Acórdão nº 2003.38.00.020708-0 de Tribunal Regional Federal da 1a Região, Quarta Turma, 19 de Julio de 2005

Data19 Julho 2005
Número do processo2003.38.00.020708-0
ÓrgãoQuarta Turma (Tribunal Regional Federal da 4a Região do Brasil)
Appeal TypeApelação Criminal

Assunto: Entorp.Uso e Tráfico Ilícito-Lei 6368/76 e Dec.78992/76

Autuado em: 26/2/2004 13:41:21

Processo Originário: 20033800020708-0/mg

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 2003.38.00.020708-0/MG

RELATOR: EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL HILTON QUEIROZ

APELANTE: JUSTIÇA PÚBLICA

PROCURADOR: MIRIAN R. MOREIRA LIMA

APELANTE: RUI BARBOSA SARAIVA FILHO (RÉU PRESO)

ADVOGADO: LÚCIO ADOLFO DA SILVA

APELANTE: VANDERLEI DA CUNHA MADUREIRA (RÉU PRESO)

APELANTE: MARIO ZENON SANDOVAL SOLIS (RÉU PRESO)

ADVOGADO: MARCOS AFONSO DE SOUZA E OUTROS(AS)

APELANTE: RAMON ARIEL FRANCISCO RODRIGUES (RÉU PRESO)

APELANTE: HOLMER ACOSTA RUIZ (RÉU PRESO)

ADVOGADO: SANDER GOMES PEREIRA JÚNIOR

APELADO: OS MESMOS

ACÓRDÃO

Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento ao apelo do Ministério Público, dar provimento parcial ao apelo de RAMON ARIEL FRANCISCO RODRIGUES e HOLMER ACOSTA RUIZ e negar provimento aos apelos de VANDERLEI DA CUNHA MADUREIRA, MÁRIO ZENON SANDOVAL SOLIS e RUI BARBOSA SARAIVA FILHO, reconhecendo-se, ainda, a possibilidade de progressão no regime prisional, para todos os réus, quanto ao delito de associação para o tráfico.

4ª Turma do TRF da 1ª Região - 11/09/2007.

HILTON QUEIROZ

DESEMBARGADOR FEDERAL

RELATÓRIO

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL HILTON QUEIROZ (RELATOR):

Cuida-se de apelações interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (razões fls.1.114/1.136), pelos acusados VANDERLEI DA CUNHA MADUREIRA e MÁRIO ZENON SANDOVAL SOLIS (razões fls. 1.217/1.224), pelos acusados RAMON ARIEL FRANCISCO RODRIGUES e HOLMER ACOSTA RUIZ (razões fls.1.161/1.210) e pelo acusado RUI BARBOSA SARAIVA FILHO (razões fls.

1.309/1.316), contra a r. sentença de fls. 1.044/1.087, da lavra do MM.

Juiz Federal da 9ª Vara/MG que absolveu os acusados do delito previsto no art. 12 da Lei nº 6.368/76 e condenou os acusados como incursos nas penas do art. 14 c/c art. 18, I, todos da Lei nº 6.368/76, pela prática do delito de associação para o tráfico internacional de entorpecentes, sendo o acusado RAMON ARIEL condenado também pela prática do delito tipificado no art. 304 c/c art. 297, ambos do CP, em concurso material com o crime de associação.

O Ministério Público apela (fls. 1.114/1.136) insurgindo-se contra a absolvição dos acusados pela prática do delito descrito no art. 12 da Lei nº 6.368/76 - Tráfico de Entorpecente. Alega que a confissão de três dos acusados deu-se de forma espontânea e coerente, além de se encontrar em sintonia com as demais provas dos autos, sendo assim haveria prova suficiente para a condenação dos referidos acusados.

Rechaça , ainda, o órgão acusador a tese da defesa do chamado flagrante preparado ou forjado, eis que a ação da polícia restringiu-se ao acompanhamento dos passos da quadrilha, caracterizando, sim, o flagrante esperado. Aduz , outrossim, que a ação da polícia encontra respaldo na Lei nº 9.034/95, que trata da utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas, bem como na Lei nº 10.409, de 11/01/2002, aplicável ao caso segundo o princípio tempus regit actum. Essa última lei prevê, no art. 33, II, "a possibilidade de 'não atuação policial sobre os portadores de produtos substanciais ou drogas ilícitas que entrem no território brasileiro, dele saiam ou nele transitem, com a finalidade de, em colaboração ou não com outros países, identificar e responsabilizar maior número de integrantes de operações de tráfico e distribuição, sem prejuízo da ação penal cabível'." (fl. 1.133).

Ainda o Ministério Público: "Prevê o caput do artigo, contudo, a autorização judicial, mas não prevê sanção para o caso de procedimento irregular." (idem).

Ao final, sustenta o Ministério Público:

"assim, ficou comprovado que Rui 'vendeu e forneceu matéria-prima, instrumentos e objetos destinados ao preparo e transformação' da cocaína e Vanderley, Holmer e Ramon 'adquiriram matéria-prima e utensílios destinados à preparação da droga'.

Vanderley também "utilizou" e "consentiu" na utilização de local que tinha a propriedade, posse e guarda para que, junto com outros componentes do grupo, pudessem praticar toda sorte de atos tendentes a preparar a droga e destiná- la ao exterior.

Comprovou-se, igualmente, que Vanderley, Ramon, Holmer e Mário, na exata medida de suas participações e responsabilidades pela empreitada, mantiveram em depósito e guardaram substância entorpecente - cocaína, matéria- prima e petrechos utilizados na preparação de substância entorpecente - cocaína.

