Acórdão nº 2007/0151058-1 de T3 - TERCEIRA TURMA

Número do processo2007/0151058-1
Data02 Abril 2009
ÓrgãoTerceira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 964.836 - BA (2007/0151058-1)

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : M L C A
ADVOGADO : ALINE RODRIGUES DE CARVALHO
RECORRIDO : A P DOS S
ADVOGADO : BRANCA DE NEVE ROSAS ROCHA

EMENTA

Direito da criança e do adolescente. Recurso especial. Ação de guarda de menores ajuizada pelo pai em face da mãe. Prevalência do melhor interesse da criança. Melhores condições.

- Ao exercício da guarda sobrepõe-se o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, que não se pode delir, em momento algum, porquanto o instituto da guarda foi concebido, de rigor, para proteger o menor, para colocá-lo a salvo de situação de perigo, tornando perene sua ascensão à vida adulta. Não há, portanto, tutela de interesses de uma ou de outra parte em processos deste jaez; há, tão-somente, a salvaguarda do direito da criança e do adolescente, de ter, para si prestada, assistência material, moral e educacional, nos termos do art. 33 do ECA.

- Devem as partes pensar, de forma comum, no bem-estar dos menores, sem intenções egoísticas, caprichosas, ou ainda, de vindita entre si, tudo isso para que possam - os filhos - usufruir harmonicamente da família que possuem, tanto a materna, quanto a paterna, porque toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família, conforme dispõe o art. 19 do ECA.

- A guarda deverá ser atribuída ao genitor que revele melhores condições para exercê-la e, objetivamente, maior aptidão para propiciar ao filho afeto - não só no universo genitor-filho como também no do grupo familiar e social em que está a criança ou o adolescente inserido -, saúde, segurança e educação.

- Melhores condições, para o exercício da guarda de menor, evidencia, acima de tudo, o atendimento ao melhor interesse da criança, no sentido mais completo alcançável, sendo que o aparelhamento econômico daquele que se pretende guardião do menor deve estar perfeitamente equilibrado com todos os demais fatores sujeitos à prudente ponderação exercida pelo Juiz que analisa o processo.

- Aquele que apenas apresenta melhores condições econômicas, sem contudo, ostentar equilíbrio emocional tampouco capacidade afetiva para oferecer à criança e ao adolescente toda a bagagem necessária para o seu desenvolvimento completo, como amor, carinho, educação, comportamento moral e ético adequado, urbanidade e civilidade, não deve, em absoluto, subsistir à testa da criação de seus filhos, sob pena de causar-lhes irrecuperáveis prejuízos, com sequelas que certamente serão carregadas para toda a vida adulta.

- Se o conjunto probatório apresentado no processo atesta que a mãe oferece melhores condições de exercer a guarda, revelando, em sua conduta, plenas condições de promover a educação dos menores, bem assim, de assegurar a efetivação de seus direitos e facultar o desenvolvimento físico, mental, emocional, moral, espiritual e social dos filhos, em condições de liberdade e de dignidade, deve a relação materno-filial ser assegurada, sem prejuízo da relação paterno-filial, preservada por meio do direito de visitas.

- O pai, por conseguinte, deverá ser chamado para complementar monetariamente em caráter de alimentos, no tocante ao sustento dos filhos, dada sua condição financeira relativamente superior à da mãe, o que não lhe confere, em momento algum, preponderância quanto à guarda dos filhos, somente porque favorecido neste aspecto, peculiaridade comum à grande parte dos ex-cônjuges ou ex-companheiros.

- Considerado o atendimento ao melhor interesse dos menores, bem assim, manifestada em Juízo a vontade destes, de serem conduzidos e permanecerem na companhia da mãe, deve ser atribuída a guarda dos filhos à genitora, invertendo-se o direito de visitas.

- Os laços afetivos, em se tratando de guarda disputada entre pais, em que ambos seguem exercendo o poder familiar, devem ser amplamente assegurados, com tolerância, ponderação e harmonia, de forma a conquistar, sem rupturas, o coração dos filhos gerados, e, com isso, ampliar ainda mais os vínculos existentes no seio da família, esteio da sociedade.

Recurso especial julgado, todavia, prejudicado, ante o julgamento do mérito do processo.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Vasco Della Giustina, julgando prejudicado o recurso especial, e a reformulação do voto da Sra. Ministra Nancy Andrighi, por unanimidade, julgar prejudicado o recurso especial. Os Srs. Ministros Massami Uyeda, V.D.G. e Paulo Furtado votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Sidnei Beneti.

Brasília (DF), 02 de abril de 2009(Data do Julgamento)

MINISTRA NANCY ANDRIGHI

Relatora

RECURSO ESPECIAL Nº 964.836 - BA (2007/0151058-1)

RECORRENTE : M L C A
ADVOGADO : ALINE RODRIGUES DE CARVALHO
RECORRIDO : A P DOS S
ADVOGADO : BRANCA DE NEVE ROSAS ROCHA

Relatora: MINISTRA NANCY ANDRIGHI

RELATÓRIO

Recurso especial interposto por M. L. C. A., com fundamento nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, contra acórdão exarado pelo TJ/BA.

