano na análise do conjunto probatório, registrou que o ente público não se desincumbiu do ônus de comprovar a correta fiscalização do cumprimento das obrigações trabalhistas da empresa prestadora.
Assim, ao atribuir responsabilidade subsidiária ao recorrente, decidiu em plena sintonia com o verbete acima transcrito (doc. 8, grifos nossos).
No julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 16, este Supremo Tribunal reconheceu a constitucionalidade do § 1º do art. 71 da Lei n. 8.666/1993 e decidiu que o inadimplemento das obrigações trabalhistas decorrentes do contrato firmado pela Administração Pública não poderia ensejar, automática e diretamente, a responsabilização do ente público tomador dos serviços pelo pagamento dos créditos trabalhistas.
Assentou-se, então, que o exame das circunstâncias do caso concreto pela Justiça do Trabalho poderia conduzir à responsabilização subsidiária da Administração Pública, tomadora dos serviços, se comprovada a omissão ou negligência de seus agentes na fiscalização do contrato administrativo, sem isso importar na declaração de inconstitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei n. 8.666/1993.
Nesse sentido: RECLAMAÇÃO ALEGAÇÃO DE DESRESPEITO À AUTORIDADE DA DECISÃO PROFERIDA, COM EFEITO VINCULANTE, NO EXAME DA ADC 16/DF INOCORRÊNCIA RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA POR DÉBITOS TRABALHISTAS (LEI N. 8.666/93, ART. 71, § 1º) ATO JUDICIAL RECLAMADO PLENAMENTE JUSTIFICADO, NO CASO, PELO RECONHECIMENTO DE SITUAÇÃO CONFIGURADORA DE CULPA IN VIGILANDO, IN ELIGENDO OU IN OMITTENDO DEVER LEGAL DAS ENTIDADES PÚBLICAS CONTRATANTES DE FISCALIZAR O CUMPRIMENTO, POR PARTE DAS EMPRESAS CONTRATADAS, DAS OBRIGAÇÕES TRABALHISTAS REFERENTES AOS EMPREGADOS VINCULADOS AO CONTRATO CELEBRADO (LEI N 8.666/93, ART. 67) ARGUIÇÃO DE OFENSA AO POSTULADO DA RESERVA DE PLENÁRIO (CF, ART. 97) SÚMULA VINCULANTE N. 10/STF INAPLICABILIDADE INEXISTÊNCIA, NO CASO, DE JUÍZO OSTENSIVO OU DISFARÇADO DE INCONSTITUCIONALIDADE DE QUALQUER ATO ESTATAL PRECEDENTES RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO (Rcl 12.580-AgR, Relator o Ministro Celso de Mello, Plenário, DJe 13.3.2013). 8.
Nesta análise inicial e provisória, tem-se não constar do acórdão reclamado ato ou indicação de circunstância relacionada à execução e à fiscalização do contrato administrativo celebrado pela Administração Pública apta a evidenciar a culpa administrativa.
A atribuição de responsabilidade subsidiária pelo pagamento de obrigações trabalhistas parece ter decorrido da aplicação da Súmula n. 331 do Tribunal Superior do Trabalho, o que contraria o decidido na Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 16. 9.
Pelo exposto, sem prejuízo de reapreciação da matéria no julgamento do mérito, defiro a medida liminar pleiteada para suspender os efeitos da decisão proferida pela 2ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho no AIRR n. 1570-21.2011.5.04.0512. 10.
Requisitem-se informações à autoridade reclamada (art. 14, inc.
I, da Lei n. 8.038/1990 e art. 157 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal). 11.
Na sequência, vista ao Procurador-Geral da República (art. 16 da Lei n. 8.038/1990 e art. 160 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal).
Publique-se.
Brasília, 27 de fevereiro de 2014.
Ministra CÁRMEN LÚCIA Relatora
Partes
Recte.(s) : João Eduardo de Rezende Dutra e Outro(a/S)
adv.(a/S) : Rogério Vieira Santiago
recdo.(a/S) : Departamento de Obras PÚblicas do Estado de Minas Gerais - Deop/Mg
proc.(a/S)(Es) : Advogado-Geral do Estado de Minas Gerais
intdo.(a/S) : Secretário de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais
intdo.(a/S) : Superintendente da Central de Pagamento de Pessoal da Seplag
intdo.(a/S) : Diretor-Geral do Departamento de Obras PÚblicas do Estado de Minas Gerais - Deop/Mg
recte.(S) : Francisco de Lima Rodrigues Vieira
recte.(S) : Luiz Fernando Barbosa Diniz
recte.(S) : Roberto Cunha Freire
Observação
PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-048 DIVULG 11/03/2014 PUBLIC 12/03/2014