A localização de verdadeiro laboratório para o refino de cocaína no imóvel, sob a responsabilidade de um denunciado com considerável histórico de envolvimento na atividade do tráfico de entorpecentes, propriedade na qual estavam presentes outros integrantes estrangeiros que colaboravam com o preparo, o depósito e a guarda da droga e com o depósito e guarda dos utensílios e produtos químicos destinados a esse preparo, implica, de maneira inequívoca, um rigoroso juízo de reprovabilidade sobre o intenso dolo com o qual o réu Vanderley se propôs a alavancar a empreitada criminosa. É certo que os antecedentes não constituem prova em si sobre os fatos narrados na denúncia, mas reforçam convicções quando permitem concluir ser o crime uma forma de procedimento rotineiro do agente, mostrando, ainda, sua tendência à reiteração da atividade delituosa. Nesse sentido, vejam-se as folhas de antecedentes criminais de fls. 265/267, da qual se extrai que o denunciado passa a ostentar a condição de reincidente em crime da mesma natureza, tráfico de drogas.

Não obstante provadas as condutas descritas no caput e no parágrafo primeiro, inciso I, do artigo 12 da Lei n° 6.368/76, a conduta de consentir e responsabilizar-se pelo local destinado ao preparo e depósito da droga serviria, ainda que isoladamente, a incriminar o denunciado Vanderley, tendo em vista o parágrafo segundo deste citado dispositivo da Lei de Tóxicos." (fls. 1.134/1.135).

VANDERLEI DA CUNHA MADUREIRA e MÁRIO ZENON SANDOVAL SOLIS apelam (fls. 1.217/1.224), sustentando a inexistência de prova idônea para condenação dos apelantes. Alegam que o Ministério Público não logrou comprovar a participação dos apelantes no evento criminoso.

Outrossim, aduzem a ausência do vínculo associativo para configurar o art. 14 da Lei 6.368/76.

Por sua vez, RAMON ARIEL FRANCISCO RODRIGUES e HOLMER ACOSTA RUIZ apelam, alegando, preliminarmente, nulidade do processo em razão de prejuízo causado à defesa pelos seguintes fatos:

. inacessibilidade da defesa a todas as provas colhidas na fase inquisitorial, em especial uma fita de vídeo gravada pelos agentes federais que registraram a presença dos acusados Holmer e Ramon na empresa Líder Química Ltda. e três envelopes pardos, contendo documentos apreendidos nas operações policiais;

. indeferimento, pelo magistrado a quo de duas perguntas à testemunha de acusação Alexandre;

. negativa ao pedido de acareação entre a testemunha Michael Antônio dos Santos e o acusado Rui Barbosa Saraiva Filho, além das testemunhas Cláudia Patrícia Lopes Tobar e Vilma Clara de Oliveira.

No mérito, sustentam que as provas produzidas contra os mesmos são contraditórias, não sendo suficientes a arrimar um decreto condenatório.

Em síntese, asseveram que:

"A verdade é que os réus foram condenados:

  1. Porque se hospederam em João Pinheiro às custas de Luis Scalia Neto, Ramon Ariel em busca de emprego, tendo pago a Luis a quantia de U$ 2.000,00 (dois mil dólares) para que este lhe servisse como agenciador de emprego, e Holmer Acosta por vir ao Brasil, a convite do amigo Ramon, para fugir das FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) que o estavam ameaçando, e à sua família, bem como os extorquindo;

  2. Porque confiaram em um brasileiro, de nome Luis, que, mostrando-se-lhes uma pessoa de recursos, ofereceu-lhes ajuda, sem que jamais desconfiassem das reais intenções deste;

  3. Por um depoimento prestado por Holmer Acosta, em sede policial, que foi integralmente descartado por ele próprio em juízo, vez que lhe eram feitas diversas perguntas ao mesmo tempo, suas respostas eram resumidas pela autoridade policial, e, ao fim, não lhe foi lido pela intérprete, 'porque já eram duas horas da manhã'.

    Quanto ao item 'a' acima, cabe ressaltar que os apelantes não tinham conhecimento sobre as reais intenções de Luís Scalia Neto, e que confiaram em sua oferta de ajuda até porque Ramon havia pago a este a quantia de dois mil dólares.

    Data maxima venia, se os apelantes podem ser condenados em vista de tal fundamentação, todo cidadão que não tomar cautelas ao contratar o serviço de terceiros, não exigir destes atestados de idoneidade, de antecedentes e de boas intenções, a partir de então, também o será.

    Se, sem que saiba, uma pessoa contratar serviços lícitos de um estelionatário, será estelionatário também? Se for contratado o serviço - lícito - um homicida, isso fará da pessoa também um homicida? O que se dirá, então, de um estuprador? Está certo, quando a esmola é muita o santo desconfia! Mas será que, em vista de todas as lacunas e obscuridades reconhecidas pelo próprio juízo a quo nestes autos, em vista de todo o lastro probatório em que se baseou a defesa, tal máxima é suficiente para que se afirme, com absoluta certeza, que existiu vínculo subjetivo entre Ramon, Holmer e os demais acusados, voltado ao tráfico internacional de drogas? A defesa entende que não.

    Resta apenas aos apelantes confiar que não seja mantida sua condenação apenas com base no depoimento prestado por Holmer em sede policial, que não lhe foi sequer lido pela intérprete após prestado, 'porque já eram duas horas da manhã', e que depois foi integralmente negado por ele em juízo.

    De fato, dadas todas as 'trapalhadas', apontadas à saciedade no inquérito policial, não parecem tão absurdas as declarações de Holmer em juízo, de que a autoridade policial lhe fazia várias perguntas de uma só vez, resumia tudo no Auto de interrogatório, de que este não lhe foi traduzido, sendo-lhe mandado assinar, e de que dele constam...

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