Acórdão nº 1.0687.06.047144-2/001(1) de TJMG. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, 31 de Marzo de 2009

Magistrado ResponsávelJudimar Biber
Data da Resolução31 de Marzo de 2009

EMENTA: PROCESSUAL PENAL - PRELIMINAR - SENTENÇA - NOVA CLASSIFICAÇÃO DADA AO DELITO, DECORRENTE DA SIMPLES CORREÇÃO DA CAPITULAÇÃO LEGAL, EM FACE DO FATO SUFICIENTEMENTE NARRADO NA DENÚNCIA - INEXISTÊNCIA DE IRREGULARIDADE OU NULIDADE - DESNECESSIDADE DE BAIXA DOS AUTOS - NÃO CONFIGURAÇÃO DA HIPÓTESE DE 'MUTATIO LIBELLI', MAS DE 'EMENDATIO LIBELLI' - INTELIGÊNCIA DO ART. 383 E ART. 384, AMBOS DO CPP. Pode o juiz dar nova definição jurídica ao crime, mormente quando o fato está explicitamente narrado na denúncia, não havendo, nesse caso, surpresa para a defesa, inexistindo quaisquer diligências a serem suscitadas posto que não se configura a hipótese do art. 384 ('mutatio libelli'), mas a do art. 383 ('emendatio libelli'), ambos do Código de Processo Penal. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. ESTELIONATO - DESCLASSIFICAÇÃO PARA FURTO - ANTECIPAÇÃO DE VENCIMENTO DOS BOLETOS E DESCONTOS DOS CHEQUES DESTINADOS AOS PAGAMENTOS PARA PROVEITO PRÓPRIO - FRAUDE CARACTERIZADA - CONDENAÇÃO MANTIDA. Inquestionável a configuração do crime de estelionato quando resta demonstrado nos autos, através das seguras provas oral e documental, aliadas aos indícios veementes, que a apelante obteve vantagem econômica mediante a utilização de meio fraudulento. PENA - DOSIMETRIA - REDUÇÃO AO MÍNIMO LEGAL - IMPOSSIBILIDADE. Não é o Juízo completamente livre na fixação da pena, mas vinculado às determinações contidas no art. 59 do Código Penal e se duas das oito circunstâncias pesaram contra o réu, considerando as três fases de sua imposição, não se justifica a genérica pretensão de imposição de pena no mínimo legalmente admitido que não encontra qualquer sustentação fática, lógica, ou jurídica. CRIME CONTINUADO - CRITÉRIO NUMÉRICO DE CRIMES - ABRANDAMENTO - IMPOSSIBILIDADE. A imposição de critério puramente matemático a conduzir a uma fração matemática específica, como não vem lastreado por norma de contenção específica, contrariaria, de forma frontal, a garantia de individualização da pena conferida não apenas ao acusado, mas também à sociedade, na forma do art. 5º, XLVI, da Constituição Federal, devendo prevalecer o critério de continuidade pelo numero de delitos praticados, o que revela uma fração matemática imposta em 1/5 até mesmo benevolente, considerando que foram três ações praticas no mesmo contexto. Recuso não provido.

APELAÇÃO CRIMINAL N° 1.0687.06.047144-2/001 - COMARCA DE TIMÓTEO - APELANTE(S): PATRÍCIA DE SOUZA CORREIA - APELADO(A)(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO MINAS GERAIS - RELATOR: EXMO. SR. DES. JUDIMAR BIBER

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, EM NÃO PROVER O RECURSO.

Belo Horizonte, 31 de março de 2009.

DES. JUDIMAR BIBER - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. JUDIMAR BIBER:

VOTO

Trata-se de recurso de apelação criminal interposto por PATRÍCIA DE SOUZA CORREIA, contra a sentença de fls.94/98, que julgou parcialmente procedente a denúncia aviada pelo Ministério Público e condenou a apelante como incursa nas sanções do artigo 171, caput, c/c artigo 61, inciso II, "g", e artigo 65, inciso III, "d" do Código Penal, por três vezes, na forma do artigo 71, do mesmo diploma legal, à pena privativa de liberdade de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão, em regime aberto, e pagamento de 18 (dezoito) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo. A sanção corporal foi substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação pecuniária e prestação de serviços à comunidade

Em suas razões recursais de fls. 108/116, a defesa bate-se, preliminarmente, pela nulidade da sentença, por inobservância do disposto no art. 384 do CPP, uma vez que a ré foi condenada por crime diverso do descrito na denúncia, pugnando ainda para seja corrigido erro material constante na pena ao final atribuída. No mérito, requer a desclassificação para o delito de furto, bem como a redução da pena ao mínimo legal e do quantum da fração atribuída à continuidade delitiva, com a conseqüente a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos.

O recurso foi devidamente contra-arrazoado às fls.118/123.

Nesta Instância Revisora (fls. 126/132), a douta Procuradoria de Justiça opina pelo desprovimento do apelo.

É o relatório.

Passo ao voto.

Conheço do recurso, eis que presentes os requisitos objetivos e subjetivos de sua admissibilidade.

Preliminarmente, sustenta a defesa a nulidade da sentença, alegando que o MM. Juiz condenou a acusada por crime diverso do que lhe foi imputado na inicial acusatória, violando o princípio do contraditório e da ampla defesa, por deixar de proporcionar à apelante a produção de provas.

