Acórdão nº 2004/0180680-0 de T6 - SEXTA TURMA

Magistrado ResponsávelMinistro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA (1127)
EmissorT6 - SEXTA TURMA
Tipo de RecursoHabeas Corpus

HABEAS CORPUS Nº 40.503 - RS (2004/0180680-0)

RELATOR : MINISTRO HÉLIO QUAGLIA BARBOSA
R.P/ACÓRDÃO : MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO
IMPETRANTE : E.T.R.C. E OUTRO
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PACIENTE : MARCO ANTÔNIO BERTUZZI (PRESO)

EMENTA

HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. CONSTITUIÇÃO DE ADVOGADO PARA ASSISTÊNCIA À ACUSAÇÃO. ILEGITIMIDADE AD CAUSAM DO MINISTÉRIO PÚBLICO. INOCORRÊNCIA. REPRESENTAÇÃO. OMISSÃO DE UM DOS GENITORES. DECADÊNCIA. INCARACTERIZAÇÃO. ORDEM NÃO-CONHECIDA.

  1. O fato simples da constituição de advogado para a intervenção do representante legal do ofendido na qualidade de assistente do Ministério Público não ilide a miserabilidade jurídica que legitima o Parquet à propositura da ação penal.

  2. Omitindo-se um dos genitores acerca do crime contra os costumes praticado contra o menor, o prazo para a representação flui a partir da data em que o outro toma conhecimento do fato típico.

  3. Ordem não-conhecida.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, retificando decisão proferida em Sessão do dia 21.10.2008, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Paulo Gallotti denegando a ordem de habeas corpus, por maioria, não conhecer do pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Sr. Ministro Hamilton Carvalhido, que lavrará o acórdão. Vencido o Sr. Ministro Nilson Naves. Os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido e Paulo Gallotti votaram com o Sr. Ministro Relator. Não participaram do julgamento os Srs. Ministros Maria Thereza de Assis Moura, Og Fernandes e Jane Silva (Desembargadora convocada do TJ/MG). Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

    Brasília, 30 de outubro de 2008 (Data do Julgamento)

    MINISTRO Hamilton Carvalhido, Relator

    HABEAS CORPUS Nº 40.503 - RS (2004/0180680-0)

    RELATÓRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO HÉLIO QUAGLIA BARBOSA (Relator):

    Cuida-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de M.A.B., contra decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, em sede de embargos infringentes.

    Narra a impetração que o paciente foi condenado pela prática do delito descrito no artigo 214 c/c artigo 224, "c", e artigo 226, III, todos do Código Penal, a uma reprimenda de nove anos, quatro meses e quinze dias de reclusão, em regime inicialmente fechado. Apelou ao Tribunal estadual, que, por maioria, reformou a anterior decisão, reduzindo a pena para sete anos de reclusão, mantido o regime de cumprimento.

    Houve determinação para expedição de mandado de prisão em desfavor do paciente, em decisão tomada pelo 3º Grupo Criminal daquela Corte.

    Alega que não houve, até o momento, oportunidade de qualquer recurso visando o desfazimento do decisum, dada a não publicação do acórdão.

    Pugna a defesa pelo reconhecimento da ilegitimidade ad causam do Ministério Público, haja vista o delito tipificado no artigo 214 do Código Penal configurar hipótese de ação penal privada; pretende, secundariamente, caso superada a nulidade anteriormente apontada, ver reconhecida a decadência do direito de representação.

    Liminar indeferida (fl. 68); informações dispensadas.

    O Ministério Público Federal opinou pela denegação da ordem (fls. 71/76), em parecer assim ementado:

    HABEAS CORPUS. ALEGAÇÃO DE NULIDADE ABSOLUTA DA AÇÃO PENAL EM FACE DA ILEGITIMIDADE AD CAUSAM DO MINISTÉRIO PÚBLICO E EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELA DECADÊNCIA. INVIABILIDADE DE PROFUNDA AVALIAÇÃO FÁTICO-PROBATÓRIA EM SEDE DE WRIT, FACE A SUA NATUREZA CÉLERE. PARECER PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM.

    É o relatório.

    HABEAS CORPUS Nº 40.503 - RS (2004/0180680-0)

    EMENTA

    HABEAS CORPUS. PENAL. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. DECLARAÇÃO DO PAI DA VÍTIMA QUANTO À IMPOSSIBILIDADE DE SUBSISTÊNCIA DA FAMÍLIA. AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA (CÓDIGO PENAL, ARTIGO 225, §1º, INCISO I). REPRESENTAÇÃO. DECADÊNCIA. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO DO TRIBUNAL A QUO. REAPRECIAÇÃO SUBJETIVA DO CONJUNTO PROBATÓRIO. INVIABILIDADE EM SEDE DO WRIT.

