Decisão da Presidência nº 798483 de STF. Supremo Tribunal Federal, 17 de Marzo de 2014

Número do processo798483
Data17 Março 2014

Decisão: Trata-se de recurso extraordinário que impugna acórdão do Tribunal Regional da 2ª Região, assim ementado: ADMINISTRATIVO.

DIREITO DE PROPRIEDADE.

TERRENO DE MARINHA.

DEVIDO PROCESSO LEGAL.

TAXA DE OCUPAÇÃO.

Não pode o poder público, apenas através de procedimento administrativo demarcatório, com citação por edital, considerar que o imóvel regularmente registrado como alodial, e há muito negociado como livre e desembargado, seja imediatamente havido como terreno de marinha, com a cobrança da chamada 'taxa de ocupação'.

O devido processo legal, para o caso, exige quando menos a intimação pessoal.

Expressiva linha sustenta, inclusive, ser exigível a via judiciária, de modo a resguardar os direitos do beneficiário da presunção de veracidade do registro, até contra terceiros, diante da potencial evicção.

Inteligência dos artigos 9o e seguintes do Decreto-lei n° 9.760/1946, 1245, §2°, do CC e artigo 5º, LIV, da Lei Maior.

Remessa e apelação desprovidas. (eDOC 3, p. 7 No recurso extraordinário, interposto com fundamento no artigo 102, III, a, da Constituição Federal, sustenta-se, preliminarmente, a repercussão geral da matéria.

No mérito, aponta-se ofensa ao artigo 20, VII, da Constituição.

Defende-se, em síntese, que a inscrição do imóvel como terreno acrescido da marinha é válida, assim como as cobranças efetuadas pela GRPU.

Decido.

O recurso não merece prosperar.

O acórdão impugnado assentou o seguinte: O autor é proprietário e possuidor do imóvel descrito na inicial desde Adquiriu imóvel alodial, sem quaisquer ônus, inexistente referência de cuidar-se de terreno de marinha, existindo anotação de cadeia dominial regular, e isso é tema incontroverso.

Posteriormente, a União realizou procedimento administrativo nº 10768-007612/97-20, através de seu órgão de patrimônio, nos termos dos artigos 9º e seguintes do Decreto-Lei nº 9760/46, e, aferindo cuidar-se a área constante do título do autor terreno de marinha, internamente demarcou-o assim, pretendendo cobrar, de tal arte, a chamada taxa de ocupação. (…) Assim, a legítima e correta interpretação do artigo 11 do DL de 1946 é aquela que atende aos princípio da ampla defesa e contraditório, segundo a qual os interessados certos devem ser intimados pessoalmente para a defesa de sua propriedade.

Mais ainda quando o registro indica, antes, imóvel alodial e, aplicada outra regra, qual a do artigo 1.245, §2º, do CC, nem se poderia trilhar a mera via administrativa.

Não se negue que a Lei nº 11.481/07 alterou a redação do citado artigo 11, excluindo a intimação pessoal.

A exclusão foi feita, provavelmente para conferir maior celeridade aos trâmites administrativos, conforme aduzido pela União.

Mas a eficiência não pode atropelar o contraditório e o direito à defesa do administrado, mormente em casos nos quais o registro imobiliário indicava ser o imóvel alodial e, assim, outras regras afastariam até a via administrativa.

Ainda que, para argumentar, se admita tal via, ela deve prestigiar a efetiva ampla defesa e contraditório.

No caso, a União tinha ciência do nome e residência dos proprietários interessados no processo administrativo impugnado e, a despeito de tal fato, estes não foram intimados pessoalmente, mas por edital, genericamente.

E ninguém soube, de verdade, do procedimento, tanto que nem oposição houve.

Tudo em flagrante ofensa aos princípios da ampla defesa e contraditório.

A atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica sobre esse ponto, como se verifica a seguir: (…) Não é outro o entendimento desta Turma Especializada, in verbis: (…) No caso, nem o procedimento administrativo previsto nos artigos 9º e seguintes do DL nº 9.760/46 observou os princípios do contraditório e da ampla defesa, pois os interessados certos, à época, não foram intimados pessoalmente.

Mas o fato é que seria possível argumentar que até processo administrativo adequado não poderia prevalecer, por si, sobre o título registrado, até então regular, de quem de direito.