Ação (fls. 30/34): cautelar de guarda dos menores J. P. dos S. N., nascido em 12/3/1991, e D. L. C. dos S., nascida em 29/10/1992, proposta em 29/12/1998, por A. P. dos S., ora recorrido, em face da mãe, ora recorrente.

Alegou o recorrido que manteve união estável com a recorrente de 1991 até 1998, ano em que foi surpreendido com uma ação de alimentos, por ela proposta em seu nome e em nome dos filhos, e consequente desconto de 45% sobre seus vencimentos de aposentadoria. Acusou comportamento irregular e “moralmente condenável” da recorrente, o que ensejou o ajuizamento da cautelar de guarda dos filhos, que até então estavam em companhia da mãe. Sustentou que a “conduta irregular e inconseqüente manifestou-se de duas maneiras: a péssima administração dos recursos financeiros advindos da pensão alimentícia obtida judicialmente (...); e uma conduta moral nada condizente com uma boa educação para os menores” (f. 31). Afirmou que a recorrente contraiu inúmeras dívidas, gastando os valores recebidos a títulos de alimentos sem empregá-los ao fim a que deveriam ser destinados, e que depois de haver retirado os menores do convívio com o pai, passou a manter sucessivas relações de namoro, o que seria uma influência, segundo ele, prejudicial aos filhos. O comportamento “extravagante” da ex-companheira, que seria desapropriado para a criação e educação dos menores, ao lado da má-administração dos recursos financeiros provenientes da pensão alimentícia, foram apontados como os fundamentos principais para que a mãe fosse destituída da guarda dos filhos, sendo esta atribuída ao pai.

Manifestação da recorrente (fls. 41/44): em 19/11/2000, manifestando-se pela primeira vez no processo, a recorrente aduziu que somente naquela data havia tomado conhecimento da ação cautelar, porquanto o recorrido fez constar da inicial, de maneira insidiosa, que ela se encontrava em endereço desconhecido, sendo que litigam em dois outros processos, uma ação de alimentos, por ela ajuizada, e outra revisional de alimentos, por ele proposta. Asseverou que o recorrido sempre teve conhecimento do seu endereço, pois “encontram-se e conversam pessoalmente, quando a parte Ré busca visita a seus filhos, filhos esses mantidos ilegalmente e de maneira criminosa, como será provado, e que assim, estão sob a guarda ilegal e provisória da parte Autora, genitor das crianças em referência” (fl. 41). Por fim, forte no princípio da ampla defesa e na má-fé do recorrido, no sentido de que atribuiu falsamente endereço desconhecido à recorrente, pugnou para que todos os atos já realizados no processo fossem desconsiderados ou anulados.

Quanto aos fatos alegados pelo recorrido, sustentou que, ao contrário do quanto aduzido, o casal passou a conviver desde 1989 e separou-se em dezembro de 1997, o que culminou com a mudança de endereço da recorrente e das crianças para Salvador, tudo com o conhecimento do recorrido. A celeuma iniciou-se exatamente a partir do momento em que a separação de fato ocorreu, pois o recorrido deixou de honrar com o compromisso de sustento dos filhos. Acrescentou, ainda, que o recorrido impôs a saída da recorrente e dos próprios filhos do apartamento que lhe pertencia, o que provocou nova fixação de domicílio na residência da mãe da recorrente. Quanto à referida má-administração dos alimentos, afirmou a recorrente que somente os recebeu durante os meses de maio, junho e julho de 1998, sendo que logo após foi o pagamento sustado, em sede de revisional, não havendo, por conseguinte, nenhuma prova da aludida má-administração do pensionamento. As dívidas que o recorrido juntou ao processo, referentes a mensalidades escolares, consistem exatamente aos meses de setembro, outubro, novembro e dezembro de 1998, em que a recorrente não mais dispunha da pensão alimentícia e passou a depender do auxílio financeiro da sua genitora.

Petição do recorrido em 11/7/2002 (fls. 38/39): sob alegação de que as crianças já se encontram sob sua guarda de fato há 3 anos, inclusive matriculados em escola local, mas que em 21/6/2002, a mãe levou os filhos para almoçar e não os “devolveu”, requereu, em antecipação da tutela, a modificação da guarda dos menores, para que lhe seja atribuída.

Manifestação da recorrente em 16/7/2002 (fl. 45): alude ao não comparecimento do recorrido na audiência de justificação deste processo; informa que ajuizou ação cautelar de busca e apreensão dos menores em 25/8/2000, em razão de ter o recorrido mantido ilegalmente as crianças sob sua guarda a partir daquela data, tudo isso para confundir o Juízo. Aduz que recuperou a guarda dos filhos em 21/6/2002, e que a exerce legalmente desde então, sendo que as crianças estão matriculadas em escola local e com frequência regular em atividades escolares. Pugna, portanto, pela extinção deste processo...

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