  4. Não merece conhecimento o writ, dada a inexistência, nos autos, do acórdão proferido em sede de embargos infringentes pelo Tribunal estadual do Rio Grande do Sul; não se poderia, neste Superior Tribunal, trazer a debate a matéria impugnada, sem a necessária manifestação do Tribunal a quo, estabelecendo os verdadeiros limites da quaestio;

  5. Ainda que ausente a decisão, já no parecer ofertado pelo representante ministerial, havia ressalva quanto à possibilidade de discussão, naqueles embargos infringentes, da matéria relativa à não-miserabilidade da vítima ou de seus responsáveis e o exaurimento do prazo para a representação, dada a inexistência de divergência;

  6. Mesmo que prosseguindo na análise do writ, não se poderia, na sede eleita, dar nova configuração ao conjunto probatório já apreciado na instância anterior; quanto à análise de provas em sede de habeas corpus, tenho me manifestado, reiteradamente, pela possibilidade de análise, desde que não implique em reapreciação subjetiva de matéria já examinada pela instância anterior, dando-lhe nova configuração objetiva;

  7. Esta Corte, assim como o Supremo Tribunal Federal, tem por despicienda a apresentação de atestado de pobreza, bastando a simples declaração do responsável quanto à impossibilidade de arcar com as despesas processuais, sem comprometimento da subsistência do grupo familiar;

  8. Quanto à alegada decadência, inviável se coloca eventual análise sobre sua ocorrência, tendo em conta que a própria impetração trabalha com meras conjecturas em relação aos marcos iniciais para a contagem do prazo decadencial, demandando, pois, acurada reapreciação das provas trazidas inicialmente ao autos da ação penal, o que, como já se demonstrou, se faz inviável na sede eleita;

  9. Writ não conhecido.

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO HÉLIO QUAGLIA BARBOSA (Relator):

  10. Primeiramente, não faz jus a conhecimento o presente writ, já pela ausência, nos autos, de cópia do acórdão proferido em sede de embargos infringentes pelo Tribunal estadual do Rio Grande do Sul.

    Não se poderia, pois, neste Superior Tribunal, trazer a debate a matéria impugnada, sem a necessária ciência do Tribunal a quo a estabelecer os verdadeiros limites da quaestio.

  11. Por outra volta, ainda que ausente o teor da referida decisão, destaco que, já no parecer ofertado pelo representante ministerial, havia ressalva quanto à impossibilidade de discussão, naqueles embargos infringentes, da matéria relativa à não-miserabilidade da vítima ou de seus responsáveis e ao exaurimento do prazo para a representação.

    Observe-se:

    "Os embargos devem ser rejeitados.

    Inicialmente, deve-se considerar que a divergência cameral consiste, única e exclusivamente, quanto ao mérito, visto que as preliminares, novamente argüidas nos presentes embargos, já foram objeto de exame por ocasião da apelação crime, tendo sido, por unanimidade, repelidas.

    Como sabido, os embargos são restritos à matéria objeto da divergência." (fls. 1.295/1.296 do Apenso; grifos no original).

  12. Mesmo que prosseguindo na análise do writ, não se poderia, na sede eleita, dar nova configuração ao conjunto probatório já apreciado na instância anterior

    Quanto à análise de provas em sede de habeas corpus, tenho me manifestado, reiteradamente, pela possibilidade de análise do conjunto probatório, desde que não implique em reapreciação subjetiva de matéria já examinada pela instância anterior, dando-lhe nova configuração objetiva.

    Vê-se, pois, trata-se:

    "(...) de comezinha lição em nossas Cortes de Justiça, que o processo de habeas corpus, devido à sua natureza jurídico-constitucional, não comporta incursão no conjunto fático-probatório para a solução da quaestio trazida, isto é, "não se presta à instrução nos moldes dos processos comuns." (Heráclito Antônio Mossin in Habeas Corpus. Antecedentes Históricos, Hipóteses de Impetração, Processo, Competência e Recursos. 6ª edição. São Paulo: Atlas, 2002, página 227); sobre o tema, trago à colação alguns julgados deste Órgão Colegiado: HC 30.206/MA, Rel. Min. PAULO MEDINA, DJ de 16/8/2004; HC 27.897/RJ, Rel. Min. PAULO GALLOTTI, DJ de 21/6/2004; HC 24.493/MG, Rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO, DJ de 17/11/2003.

    Contudo, o que se pretende impedir, disso estou convicto, é uma perquirição meticulosa, aprofundada, minuciosa do arcabouço probatório, o que, por certo, não significa a total impertinência de sua análise.

    Observa-se que a correta delimitação da matéria já se manifestava, nos idos da década de sessenta, nas discussões de nossa Suprema Corte. Trago aqui notícia do julgamento do HC 42.697, da relatoria do saudoso Ministro Victor Nunes Leal, que, ao debater sobre o alcance da expressão 'abuso de poder' contida na norma constitucional disciplinadora do remédio heróico, assentou a inviabilidade de uma proibição absoluta quanto à apreciação de provas em sede de habeas corpus (artigo 141, §23, da Constituição Federal de 1946, "Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. Nas transgressões disciplinares, não cabe o habeas corpus).

    Permitam-me reproduzir trechos do julgado:

    'Desses casos, que acabei de mencionar, que havemos de concluir em relação à norma tradicional de que no habeas corpus não se examina prova? O que deles resulta, em última análise, é que o Supremo Tribunal Federal está aplicando a noção do abuso de poder como fundamento para concessão do habeas corpus. Em muitos casos, realmente, não é possível verificar se houve abuso de poder senão examinando a prova, em certa medida, que não é suscetível de ser estabelecida em termos absolutamente exatos, dependendo, em cada caso, da prudência e tirocínio dos julgadores.'

    E, mais adiante, conclui com maestria:

    'Não há, pois, Sr. Presidente, um desvio do Supremo Tribunal na sua antiga orientação de não examinar prova em habeas corpus. O Supremo Tribunal não...

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