Acórdão nº 2008/0003244-0 de T3 - TERCEIRA TURMA

Data23 Junho 2009
Número do processo2008/0003244-0
ÓrgãoTerceira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.021.688 - RJ (2008/0003244-0)

RELATOR : MINISTRO MASSAMI UYEDA
R.P/ACÓRDÃO : MINISTRO SIDNEI BENETI
RECORRENTE : E.A.S.
ADVOGADOS : ANTÔNIO AUGUSTO ALCKMIN NOGUEIRA
ALEXANDRE FIDALGO E OUTRO(S)
RECORRIDO : E.A.D.S.N.
ADVOGADO : L.R.L.S. E OUTRO(S)

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ATO ILÍCITO. RESPONSABILIDADE CIVIL. INOCORRÊNCIA. LEI 5.250/67 (LEI DE IMPRENSA). ABSOLVIÇÃO CRIMINAL COM REFLEXOS CIVIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. PUBLICAÇÃO DE REPORTAGEM EM REVISTA DE GRANDE CIRCULAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE DANO EXTRAPATRIMONIAL NA ESPÉCIE. LIBERDADE DE INFORMAÇÃO. FATO PÚBLICO E NOTÓRIO. UTILIZAÇÃO DE EPÍTETO (ANIMAL). POLISSÊMICO. POSSIBILIDADE. VALORAÇÃO DE PROVAS. SÚMULA 7. NÃO INCIDÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. PROVIMENTO.

  1. No caso em exame, não se trata de reexame de prova, isto é, de motivos de conhecimento dos fatos em que se funda o reconhecimento de dano moral e uso da imagem, visto que os fatos são absolutamente certos, mas sim de valoração jurídica.

  2. A imagem exposta ja havia resultado, evidentemente, em positivas vantagens, inclusive patrimoniais, no decorrer da carreira do atleta, com a contra-partida, contudo, da abertura de caminho para a negativa exposição, dado o caráter polissêmico da expressão. Logo, no caso, não se tem acréscimo negativo à matéria, mas, sim, a simples transposição de qualificação já antes criada, consentida e usufruída, posta à receptividade e ao debate da opinião pública. Em verdade, a imagem estampada, subsumiu-se no geral caráter visivelmente informativo e educativo da matéria a respeito de acidentes de veículos, ainda que desagradando ao Autor e a quem mais negativamente lembrado.

  3. No caso concreto, declarada pela justiça penal a não caracterização dos crimes considerados contra a honra, inexistirá o ilícito civil correspondente, salvo se a absolvição decorrer de insuficiência de provas.

  4. Nos termos dos dispositivos legais invocados pelo Autor, responde por danos morais e à imagem quem cause dano. No entanto, não houve, no caso, dano causado ao autor, mas tecnicamente, simples incômodo ou desconforto pela exposição do lado negativo da figura pública. Portanto, não há o que indenizar ao autor.

  5. Recurso Especial provido, julgando-se improcedente a ação, nos exatos termos, inclusive quanto à sucumbência da sentença.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Sidnei Beneti, divergindo do voto do Sr. Ministro Relator, no que foi acompanhado pelos Srs. Ministros Vasco Della Giustina e Paulo Furtado, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, dar provimento ao recurso especial para julgar improcedente a ação, vencido o Sr. Ministro Massami Uyeda. Designado Relator o Sr. Ministro Sidnei Beneti.

Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Nancy Andrighi.

Brasília, 23 de junho de 2009(Data do Julgamento)

Ministro SIDNEI BENETI

Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 1.021.688 - RJ (2008/0003244-0)

RELATOR : MINISTRO MASSAMI UYEDA
RECORRENTE : E.A.S.
ADVOGADOS : ANTÔNIO AUGUSTO ALCKMIN NOGUEIRA
ALEXANDRE FIDALGO E OUTRO(S)
RECORRIDO : E.A.D.S.N.
ADVOGADO : L.R.L.S. E OUTRO(S)

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO MASSAMI UYEDA (Relator):

Cuida-se de recurso especial interposto pela E.A.S., fundamentado no artigo 105, III, "a" e "c", da Constituição Federal em que se alega violação dos artigos 128, 295, parágrafo único, 333, I, 460, 515 e 535 do Código de Processo Civil; 27, VIII, da Lei n. 5.250/67; e 20, 884, 885, 886 e 944 do Código Civil, além de dissídio jurisprudencial.

