Decisão da Presidência nº 32655 de STF. Supremo Tribunal Federal, 27 de Febrero de 2014

Número do processo32655
Data27 Fevereiro 2014

Decisão: Vistos.

Trata-se de recurso ordinário em mandado de segurança interposto contra decisão do Superior Tribunal de Justiça que acolheu parcialmente os embargos de declaração opostos, mas que, entretanto, manteve os fundamentos do acórdão que denegava a segurança, ante a inocorrência da decadência prevista pelo art. 54 da Lei 9.784/99, acórdão assim ementado: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.

ART. 535, II, DO CPC.

OMISSÃO NO JULGADO.

ANISTIA DE SERVIDOR PÚBLICO.

ANULAÇÃO.

COMISSÃO INTERMINISTERIAL.

PRAZO.

PRORROGAÇÃO POR MEIO DE DECRETO.

LEGALIDADE.

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PARCIALMENTE ACOLHIDOS, PARA SANAR OMISSÃO, SEM ALTERAÇÃO DO RESULTADO DO JULGAMENTO.

I.

Cabível a oposição de Embargos de Declaração, quando houver, na sentença ou no acórdão, obscuridade, contradição ou omissão, de acordo com o art. 535, I e II, do Código de Processo Civil.

II.

Assiste razão, em parte, à embargante, quando aponta a ocorrência de omissão no acórdão, uma vez que a questão, relativa à legalidade da prorrogação dos trabalhos da referida Comissão Interministerial, não foi examinada no decisum.

III.

O prazo para o reexame dos processos de anistia de que trata a Lei 8.878, de 11/05/94, pela Comissão Interministerial, criada pelo Decreto 3.363, de 11 de fevereiro de 2000, foi regularmente prorrogado por meio de Decreto, a saber, pelos Decretos 4.132, de 14/02/2002, e 4.595, de 13/02/2003, de forma que não há se falar em nulidade da Portaria 325, de 22/07/2002, que anulou a decisão concessiva de anistia à ora embargante.

IV.

De qualquer sorte, a Terceira Seção desta Corte firmou entendimento no sentido de que 'a Portaria Ministerial que determina, nos termos da previsão contida no art. 13 do Decreto n.º 3.363/2000, a prorrogação do prazo de que trata o mencionado dispositivo, há de ser considerada válida, uma vez que não extrapola as determinações do ato que regulamenta' (STJ, MS 8.527/DF, Rel.

Ministra LAURITA VAZ, TERCEIRA SEÇÃO, DJe de 03/06/2008).

V.

Embargos de Declaração parcialmente acolhidos, para, nos termos da fundamentação do voto, sanar a omissão apontada, sem alterar, contudo, o resultado do julgamento.

Na origem, Wanda de Oliveira Benjamin impetrou mandado de segurança em face de ato do Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão, do Ministro de Estado da Fazenda e do Ministro de Estado da Educação, os quais, após a edição da Portaria Interministerial nº 325/2002, anularam a decisão da Subcomissão que havia concedido anistia à Impetrante.

Na petição do recurso, a recorrente alega que a decisão do Superior Tribunal de Justiça é contrária à jurisprudência, tendo em vista a visível ocorrência, no caso, da decadência prevista pelo art. 54 da Lei nº 9.784/ Nesse tocante, aduz: Ainda que pudesse ser discutida a legalidade ou ilegalidade de tal reconhecimento, publicado no Diário Oficial da União, nos idos de 1994, a passagem do tempo é suficiente para consolidar o entendimento adotado pela Comissão Especial de Anistia, por motivos de segurança jurídica, nos termos do artigo 54, da Lei nº 9.784/99, que restou data venia, manifestamente violado pelo r.

Acórdão recorrido.

Ocorre, porém, que o instituto da decadência adotado pelo artigo 54 da Lei nº 9.784/99 visa trazer segurança jurídica para as relações com o próprio Estado, de forma que é perfeitamente admissível que o Estado renuncie rever qualquer dos seus atos, que gerem efeitos para terceiros, quando passados mais de cinco anos.