Nos casos em que exista bem havido regularmente como livre do ônus, assim transcrito, assim há muito negociado, não havendo concordância do proprietário aparente, é razoável entender existir necessidade de uso da via judicial, com retificação do registro imobiliário, para que, finalmente, o terreno seja considerado de marinha.

Esta linha tem aparo em preceitos claros (artigos 32 e seguintes do mesmo Decreto-lei nº 9.760 e, hoje, o artigo 1.245, §2º, do CC).

No caso, este debate é desnecessário, pois a sentença já fixou aspecto sobre o procedimento administrativo, e a parte não recorreu. (grifei) (eDOC 2, p. 82-83 e DOC 3, p. 1-3) Assim, o Tribunal de origem decidiu com base na legislação de regência (Decreto-Lei 7.760/1946) e nos elementos probatórios dos autos.

Para se entender de forma diversa, seria imprescindível interpretar a legislação infraconstitucional, assim como revolver o conjunto fático-probatório dos autos, procedimentos vedados no âmbito do julgamento do recurso extraordinário.

Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO.

TERRENOS DE MARINHA.

TITULARIDADE.

DEMARCAÇÃO.

NECESSIDADE DE ANÁLISE DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL.

OFENSA REFLEXA.

IMPRESCINDIBILIDADE DE EXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO.

INCIDÊNCIA DA SÚMULA 279 DO STF.

AGRAVO IMPROVIDO.

I - Para se chegar à conclusão contrária à adotada pelo Tribunal de origem, acerca da titularidade do imóvel, seria necessária a análise das normas infraconstitucionais aplicáveis à especie, bem como o reexame do conjunto fático probatório constante dos autos, o que atrai a incidência da Súmula 279 do STF.

Precedentes.

II – Agravo regimental improvido. (ARE-AgR 757.502, Rel.

Min.

Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe 24.9.2013) Agravo regimental em agravo de instrumento. 2 Direito Administrativo. 3.

Terreno de marinha.

Discussão acerca da titularidade do imóvel.

Necessidade de reexame do conjunto fático-probatório.

Impossibilidade.

Súmula 279. 4.

Agravo regimental a que se nega provimento. (AI-AgR 801.728, de minha relatoria, Segunda Turma, DJe 19.4.2012) AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.

CONSTITUCIONAL.

TERRENOS DE MARINHA.

TITULARIDADE DOMINIAL.

DEMARCAÇÃO.

NECESSIDADE DA ANÁLISE DE LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL E DO REEXAME DE PROVAS.

OFENSA CONSTITUCIONAL INDIRETA.

INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 279 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. (RE-AgR 550.347, Rel.

Min.

Cármen Lúcia, Primeira Turma, DJ 7.4.2011) Ante o exposto, nego seguimento ao recurso extraordinário (arts. 21, §1º, do RISTF, e 557, caput, do CPC).

Publique-se.

Brasília, 17 de março de 2014.

Ministro Gilmar Mendes Relator Documento assinado digitalmente

Partes

Reclte.(s) : Edno Jose de Oliveira

adv.(a/S) : Geraldo Alves Mundim Neto e Outro(a/S)

recldo.(a/S) : Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais

adv.(a/S) : sem Representação nos Autos

intdo.(a/S) : Ministério PÚblico do Estado de Minas Gerais

proc.(a/S)(Es) : Procurador-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais

intdo.(a/S) : José Jairo Alves Martins

intdo.(a/S) : Adenilton de Oliveira Sousa

intdo.(a/S) : Flávio Narciso da Fonseca

intdo.(a/S) : Ana Flávia Alves

intdo.(a/S) : Adriel AntÔnio dos Santos

intdo.(a/S) : Jairo Campos da Silva

intdo.(a/S) : Geraldo Ribeiro Magalhães

intdo.(a/S) : Jucélia de Oliveira Magalhães

intdo.(a/S) : Geraldão Materiais de Construção Ltda - Me

adv.(a/S) : Aroldo Plinio Gonçalves

adv.(a/S) : Rodrigo Ribeiro Pereira

Observação

PROCESSO ELETRÔNICO

DJe-055 DIVULG 19/03/2014 PUBLIC 20/03/2014

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