Os elementos dos autos dão conta de que E.A.D.S.N., ora recorrido, ajuizou ação de indenização contra a E.A.S., ora recorrente, objetivando o ressarcimento dos danos à sua honra e à sua imagem suportados, além dos valores auferidos indevidamente com o uso de sua imagem, decorrentes da reportagem publicada pela empresa-ré de jornalismo na "Revista Veja" n. 1.619, em que foi estampada, em sua capa, a manchete com sua foto e a expressão "Animais no volante - Casos como o do jogador Edmundo mostram o que a justiça pode fazer contra a barbárie do trânsito".

O r. Juízo de Direito da 30ª Vara Cível da Capital - Comarca do Rio de Janeiro, após anotar que a alcunha de "animal" conferida pela imprensa esportiva ao autor da ação, jogador de futebol nacionalmente conhecido, notabilizou-se em razão do excelente desempenho de sua atividade esportiva, bem como de "incompreensíveis momentos de explosão de raiva ou má conduta", reputando serem notórios tais fatos, julgou a demanda improcedente, sob o argumento de que, "não tendo havido deturpação ou manipulação dos fatos, na medida em que a matéria apenas consignou os fatos que envolveram o acidente provocado pelo autor que culminou na morte de três pessoas e em sua condenação por sentença confirmada pelo Tribunal de Justiça, não há que se falar em direito à indenização, vez que a conduta do Autor, nesse episódio, foi fielmente retratada na matéria" (fls. 1036/1044).

Irresignado, E.A.D.S.N. interpôs recurso de apelação, ao qual o egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro conferiu parcial provimento para condenar a empresa-ré, E.A.S., ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 25.000,00 (vinte cinco mil reais) e, pelos danos à imagem, no valor de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), corrigidos monetariamente e acrescidos de juros legais a partir da citação. O Tribunal a quo condenou a empresa-ré, ainda, a título de retratação e exercício de "direito de resposta" do autor, a publicar o acórdão na 1ª edição da Revista Veja, na íntegra, em suas páginas interiores, após o seu trânsito em julgado (fls. 1153/1171). O acórdão recorrido restou assim ementado:

"DANO MORAL - PUBLICAÇÃO DE MATÉRIA JORNALÍSTICA OFENSIVA, COM UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE IMAGEM NÃO AUTORIZADA E FORA DE CONTEXTO EM CAPA DE REVISTA DE GRANDE CIRCULAÇÃO NACIONAL E EM "OUTDOORS" - SENSACIONALISMO E ABUSO DO DEVER DE INFORMAR - DETURPAÇÃO DA REPORTAGEM, TRANSFORMADA EM ESCÁRNIO DA IMAGEM DO AUTOR, CUJA CONDUTA JÁ VEM SENDO APRECIADA PELAS INSTÂNCIAS CÍVEIS E CRIMINAIS PRÓPRIAS - PROCEDÊNCIA - CONJUNTO PROBATÓRIO DOS AUTOS FAVORÁVEL ÀS ALEGAÇÕES CONSTANTES DA INICIAL - FIXAÇÃO DE INDENIZAÇÃO DE ACORDO COM O NÍVEL SOCIAL DO OFENDIDO E A CAPACIDADE ECONÔMICA DA OFENSORA - DIREITO DE RESPOSTA EM FORMA DE RETRATAÇÃO COM A PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO NO MESMO VEÍCULO JORNALÍSTICO - PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO DO AUTOR - REFORMA DA SENTENÇA.