Requer o provimento do recurso para reformar a decisão do Superior Tribunal de Justiça e conceder a ordem reconhecendo a declaração de decadência do direito da Administração Pública (Recursos Humanos do Ministério da Previdência e Assistência Social) anulando em todos seus efeitos, a Portaria interministerial nº. 325 de 22 de julho de 2002, conforme determinação do art. 54 da Lei nº. 9.784/99, não podendo os mesmos serem demitidos ou afastados de suas funções.

A União apresentou contrarrazões ao recurso, em que pugna pelo improvimento do recurso ante a inadequação da via eleita e pelo poder de exercício da autotutela pela Administração Pública.

A douta Procuradoria-Geral da República manifestou-se pelo não provimento do recurso, parecer assim ementado: Recurso ordinário em mandado de segurança.

Servidor público.

Anistia anulada.

Suposta violação ao art. 54 da Lei 9.784/1999, que estabelece prazo decadencial de 5 anos para a Administração anular atos dos quais decorram efeitos favoráveis para os destinatários.

O art. 54 da Lei 9.784 não tem aplicação retroativa.

Para atos anteriores à lei, começa a contar do início de sua vigência.

Entendimento consolidado nos Tribunais Superiores.

A Portaria Interministerial atacada pelo writ é de 2002, de modo que não foi alcançada pelo prazo decadencial.

Parecer pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

Decido.

Postulava a impetrante, com o ajuizamento do mandamus no Superior Tribunal de Justiça, a anulação da Portaria Interministerial nº 325/2002, a qual desconstituiu a anistia concedida à impetrante em 1994.

Fundamenta sua pretensão em razão de o ato ter sido praticado após a decadência quinquenal prevista pelo art. 54 da Lei nº 9.784/99: Art. 54.

O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.

O Superior Tribunal de Justiça denegou a segurança, tendo em vista a jurisprudência da Corte ter assentado a compreensão de que até a edição da Lei nº 9.784/99 a Administração poderia rever os seus atos a qualquer tempo, não sendo possível lhe atribuir incidência retroativa, vale dizer, o prazo decadencial de cinco anos previsto no artigo 54 somente pode ser contado a partir de sua vigência.

Tal decisão encontra-se correta, a não merecer reparos.

Com efeito, é cediço o entendimento desta Suprema Corte de que, frente a suspeitas de ilegalidade no ato de declaração de condição de anistiado, a Administração há de exercer seu poder-dever de anular seus próprios atos, sem que isso importe em desrespeito ao princípio da segurança jurídica ou da confiança.

Veja importante decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Ordinário no Mandado de Segurança nº 25.856/DF, Relator o Ministro Eros Grau: EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA.

DIREITO ADMINISTRATIVO.

ANISTIA [LEI N. 8.878/94].

REVOGAÇÃO POR ATO DO MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA APÓS PROCESSO ADMINISTRATIVO QUE TEVE CURSO EM COMISSÃO INTERMINISTERIAL.

POSSIBILIDADE.

SÚMULAS 346 E 473 DO STF.

DECADÊNCIA.

INOCORRÊNCIA.

CONTAGEM DO PRAZO QUINQUENAL A PARTIR DA VIGÊNCIA DO ARTIGO 54 DA LEI N. 9.784/99 [1º.2.99].

CERCEAMENTO DE DEFESA.

VIOLAÇÃO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.

INOCORRÊNCIA.

RECURSO IMPROVIDO. 1.

A Administração Pública tem o direito de anular seus próprios atos, quando ilegais, ou revogá-los por motivos de conveniência e oportunidade [Súmulas 346 e 473, STF]. 2.

O prazo decadencial estabelecido no art. 54 da Lei 9.784/99 conta-se a partir da sua vigência [1º.2.99], vedada a aplicação retroativa do preceito para limitar a liberdade da Administração Pública. 3.

Inexistência de violação dos princípios do contraditório e da ampla defesa.