Em que pese a apelante ter sido denunciada no art. 155 sendo condenada pelo art. 171, ambos do Código Penal, não vejo qualquer irregularidade, ou mesmo nulidade no fato do Juízo dar ao fato capitulação diversa daquela contida na denúncia, porque na verdade o réu não se defende da capitulação se não dos fatos que lhe são imputados, de modo que se a conduta descritiva contida na denúncia não se amolda à sua capitulação, pode o Juiz dar nova definição jurídica ao fato, o que, de resto, encontra específica indicação no art. 383 do Código de Processo Penal.

Basta verificar que constou expressamente da denúncia o fato a dar o deslinde sustentado pela sentença produzida, para que se chegue à conclusão que a pretensão da defesa não tem fundamento jurídico válido, senão vejamos a ação descritiva:

A denunciada, no mês de março 2006, subtraiu para si R$10.169,69 (dez mil cento e sessenta e nove reais e sessenta e nove centavos), pertencentes a Pedreira Um Valemix Ltda, onde trabalhava como auxiliar administrativo, no setor de finanças/contas a pagar.

A denunciada, valendo-se da condição de funcionária da empresa, responsável pela emissão dos cheques destinados a pagamentos de boletas e duplicatas, antecipou no sistema de controle interno o vencimento de três boletas, sacadas em benefício de Sociedade Mineração Indústria e Comércio Ltda., no valor de R$3.072,06, de Distribuidora Automotiva Ltda., no valor de R$4.977,05, e de Bressan Distribuidora e Peças, no valor de R$2.106,14, conforme se vê às fls. 10/12 dos autos do inquérito policial em epígrafe.

Com tal expediente, providenciou a emissão dos cheques que seriam utilizados para os respectivos pagamentos, antes do vencimento, descontando-os mediante apresentação ao estabelecimento bancário e subtraindo os valores em proveito próprio, deixando as boletas sem pagamento (...)

Ora, não se trata de hipótese concernente ao art. 384 do Código de Processo Penal (mutatio libelli), mas, sim, da situação prevista no art. 383 do mesmo Diploma Legal (emendatio libelli), já que a mudança ocorrida quando da sentença de condenação limita-se à capitulação dada ao crime pela denúncia.

Sobre o assunto, orienta o colendo Superior Tribunal de Justiça no sentido de que:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. ART. 1º, I, ALÍNEA A, C/C §§ 3º E 4º, INCISO I DA LEI Nº 9.4555/97. DEFESA PRELIMINAR. CRIME INAFIANÇÁVEL. INAPLICABILIDADE. AUTORIA. ANÁLISE DE PROVAS. INVIABILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7 DESTA CORTE. HIPÓTESE DE MUTATIO LIBELLI. INOCORRÊNCIA. ART. 70 DO CP. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. (...) III - Se a imputatio facti, explícita ou implicitamente, permite definição jurídica diversa daquela indicada na denúncia, tem-se a possibilidade de emendatio libelli (art. 383 do CPP). Não há, pois, nulidade decorrente da inobservância do mecanismo da mutatio libelli (art. 384 do CPP), se a exordial acusatória apresenta narrativa abrangente que admite outra adequação típica (Precedentes do Pretório Excelso e do STJ). (...) (REsp 809932-MG - 5ª T. - Rel. Mini. Felix Fischer - DJU 26.02.2007 - p. 635)

Seria mesmo inexigível, a pretensão de qualificar a ação jurisdicional a deslindar o processo criminal, como mutação da denúncia, na forma do art. 384 do Código Penal, já que a própria circunstância fática que se subsumiu ao tipo penal da condenação, encontra regular descrição na inicial, tendo o Juízo dado qualificação jurídica diversa ao fato explicitamente descrito, o que é expressamente admitido pelo art. 383 do Código de Processo Penal, sem as providências pretendidas pela defesa que estão declinadas no art. 384 do mesmo diploma processual.

Em relação ao erro material na dosimetria da pena, em que pese a defesa tenha suscitado a matéria em preliminar, deixarei para analisá-lo em momento oportuno, a partir da verificação do mérito recursal, porque o virtual equívoco não produz qualquer tipo de nulidade e pode ser corrigido a qualquer momento.

Rejeito as preliminares.

No mérito, pretende inicialmente a defesa a desclassificação do crime de estelionato para o de furto.

A materialidade delitiva está demonstrada através do boletim de ocorrência de fls. 07/09, dos recibos de fls. 13/15 e dos documentos de fls. 23/35.

A autoria também não consente dúvidas, porquanto confessada pela apelante na fase inquisitiva (fls. 16/18), apesar do seu não comparecimento em juízo, estando ainda alicerçada pelos depoimentos testemunhais de Karina Magri Azevedo (fls. 10/12 e 82), de Elci Maria Vieira Metzker (fls. 19/22 e 83), Hudson José de Souza (fls. 21/22 e 84) Gislene Serafim dos Reis (fls. 36/37 e 77), valendo ressaltar que nem mesmo foi objeto de inconformismo defensivo.

Vislumbra-se que a defesa não traz qualquer fundamentação ou justificativa para o pedido, limitando-se a requer a desclassificação no final de suas razões.

Friso inicialmente que para a composição do crime de estelionato, necessária a presença de quatro elementos essenciais: o emprego da fraude, a provocação ou manutenção de erro; a locupletação ilícita e, por fim, a lesão ao patrimônio de outrem.

Cesar Roberto Bitencourt nos dá conta:

O elemento subjetivo geral do estelionato é o dolo, representado pela vontade livre e consciente de...

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