  1. O fato de o autor ter se envolvido em acidente fatal de repercussão na mídia e considerado culpado nas ações cíveis e criminais próprias, não lhe retira a proteção constitucional à sua imagem e à sua honra, que não podem servir ao bel-prazer das empresas jornalísticas, que têm sua atividade limitada pela Constituição Federal e pela Lei de imprensa.

  2. A utilização de fotografia não autorizada e fora de contexto maculou a reportagem, inicialmente de caráter educativo, transformando-a em publicação sensacionalista e ofensora à dignidade humana.

  3. Recurso a que se dá provimento parcial para condenar a empresa jornalística ao pagamento de indenização por danos Morais em valor fixo, atendendo às peculiaridades das partes e do caso, bem como à publicação do acórdão como forma de exercício de "Direito de Resposta", legalmente previsto.

  4. Sentença reformada para julgar parcialmente procedente o pedido do Autor, com ônus sucumbenciais para a Ré, face à decadência em parte mínima do pedido inicial"

    Opostos embargos de declaração pela E.A.S., o Tribunal de origem os acolheu parcialmente para que "a condenação aos danos gerados à imagem do autor seja fixada na proporção de 10% da tiragem da revista cuja publicação ofensiva foi veiculada, a ser apurado em liquidação de sentença" (fls. 1181/1184).

    Busca a recorrente, E.A.S., a reforma do r. decisum, sustentando, preliminarmente, negativa de prestação jurisdicional, a despeito da oposição dos embargos de declaração. Aduz, ainda, que o Tribunal de origem, ao condená-la ao pagamento pelos danos materiais, não deduzidos na petição inicial e tampouco na apelação, procedeu a julgamento extra petita.

    No mérito, aduz que, em se tratando de matéria jornalística inspirada no interesse público, albergada "no artigo 27, VIII, da lei n. 5.250/67, que regula os preceitos constitucionais que tratam da liberdade de expressão, do livre exercício da imprensa, independentemente de censura e dos artigos que tratam dos direitos de personalidade", não há falar em dever de indenizar. Anota, ainda, que a condenação imposta denota inequívoca desproporção na mensuração da extensão do dano e a gravidade da culpa. Afirma, ainda, que as expressões "animal" ou "animais", utilizadas na matéria, já foram valoradas pelo Poder Judiciário, em sede de ação criminal, onde se afastou a ofensividade destas em relação ao recorrido. Assevera que o recorrido não produziu prova acerca da referida ofensividade, bem como da veiculação da revista por meio de outdoors. Anota, ainda, ser dispensável a autorização para o uso da imagem do recorrido, já que sua utilização deu-se para ilustrar reportagem de inequívoco interesse público. Pugna, por fim, pela redução da condenação que lhe fora imposta.

    O recorrido apresentou contra-razões às fls. 1334/1374.

    É o relatório.

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.021.688 - RJ (2008/0003244-0)

    EMENTA

    RECURSO ESPECIAL - NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL - NÃO OCORRÊNCIA - JULGAMENTO EXTRA PETITA - NÃO VERIFICAÇÃO - ABUSO NO EXERCÍCIO DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO - DEVER DE INDENIZAR - OCORRÊNCIA - RESPONSABILIDADE CIVIL INDEPENDENTE DA CRIMINAL - OBSERVÂNCIA - DANO MORAL DECORRENTE DOS DANOS CAUSADOS À HONRA E À IMAGEM DO RECORRIDO - QUANTUM QUE NÃO SE REVELA EXORBITANTE - REPARAÇÃO PATRIMONIAL DECORRENTE DA UTILIZAÇÃO INDEVIDA DO USO DA IMAGEM - POSSIBILIDADE - ADOÇÃO DE CRITÉRIO QUE ATENDA À RAZOABILIDADE E IMPEÇA O ENRIQUECIMENTO INDEVIDO - NECESSIDADE - PUBLICAÇÃO DE RELATO DOS...

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