Todos os recorrentes apresentaram defesa no processo administrativo e a decisão da Comissão Interministerial contém todos os elementos inerentes ao ato administrativo perfeito, inclusive fundamentação pormenorizada para a revogação do benefício.

Recurso ordinário a que se nega provimento (DJ 14/5/10).

E, ainda, no mesmo sentido: EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA.

ADMINISTRATIVO.

ANULAÇÃO DAS ANISTIAS CONCEDIDAS A EMPREGADOS PÚBLICOS COM BASE NA LEI 8.878/94.

PORTARIA INTERMINISTERIAL N. 372/2002.

NÃO CONFIGURAÇÃO DE DECADÊNCIA.

ART. 54 DA LEI 9.784/99.

LEGALIDADE DO DECRETO N. 3.363/2000.

PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA QUANTO AOS SUBSTITUÍDOS NÃO ALCANÇADOS PELO ACÓRDÃO RECORRIDO.

IMPOSSIBILIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA EM MANDADO DE SEGURANÇA.

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. (RMS 26.235/DF, Rel.

Min.

Cármen Lúcia, Primeira Turma, DJ 1º/7/10).

MANDADO DE SEGURANÇA - CAUSAS DE PEDIR - VINCULAÇÃO.

O Órgão julgador do mandado de segurança está vinculado às balizas subjetivas e objetivas da impetração.

ANISTIA - PORTARIA Nº 1.104/64, DA AERONÁUTICA.

A anistia, considerada a Portaria nº 1.104/64, da Aeronáutica, apenas beneficia os integrados à Força Aérea em data anterior à edição.

PROCESSO ADMINISTRATIVO - ANISTIA - REEXAME - PRAZO DECADENCIAL.

Observado o quinquênio previsto no artigo 54 da Lei nº 9.784/99, possível é o reexame de ato que tenha implicado, à margem da ordem jurídica, o deferimento de anistia (RMS 25.852/DF, Rel.

Min.

Marco Aurélio, Primeira Turma, DJ 27/2/09).

EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA.

ADMINISTRATIVO.

INCORPORAÇÃO NO SERVIÇO ATIVO DA AERONÁUTICA APÓS A EDIÇÃO DA PORTARIA 1.104/GM3-64.

AUSÊNCIA DO DIREITO À ANISTIA.

PODER DE AUTOTUTELA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.

TEMPESTIVIDADE.

RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO.

I - Em razão do poder de autotutela, a Administração Pública pode declarar a nulidade de seus próprios atos, quando eivados de vícios que tornem ilegais, ou revogá-los, por motivo de conveniência e oportunidade.

II - Agravo regimental improvido (RMS 25.596/DF, Rel.

Min.

Sepúlveda Pertence, Redator para o Acórdão o Ministro Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, DJ 5/6/09).

EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA.

SERVIDORES DA EXTINTA SIDERBRÁS.

ANISTIA.

LEI Nº 8.878/94.

PORTARIA Nº 387/94.

PEDIDO DE REINTEGRAÇÃO NO SERVIÇO PÚLICO.

O Conselho de Coordenação e Controle das Empresas Estatais anulou várias decisões concessivas de anistia, com base no Decreto nº 1.499/95.

E o fez, na forma da Súmula 473/STF, pela comprovação de indícios de irregularidade nos processos originários.

Mais tarde, o art. 11 do Decreto nº 3.363/2000 ratificou os atos praticados pelo citado Conselho de Coordenação e Controle das Empresas Estatais.

Presunção de legitimidade desses atos que não foi infirmada pelos impetrantes.

Recurso ordinário desprovido. (RMS 25.662/DF, Rel.

Min.

Carlos Britto, Primeira Turma, DJ de 28/9/07).

A legitimidade do exercício do poder de autotutela pela Administração Pública está consagrado nas Súmulas nºs 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.

Vide: A administração pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos (Súmula 346).

A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial (Súmula 473).

Com relação à incidência do prazo decadencial, é assente, nesta Suprema Corte, que é vedada a aplicação retroativa do disposto no art. 54 da lei nº 9.784/99 para limitar a atuação da Administração Pública; por conseguinte, o prazo decadencial conta-se a partir da sua vigência, ou seja, a partir de 1º de fevereiro de 1999.

Nesse sentido, além dos precedentes já citados acima, vide: Agravo regimental em recurso ordinário em mandado de segurança.

Anistia.

Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT).

Portaria Interministerial nº 372/02.

Legítimo exercício da autotutela administrativa.

Decadência administrativa não configurada.

Artigo 54 da Lei nº 9.784/99.

Legalidade do Decreto nº 3.363/02.

Observância do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. 1.

O prazo decadencial previsto no art. 54 da Lei nº 9.784/99 inicia-se com a sua vigência legal, em 1º/2/99, não podendo ser aplicado de forma retroativa.

Precedentes. 2.

Em consonância com as limitações legais, o Decreto nº 3.363/2000 criou a Comissão Interministerial para, mediante o reexame dos processos de anistia, verificar a escorreita adequação dos processos às hipóteses de que trata a Lei nº 8.878/94.

A Portaria Interministerial nº 372, por sua vez, apoiada nos preceitos legais, bem como no Decreto nº 3.363/2000, materializa o exercício do poder de autotutela da Administração Pública.

É cediço o entendimento desta Suprema Corte de que, diante de suspeitas de ilegalidade no ato de declaração de condição de anistiado, a Administração há de exercer seu poder-dever de anular seus próprios atos, sem que isso importe em desrespeito ao princípio da segurança jurídica ou da confiança.

Súmulas 346 e 473 do STF.

Precedentes. 3.

Inexistência de violação das garantias do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, restando demonstrado nos autos, a partir dos documentos a ele anexados, a preocupação da comissão revisora em resguardar a observância desses princípios, inclusive com a abertura de prazo para a apresentação de defesa. 4.

Agravo regimental a que se nega provimento. (RMS nº 27.998/DF-AgR, minha relatoria, Primeira Turma, DJe de 21/9/12).

Pelo que se depreende dos autos, a anistia foi concedida em 1994, sendo que o prazo quinquenal passou a fluir a partir de 1º de fevereiro de 1999, data de início da vigência da Lei nº 9.784/99, razão pela qual, quando da publicação da Portaria Interministerial 325, em 23 de julho de 2002, ainda não havia transcorrido o prazo decadencial para a Administração Pública anular o ato.

Irrefutável, destarte, a conclusão de que se encontra correta a decisão recorrida, do Superior Tribunal de Justiça, a não merecer reparos.

Anote-se, por oportuno que, nos termos do artigo 205 do Regimento Interno desta Corte, em hipóteses como a presente, em que o recurso em mandado de segurança versar matéria objeto de jurisprudência consolidada do Tribunal, poderá o relator decidi-lo monocraticamente.

E tal tipo de agir, conferido ao relator do feito, também já foi submetido ao crivo desta Corte, quando se tratar de recurso ordinário em mandado de segurança, o qual referendou tal possibilidade, ao apreciar o RMS nº 24.549/DF-AgR, de minha relatoria, Primeira Turma, DJ de 20/10/11, in verbis: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR – PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO – AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO – AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1.

Legitimidade da atuação do Ministro Relator ao julgar monocraticamente pedido ou recurso contrário à jurisprudência consolidada do STF. (…) 4.

Agravo regimental não provido (grifos no original).

Ante o exposto, nego seguimento ao recurso (art. 21, § 1º do RISTF).

Publique-se.

Brasília, 27 de fevereiro de 2014.

Ministro Dias Toffoli Relator Documento assinado digitalmente

Partes

Recte.(s) : Anisio Rodrigues dos Reis Junior

adv.(a/S) : Paulo José Boscaro

recdo.(a/S) : Estado de SÃo Paulo

proc.(a/S)(Es) : Procurador-Geral do Estado de SÃo Paulo

Observação

PROCESSO ELETRÔNICO

DJe-045 DIVULG 06/03/2014 PUBLIC 07/03/2014

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